Iguais, porém opostos escrita por Cellis


Capítulo 10
Como rapidez e lentidão


Notas iniciais do capítulo

Olaaa, meus amores! Espero que estejam bem, morrendo de saudades e pronto para alguns tiros.
Demorei um pouco, sim, eu confesso, mas é porque estava preparando com muito carinho algo pelo qual vocês estão ansiosos há tempos!
Enfim, espero que gostem.

Boa leitura ♥



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— Bem, pense pelo lado positivo, espaguete. — iniciou Jimin, dando um curto passo para frente e tomando cuidado para não esbarrar em ninguém. Não importava o quão de elite o Kobe Suwon fosse, a fila no refeitório no horário de almoço era tão quilométrica quanto em qualquer outro colégio do país. — Pelo menos agora você será recompensada pela difícil convivência com o Taehyung. Pode, até, ganhar uma nota alta se aturá-lo direitinho.

Bo Ra respirou fundo, segurando-se para não rolar os olhos. Ainda que Jimin fosse tão útil quanto uma porta quebrada às vezes, ele ainda era um ótimo e fiel amigo e, só por isso, Bo Ra se esforçava para nunca tratá-lo mal.

Agora, ela começaria a perceber que tentar agir assim com todos não seria uma tarefa fácil.

— Pensando bem, a situação é um tanto cômica. — continuou. Por sorte, eles já conseguiam ver as funcionárias da cozinha distribuindo as bandejas com o prato do dia, o que significava que logo poderiam receber as suas. — Dos quase trinta alunos que compõe a nossa turma, você acabou justamente como parceira dele.

Bo Ra encarou o amigo, erguendo uma sobrancelha acusadoramente.

— Você está se divertindo com isso, não é? — indagou e, quando ele tentou esconder um sorriso travesso de canto, ela teve sua confirmação.

— Claro que não. — ele respondeu, dando de ombros.

Quando a vez deles finalmente chegou, Bo Ra percebeu que Jimin tinha, na verdade, razão. Não no fato de estar internamente morrendo de rir da cara da amiga, mas sim ao constatar a brincadeira de péssimo gosto do destino ao planejar aquele trabalho. Bo Ra não conhecia ou não se dava bem com a grande maioria dos alunos da sua sala, então, por que diabos sua dupla tinha que ser justamente Kim Taehyung? Poderia ter sido Yoona, a adolescente de cabelos falsamente ruivos que tagarelava durante todas as aulas da manhã ou, ainda, Sung Jo, o filho de um magnata da construção civil que se orgulhava do fato de nunca cortar os cabelos. Mas não, ela tinha de ficar de frente para Taehyung naquele momento e, agora, deveria escrever linhas e mais linhas sobre a personalidade conflitante do garoto.

De agora em diante, prestaria o dobro de atenção nas intenções dos seus professores.

Depois da escolha das duplas, os dois não trocaram nenhuma palavra sequer. Alguns olhares foram dados e também recebidos, mas nunca longos o suficiente para que o outro percebesse. Por fim, era hora do almoço e um Jimin esfomeado arrastara Bo Ra para o refeitório tão rapidamente, que Taehyung quase só conseguiu ver suas longas mechas escuras passarem por ele e logo sumirem em direção à porta. Agora, ela só conseguia imaginar o quão gostosos aquela sopa de legumes e o assado poderiam estar, caso as cozinheiras estivessem de bom humor.

Focada na bandeja vermelha que tinha em mãos, Bo Ra não percebeu que estava indo de encontro a alguém. Se Jimin não tivesse lhe avisado, ainda que em cima da hora, o desastre para Bo Ra teria sido muito maior do que apenas algumas gotas de suco de maçã derramadas ao lado da vasilha de arroz.

— Desculpe. — a pessoa em quem ela esbarrara disse primeiro, o que fez com que ela se sentisse um pouco mal e sem educação. Mesmo assim, direcionou o olhar para o garoto, que arregalou os olhos de surpresa. — Bo Ra?

