Conte-me uma história escrita por Chão


Capítulo 11
Capítulo 11 - O Diabo


Notas iniciais do capítulo

O Diabo mora dentro de todos nós.
Os demônios são nossos próprios pensamentos.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/754934/chapter/11

Matheus

   Sabe naquelas cenas dos filmes sobre patricinhas em que as portas se abrem e elas entram desfilando com uma música qualquer? Então, foi exatamente assim que aconteceu.
    A porta se abriu de forma brusca e Nick surgiu. Todos se viraram e olharam pra ele, inclusive André e eu. Ele vestia uma calça preta e camiseta branca com a jaqueta de couro por cima. Seus olhos  estudaram a sala até me encontrarem. Então ele lançou um olhar furioso para André e caminhou a passos firmes em direção à cozinha.
     - O Diabo chegou. - disse Isa parada ao meu lado.
     - E chegou com classe. - disse Katy.
     - Ei, ou você tá comigo ou contra mim. - a encaro por algum tempo e então ambos rimos.
     - Atura isso, Theus? - Pergunta Isa.
     - É só o babaca do Nicolas. - sorrio para ela. - É fichinha.
      Nos entreolhamos e rimos.
      Após a chegada, nada triunfal de Nicolas, todos voltaram a se ocupar em encher a cara.
       A festa se arrastou noite a dentro. E quanto mais ela se estendia, mais fora de controle ficava.
         As últimas coisas de que me lembro, antes de apagar, é de alguém gritando, um soco sendo desferido e pessoas arrastando um garoto para fora. E logo após isso minha mente se tornou um grande e imenso borrão.

Vinicius

    Ele agarrou o pote de sorvete e cruzou as pernas. Então ligou a televisão e colocou um filme de terror qualquer. Seus dedos tocaram o celular em cima da almofada, mas algo lhe dizia que não era o momento exato.
     Seus pais haviam ido se deitar, mas ele sabia que acabariam por não dormir. Afinal, como dormir com dois filhos problemáticos?
      Conforme o filme avançava, Vinicius foi tomado pelos velhos pensamentos deprimentes. A escuridão se instalou como uma praga que se arrastou lentamente por sua mente, até fazer o vazio preencher seu peito.
       Ele queria contar de verdade a Matheus sobre o que viu ao chegar até o corpo. Sobre como o assassino pareceu-lhe familiar, mesmo estando com uma máscara. E sobre a ameaça que fez. O que impedia-lhe de arriscar a vida daqueles com quem ele se importava.
       Amanhecia do lado de fora quando alguém bateu em sua porta. Por alguns segundos Vinicius pensou ter imaginado o barulho. E então o papel branco deslizou por baixo da porta, parando alguns centímetros a sua frente.
      Ele se levantou devagar. As mãos se fecharam com força, enquanto ele as deixava juntas ao corpo.
        Vinicius se abaixou e pegou o papel. Os dedos trêmulos agitavam a folha amarelada.
        As letras, recortadas de revistas e jornais, soavam ameaçadoras e mórbidas.
               "O que é, O que é?
               Esta descansando eternamente
               E você é o culpado."

     A folha caiu suavemente em direção ao chão.
      Vinicius abriu a porta. Ao longe a escura se afastava cada vez mais.
              
                            Matheus
      
     A luz que entrava pela janela da sala era cegante e dolorida. Minha cabeça doía tanto que não iria me surpreender se descobrisse que existia pequenos anões dentro dela que martelam o meu cérebro.
       O braço de André estava sobre mim e seu corpo colado ao meu. Ele roncava baixinho e de forma tranquila.
       Várias pessoas estavam espalhadas pelo chão. Algumas caídas umas sobre as outras, outras deitadas de qualquer jeito. E isso me fez rir. Isa estava desmaiada de qualquer jeito no outro sofá. O cabelo loiro caído sobre o rosto a deixava parecendo a Samara descolorida.
        Tentei voltar a dormir, mas então alguém gritou no andar de cima, fazendo todos os presentes levantarem assustados. Senti a gravidade me puxar para baixo quando André literalmente me empurrou para fora do sofá. Meu corpo se chocou contra alguém, que soltou uma série de palavrões.
        - O que aconteceu? - Perguntou ele me olhando de cima.
        - Nada.  - revirei os olhos enquanto saía de cima do garoto.
        No andar de cima o som de algo pesado caindo fez com que todos olhássemos para cima. Alguém xingou. Então  outro grito, dessa vez mais irritado, cortou o ar.
         Fui um dos primeiros a chegar no andar de cima e a tentar separar os corpos. Nicolas, como sempre, estava perdendo a briga e por um milésimo de segundo pensei em soltar o outro garoto e deixá-lo acabar o trabalho. Infelizmente eu sou uma ótima pessoa.
         - Vai se fuder. - gritou o garoto tentando se soltar. - Eu vou acabar com esse ladrãozinho.
          Um longo e incomodo silêncio se instalou sobre o corredor enquanto todos olhavam para Nicolas. Que levantou com um sorrisinho idiota no rosto. Ele limpou o sangue que escorria no canto da boca.
         - Do que ele tá falando, Nicolas? - Perguntou Isa. Ela se colocou entre os dois garotos.
          - O idiota aí achou que eu tava roubando o precioso celular dele. - Nick limpou a boca novamente. - Acho que ele ficou com medo de verem o belo vídeo que ele gravou ontem à noite.
         - Eu vou matar você. - gritou o garoto aproveitando a minha brecha e se lançando contra Nick.
          - Vamos parar com essa exalação de testosterona? - Disse André puxando o garoto para longe de novo. - James, vamos embora, e vamos agora.
          André puxou o garoto consigo, enquanto a galera abria caminho.
           - Quero ver explicar isso pra mamãe. - disse ele enquanto os dois desapareciam em meio a escada.
        Todos se viraram novamente para Nick.
         - Você não consegue ficar sem causar confusão? - perguntei o encarando.
         - O show já acabou, Matheus. - ele retribuiu o olhar. - Seu namoradinho já foi.
         Nick pegou a jaqueta no chão e saiu pisando firme.
         O silêncio se instaurou novamente.
           - Vamos lá, galera. - Isa bateu palma. - A festa acabou. Todo mundo metendo o pé.
                   
