Lua Nova: Outros Caminhos escrita por Sarah Lee


Capítulo 2
17. Dor


Notas iniciais do capítulo

Desculpa a demora para postar queridxs, estava mega doente e talz. Mas fiquei muito feliz com os comentários (vocês não tem idéia de como isso da motivação pra gente!). Então sem mais delongas, aproveitem a leitura (tentarei postar regularmente a partir de agora ♥).



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Minha mandíbula estava dolorida quando acordei. Eu suava frio e me perguntei o porquê do quarto estar girando. Olhei para meu relógio e o horário marcado eram cinco da manhã, parece que nunca mais terei uma boa noite de sono.

Me arrastei até a janela do quarto e puxei uma cadeira para perto dela, para que a brisa fria da noite pudesse acalmar meu coração acelerado. E ali fiquei observando. Não havia algo em particular para ser observado, só a floresta negra e silenciosa de Forks. Mas olhar para lá, de certo modo, me deixava mais tranquila.

Como se sentisse que havia alguém cuidando de mim.

O que havia acontecido com Jacob, no dia anterior, ainda estava me deixando confusa. Eu não queria que ele se afastasse, mas ainda não sabia se podia amá-lo. Eu precisaria de um pouco mais de tempo para decidir, e a questão é se Jacob realmente esperaria por mim.

Charlie também acordou cedo neste dia, assim que a claridade começou a aparecer no céu cinza, ele desceu as escadas cuidadosamente. Talvez por achar que eu ainda estava dormindo.

— Pai? — Chamei sem pensar.

Charlie apareceu na porta, estava visivelmente abalado e exausto. As noites tranquilas de sono que tínhamos absolutamente nos abandonaram.

— Bella, não sabia que estava acordada... — Ele falou cuidadosamente, enquanto se ajeitava de dentro de seu terno cinza escuro. Provavelmente comprado por Renée há muito tempo, o terno tinha um caimento estranho em seu corpo. — Você hãn... Gostaria de me acompanhar? — E fez um gesto para a porta.

— Claro, pai! — Respondi rapidamente. Com tanta coisa sobre Edward e Jacob ocupando minha cabeça ultimamente, havia me esquecido que hoje é o funeral de Harry Clearwater. — Desço em um instante — Terminei enquanto ele se retirava do quarto para me dar privacidade.

O caminho para o cemitério foi silencioso, Charlie não estava para conversa, preso em seus pensamentos durante todo o trajeto. E eu com meus próprios problemas. - De algum modo o céu parecia mais cinzento hoje -, pensei, melancólica.

Chegando ao pequeno cemitério da cidade, parecia que todos os residentes da reserva estavam lá. O que não me surpreendia, já que Harry era um dos anciões da tribo e alguém querido por todos. O campo aberto salpicado pelas lápides de desconhecidos me provocavam uma sensação estranha. Sam e seu grupo estavam amontoados em um canto da propriedade, provavelmente o boato que Sam havia formado uma gangue afastava as pessoas leigas à situação sobrenatural que rodeava Forks. Sem saber ao certo o porquê, meus olhos vasculharam o local em busca de algo.

Uma onda de alívio percorreu meu corpo quando avistei Jacob conversando com Leah perto de uma árvore - ele estava bem, afinal -. Por reflexo desviei meu olhar do dele, assim que ele me notou.

Cumprimentei diversas pessoas nas horas que percorreram o velório, Seth estava ocupado demais consolando sua mãe, de modo que me privei de desejar minhas condolências para eles. Aproveitando que Jacob foi se juntar ao seu bando, me aproximei de Leah. — Meus pêsames Leah, Harry foi... Um grande homem... — Ela não me respondeu, seu silêncio e ar de antipatia podem funcionar como um tipo de escudo. - eu mesma já me utilizei diversas vezes desta técnica -, mas no fundo de seus olhos escuros pude perceber que ela ficou grata pelas palavras. Também notei, enquanto me afastava para me juntar a Charlie, que ela observava Sam e Emily com intensidade de mais no olhar. Penso o porquê disso.

