Amem escrita por Liz Setório


Capítulo 26
Regresso


Notas iniciais do capítulo

Nesse capítulo além de fortes emoções eu também trago uma música, que aparecerá num determinado momento do capítulo, seus trechos aparecerão em itálico e entre aspas, você pode ouvir no momento que esses trechos aparecerem ou ao longo do capítulo. Sinceramente acho esse capítulo muito essa música. A canção em questão é "Você não me ensinou a te esquecer". Link da música: https://www.youtube.com/watch?v=oARKLXIj6zw
Sem mais delongas, deixo vocês com o capítulo.
Boa leitura!



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Tomei  coragem e toquei a campainha. Não devo ter esperado por muito tempo, todavia a curta espera me pareceu uma eternidade. Fiquei extremamente nervoso, o meu coração estava a mil. Não me aguentava mais de saudades do meu Miguel, o meu maior desejo naquele momento era vê-lo.

— Boa tarde — disse o homem que abriu a porta.

Ao ver aquele homem me senti terrivelmente desapontado. Onde estava Miguel? Teria se mudado? Ele havia me trocado por aquele homem?

— Boa tarde, eu gostaria de falar com o Miguel, por favor.

— O Miguel?! Ele já não mora mais aqui há um bom tempo. Ele deixou a cidade.

Naquele momento entrei em choque. Como assim o Miguel tinha ido embora? Para onde o meu amado poderia ter ido?

— O senhor sabe onde ele está? — questionei aflito.

—  Não, não faço a menor ideia…

— Obrigado de qualquer forma, preciso ir agora.

Depois dessa curta despedida, ainda em choque, deixei o local. De nada adiantaria ficar ali, aquele homem não tinha mais informações para me dar. Resolvi então ir até a casa do Flávio, talvez ele soubesse de algo.

Enquanto caminhava até a casa do padre não consegui deixar de pensar no quanto eu tinha sido burro por ter abandonado o Miguel. Como pude deixar o amor da minha vida abandonado assim? Como pude achar que ele me esperaria por tanto tempo?

— Você é um jumento — murmurei de forma raivosa para mim.

Continuei andando e no meu caminho não pude deixar de sentir uma forte nostalgia, tudo naquela cidade me lembrava Miguel. Era como se cada cantinho daquele lugar contasse um pouco da nossa história: as nossas brigas, os nossos amassos, as nossas alegrias…

Quando cheguei na casa de Flávio fui logo recebido. Ele pareceu surpreso em me ver, talvez o padre tivesse esperanças de que eu escolhesse a Igreja ao invés do Miguel ou talvez ele só não estivesse esperando me ver.

— Paulo, você por aqui?! Venha, entre.

Obedeci a ele e já dentro de sua casa, fui logo interrogando de maneira desesperada:

—  Flávio, você sabe onde ele está? Onde está o meu Miguel?

— Desculpe, mas eu não sei. O Miguel foi embora e não me disse para onde ia. Ele pediu pra eu te entregar uma carta, talvez nela ele diga onde está. Você está muito nervoso, respire fundo, Paulo. Vou pegar um pouco de água para você.

Dentro de pouco tempo Flávio voltou com um copo de água e com a carta. Bebi a água num rápido gole, quase me engasguei e cheio de curiosidade abri o envelope.

 

Meu amado Paulo,

Peço a você que me perdoe, meu amor, mas era impossível para mim ficar aqui te esperando. Seria uma loucura. Ainda mais, pelo simples fato de tudo nessa maldita cidade me lembrar você. Ficar aqui era um suplício. Imagine viver tamanha tortura durante dois anos de pura incerteza? Eu morreria!

Quando eu vi a sua carta, pensei em suicídio. Chorei como um bebê, não quis acreditar naquilo. Esperei o seu arrependimento, pensei que você poderia voltar atrás . Ah, se você tivesse se arrependido, eu faria de conta que nunca havia lido aquela maldita carta. Eu apenas te daria um demorado beijo e seguiríamos em frente com o nosso amor pecaminoso. Mas, agora, com a cabeça fria, vejo que foi melhor assim. Na verdade nós nunca fomos um casal, estávamos sempre nós três: eu, você e a Igreja.