Ele sorriu um pouco sem jeito, o que provocou nela a mesma reação.

— Hoseok. — ela disse, o reconhecendo em voz alta. — Desculpe pelo esbarrão.

— Não, tudo bem. Eu também não estava prestando atenção por onde andava, mas acho que isso acabou sendo algo bom. — por fim, o garoto exibiu o sorriso simpático e radiante que sempre trazia consigo. Não queria forçar nenhuma situação, então resolveu prosseguir o mais suavemente que conseguia. — Está procurando uma mesa?

Bo Ra fez um gesto positivo com a cabeça, correndo os olhos pelo refeitório. O sinal do almoço tocara há poucos minutos, por isso, as opções de lugares para se sentar ainda eram muitas. O único problema era que Bo Ra tinha aqueles minutos com Jimin como sagrados, e era justamente por isso que ela fazia questão de que os dois sempre se sentassem sozinhos em alguma mesa mais afastada — ou seja, sem serem incomodados por um terceira, ou ainda quarta, presença.

Então, ela se lembrou dos pensamentos que tivera durante a noite e também naquela manhã. Sem preconceitos. Talvez, o primeiro passo para se livrar de tal mau hábito fosse permitir-se sair de sua zona de conforto ou, quem saber, deixar que mais alguém desfrutasse dela.

— Você quer almoçar conosco? — ela perguntou educadamente a Hoseok, por fim.

Ele manteve o sorriso no rosto e, ainda assim, o mesmo parecia nunca deixar de ser natural.

— Claro.

Jimin, que fez uma careta ao estranhar aquela situação, seguiu na frente e logo apontou para uma mesa qualquer. Bo Ra foi a primeira a se sentar, seguida por Hoseok, que apanhou o lugar de frente para ela, e, por fim, foi a vez de Jimin — e ele teria se sentado ao lado da amiga, se não tivesse escutado seu nome sendo gritado na outra ponta do lugar. De longe, Park Bo Gum acenava para Jimin e convidava o garoto para se sentar em sua mesa.

— Ele é a minha dupla. — Jimin explicou sem muito ânimo, referindo-se ao trabalho do Sr. Do.

O garoto, alto e atlético, era uma das poucas pessoas com as quais Jimin não fazia muita questão de se dar bem no colégio. Bo Ra entendia o porquê e não tirava a razão do amigo — afinal, também detestava pessoas nitidamente homofóbicas como Bo Gum, mas que sempre se protegiam com a mesma explicação estúpida de que faziam apenas brincadeiras. Claro, ninguém além dela sabia sobre Jimin mas, mesmo assim, odiava ver o quanto ele se sentia desconfortável com aquela situação. Aproximou-se do amigo e diminuiu o tom de voz, mesmo que Hoseok não estivesse prestando atenção nos dois.

— Vai, mas só se você quiser. — ela disse. — Mas, se ele lhe constranger, me avise que eu não deixarei barato.

Jimin não conseguiu segurar uma risada, imaginando como seria se Bo Ra enfrentasse alguém que era, quase que literalmente, duas vezes o tamanho dela. Por fim, respirou fundo. Se fosse para conviver com Bo Gum, que fosse logo e o mais rápido possível.

Por um momento, chegou a sentir-se no lugar de Bo Ra em relação a Taehyung, o que o fez rir mais uma vez.

— Licença. — disse, apanhando sua bandeja para sentar-se com Bo Gum.

Por fim, Bo Ra e Hoseok foram deixados sozinhos, o que a fez imaginar que aquele seria um almoço um pouco desconfortável. Hoseok, por outro lado, mantinha seu bom humor inabalável e tomou como objetivo não deixar o silêncio tomar conta daquele momento.

— Está tudo bem? — ele indagou, fitando-a. — Quero dizer, você esteve um pouco silenciosa nos últimos dias.

