Avatar: A lenda de Mira - Livro 4 - Fogo escrita por Sah


Capítulo 8
Lembranças amargas




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Haru 

 

Eu ainda estou em choque. Posso sentir a energia  fluindo através de mim. Eu tremo de excitação.  Yue Bay não se mexeu, ele apenas espera que eu o ataque. Porém sei os seus métodos. Ele é forte. Forte demais, por todos esses anos absorvendo o poder de tantos dobradores. Ele também se acha superior a mim. Superior a todos os outros.  As linhas negras de afastam dele. Ele as repele com facilidade.

—  Essa energia é suja. – Eu o ouço.

Sim, ela era. Essa energia que agora eu domino é fruto de todas as frustrações e energias negativas que fluem entre os homens. 

— Você não pode me enfrentar com esse tipo de poder. É inútil.

Só que ele ignora uma coisa fundamental. Um dia La o espírito do Mar, já foi puro. Uma massa de poder e espírito incorruptível. Porém a partir do momento que ele absorveu o poder de tantos dobradores, ele absorveu outras coisas, que agora estão latentes dentro dele.  É isso que Vaatu me diz.

O vento sopra forte. Nuvens escuras começam a surgir no céu.

— Está chovendo muito ultimamente. – È o que eu digo em resposta.

Eu forço as linhas para ele. Tento com todo o meu poder recém-adquirido. Só que não tenho resultados.

— Chuva é um bom presságio. — Ele diz ainda imóvel.

— Nisso podemos concordar.

Desisto de usar esse poder, assim  eu forço entre os meus pés uma lança de pura pedra. Eu fico um pouco surpreso, fazia um tempo que eu não conseguia dobrar . Faço isso com facilidade, mais rápido do que um dia eu fiz.

Eu parto para o ataque. Me aproximo e finco a lança em sua forma. Porém como era de se imaginar. A lança atravessa a água e se dissolve em seu interior.

Não há como ver suas expressões, mas começo a perceber que ele ficou incomodado. A forma da água cresce um pouco mais, e mais. Assim ele fica o dobro da minha altura.

— Você não quer me enfrentar. Apesar do seu interior. Essa sua capa é humana, e sem ela você não é nada.

Ele aponta um dos braços para mim, e sou atingido por um jato de água que me leva para trás, tropeço em algumas pedras e caio com força no chão. Quando eu tento me levantar a água que me atingiu me puxa para perto dele.

Raiva. Eu me apego a isso, e agora eu posso ver as minhas linhas se aproximarem levemente.  Percebo que a única forma de vencê-lo e fazê-lo  liberar esses sentimentos tão humanos.

Tento dobrar ar, só que eu não consigo. Minhas mãos e pés não formigam, não sinto aquela energia .  Tento o fogo, mas também é inútil. Por quê isso está acontecendo? Eu dobrei terra há alguns minutos. Forço os meus pés e sinto a terra tremer levemente.  Eu ainda sinto. Olho para a caixa retorcida no chão.  Isso significa alguma coisa. Tem haver com a energia que eu absorvi agora pouco.   Mas, não tenho tempo de teorizar. Yue Bay está perto o suficiente para me envolver com um dos seus braços transparentes, só que ele não faz.

— Me absorver, não é uma boa ideia? – Eu falo para ele.-- Por que isso significa absorver Vaatu?  -- Eu continuo.

Se alguma vez aquela criatura sentiu medo, acho que foi naquele momento. Ela desliza um pouco para trás, se afastando de mim. E é por causa desse medo que eu consigo atingi-la Umas das linhas negras envolve o braço transparente, e a atravessa.

Tampo os meus ouvidos. Posso ouvir no fundo da minha cabeça o grito de dor. E isso me faz sorrir. 

— Você não pode fazer isso. – Ouço reclamar.

— Não posso? Por que não?

Começo a perceber que uma sombra escura começa a envolver os meus braços, depois as minhas pernas. Assim sou coberto por essa capa negra. Quase como os braços que me ajudaram a controlar aqueles dobradores, só que agora me sinto mais forte.