Quando li a sua carta, fui atrás do Flávio, quase bati nele. Implorei para ele me contar onde você estava, mas ele não contou. Senti muita raiva dele e disse que iria atrás de você, prometi lhe procurar no céu e no inferno, porém, depois, achei que não valia a pena te procurar. Eu só te causaria mais confusão...

Às vezes eu acabava sendo meio grosso contigo quando você demonstrava a sua indecisão, porém depois das grosserias eu sempre me sentia culpado, me sentia mal, porque sabia que você sofria com toda aquela incerteza. Hoje me arrependo de não ter sido mais companheiro seu, algumas vezes, acho que eu acabei te forçando a tomar uma decisão que você não estava preparado para tomar. Talvez nunca esteja...

Depois de um tempo vivendo em tristeza profunda e de uma tentativa  de suicídio, eu passei a viver uma vida profana: “buscando em outros braços seus abraços. Perdido no vazio de outros passos. Do abismo em que você se retirou. E me atirou e me deixou aqui sozinho”. Estive com vários homens e te digo isso, porque não quero que o Flávio tenha o constrangimento de lhe contar e também porque quero ser sincero contigo, mas saiba, meu bem: MEU ÚNICO AMOR foi você. Eu me sentia tão vazio e perdido, por isso, saia por aí e acabava me envolvendo com qualquer um, todavia, não existia sequer uma paixão, tratava-se apenas de um envolvimento carnal.

Nos tempos do seminário eu até senti algo pelo Tobias, isso é bem verdade, porém não posso chamar aquilo de amor, pois somente com você conheci o amor e aprendi, apesar dos pesares, como era se sentir feliz com alguém.

Não sei o que vou fazer agora, estou completamente sem rumo. Paulo, eu te amo e não sei o que farei, pois  “você não me ensinou a te esquecer. Você só me ensinou a te querer E te querendo eu vou tentando me encontrar.” Mas, mesmo assim, tentarei viver sem você, tentarei, de alguma forma, tampar o enorme vazio deixado por você em meu peito.

Quiça, seja melhor assim para nós dois. A gente sempre acabava brigando e eu lhe causava muita confusão.  Não te peço para me esperar, muito pelo contrário, quero que siga a sua vida, pois se Deus te criou apenas para amar a Ele e à Igreja o que eu posso fazer? Não sei se um dia você poderia me amar e ser meu por inteiro. Meu amor, se um dia for da vontade de Deus, espero te ver de novo. Talvez, nossos corações estejam mais calmos e a gente possa se amar de uma forma mais tranquila.

Provavelmente essa carta não chegará em suas mãos, eu te conheço e sei que as chances de você voltar são mínimas, quase inexistentes, entretanto, espero que você seja feliz, meu amor. Te desejo o melhor do mundo. Eu te amo. Te amo com todo o meu ser e para sempre te amarei.

Com amor e dor, do seu amado Miguel.

Um milhão de beijos.

 

Quando terminei de ler a carta, estava imerso em lágrimas. Demorou muito tempo para eu me acalmar.

— E agora, Flávio? Como viverei sem o Miguel? — perguntei meio choroso.

Ele não respondeu nada, apenas me deu um forte abraço.

— O que farei da minha vida sem ele? Ele não me disse para onde foi — falei, enquanto me soltava do abraço de Flávio.

Tive novamente mais uma crise de choro e mais uma vez fui consolado por Flávio, quando consegui me tranquilizar, perguntei ao padre sobre algo na carta de Miguel que havia me perturbado muito.

— Ele falou de tentativa de suicídio, padre. Como foi isso?

— Depois que você foi embora ele veio aqui, queria porque queria que eu revelasse onde você estava, mas eu não fiz isso e se não fiz não foi por maldade, mas sim porque sabia que se ele fosse lá, vocês corriam risco de excomunhão, pois ao ver o Miguel o abade poderia muito bem entrar em contato com o bispo e o Meirelles daria um jeito de providenciar a excomunhão, ao menos a do Miguel, talvez até a sua, porque quando a Igreja quer, desrespeita suas próprias regras… E também corria o risco da visita do Miguel te desestabilizar ainda mais… Enfim, ele insistiu muito, estava muito nervoso, porém eu tive jogo de cintura e o convenci que você precisava de tempo para colocar as ideias em ordem … O Miguel ficou muito triste e eu segui acompanhando ele, sempre o visitava, um dia, fui visitá-lo, mas ele não abria a porta. Então resolvi ver se a janela do quarto que dava acesso à rua estava aberta, aí vi o Miguel caído no chão ao lado de um frasco de remédios vazio…

— Meu Deus! — exclamei.

