Café avec un parfum de fleurs. escrita por sea nymph


Capítulo 5
Act V.




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Algumas semanas antes.

"Você trabalha aqui?", aqueles olhos azuis-perolados lhe estrangulavam, era visível que Merlin controlava o tom de voz.

Arthur estava boquiaberto com a imagem em sua frente. Esse não era um dos rapazes com quem trocara uns beijos na semana que passou? Aquele rapaz que acabou encontrando-o logo depois que mentira para sair com a lindinha da Amélie? Era ele mesmo. Jamais esqueceria daquela boca cheia. A culpa pesou sobre suas costas e a única defesa que encontrou foi desviar a atenção para as flores vermelhas.

"Não sabia que era florista também.", comentou, limpando sua garganta e aliviando a tensão ao apertar sua nuca.

"Não sou.", disse Merlin seco. "Enfim, Minhyuk, preciso ir. Obrigado. E qualquer coisa, pode me procurar."

O barista observou em silêncio a despedida do outro, a cabeça relembrando exatamente o ocorrido no festival da Colheita. Os dois estavam escondidos em um dos becos da cidade, conseguia sentir cada deslocamento do osso do mais novo de tão apertado que era o lugar. Seu gosto ainda vinha a memória e sua voz baixa naquele fuzuê de gente ainda era melodia pros ouvidos. Desde que o conhecera na primeira semana, Arthur estava certo de que quiçá o moreno lhe tiraria da vida de galinhagem. Mas foi só ver um par de olhos piranhos, que se perdeu novamente.

Quando voltou a si pra tentar se recuperar da surpresa, percebeu a sombra de um par de orbes amendoadas lhe encarando. Minhyuk estava de braços cruzados e balançando um dos pés, visivelmente curioso e impaciente.

"O que é que foi isso?"

"Isso o que? Não viaja, japonês. Não teve nada.", se fez de idiota e sentou em uma das cadeiras acolchoadas.

"Art, eu conheço quando você faz besteira... Igual com a Guin-", o pulo que Arthur deu pra tampar a boca do mais novo, acabou assustando-o.

"Tá maluco? Não fala o nome dessa praga.", já estavam próximos o suficiente, o sussurro do loiro foi ríspido mas não apaziguou o interesse alheio, que sustentou o semblante esperando uma explicação. "... Eu e o Merlin ficamos juntos."

"Isso eu percebi. O que eu quero saber é o que rolou pra...", ele apontou a porta como se Merlin estivesse ainda ali, esperando junto com ele uma explicação. "Você fez besteira de novo?"

O silêncio delatou sua culpa. O olhar acizentado de Arthur cruzou pelo vidro das janelas, contemplando a movimentação amena da cidade naquela manhã. Ainda estava tão cedo. Com um baque daquele, ele precisava de um copo de vodka antes pra sobreviver. Poderia estar exagerando, mas o moreno havia mexido com sua cabeça. Até demais.

"Menti. Disse que estava vindo pra casa, mas fui pegar a menina que te cont-"

"Ele era o cara que você ficou gamado aquele tempo todo?!", os pequenos olhos desenhados de Minhyuk dobraram de tamanho. Sua boca quase infantil abriu-se em exagero. "O que essa floricultura tem? Esses meninos são banhados a mel? Eu, você... Só falta o Sherlock ser fisgado."

O barista deu de ombros, também o que isso importaria agora? Já tinha acabado com suas chances mesmo e sabia que era culpado pelas escolhas que tomou. A única coisa que podia fazer era seguir seu rumo e deixar o rapaz se remoer de raiva, porque no final, Merlin estava certo. Pensando assim, até foi melhor pra que ele conhecesse sua índole antes de ser fisgado, pouparia mais as magoas futuras. Não era?

"Vamos trabalhar.", disse por fim, recebendo de Minhyuk um resmungo em resposta.

* * *

Merlin entrou na Mallorn como um furacão, espantando Hyunwoo e quase provocando um acidente com um broto de orquídea. O coreano olhou-o por cima do ombro pronto pra reclamar, mas acabou estranhando as feições tristes que o amigo sustentava. A intenção que teve foi de descer as escadas e saber o que estava se passando, só que o silêncio que o moreno mantinha, deixo-o arredio pra se aproximar.