Bo Ra sentiu-se levemente envergonhada por ter simplesmente ignorado alguém que esteve aparentemente preocupado com ela, contudo, se pudesse voltar no tempo, ainda teria tirado aqueles dias apenas para ela mesma.

— Sim, está tudo bem. Eu só precisei resolver alguns problemas pessoais.— afirmou, sem entrar em detalhes. Apanhou uma quantidade considerável da sopa de legumes antes de continuar. — Desculpe se eu lhe fiz pensar que você tinha feito alguma coisa errada.

O sorriso do garoto aumentou, se é que aquilo era humanamente possível.

— Tudo bem, você não fez por mal. — ele disse, compreensível. — Fico feliz em saber que você está bem, pelo menos.

Na verdade, Hoseok era uma pessoa de convivência extremamente fácil, o que fez Bo Ra perceber que estava errada ao pensar que almoçar sozinha com ele poderia ser desconfortável. A conversa fluía tão bem que ela se via realmente prestando atenção no que ele dizia, sem dar espaço para os pensamentos secundários que rodeavam a sua mente. Estavam sendo minutos agradáveis, e Bo Ra não via problemas em admitir isso.

Havia, por outro lado, alguém extremamente incomodado com aquela situação. Algumas mesas atrás de Bo Ra, Kim Taehyung almoçava com seus dois habituais companheiros sem, realmente, interagir com eles. Sua atenção estava presa naquela mesa em específico, onde Hoseok exibia seu sorriso falso e fazia o tronco de Bo Ra balançar conforme ela ria. Lembrou-se de quando prometeu para si mesmo que não se meteria e que deixaria Bo Ra descobrir por si só quem Hoseok realmente era; contudo, esperava um pouco mais de rapidez da parte dela naquela época.

Mas Hoseok era bom no que fazia. Quando aquele garoto de quatorze anos entrou em sua casa pela primeira vez, mostrando-se como o primo educado e simpático de Yoongi, Taehyung também não conseguiu ser rápido. E as coisas quase perderam o controle por causa disso. Naquele verão, Taehyung teve de fazer algo de que não se orgulhava, talvez dando um dos primeiros passos na direção da pessoa que era hoje, mas não se repreendia por isso. Se fez o que fez, foi porque teve de lidar com alguém muito pior do que ele.

Mas Bo Ra não era assim, e ele não precisava de um trabalho de colégio para saber dessa característica dela. Ele sabia que  Hoseok estava planejando algo, ou pelo menos querendo apenas se divertir, e também que Bo Ra não seria fria como ele foi quando descobrisse isso. Infelizmente, ela aparentava ser mais forte do que realmente era.

Aish... que desgraça! — Yoongi resmungou, espreguiçando-se e enfiando-se no campo de visão de Taehyung. — Posso saber onde vocês dois estão?

Taehyung assumiu sua típica expressão de poucos amigos, ao passo que Jungkook pareceu despertar assustado de um transe.

— O que disse, hyung? — o mais novo indagou, um tanto confuso.

— Que você está olhando demais para a mesa do time de lacrosse. Eu não gosto daquele tal de Bo Gum, que é o líder do time, por isso, você pode tirar o cavalo da chuva se estiver pensando em ser amiguinho dele. — Yoongi ameaçou, apontando ameaçadoramente para o mais novo, que se encolheu e ruborizou. Em seguida, direcionou o curto dedo indicador na direção de Taehyung. — E você, em que planeta está? Fica olhando com essa cara de ódio para sabe-se lá onde.

Taehyung inclinou a cabeça e, sem cerimônias, empurrou a mão de Yoongi para o lado.

— Essa é a minha expressão habitual. — disse, dando de ombros. — Além disso, a culpa não é minha se nada aqui prende a minha atenção.

Yoongi levou a mão que acabara de ser estapeada ao peito, fingindo ter se ofendido.

— Alguém acordou na TPM. — murmurou e, em seguida, riu.

