Amem escrita por Liz Setório


Capítulo 13
Visita Inesperada


Notas iniciais do capítulo

ATENÇÃO: este capítulo é contraindicado para quem tem problemas cardíacos: fortes emoções irão acontecer.

Boa leitura!



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— Vá — disse num tom de voz fraco, quase inaudível.

— Você tem certeza? — questionou.

Não disse mais nada e apenas observei Miguel se afastando lentamente de mim. Quanto mais ele se afastava maior era a minha vontade de chorar. Num determinado momento não consegui mais segurar as lágrimas e elas começaram a rolar desesperadamente pelo meu rosto.

Quando o meu amado já se aproximava da entrada do ônibus ele olhou para mim e eu então me deixei levar pela emoção e gritei com toda a minha força:

— Miguel, espere.

Nesse mesmo momento ele veio correndo em minha direção, mas eu não consegui correr até ele, era como se uma força maior me mantesse fixo ao chão. Quando pude perceber fui tomado por um forte abraço de Miguel que foi retribuído de maneira intensa por mim. Ele até tentou me beijar, porém eu suavemente virei a face.

— Estamos em público — sussurrei no ouvido dele.

Miguel limitou-se a dar um leve riso. Eu ainda chorava, estava entregue a emoção do momento.

Passado um breve tempo nos acalmamos e Miguel lentamente se soltou do meu abraço.

— Você vai comigo?! Eu não acredito, Paulo — declarou visivelmente surpreso.

— Eu não aguentaria te deixar partir.

Ele não disse nada, apenas manteve o olhar fixo em mim, um olhar que demonstrava todo o seu amor pela minha pessoa.

— Eu te amo — disse quase em sussurro.

— Eu te amo — respondeu em tom mais alto que o meu.

Fiquei tímido e direcionei o meu olhar para o chão, Miguel delicadamente levantou o meu queixo, fazendo com que os nossos olhares se encontrassem.

— Nós vamos ficar juntos para sempre. Entendeu?!

Limitei-me a um balançar de cabeça. Estava confuso de mais para conseguir expressar algo por meio da fala.

Os meus sentimentos eram conflitantes. Eu não sabia muito bem se estava tomando a decisão certa, ainda tinha muito medo do castigo divino. No entanto, uma parte de mim, praticamente bradava que o correto era ficar com Miguel.

Procuramos um banco e sentamos para esperar a saída do outro ônibus. No tempo que ficamos sentados praticamente não falamos nada, era como se conversássemos por telepatia, palavras naquele momento pareciam ser completamente desnecessárias. Todavia, Miguel aparentava compartilhar do mesmo sentimento de confusão que eu e rompeu o silêncio, indagando:

— Você tem realmente certeza que vai comigo? Você não vai desistir quando já estivermos prestes a entrar no ônibus?

Balancei a cabeça negativamente.

— Paulo, fale. O gato não comeu a sua língua — disse levemente irritado.

— Eu já tomei a minha decisão, fique tranquilo — pedi.

Aquela fala não tinha sido completamente sincera. Eu ainda tinha muitas dúvidas, mas dessa vez tentaria manter a minha decisão até o final.

Felizmente, consegui manter-me firme, apesar de toda confusão que pairava a minha mente. Entrei no ônibus junto com Miguel e nesse momento, sussurrei um Pai-Nosso, findada a oração pedi a Deus que me perdoasse pelo pecado que eu insistia em cometer.

Já dentro do ônibus, sentado lado a lado com o meu amor, não me sentia menos confuso, mas talvez um pouco mais calmo. O meu mal estar foi se abrandando aos poucos, o que eu julguei ter sido um castigo divino, foi apenas uma expressão do meu nervosismo que foi diminuindo, diminuindo e logo eu já não tinha praticamente mais sintoma nenhum, apenas as náuseas permaneceram ao longo da viagem.

Miguel repousou a cabeça em meu ombro e eu levemente acariciei sua face. Nos olhos dele estava refletido todo o amor que ele sentia por mim. Olhar para Miguel era revigorante, eu me sentia amado e sentia que tudo aquilo valeria a pena.

Retirando a cabeça do meu ombro e pousando uma de suas mãos em minha coxa, pediu:

— Quero que esqueça o sacerdócio. Evite rezar, ler a Bíblia ou fazer qualquer outra coisa que te lembre a Igreja. Agora somos homens comuns.

— Por que você sempre me pede o impossível?