Sentia-me desconfortável a todo instante que estava entre o luto, como se eu estivesse experimentando uma dor que não era minha. Uma intrusa. Apesar de Harry ter sido como um tio para mim, um bom amigo de Charlie e alguém que sempre me tratou bem, não me parecia certo estar nesse ambiente. Meus pesares eram outros, este pertencia a eles.

— Ei, Bells — Jake se aproximou de mim, sua constante aura de energia parecia ter sido encoberta, como o sol pelas nuvens cinzas de Forks. — Você está bem? — com um tom tímido na voz.

Jacob era outro que parecia deslocado, seu terno era pequeno agora que seu corpo havia mudado tanto, então ele ficava apertado em alguns lugares. E utilizar roupas, principalmente roupas pesadas, quando sua temperatura corporal passa facilmente de quarenta graus, deve ser algo desagradável.

Observar Jake me fez perceber o quanto ele estava tenso. Suas mãos estavam suadas, ele ficava as abrindo e fechando em um movimento mecânico, e também mudava constantemente seu peso entre as pernas. Ele estava nervoso. Então outro tipo de desconforto tomou conta de mim, as lembranças de nós, no banco do carro, fazia meu estômago se contorcer e o céu girar. — Ei! Vai com calma Bella — Ele tentou me segurar para que eu não caísse, mas o toque de suas mãos na minha cintura me deixou rígida. Algo não se encaixava. E Jake também deve ter sentido isso, pois acabou se distanciando novamente.

— Desculpe, eu... — Não consegui achar as palavras certas para dizer, estava tudo tão confuso na minha cabeça, a mistura de sentimentos me sugava o ar. Senti as lágrimas se formando no canto dos meus olhos, e os buracos aumentando no meu peito. De modo que decidi me afastar. — Desculpe... — Soltei mais uma vez. Esse não é o lugar para me deixar despedaçar, não entre essas pessoas, não quando Charlie mais precisa de mim.

Agora como ancião da tribo, Billy tratou de dar continuidade à cerimônia. Eu me aprontei e fui logo segurar a mão de Charlie, mais para me dar suporte do que para ele. Jacob se manteve afastado, mas ainda me fitava nervosamente com seus olhos castanhos escuros.

O evento foi rápido, eu não entendia o que Billy falava - algo sobre a vida ser só uma passagem, e de grandes espíritos -, mais uma prova de que este não era meu lugar. Mas fiquei respeitosamente em silêncio, apertando a mão de Charlie nos momentos em que parecia que ele não conseguiria, para mostrar que eu estava aqui. Me dei conta de como estive ausente nesses dias, devido à dor e depois ao medo, quando me abriguei em La Push. Decidi ser uma filha melhor para Charlie a partir de agora, e poupa-lo de certas dores.

Charlie se prontificou de ir levar o caixão quando foi solicitado, e Sam se juntou a eles, com Billy seguindo a comitiva em sua cadeira de rodas. Billy estava visivelmente aborrecido por não ter a oportunidade de carregar o corpo de seu amigo.

— Ei...  Bella? — A voz chamou atrás de mim. Não precisei me virar para saber que era Jacob, em seu tom desanimado. — Quero dizer, como você... — ele bufou de frustração por não conseguir encontrar as palavras certas. Mas ele definitivamente não precisava.

Era isso que eu mais gostava no Jacob. Nós não precisávamos de palavras complexas, ou de gestos exagerados para sabermos o que o outro estava pensando, o que o outro sentia. Era quase como se tivéssemos nossa própria telepatia de lobos. Era tudo tão mais fácil com ele, não é mesmo? Cada vez estava mais acostumada com a sua presença, sua energia. Mas constatar isso me deixou inquieta novamente.