A terra treme e a chuva começa a cair violentamente.  Não há raios, nem nada além da água que cai do céu. Nem o vento que normalmente acompanha tempestades assim. Somente água. Como se os céus soubessem o que estava prestes a ocorrer. Talvez eles saibam.

A sombra negra não se limita ao meu corpo ela começa a envolver Yue Bay. Ele tenta se livrar, mas, minhas linhas ainda o prendem.

— A morte para um espírito é a inexistência. Não se preocupe La, você ainda vai existir dentro de mim.

Sou golpeado por um poder esmagador, eu caio no chão com o impacto. Sinto o meu peito queimar e meu coração acelerar. È insuportável.

— Vaatu? – Eu pergunto para o nada.

Recebo em troca um silêncio ensurdecedor. Tento me levantar, mas as minhas pernas não se sustentam. Olho para aonde deveria estar Yue Bay, não há nada lá. Olho para as minhas mãos. As linhas negras sumiram, quase como se nunca tivessem existido.

A queimação para aos poucos, e minha respiração desacelera. A chuva ainda cai com intensidade.

— Avatar? – Ouço alguém chamar.

— Kieran. – Ele ainda está aqui. Tinha me esquecido.

Ele ajuda a me levantar.

— Que droga foi aquela? Aquele monstro, você derrotou aquele monstro. – Ele repete.

— Derrotei?

Sim, derrotei. Aquilo ainda era irreal.

Coloco a mão no meu peito. A queimação parou, porém sinto como se ele fosse explodir. A armadura me sufoca. 

— Você está bem? -- Kieran parece preocupado.

— Tire isso de mim. – Eu digo.

— Tirar? Tirar o que?? – Ele parece confuso.

Meu coração se acelera.  Ele percebe e abre a armadura com um toque no metal.

Finalmente eu consigo respirar. Olho para a minha pele, ela está marcada. Ondas de pele branca e retorcida , como se eu tivesse sido atingido por um raio.

— Uma cicatriz? – Eu pergunto.

Como se esse fosse um preço caro a se pagar por todo esse poder. É a única coisa que eu penso antes de desmaiar e acordar no vazio.

O vazio, eu já estive aqui antes. Por isso não sinto medo. Só que não dura muito , assim ele começa dar lugar a diversas formas, de diversas cores.

Eu abro os olhos, o teto de madeira diz olá para mim. Aquelas telhas que me acompanharam por toda a minha vida em Nova Ba sing se. Olho para as minhas mãos. Pequenas e gorduchas. 

— Haru! Já está na hora de acordar. – Uma voz familiar.

— Han?

Mas, ele está morto, pelo menos foi o que me disseram.

Olho para ele, meu irmão. Ele é quase 7 anos mais velho que eu, porém ele não parece velho, na realidade parece bem mais jovem que minha memória mais recente dele.

— Mamãe não vai pedir de novo. – Ele diz em um ultimato.

Me levanto, e quando eu coloco os pés no chão, vejo que eu estou baixo. Passo a mão pelo meu rosto e cabelo.  E percebo finalmente que sou uma criança.

— Que tipo de sonho é esse?  — Eu não consigo mais sonhar.

— O que você disse? – Han me pergunta.

Ele se aproxima de mim e me pega pelo braço.

Quando saímos daquele pequeno quarto, eu vejo sentado em nossa cozinha um rosto desconhecido, porém aquelas roupas me remetem ao conselho.

Aquele dia, era o dia que me levaram para Republic City.

— Esse é o Haru. – Minha mãe me apresenta.

O homem é alto, ou pelo menos eu o acho alto. Ele se abaixa para ficar da minha altura.

— Bem, esse é o garotinho que eu ouvi falar.

— Ouviu falar? – Eu respondo sozinho.

— Sim, que pode fazer coisas incríveis.

Não. Não. Eu tento evitar. Eu sei no que isso vai dar. Eles vão me levar, vão me testar, vão acabar com toda a minha vida.

