Avatar: A lenda de Mira - Livro 4 - Fogo escrita por Sah


Capítulo 3
Um improvável aliado


Notas iniciais do capítulo

Essa foi uma semana produtiva. Por isso esse capítulo saiu bem mais cedo do que eu imaginava. Espero que gostem.



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Iroh

Não foi fácil arranjar tudo. Minhas ligações com aquele lugar estavam desgastadas, mas eu sabia que eu podia contar com Suinze, ele me devia mais favores do que eu conseguia contar. Contatá-lo era o desafio, e o tempo não estava ao meu favor.

Ele ainda era um pescador, desde que foi dispensado do exército há mais de 20 anos, esse era o único oficio possível para ele, na verdade o único ofício possível para qualquer habitante de Jang Hui.  Só que por trás de tudo isso, ele era o que chamamos de atravessador. E assim como o nome já diz, ele ajudava quem precisava  fugir da União do fogo.

Não era comum ter refugiados da União do Fogo em Republic City, na realidade a imagem de Republic City era a mais manchada possível para qualquer cidadão do fogo, e assim a escolha mais provável era que eles fugissem para as nações do Antigo Reino da Terra . Mas, como tudo no mundo, sempre havia exceções. E tal como eu era, eu precisava encontrá-las. 

Eu tenho experiência. Há muito tempo, eu estive do outro lado. Eu sabia localizá-los, esses fugitivos. Por isso foi fácil, e levou muito menos tempo do que eu imaginava. E com isso eu consegui localizar Suinze, que com todos os problemas, eu o obriguei me ajudar.

Apesar de toda a tensão, de todo o caos que assolava aquele país, eu consegui escondê-los pelo tempo necessário. 

Claro que vieram atrás dela. Foi em questão de horas depois da sua chegada. Pessoas do exército e o próprio Haru fizeram questão de revistarem cada centímetro da casa. Mas, a amiga dela, a garotinha suja e com o cabelo desgrenhado, já havia previsto e assim, eles todos se esconderam nos túneis que passavam por toda a cidade.   

Sina, era o rapaz que trabalhava no governo, a pessoa que eu achei que era o meu principal inimigo, porém, ele estava quebrado, sua irmã e amiga da Mira, havia morrido no desabamento, e agora eu sentia pena dele, por que nem velar o corpo da irmã ele podia. Não só o seu rosto, mas o de Mira e seus amigos estampavam o noticiário, como os grandes causadores do desastre do palácio presidencial. 

Mira ainda não havia acordado. Seu rosto estava quente e sua respiração bem normal, era como se ela dormisse tranquilamente. Meelo, o garoto com o cabelo comprido ,dizia que isso era normal, que ela tinha entrado em uma espécie de meditação, e que era necessário para que ela se recuperasse inteiramente.  E eu acreditei nele.

Levou dois dias inteiros para que tudo estivesse pronto. E mais três horas para que todos embarcassem com segurança nas docas da Cidade da Fuligem.

— Tomem conta dela. E se precisarem, falem com Suinze, ele os trará de volta.-- Foi o que eu disse ao me despedir. 

O barco velho, e discreto, desapareceu no horizonte, levando Mira, para a União do fogo, que apesar de tudo, era o lugar mais seguro para ela nesse momento.

E ainda bem que tudo deu certo. Suinze não se atrasou e eles foram antes que os interrogatórios começassem.

Foi no outro dia. Depois de levar o gêmeos para Wana, que agora vivia com a família em algum lugar perto da fronteira, que eles bateram na minha porta. Um dos generais,  Tzar, me levou pessoalmente para Haru, para um dos prédios das Industrias Varrick, na parte mais nobre da cidade.

— Como é bom ver você novamente Iroh! – Haru me disse com uma satisfação no olhar.

— Pena que não posso dizer o mesmo – Eu respondi

Haru parecia um pouco diferente. Apesar de parecer mais forte, ele também parecia mais cansado.  Com olhos fundos e vidrados, parecia que não dormia á dias.

— Isso me deixa muito chateado. Achei que éramos amigos.

Haru era alto, quase da minha altura, mas naquele momento, ele pareceu ser maior que eu. Me sentaram em uma cadeira de metal, dura e fria, em uma sala sem muitos móveis ou iluminação. Tudo parecia ser muito provisório.

— Acho que você entendeu errado. Eu não sou amigo de ninguém.

Ele sorriu.

— Eu sei disso. Você deixou todos os seus amigos para trás. Tal como fez com a sua própria filha e esposa.

Isso me deixou surpreso. Ele realmente sabia?

— Você parece surpreso. Achou que ninguém iria descobrir?  -- Ele riu. – Você deixou várias pistas por ai. Mas, a maior dela foi deixar esse segredo nas mãos de um fraco.

Em Republic City apenas uma pessoa sabia a minha verdadeira origem. Nem Wana e muito menos Mira sabia disso.

— Mufu? – Eu disse.