— Estou bem Jacob... É com Billy que você devia se preocupar — E finalmente me aproximei dele. Eu não cheguei a encostar, mas sentia as ondas de calor emanando de dentro do tecido pesado de seu terno. Como se embaixo desse tecido escuro, estivesse o sol em pessoa, ardendo e gritando para ser libertado. — Vai demorar um bom tempo para ele conseguir superar a perda.

Me lembrei de como eu não consegui. O pensamento de Charlie se tornar o que eu me tornei quando Edward foi embora, experimentar a dor que eu senti por nunca mais vê-lo, me fez ficar assustada. Ninguém merecia passar pelo o que eu passei.

Ao presenciar meu súbito estado de angústia, Jacob se aproximou ainda mais, completando o pequeno espaço que ainda havia entre nós. Ele colocou delicadamente seus braços na minha cintura, me abraçando por trás. E desta vez, eu não recuei.

— Eu estou aqui Bells — Sua voz era grave e quente, e muito determinada quando completou. — Sempre estarei por você.

Jacob me deu o mais puro dos beijos no topo da minha cabeça. Pelo menos foi assim que ele se mostrou ser. Um beijo que me fez esquecer a dor, tapar as rachaduras, sentir aquecida. Ele estava, ou pelo menos tentava, consertar tudo que Edward deixou em pedaços. Então comecei a pensar sobre os “dias bons” ao lado dele, e que a possibilidade de voltar a ser feliz não parecia mais uma fantasia impossível. Eu tinha que acreditar nisso, eu me devia isso.

Eu sabia que as más memórias não haviam desaparecido, elas apenas estavam lá escondidas, como o sol sob as nuvens espessas de chuva. Tantas perguntas e pensamentos me faziam sofrer por antecedência, pois eu sabia que após tanto tempo em abstinência, a solidão voltaria dez vezes pior.

Novamente eu esperei a dor vir. Novamente, ela não veio.

O enterro não durou muito mais, os residentes da reserva seguiram de volta para suas terras, pois ainda havia questões dos rituais a serem resolvidas. E nós, “pessoas de fora”, não estávamos permitidos a participar dessa parte. — Te encontro mais tarde na praia? — Jake me disse preocupado. E após eu confirmar com a cabeça, ele voltou a seguir seu pai por entre a floresta.

Fiquei vagando por La Push até o entardecer, normalmente evitava os momentos solitários de reflexão, mas desta vez ele se fazia necessário. Precisava colocar algumas coisas no lugar. Charlie também não fez protestos, ele havia combinado de esperar Billy após os rituais, de modo que fiquei livre para fazer o que eu quisesse. Depois de um tempo andando sem rumo na areia, acabei me acomodando nas raízes do grande salgueiro branco.

Observar o sol tocando o mar, como dois opostos se unindo, me trazia paz. Era a combinação perfeita de fogo e água. Fogo sob a água. E essa comparação me fez lembrar de algo importante. No dia anterior, quando eu quase me afoguei, eu tenho certeza que vi labaredas laranjas dançando sob a água, mas não havia como isso ser possível, não é mesmo? Talvez fosse parte do delírio de quase afogamento que eu tive.

A imagem continuou martelando minha cabeça durante vários minutos, pois algo parecia estranhamente familiar no laranja perfeito que as chamas formavam. Como se eu já tivesse as visto anteriormente. Os pensamentos correram fazendo as conexões, mas a ficha demorou a cair. Jacob havia dito que perderam Victoria próximo ao Canadá, quando ela escapou pela água .- Os sugadores de sangue têm a vantagem lá -, ele havia dito.

Perceber a gravidade da situação arrancou o ar dos meus pulmões, me fazendo entrar em pânico pelo o que poderia ter acontecido. Victoria, com seus dentes afiados e seu olhar negro de sede, estava a poucos metros de mim e Jacob na praia. O que faríamos se ela tivesse resolvido atacar? Eu, e até mesmo Jake, poderíamos estar mortos agora mesmo. De todas as coisas ruins que poderiam acontecer comigo, seria bem pior se eu soubesse que fui responsável pela morte dele. A tortura que ela planejava fazer quando me pegasse teria sido bem melhor que isso.