— Sim, eu posso. – Eu respondo involuntariamente.

Eu não consigo evitar. Isso no fim das contas é apenas uma memória.

Eu movo os meus braços e faço uma pequena corrente de ar rodopiar entre os meu cabelo.

O homem bate palmas.

— Isso é incrível.  Você pode fazer mais alguma coisa?

E naquele momento eu condeno a minha vida.

Faço um degraus surgir debaixo dos meus pés, o que me ergue e me deixa na altura do homem.

— Agora eu estou da sua altura. – Eu digo com a minha voz infantil.

Eu não havia percebido naquela época, mas agora eu consigo notar o olhar ambicioso do homem.  Como se eu fosse seu baú do tesouro.

Fui engolido pelo vazio novamente, fecho os olhos tentando sair daquelas lembranças. Só que quando eu abro os olhos eu só consigo ver Republic City no horizonte.

Estou um pouco maior agora. Aquele homem de antes está ao meu lado.

— Terá outros, fingindo ser você. Você só terá que vencê-los. Provar que você é o Avatar.

Havia essa necessidade. Fazer me provar. Vários impostores apareceram antes, e agora o governo quer ter certeza de quem realmente é o avatar. Vários membros do conselho tinham seu próprio candidato, se é que podemos denominar assim.

Pak, esse é o nome do homem que me leva até a arena. Não tenho muitas lembranças dele, seu rosto é nebuloso, um borrão nessa lembrança. 

Eu me lembro que fiquei surpreso quando eu entrei na arena. Porém esse sentimento é muito maior do que eu me lembrava. Eu me senti minúsculo com toda aquela imponência.

Haviam dois meninos, de idade aproximada. Eu era o mais novo entre eles. Pak se sentou entre alguns rostos conhecidos. Meelo, Mufu e Unac. Todos 20 anos mais jovens. 

— Vocês só tem que  nos provar. Uma simples batalha. Nada de mais. – Unac disse com expectativa.

Um dos garotos começou a atacar com rajadas de ar. Eu fiquei assustado. Nunca tinha feito nada parecido. Eu corri e me afastei, saindo da arena.

— Haru! – Pak gritou comigo. 

— Ele vai me machucar. – Eu lamentei.

Ele colocou a mão na cabeça, e me lembro do seu rosto de raiva.

— É só você fazer o que combinamos!

O que combinamos? Sim, ele havia tentado me treinar, eu me lembro. Um treino um pouco duro demais para uma criança da minha idade. Porém a coisa que mais  me lembro eram das broncas e dos castigos, por não fazer o que ele quis.

Eu voltei com passos arrastado para o centro da arena, o garoto que tinha me atacado, tinha um sorriso maldoso no rosto. Fui derrubado no chão diversas vezes. Eu sentia meu joelho latejar de dor, e o gosto das lágrimas salgadas que escorriam dos meus olhos.

— Parece que esse garoto que você trouxe, é inútil. – Eu ouvi Unac para  Pak.

— Ele é inútil, mas ainda continua sendo o Avatar. Um avatar Inútil. – Ele reclamou.

O garoto que ainda não havia feito nada, se aproximou de mim. Seu rosto não tinha a expressão maldosa que o outro tinha, mas, havia uma coisa muito mais assustadora nele do que no outro.

O ar ficou quente de repente, e uma explosão vermelha fez o outro menino cair.

— Vamos  acabar com isso.

Olhei para Unac. Ele estava orgulhoso.

— Eu o encontrei na fronteira. Um garoto forte e habilidoso. – Ele disse para quem quisesse ouvir.

— Dobre a porcaria do ar! – Pak gritou para mim.

Apesar do treinamento eu não conseguia fazer muito. Eu joguei uma rajada para cima do menino, porém ele contra-atacou com algumas chamas, que aumentaram em contato com o  meu ar.

— Dobrem outros elementos. Isso não é uma batalha comum. Queremos ver a habilidade de vocês.