Como já estava acostumado a fazer, Taehyung resolveu ignorar o sarcasmo de Yoongi, voltando sua atenção para sua bandeja ainda quase cheia. Ouviu Jungkook comentar algo, porém, sua atenção foi novamente capturada por outra coisa, o que lhe impediu de entender o mais novo — ou melhor, outro alguém. Os cabelos vermelhos de Hoseok moviam-se sedosos e, quando Bo Ra se levantou, a luz do Sol refletiu nos fios do rapaz. Ele observou Bo Ra caminhando na direção da bancada de bandejas, depositando a sua já vazia lá, enquanto Taehyung o observava de longe.

E, então, ele riu. Não o riso simpático que geralmente exibia para cativar as pessoas, mas algo tão tenebroso quanto a risada de Yoongi. Taehyung não soube ficar quieto diante daquilo, pelo contrário: quando Hoseok se levantou, ele fez exatamente o mesmo.

Pouco se importava com aquela sua ideia estúpida de não se meter.

— Onde você vai? — indagou Yoongi, confuso. — Nós ainda não acabamos de comer.

— Eu já. — foi a última coisa que o rapaz disse, antes de deixar os amigos para trás.

Hoseok caminhava tranquilamente pelo corredor, com as mãos nos bolsos da calça e um assobio nos lábios. Parou de frente para o seu armário, digitou a senha sem pressa alguma e apanhou sua escova de dentes. Em seguida, quando bateu a porta de metal, revelou também a figura alta de Kim Taehyung parada ao seu lado e o encarando com toda a atenção.

O ruivo franziu o cenho.

— Taehyung, certo? — indagou, como se estivesse se esforçando para lembrar o nome do outro.

Taehyung, por outro lado, exibiu para ele o mesmo sorriso tenebroso que vira há pouco tempo.

— Sabe, eu cheguei a me perguntar se você realmente não me reconhecera ou ainda não se lembrava de mim. Afinal, na noite da festa, eu mesmo não me lembrei. — iniciou, calmamente. — Mas Jung Hoseok é esperto demais para cometer tal falha.

Hoseok manteve o cenho franzido por mais alguns segundos, porém, a expressão confusa logo se desfez. Eles estavam completamente sozinhos no corredor, quando o semblante do garoto assumiu o típico ar sarcástico dos Min.

Ele poderia facilmente ser um irmão mais novo e com menos escrúpulos de Yoongi, seu primo.

— Vou levar isso como um elogio. — disse Hoseok. — Eu estava me perguntando quanto tempo mais esse momento demoraria para chegar. Você foi mais rápido da última vez, Taehyung.

A respiração de Taehyung estava pesada e ele não fazia a menor questão de esconder que estava se segurando para não avançar em Hoseok.

— O que você quer? — ele indagou, freando os próprios punhos antes que os mesmos se movessem. — Por que voltou?

Hoseok riu, endireitando-se para ficar exatamente de frente para Taehyung.

— Acredite se quiser, a ideia não foi minha. Meus pais queriam que eu terminasse o colégio num lugar assim. — respondeu, olhando ao redor do Kobe Suwon. — Na verdade, eu não dou a mínima se você acredita em mim ou não.

— Eu não preciso acreditar, desde que você não esqueça onde é o seu lugar. — Taehyung retrucou, dando um passo para frente.

Hoseok tinha esquecido o quanto não gostava do garoto.

Aigoo... eu deveria ter sido mais rápido naquele dia. — reclamou, tão naturalmente quanto se comentava sobre o tempo. — Se tivesse escondido os documentos que encontrei no cofre do seu pai antes de você aparecer feito um intrometido, você não teria metade dessa prepotência de agora.