John também pareceu curioso, tanto que nunca tinha visto ele chamar o mais novo várias vezes para sua sala. Merlin dispensava sempre um olhar passivo de emoção quando perguntavam se estava bem, aos clientes dava respostas curtas e os atendia com uma gentileza ensaiada e sorrisos amarelos, principalmente se um casal estava ali escolhendo as pétalas que enfeitariam seu casamento.

Hora do almoço havia chegado e os dois mais novos haviam combinado de sair pra comer juntos. Próximo a floricultura, uma antiga lanchonete ainda fazia sucesso por entre os habitantes. O coreano se ofereceu em comprar para os dois croissants recheados junto de algo pra beber. Mas, Merlin não queria almoçar e achou melhor ficar sozinho na sala de intervalo.

O silêncio perdurou por mais algumas horas e cansados de tentar saber o que havia acontecido, John e Hyunwoo tomaram seu expediente como prioridade, ignorando completamente a quietude alheia. Não por maldade, mas apenas respeitavam o qualquer que fosse o momento do rapaz.

"Hyunwoo...", chamou Merlin assim que o mais forte havia terminado de receber o pagamento de um buquê de lavanda. "Você já beijou alguém?"

"Não.", respondeu como se fosse algo qualquer, algo que não lhe pertencia. "Por que?"

"É sério? Nunca beijou ninguém?"

"Não. Não tenho tempo pra isso."

O moreno o encarou. Ele deu de ombros.

"... Eu sou interessante?"

"Não pra beijar.", continuou Hyunwoo, folheando tranquilo algumas revistas novas que haviam acabado de chegar.

"Você é um péssimo amigo, sabia?!", grunhiu, sumindo pela porta da frente, fazendo os sinos berrarem com a intensidade da força.

A testa do coreano encheu-se de linhas finas ao franzi-la. O que diabos fora aquilo? Ele só tinha sido sincero. Largando a revista em cima da poltrona, Hyunwoo saiu da loja procurando o colega. Não demorou pra encontrá-lo escondendo os olhos com ambas as mãos. Era visível o avermelhado que o nariz comprido do outro estava apossando. E os fungados denunciavam o choro baixo.

O mais forte não pensou em nada quando com os braços puxou o rapaz ao encontro do seu corpo. Apesar de chato e muitas vezes implicante, Merlin era seu único amigo naquele lugar. Os dois dividiam o apartamento, ele quem ensinou como ser simpático e atender as pessoas que vinham em seu auxílio; foi e é o único que se importa com seu bem-estar e saúde. Ele quem apresentou John e o transformou em seu colega de trabalho.

A lágrimas de Merlin eram quentes e ensopavam o cardigã escuro que cobria o corpo do asiático, os soluços estavam abafados pois como uma criança, o florista enfiava seu rosto contra o peito forte do outro. O que havia acontecido? Nem mesmo por esses dois anos juntos, Hyunwoo tinha-o visto chorar tanto. Seus dedos longos e calejados passaram a aninhar os fios escuros e grossos.

Não dizia uma palavra, não sabia o que dizer, mas queria que por mais dolorido fosse o que estivesse sentido, estaria ali pra apoiá-lo.

—__________

Minhyuk segurava contra o peito um envelope vermelho, seu nervosismo era visível enquanto o mais novo namorava pela vitrine as luzes fracas de Mallorn. Hyunwoo ainda estava trabalhando, conseguia ver a silhueta forte do rapaz sobre a bruxuleadas douradas do estabelecimento. Era tão lindo com aquele avental preso no corpo, as mangas da blusa desgrenhadas até a altura dos cotovelos. Quase um atentado a qualquer mente sã.

"Decisão difícil, Minhyuk?", a voz de Sherlock tinha um timbre inconfundível. O homem cruzava os braços para trás, como costumava fazer ao observar situações.

"D-desculpe, senhor... Eu não devia...", atrapalhado, o mais novo guardou o envelope no bolso do avental escuro. Procurou no balcão qualquer coisa que lhe ocupasse as mãos.

O som de um riso foi o que lhe ocupou os ouvidos. Minhyuk ergueu seus olhos para o rosto do mais velho em tempo de notificar o sorriso nos lábios esculpidos. Havia uma sombra ligeira ofuscando o brilho dos olhos translúcidos do homem quando ele voltou a atenção para a floricultura. Era a segunda ou quarta vez que Sherlock voltara a Le Monde depois de visitar Mallorn. As mãos sempre vazias e uma leve tristeza cortando suas feições impassíveis.