Não havia como eu fugir, se Victoria ainda estivesse nessa área eu não teria a mínima chance, de modo que eu permaneci encolhida nas raízes da árvore branca, temendo e esperando pelo meu inevitável fim. A praia tinha se tornado um dos meus pontos favoritos nos últimos tempos, talvez pela beleza e tranquilidade. Mas acredito que em boa parte tenha sido por causa da companhia de Jacob. Ele se fez sol nos momentos que mais me faltaram luz, e eu não teria como agradecer o suficiente por isso. Talvez sem ele para me ajudar com a dor, eu já tivesse me partido inteira em pedaços.

A temperatura foi baixando e o sol já havia se posto no horizonte, uma leve cortina de estrelas apareceu no céu noturno enquanto a lua ainda estava se acomodando no seu posto. Foi quando Jacob me achou.

— Bella! — Ele disse enquanto corria, eu não levantei a cabeça para vê-lo, mas percebi que ele se aproximava em grande velocidade, pois sua voz estava ficando cada vez mais perto. — Eu estava te procurando! Desculpe, a cerimônia durou mais do que eu previa.

Eu não respondi, a dor havia voltado nos momentos em que eu aguardei minha carrasca. A perspectiva de poder ter causado a morte de alguém que me era tão caro, não deixava ar suficiente entrar nos meus pulmões, de modo que apenas balancei um pouco a cabeça. Jake não disse mais nada, entendendo a minha situação. Se eu olhasse seu rosto agora, provavelmente o veria em dor. Ele se sentou próximo, passando gentilmente o braço ao redor de mim, foi só então que eu percebi que estava com muito frio de novo.

— Você se lembrou deles? — Sua voz era grave e carregada de dor. — Vou evitar te deixar sozinha, ok? — Jake apertou ainda mais o abraço. Era quente e confortável em seus braços, o ar conseguia entrar mais facilmente no meu corpo, e por um momento, eu senti que não havia outro lugar em que eu queria estar. As dúvidas sumiram da minha mente, mesmo eu sabendo que elas voltariam depois, eu não me deixaria estragar esse momento. Eu estava em busca da felicidade, não é mesmo?

Foi mais fácil que da última vez, eu só precisei levantar um pouco minha cabeça e lá estava ele, me encarando com seus olhos de um castanho quase negro. Sua respiração quente e constante, lentamente se encontrou com a minha. “Um lugar ao qual eu poderia confiar”, foi o pensamento que passou pela minha cabeça. Em um mundo em que a confiança havia me quebrado, confiar em Jacob Black era uma aposta arriscada, mas que eu estava disposta a fazer.

Foi com um movimento familiar que nossos lábios se encontraram, sua respiração parecia que me derreteria por dentro, suas mãos prendiam-me gananciosamente pelas minhas costas. Tentando me puxar para mais perto. E eu me senti completa de novo.

Não demorou muito para nos distanciarmos ofegantes, Jacob parecia ainda mais iluminado do que jamais foi, provavelmente esse beijo sanou alguma de suas dúvidas. Se é que ele tinha alguma. Pois eu tenho várias. — Seu pai está te esperando — Com todo o transtorno de Victoria, eu havia me esquecido de Charlie. Eu sabia que ele estava esperando por Billy, para se darem um pouco de apoio mútuo. E eu tinha prometido ser uma filha exemplar de agora em diante. Jacob se levantou, tirou um pouco de sujeira de sua camisa branca, e me olhou reluzente como nunca antes. — Vamos? — Disse sorridente, enquanto me estendia sua mão.

Por um momento hesitei, sabia que pegar essa mão acarretava em muitos sentimentos e acordos que eu não sabia se conseguiria cumprir, seriam mais responsabilidades e momentos para serem guardados. Eu pensei, respirei, e decidi que eu devia ao menos tentar. Agora por mim mesma.

Eu peguei sua mão, desta vez, oficialmente.


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