Se fosse capaz de sentir tais coisas, Taehyung teria, na verdade, pena de Hoseok. Ele não estava nem perto de ser a pessoa que acreditava ser, não passando de um rastro de um cleptomaníaco que, aos quatorze anos, tentou roubar informações confidencias do cofre de uma família que acabara de conhecer. Ele não era esperto o suficiente naquela época e, pelo visto, continuava não sendo.

— Mesmo assim, eu ainda teria a filmagem mostrando o bandido que você é. — disse Taehyung, o que irritou o outro. — Você provavelmente não sabe disso, mas eu sou muito bom em conservar objetos valiosos para mim. Talvez seja por isso que eu ainda tenha aquela fita tão bem guardada.

Hoseok não esperava que, ao tentar cumprir a ordem de seu pai naquela época de descobrir uma engrenagem podre na empresa dos Kim, ele fosse ser surpreendido por alguém que tinha a mesma idade que ele e também o mesmo nível de calculismo. Pela primeira vez, foi chantageado, assim como Taehyung viu-se fazendo aquilo também pela primeira vez.

Apesar de chocado por se deparar tão repentinamente com tamanha corrupção dentro da empresa do pai, o garoto não podia deixar aquelas informações vazarem. Tinha a chance de proteger a sua família e, por isso, o fez. Sentiu-se sujo, mas descobriu que, assim como usar o seu próprio filho para fazer algo tão baixo como roubar documentos, atitudes como a chantagem eram normais no mundo dos negócios. Foi por isso que, naquele ano, ele percebeu que jamais teria estômago para assumir o negócio da família, por mais robótico e frio que fosse.

E também o motivo pelo qual Taehyung esperava que o assunto tivesse morrido naquele dia, no escritório do seu pai.

— Tudo bem, Kim. — disse Hoseok, por fim. Deu de ombros e sorriu para o outro. — Eu não tinha a intenção de me aproximar da sua família novamente, na verdade.

Taehyung manteve a expressão séria, sem recuar.

— Não só da minha família. — afirmou. — Kang Bo Ra. Eu não sei o que você está planejando, mas tenho certeza de que acaba por aqui.

Hoseok não demorou muito para entender e, logo, riu descaradamente na frente do outro.

— Então é isso? Você deveria ter me contado antes, Taehyung. Teria poupado meu tempo, meus esforços e alguns dos seus neurônios de morrerem queimados. — rebateu, ainda rindo. Sua postura relaxada incomodou Taehyung, mas ele se manteve em silêncio. — Tudo bem também, eu posso me divertir com outra garota. Vai ser uma pena, porque ela é realmente muito...

— Fique longe. — Taehyung interrompeu entre os dentes, pronto para deixar seus punhos fazerem o trabalho que tanto queriam. — Esse é o meu primeiro e último aviso.

Por um momento, Hoseok apenas o encarou. Assim como Taehyung pensava sobre ele, o rapaz acreditava que o outro não era tudo isso que fazia questão de aparentar. Mesmo assim, o ruivo levava uma vida confortável demais para arriscar confrontá-lo, ainda que quisesse.

— Quem diria que o grande e temido Kim Taehyung tem, na verdade, uma fraqueza tão mundana. — comentou Hoseok, sorrindo debochadamente. — Não se preocupe, você não vai se sentir incomodado por mim novamente.

Hoseok usava um tom de voz tão baixo e grave que, se estivesse conversando com qualquer outra pessoa, a mesma com certeza se sentiria ameaçada. Contudo, quando Taehyung tornou a não respondê-lo, o garoto deu meia volta em direção ao banheiro, assumindo sua postura tranquila de antes e enfiando a escova de dentes no bolso. Taehyung não se moveu durante vários minutos, apenas respirou fundo e esperou que Hoseok tivesse entendido sua mensagem.

Por fim, ele havia se metido ainda mais do que esperava.