"Conheci o tal rapaz que lhe rouba os pensamentos...", era quase letal o sussurro que vinha do chefe. As bochechas do coreano se tingiram de forma inevitável. "Bom gosto."

"O-obrigado.", o que mais poderia dizer? Desviava ainda mais a atenção do corpo esguio, quando fingiu interesse em organizar comandas já quitadas. Ouviu mais uma vez o riso do mais velho até que estivesse sozinho.

Minhyuk odiava o fato de ser tão facilmente previsível, ou talvez Arthur contara para o chefe sobre sua paixonite nada correspondida. Bufou, acreditando que a segunda opção fizesse mais sentido. Falando no loiro, desde o encontro com Merlin, ele estava diferente. Mal saía a noite, nem sequer queria conversar sobre os bares que ainda não teve a honra de conhecer. Mesmo com o Festival da Noite Estrelada tão próximo, não chegou a comentar suas estratégias de como terminá-lo com seus instintos sexuais satisfatórios.

"Então, tomou coragem?", começou o coreano depois que abandonou seus pensamentos. Arthur só ergueu seus olhos azuis escuros, fingindo graça em não entender do que se tratava a abordagem. "Você sabe do que estou falando..."

"Merlin.", o resmungo foi entredentes, os fios loiros e dourados se moveram lentos quando o mais velho encarou o outro. "Esquece esse assunto, Minhyuk, puta merda. Já deu."

Minhyuk cruzou os braços na altura do peito, ouvindo o leve amassado do envelope que esquecera por segundos. Seus olhos automáticos se voltaram para as vitrines de Mallorn e os contornos grandes lhe roubaram mais um suspiro.

O expediente chegou  ao fim tão rápido quanto os flocos de neve que batiam contra a janela da cafeteria. O último cliente havia saído com avalanche de agradecimentos pelo chá quente com gengibre daquela noite, "havia salvado sua noite". O coreano sorria animado com cada obrigado que recebia. Sherlock já não estava mais no estabelecimento, dando aos rapazes a responsabilidade de fechar o caixa do dia, junto da loja. O companheiro de trabalho se encontrava dentro da cozinha, checando se tudo estava nos conformes enquanto ele, limpava as mesas e qualquer outra coisa que estivesse fora dos padrões de organização da casa.

Depois de uma última inspeção, ambos os rapazes se despediram e seguiram caminhos opostos. Minhyuk olhou por um segundo a silhueta loira se afastar com passos lentos e curtos, seguido por uma sombra tão desinteressada quanto. As coisas pareciam ter fugido do controle na cabeça do mais velho e aquele frescor do desapego havia fugido de seus olhos. O coreano, porém, continuava sua batalha interna entre entregar ou não a sobrecarta vermelhenta. Dando um suspiro vencido, ele tirou do bolso interno do casaco o que lhe atormentava e se dirigiu para Mallorn.

"Estamos fechad- Ah, oi, Min...?"

"Hyuk. Minhyuk.", disse quando um Merlin impaciente lhe abriu a porta. Seus olhos não hesitaram em olhar por cima do ombro do mais alto quem realmente estava querendo encontrar. "O... Hyunwoo ainda está por aqui? E-eu ... Eu gostaria de falar com ele."

Merlin radiografou seu rosto lívido pelo nervosismo. Desde a desastrosa visita a cafeteria nunca mais tinha visto o moreno. Aliás, em qualquer outra entrega ou quando vinha pedir algumas flores. Parecia que até este momento, o rapaz evitava-os descaradamente. Ainda com as feições torcidas em um desgosto cansado, o mais novo viu-o coçar a nuca desajeitado.

"Hyunwoo, é? Ele já foi pra casa tem alguns minutos."

"Ah...", o murmuro lhe roubou as notas e seus olhos não conseguiram esconder o desapontamento. Devia ter vindo mais cedo, por que por uma vez não escutava os conselhos de Arthur?

"Isso é um convite para o festival?", Merlin indagou apontando descaradamente o papel nos dedos magros do asiático. Cruzando os braços na altura do peito, ele começou a rir. "Olha, bem que desconfiava que você era um tanto maluco... Gostei. Vou ajudar você. Eu moro com o Hyunwoo, sabe? Entre, deve estar congelando...", e espaçou para dar lugar ao mais novo.