— Só faça um esforço. Eu quero ser feliz com você e quero esquecer de uma vez o nosso passado de santidade — Fez aspas com as mãos assim que terminou de dizer a última palavra.

— Não vamos falar sobre isso. Vamos tentar curtir a viagem — sugeri.

Com o decorrer da viagem foi como se Miguel e eu fossemos aos poucos esquecendo que um dia havíamos sido padres. A cada momento o assunto distanciava-se mais da Igreja e aproximava-se de assuntos ditos do mundo.

— Você acha que a vilã vai conseguir separar os mocinhos? — indaguei.

— Ah, Paulo não seja trouxa. É uma novela, os mocinhos sempre ficam juntos no final.

Aquela frase me tocou bastante. Senti-me como um mocinho de novela. Afinal estava enfim fugindo com o meu amor proibido.

— Como nós dois — observei.

— Sim, como nós dois, meu amor — reforçou em tom apaixonado.

Miguel aproximou seu rosto do meu e mais uma vez eu desviei de uma investida sua.

— Eu acho que não estamos num lugar adequado.

Então, ele aproximou-se de mim e sussurrou o seguinte:

— Quando estivermos no lugar adequado você me dará tudo que me deve.

A forma como ele falou aquilo me deixou inteiramente desconcertado e fez com que o meu corpo se arrepiasse.

Seis horas se passaram e finalmente chegamos ao nosso destino.

E ao descermos do ônibus lembrei-me de algo que não poderia ter esquecido: tinha que dar notícias a Michele.

Peguei o celular que estava no bolso da mochila e liguei para a minha sobrinha.

— Até que enfim lembrou de mim — A garota declarou ao atender o celular.

— Desculpe, eu passei por muitas emoções.

— O senhor está com o Miguel? — perguntou sem cerimônias.

— Sim, estou.

— Ótimo, tio. Fico feliz por vocês.

— Obrigado. Agora é a hora de você começar o nosso plano e ligar para a sua mãe.

— Sim, farei logo isso.

— Ok, tenha juízo e não invente de aprontar nada com o Lucas.

— Tio… Confie em mim e apronte muito com o Miguel.

Meu Deus, eu não sabia quem era o mais pervertido da história. A Michele ou o próprio Miguel… Como a menina poderia dizer uma coisa dessas?

— Michele?! — falei em tom repressor

— Tchau, tio.

— Tá bom, tchau.

Ao desligar o telefone fui com Miguel até a quitinete que ele tinha alugado para nós. Chegando ao local o meu amado lamentou pelo fato de só ter um colchão jogado no chão.

— Fique tranquilo, logo compraremos mais coisas. Enquanto isso comeremos na casa do meu amigo João, ele ficou de nos ajudar até nos estabilizarmos. Amanhã mesmo ele deve nos levar até o restaurante que está contratando garçons.

Trabalhar como garçom não seria ruim, mas seria no mínimo esquisito. Durante toda a minha vida eu havia apenas trabalhado como padre.

[...]

Miguel e eu conseguimos o emprego de garçom. Mais uma vez éramos colegas de profissão. Eu gostava muito do ambiente do restaurante, o problema era que não muito longe dali havia uma igreja católica e toda vez que eu passava por ela me arrepiava, era como se eu sentisse o peso de todo pecado cometido por mim.

— Nunca tem missa naquela igreja perto daqui — comentei com Miguel.

— Espero que não tenha nunca — respondeu de forma ríspida e voltado a concentrar-se no seu trabalho.

[...]

Dois meses se passaram. Miguel e eu vivíamos entre tapas e beijos, quase sempre as nossas discussões eram motivadas pela minha falta de entrega ao relacionamento e sentimento de culpa por estar com ele.

— Você sabe que as pessoas comentam sobre nós?

— E daí? Você tem vergonha? — interrogou irritado.

— Não, eu tenho medo. Medo que façam algo com a gente ou descubram quem somos — vociferei.

— Deixe de ser idiota, ninguém vai descobrir que o honrado padre Paulo sabe fazer um boquete bom como ninguém.

— Me respeite, Miguel — ordenei aos gritos — Estou começando a achar que foi um erro ter largado a Igreja e ter ficado com você.

— Então volte pra lá, Paulo. Ninguém está te segurando aqui — berrou enquanto saía de casa.

Miguel saiu completamente irritado e bateu a porta com força. Pouco tempo depois escutei a campainha tocar. Ele tinha se arrependido?

Ao abrir a porta assustei-me, pois não era Miguel, mas sim um padre. A Igreja havia descoberto sobre mim e Miguel?


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