Quando ele disse isso, o garoto pegou um frasco de água de um dos bolsos da sua roupa, e a dominou, a fez flutuar a sua volta, antes de me atacar com um chicote. Eu cai no chão novamente.

PAk havia perdido a paciência.

Ele se levantou e interveio entre mim e o garoto.

— Eu fiz todos os testes. Eu tenho certeza que esse garoto é o Avatar.

Unac também se levantou.

— Eu também fiz, Pak. Ele se mostrou capaz.

— Não, mas, isso não pode estar certo. Eu o treinei, eu o vi dobrar terra e ar.

— Você sabe que eu sou especialista em  genética, e anatomia de dobradores, sou o mais capaz de definir quem é o Avatar, todos sabem disso.

PAk parecia desacreditados.

— Mas, eu fui até Nova Ba Sing Se, eu segui os rumores.

— Ele ainda é um dobrador, seu trabalho não foi inútil.

PAk, estava próximo a mim. Ele parecia decepcionado, muito mais que isso, parecia que todos os seus sonhos tinham esvaído.

— Certo, então se levante Haru. Temos que ir encontrar a sua mãe, e contar como você foi um completo imbecil. Como eu gastei cada recurso que eu tinha para te encontrar.

Ele pegou forte o meu braço, quase me erguendo do chão.

— Está doendo. – Eu reclamei.

— Doendo? Como você ainda tem coragem de falar isso? 

E assim ele me deu  o primeiro tapa.  Que foi sucedido por outro e outro.  Quando eu cai no chão ele me chutou, e não parecia que iria parar. O pior foi ver que ninguém veio impedi-lo. Todos olharam para mim, como o lixo que ele queria que eu fosse.

Assim eu senti o poder avatar pela primeira vez. O calor que emana e me afasta do mundo. Meus olhos queimaram e meus pés se ergueram do chão.

O olhar de surpresa de Pak, não foi maior do que a dos outros.

—- Eu não posso acreditar. – Unac disse com um sorriso.

O outro garoto caiu para trás, e o vento fez com ele fosse arrastado. E assim seu truque ficou a mostra.

— Ele está usando um lança chamas. Ele não dobrou o fogo de verdade. – Pak disse eufórico.

Unac se retraiu.

— Eu não acredito que ele mentiu para mim. – Ele deu de ombros.

— Pode parar Haru! Você foi incrível – Pak dizia.

Mas, isso não importava, no fim, o poder, a raiva foram maiores. Eu o ergui. Mais alto que eu pude, e o joguei com força contra a arena.

Quando criança eu não havia entendido o estrago que eu havia feito, mas agora, eu ouvi seu corpo cair com força, seus ossos  quebrarem, e seus olhos perderem a vida.

E como aconteceu antes, ninguém me impediu.

O rosto de Pak desapareceu. Ele era apenas um homem desconhecido, que minha mente tentou esquecer.

Foi naquele dia, que pela primeira vez, eu vi Korra. Assim que eu cai, esgotado.

Eu não ouvi suas palavras, mas seu rosto era de desaprovação e pena. Ela passou a mão pelo o meu rosto, e afagou a minha cabeça.

— Eu entendo. – Foi a única coisa que me lembro dela dizer. Porém, sei que teve mais, muito mais. Coisas que minha mente apagou devagar.

O vazio novamente, por poucos segundos, antes da sombra negra cobrir os meus olhos.

— Foi naquele momento, que eu fiquei mais forte dentro de você. Quando você matou pela primeira vez. E todos aqueles ressentimentos brotaram na sua consciência.

— Avatar? Avatar?

Sinto alguém me sacudindo.

Abro os olhos, finalmente estou de volta. Kieran me sacode com força.

— Ufa. – Vejo seu olhar de alívio.

Minha roupa está aberta, as cicatrizes ainda estão lá.  Todo esse poder me fez lembrar de coisas distantes. Coisas que me fizeram entender como eu havia chegado naquilo que eu havia me tornado.


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