Dentro do aconchego místico de Mallorn, Minhyuk mal pode acreditar na sua sorte, ou do pouco que tinha. Óbvio que gostaria de encontrar o rapaz e perder, de uma vez por todas, essa sua relutância em enfrentá-lo, mas não iria negar aquela ajuda do universo. Quantas foram as oportunidades que havia perdido? Demorando um pouco pra deixar seu corpo se acostumar com a atmosfera fora de época da floricultura, o asiático esperou paciente a silhueta igualmente esguia fechar a porta e vir em seu encontro. Merlin ofereceu as poltronas gastas perto da estante de revistas pra que se sentassem, mas o coreano negou, estendendo a mão com o convite para o outro.

"Você não acha mesmo que eu vou ser seu pombo correio, não é?"

* * *

Hyunwoo girou a maçaneta e olhou sem interesse pelo apartamento, a única coisa que ele desejava era sua cama, uma espécie estranha empoleirada embaixo da janela que dava para a rua principal do prédio. Algumas xícaras quebradas serviam de vasos para seus cactos minúsculos e livros se amontoavam ao lado, cobrindo quase todo o parapeito descascado. O ambiente era muito pequeno para duas pessoas, mas até que ele e Merlin conseguiam se virar bem ali. A sala misturava-se perfeitamente com o seu "quarto", com apenas duas poltronas e uma TV engenhosamente posta numa pequena estante coberta por pertences do colega. As paredes eram de um creme suave e os papéis de parede que cobriam metade do concreto tinham tons azulados. Pôsteres estranhos faziam parte da decoração, quando não eram fotos de pessoas que não conhecia. Alguns móveis doados por seus pais também estavam por ali e a cozinha, por fim, ficava no outro extremo onde Merlin se instalara.

O coreano não conseguia parar de pensar sobre os ocorridos de hoje. John escondido na estufa sem sequer deixar um bilhete, o dono da Le Mond indo e vindo da floricultura com uma obsessão pelo seu chefe, Merlin distante desde o dia que chorou em frente ao trabalho. O que diabos estava acontecendo ali? Como que tudo começou a ficar tão esquisito e sem paz? Hyunwoo gostava da falta de movimentação que Esdmound tinha, era pacato, sereno e até ele, que mal se abalava com novidades, se viu pensando o porquê do rapaz de cabelo colorido não ter ido dar o ar de sua graça na loja.

Minhyuk. Esse era o nome dele. Lembrava do primeiro dia que haviam se visto e do quanto os fios tingidos haviam lhe chamado atenção. Pareciam as rosas do impossível, foi o que tinha dito para Merlin quando o mesmo perguntou sobre o rapaz. O coreano mais novo sempre estava ali, em horários certos, namorando as flores com uma curiosidade tímida, ou sentado nas poltronas folheando as revistas de jardinagem. Depois do primeiro encontro com a presença do loiro barista, eles nunca mais trocaram uma palavra. Por mais que tivesse vontade, não conseguia, já que sempre quando os olhos se encontravam sua voz se perdia.

Hyunwoo segurou a chaleira fumegante e despejou a água quente no amontoado de folhas secas, o perfume do chá vinha ao nariz de imediato alcançando seus músculos que relaxaram com a terapia improvisada. Não adiantava buscar por respostas se ele próprio não sabia como encontrar a derivadas. Dando de ombros, achou melhor ligar nas notícias locais e esperar Merlin para discutirem o jantar da noite.

Duas batidas na porta maciça tiraram-no da rota que havia desenhado antes e erguendo os olhos, curiosos, não demorou para atender quem ali estava.

"Esqueceu a chave de nov- oh.", começou o mais forte, acreditando que encontraria Merlin ali, mas visão dos fios lisos tingidos de azul lhe calou imediatamente.

"A-ah. Oi.", a voz um tanto rouca de Minhyuk lhe adentrou os ouvidos como da primeira vez, os olhos amendoados estavam cobertos por uma timidez exagerada. "Merlin disse que eu o encontraria aqui e..."

Um silêncio incômodo acabou roubando qualquer que fosse a frase que Hyunwoo estava disposto a dizer. Seus olhos namoravam descarados os ângulos quase perfeitos do mais magro, piscando vez ou outra, como se quisesse decorar o que estava a sua frente. Não sabia explicar o porque de suas bochechas começarem a ficar lentamente mais quentes e de seu coração estalar duas ou três vezes batidas arritmadas. Era um efeito simples, mas que pra pouco que entendia, significava bastante.

"Por favor, entre.", conseguiu dizer, levando aos lábios a xícara fumegante e queimando sua língua.


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