Bufou, sem muito ânimo. A essa altura, Yoongi e Jungkook já não estariam mais no refeitório. Pensou em procurar por eles, mas logo desistiu; até porque, não estava com vontade de conversar com ninguém naquele momento. Virou-se, pronto para retornar para a sua sala, quando deparou-se com Bo Ra a não muitos passos atrás dele. Ela o encarava com atenção, chegando a tombar a cabeça levemente para a esquerda, e ele não soube dizer se conseguiu esconder a surpresa ao vê-la.

— Posso lhe fazer uma pergunta? — ela indagou repentinamente.

Ele não foi capaz de ler nada na expressão facial dela, o que o incomodou. Será que ela teria escutado sua conversa com Hoseok? Não, muito provavelmente não. Não estaria tão calma e natural se o tivesse feito, com certeza. Taehyung deu um par de passos desconfiados para frente, mantendo o contato visual. Aquilo significava que ela poderia seguir em frente com o que quisesse perguntar, e foi justamente o que ela fez.

— Você já esteve em um parque de diversões, por acaso?

Se ele dissesse que esperava por algo tão aleatório, estaria sendo hipócrita. Onde diabos Bo Ra planejava chegar com aquilo?

— Não.

Ela quis rir, porém, se conteve em consideração ao seu plano.

— Então conhecerá hoje. — ela afirmou, já dando as costas para o outro.

Sem entender absolutamente nada, a única coisa que Taehyung conseguiu expressar foi um questionamento simples.

—Por que? — indagou, odiando o fato de estar parecendo uma criança confusa.

Bo Ra virou-se para ele novamente, fitando-o com os olhos semicerrados.

— Dizem que só se conhece verdadeiramente uma pessoa quando convive-se com pelo menos um dos dois extremos dela: o divertido ou o triste. Eu me dei conta de que, na verdade, nunca vi nenhum desses seus dois. — Bo Ra respondeu, naturalmente.

— E por que escolheu o divertido? — ele indagou de volta, incapaz de conter a curiosidade.

A Kang não chegou a perceber mas, ao responder o garoto, deixou escapar um sorriso de canto.

— Achei que seria um desafio interessante.

 

***

 

Taehyung era um aluno exemplar e não fazia nada dentro da sala de aula além de prestar atenção em seus professores, contudo, ele não conseguiu manter seu foco em mais nada naquele dia; pelo menos não em nada relacionado às aulas e matérias. Sua mente viajava entre o sarcasmo ousado e obscuro de Hoseok, passando pelo fato de que sairia sozinho com Bo Ra naquela noite e chegando, até mesmo, em qual seria a vestimenta adequada para se usar em um parque de diversões. Ele tinha muita coisa em mente para prestar atenção nas fórmulas de Física do professor Namjoon ou nos delírios literários daquele professor mais alto, o qual tinha um nome tailandês extremamente difícil de ser lembrado.

No fim do dia, o sinal que anunciava o fim das aulas tocou, porém ele sequer se moveu. Esperou para ver o que ela faria. Bo Ra, por sua vez, passou por ele com o braço entrelaçado no de Jimin, gargalhando discretamente de algo que o outro dissera e sem realmente prestar atenção na presença de Taehyung.

Ótimo. Ele não esperava nada mais do que isso.

A ida para casa foi silenciosa, como de costume. Ele nunca trocava mais do que as palavras essenciais com o seu motorista, assim como o mesmo também o fazia. Não havia ninguém em casa e ele também não fez questão de perguntar à Sra. Kang onde sua mãe estava — até porque, a resposta seria tão óbvia quanto um shopping ou um salão de beleza. Ao invés disso, deu ordens claras aos empregados para não o incomodarem, pois sua intenção era passar as próximas horas em seu quarto, sozinho com suas paranóias e cálculos.