                            ¥¥¥

     Me larguei sobre o sofá. O suor escorrendo por meu rosto.  Apesar da chuva la fora, dentro da casa tava um inferno.
      - Você e o André foram o casal mais fofo da festa. - disse Isa sentando ao meu lado. - Me diz que pegou o número dele.
       Tiro o celular do bolso e balanço na frente dela. E só então a tela acende e as várias mensagens de Vini aparecem.
        "Merda, eu sou um lixo de pessoa."
         Deslizo o dedo pela tela indo até a primeira mensagem.
         " Eu sei que é egoísmo da minha parte, mas queria você aqui."
          A última era de algumas horas atrás.
          " Bom dia. Espero que sua noite tenha sido melhor que a minha."
           - Vinicius? - pergunta Isa levantando uma sobrancelha.
           - Sim. - deslizo a tela e ligo para ele.
            Ele atende após o nono toque.
            - Hey. - sua voz está baixa. - Dormiu bem?
            - Acho que sim. - sorrio para mim mesmo. - Foi a festa da Isa e eu apaguei.
           - Que coisa feia. - ele riu.
           - O que aconteceu? Tipo, agora a noite. 
           - Nada demais. - Vinicius ficou mudo por um longo segundo. - Vou te ver hoje?
            - Talvez. - fecho os olhos enquanto a dor martela meu crânio. - Se eu não morrer até lá.
            - Eu tenho aspirina.
            - Me ganhou.

              ¥ ¥ ¥

    Ainda caia o mundo lá fora quando Vini deu um passo para o lado, me deixando entrar em sua casa. As olheiras em seus olhos eram difíceis de não encarar. Ele sorriu, e isso fez uma pequena parte de culpa me preencher de um jeito arrasador.
     - Pesadelos? - perguntei assim que a porta se fechou. 
     - Emorragia nasal. - disse ele em um tom que foi meio difícil decidir se era verdade ou não. Então o sorriso abobalhado surgiu em seus lábios.
      Me larguei sobre o sofá, a dor de cabeça ainda não havia ido embora. 
       - Você me deve uma aspirina ou um tiro na cabeça que faça a dor passar.
        Vini desapareceu pela porta da cozinha, voltando logo em seguida com uma caneca enorme do Star Wars. O cheiro de café predominou o ambiente.
       - Tenho uma ideia melhor. - disse ele me passando a caneca. Então sentou ao meu lado e bateu de leve em minha coxa. - O que aconteceu na festa?
         - Bem, ela tava legal. Tipo, a Isa sabe como dar uma festa. - tomei um gole do café amargo. - Aí o demônio apareceu.
          - Nicolas? - Vini pronunciou o nome com nojo.
          - Exatamente. - Tomo outro gole. - E por incrível que pareça ele não fez nem menção de falar comigo ou coisa do tipo. Até agora de manhã.
         Vini fechou as mãos com força.
         - Aparentemente ele estava fazendo uma Sex Tape com um garoto. Aí tentou roubar o celular do moleque, ou sei lá o que aquele garoto realmente queria fazer. E o moleque desceu a porrada nele.
         Trocamos um breve olhar e começamos a rir.
          - E você? - ele me olhou nos olhos. E algo dentro de mim se agitou com violência. A temida pergunta. - Beijou muito?
          Tomei um longo gole de café enquanto confirmava com a cabeça.
          - Sem problemas. - ele sorriu. - Ainda não estamos namorando ou algo do tipo. 
          Vini disse o "Ainda" com tanta ênfase que me fez sorrir.
          Apesar do sorriso em seu rosto, um traço de decepção havia passado por sua voz.
          - Continuo me sentindo culpado. - murmurei. Tomo o último gole de café e coloco a caneca entre as pernas. - Você sabia que tem sangue no canto da sua boca?
           - Que? - Vini esfregou as costas da mão em ambos os lado da boca.
           - Vai me contar o que realmente aconteceu de noite ou eu vou ter que adivinhar?
            Vinicius encarou o chão. Seus dedos bateram sobre as coxas. Ele soltou um longo suspiro e então começou a falar.

          ¥ ¥ ¥

   As cordas apertaram ao redor de seus pulsos. Seu cabelo castanho estava caído sobre o rosto enquanto seus braços eram puxados para cima. Seus lábios emitiram um ruído baixo, algo que podia ser entendido como "Me solta. Por favor." As manchas de sangue cobriam boa parte da camiseta branca. O corte em seu labio ainda sangrava. O sangue deslizava por sua pele até chegar a seu queixo e cair em gotas pesadas sobre o chão de cascalho.
     Seu corpo foi içado em meio às árvores da entrada do parque. Seus braços foram esticados, a deixando em formato parecido com o da cruz. 
      Seu grito cortou a noite. Então seus olhos encontraram os dele e com uma voz fraca ela fez a pergunta que todos queriam saber a resposta.
       - Quem é você?
       O sorriso sarcástico surgiu em seus lábios. Então ele cobriu o rosto com a máscara de um demônio.
         - O Diabo. - respondeu de forma seca.
          Então mirou a arma para a cabeça dela. O som do tiro ecoou parque a dentro.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Olha quem atualizou
Comenta ae
Deixa o tio felizaum ❤️



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Conte-me uma história" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.