— Com muito esforço consegui arrombar a porta. Felizmente o Miguel estava vivo, fui correndo chamar ajuda e levamos ele pro hospital da cidade vizinha.

— Eu sou um monstro.

— Por quê?

— Por quê? Eu quase matei o Miguel. Ele só fez isso por minha causa. Agora quem tem vontade de se matar sou eu. O que farei da minha vida sem ele?

— Calma, Paulo, por favor, aja com a mente. Lembre que esse mundo é pequeno, vocês ainda podem se encontrar…

— Acho bem difícil, Flávio.

— Eu te peço calma, se Deus quiser no final tudo dará certo e o melhor para você e para o Miguel acontecerá.

[...]

Passei aquela noite na casa do Flávio, praticamente não consegui dormir. A todo momento pensava em Miguel e no quanto ele havia sofrido na minha ausência. Ele estaria bem?

No dia seguinte me despedi de Flávio e viajei para a casa de minha mãe. Durante a minha estada no mosteiro telefonei para ela algumas vezes, porém a saudade que eu sentia era enorme, precisava ir vê-la o quanto antes, precisava também decidir qual rumo tomaria. Voltar ou não para o mosteiro? Era a questão que martelava na minha cabeça, todavia eu não tinha muita opção. Afinal, compulsoriamente eu havia ficado com a Igreja e dificilmente eu conseguiria ter uma paróquia novamente sob o meu comando, a minha única opção era voltar para o mosteiro.

Eu até poderia largar de vez a Igreja, porém não teria o menor sentido. Eu já não tinha mais Miguel e se assim era, ou eu me mataria ou voltaria para o mosteiro.

Coragem para o suicídio me faltava, então o meu destino final acabaria sendo o mosteiro e lá eu ficaria até o fim dos meus dias.

[...]

— Finalmente lembrou que tem mãe.

— Eu tive problemas, mãe. Não deu pra vim antes —argumentei.

— E onde está o seu amigo, o Miguel?

— Eu… Eu… Não sei.

— Não sabe? Vocês brigaram? — interrogou preocupada.

— Digamos que seguimos caminhos diferentes — expliquei.

Minha mãe não me disse nada, apenas me olhou com um semblante pensativo. Talvez estivesse se questionando sobre quais caminhos seriam esse, entretanto felizmente ela não me fez mais perguntas

[...]

Mais tarde, naquele mesmo dia, numa conversa com Ângelo, fui questionado sobre qual rumo daria à minha vida.

— Eu vou pro mosteiro. Aparentemente essa é a vontade de Deus.

— Você pode fazer tantas coisas com a sua vida, meu irmão. Você poderia, sei lá, fazer uma faculdade, começar uma nova carreira...

— Não. Nada disso tem sentido sem o Miguel. No mosteiro eu estarei um pouco melhor.

— Se essa é a sua decisão… Mas saiba que pode contar comigo para qualquer coisa, eu sempre estarei aqui e sempre cuidarei de você.

[...]

Fiquei na casa de minha mãe até o dia de voltar para o mosteiro. Antes da minha partida me despedi de mamãe, porém não disse para onde estava indo.

— Não demore tanto para vir me ver — pediu.

— Eu não sei quando poderei estar aqui de novo.

— Você parece mais um executivo do que um padre. Nunca tem tempo pra nada. Por que isso, Paulinho? — reclamou.

Naquele momento me perguntei se deveria contar para ela para onde iria e o porquê de eu não saber ao certo quando voltaria.

— Mãe… Eu… Eu…

— Você o que? Diga logo — ordenou impaciente.

— Eu estou indo para o Mosteiro do Silêncio — revelei.

— Você fez alguma coisa de errado, meu filho? Porque até onde sei quase todos os padres que estão lá fizeram algo de errado.


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Notas finais do capítulo

Eita, será que o Paulo vai contar a verdade ou vai inventar uma desculpa esfarrapada?
Não perca o próximo capítulo. Infelizmente o fim está próximo :/
Muito obrigada por ter lido ♥



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