E foi o que ele fez. O grande cômodo com paredes cinzas bem escuras e móveis que variavam no tom, porém eram da mesma cor, foi um alvo interessante da sua atenção (ou, pelo menos, da falta da mesma). A primeira pergunta que surgiu em sua mente, assim que ele sentou-se na beirada de sua cama, foi se Hoseok manteria sua promessa. Ele tinha que manter, afinal, Taehyung ainda guardava a prova visual de que, há alguns anos, o garoto tentara roubar o cofre da sua família. Mas ainda se tratava de Jung Hoseok e a sua falta irritante de escrúpulos. Quando Taehyung o chantageou naquela época, era nítido que o ruivo ainda estava tentado a não dar a mínima para a fita de vídeo e sair da casa dos Kim com os documentos que comprovavam a corrupção dentro da empresa da família em mãos. Ainda assim, ele optou pela solução mais sensata, entregou os papéis para Taehyung e foi embora, prometendo nunca mais voltar. Mas ele estava de volta e, aparentemente, pior do que quando tinha apenas quatorze anos.

Taehyung esperava que ele tivesse criado mais juízo pois, caso contrário, seria obrigado a fazer algo mais baixo do que  costumava fazer.

Quando se deu conta, faltava apenas uma hora para o horário no qual Bo Ra dissera que bateria em sua porta. Que história seria aquela de conhecê-lo melhor? Claro, provavelmente tinha relação com o trabalho do Sr. Do — ele mesmo, por sua vez, estava planejando observá-la com mais atenção para eleger as características certas — mas ainda soava como algo que escondia alguma outra intenção. O que quer que fosse, ele não tardaria a descobrir; afinal, era bom nisso e não escondia de ninguém.

Tomou um longo banho e se vestiu como acreditava que deveria. Quando estava descendo as escadas, lembrou-se de que ainda não tinha comido nada, mas também não deu atenção a isso — raramente sentia fome. No exato horário em que havia dito, Bo Ra tocou a campainha da porta da frente. A Sra. Kang estava indo atender a mesma, porém Taehyung apressou-se para dizer que não precisava, pois era alguém que ele já estava esperando.

Sabe-se lá o que a idosa pensaria se o visse sair de casa com a sua neta, em pleno cair da noite.

Bo Ra usava uma calça jeans escura, um tênis cano médio vermelho e uma blusa branca sem detalhes e, quando viu a roupa social de Taehyung, não conseguiu conter uma gargalhada. Ele interpretou aquilo como um gesto de ironia, o que o incomodou e o fez querer dar meia volta de volta para o seu quarto, largando-a sozinha.

— O que foi? — perguntou, ao invés disso.

— Desculpa. — ela respondeu, se recompondo. — Eu, por acaso, não avisei que estávamos indo a um parque de diversões?

— Sim, avisou. — ele afirmou, sem entender.

— Então o que diabos você está fazendo com essa roupa social? — Bo Ra indagou, apontando para as vestimentas caras dele. — Pelos céus, você está usando até um blazer!

— Não conheço nada e nem ninguém que me empeça de sair assim. — ele não sabia que, naquele momento, protagonizava a maior cena de orgulho ferido que Bo Ra já presenciara na vida.

— Pois há duas coisas: o bom senso e eu. — a garota disse, ainda se divertindo com aquela cena. — Por favor, volte lá em cima e troque tudo isso por um tênis, uma calça jeans e um moletom.

Taehyung sentiu-se extremamente coagido, contudo, sua inexperiência o fez calar-se e dar meia volta, batendo firmemente os pés contra o chão. Odiava admitir isso, mas ela deveria estar certa, ainda que ele só pudesse ter certeza disso quando chegassem no tal parque e ele observassem com atenção as roupas das outras pessoas. Bo Ra, por sua vez, sentiu-se orgulhosa por ter iniciado com sucesso o seu plano de tirar o Kim de sua zona de conforto, começando pela críticas às suas roupas.

Ao que tudo indicava, ela conseguiria cutucá-lo e, consequentemente, descobrir quem ele realmente era ainda mais rápido do que imaginava.


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Muita coisa para ser digerida por aqui kkkkk
Não se esqueçam que eu sou movida pelas minhas interações com vocês!

Até ♥