Ele era o diretor da escola de dobradores, mas antes disso ele foi parte do conselho e atuou como uma espécie de diplomata na União do Fogo há muito anos . Aonde nós  nos conhecemos.  Quando eu vim para Republic City, ele foi a primeira pessoa que eu procurei. Ele me arranjou trabalho e moradia, e uma escola de qualidade para Mira. Eu devo quase toda a minha vida aqui, a ele.

— Ele demorou para falar. Mas, até um velho como ele, sabe quando atingiu o limite.

O que eu pensei quando conheci Haru? Achei que ele era a salvação da minha filha, que apesar das circunstância poderia ter uma vida normal. Ele me ajudou a vencer toda a lavagem cerebral que eu havia sofrido por parte da UCG. Me deu paz por alguns dias, me deu esperança para um futuro melhor. Mas, nesse instante, eu apenas penso em como fui enganado. Em como desde o inicio suas intenções eram cruéis.

— Você faz o antigo presidente parecer uma velhinha bondosa.

Ele fechou o rosto.

— Eu estou ficando cansado de brincar com você. Me diga logo! Onde está a Mira? – Ele gritou.

— Prefiro a morte. Já havia escolhido essa opção desde o momento que eu vim para Republic City.

Ele havia perdido a paciência. E assim ele me deu um tapa no rosto. Tão forte que ecoou pela sala.  Senti o gosto de sangue imediatamente. Ele realmente acha que está me intimidando. Eu já passei por coisas piores. As cicatrizes em todo o meu corpo não me deixam mentir.

— Existe uma coisa em que a União do fogo é melhor do que qualquer outro país. São os seus interrogatórios. Eles realmente sabem fazer isso.

Haru me olhou. Com ódio. Eu não tenho medo do ódio. Eu vivo com ele nas minhas costas, me perseguindo a cada esquina. Só que seu olhar mudou depois. Se transformou em uma frieza  demoníaca. E aquilo me fez ter medo. Era como olhar para a morte.

— Parece que ele não gosta muito de você. – Haru falou aleatoriamente.

Engoli em seco.

— Normalmente, ele sequer sente alguma coisa por humanos. Mas, dessa vez ele ficou irritado com você.  – Haru passou a mão nos cabelos, e respirou fundo. – Talvez seja isso que me impeça de acabar com você, aqui e agora.

Ele andou até mim. Minhas mãos formigaram, eu queria bater nele, mas o medo, pela primeira vez, se antecipou ao ódio.

— Levem –no. – Ele disse por fim.

E assim dois soldados me vendaram e me algemaram, me levando para o desconhecido.

Fiquei no escuro por um bom tempo, mesmo quando tiraram a venda, eu me recusei a abrir os olhos. O escuro tinha um efeito calmante sobre mim, um hábito que adquiri na terapia.   Era só fechar os olhos e me concentrar o suficiente para que qualquer sentimento ruim fosse embora.  

Depois de um certo tempo, eu abri os olhos. Eu estava em uma sala vazia, com apenas uma das luzes acesas. Me sentei em um dos cantos e aguardei.

Havia se passado certo tempo quando eu ouvi meu primeiro companheiro de cela chegar. Ele falava alto, e exigia que o soltassem. Mas, como eu bem sabia era inútil.  

Eles os jogaram para dentro da cela, ele tropeçou e caiu. Assim ele reclamou de dor.

Quando nos deixaram a sós, ele reparou que eu estava lá. Ele era baixo. Deveria ser um pouco mais velho que eu, e tinha enormes entradas na cabeça, o que denunciava a sua futura calvície. Mas, não era isso que me chamava a atenção. Um corte de sangue seco, passava pela a sua testa. Seus braços também estavam mal enfaixados e sua roupa, que um dia foi branca, estava repleta de manchas de sangue e terra.

— Você não parece muito bem. – Eu comentei.

Ele se levantou e se arrastou até se sentar de frente para mim.

— Não tive tempo de ir ao hospital, como pode ver. – Ele me disse ironicamente.

— Bem, não tivemos tempo para nada. – Eu respondi

Ele se ajeitou novamente e tocou uma das ataduras e reclamou de dor.

— Parece que você também tem problemas com o Avatar.

Ele pareceu incomodado quando eu mencionei o Haru.

— Quem dera fosse só  problemas.  – Ele suspirou.

— Iroh. – Eu cumprimentei.

— Você é o terceiro Iroh que eu conheço. – Ele riu

— É um nome bem comum.

— Sim, sim. Meu nome é Kento. Kento Beifong.

Eu reconheci aquele nome, e finalmente liguei o nome a pessoa.

— O Chefe da Polícia? – Perguntei já aflito.

— Sim, não estou nos meus melhores dias, mas ainda sou o Chefe da polícia.

Eu pensei, e pensei. Aquilo não fazia sentido. Eles são aliados. Não são?

— Achou que a polícia estava do lado dele? – Ele riu – Não sei se percebeu, mas foi o exército que assumiu tudo.

Isso me deixou mais chocado do que deveria. Lembro-me de quando eu entrei para a UCG, foi por causa da polícia.

Mufu nos ajudou o quanto pode, só que mesmo para ele, as consequência seriam graves se descobrissem que ele havia nos ajudado.  Vivemos bem na medida do possível, eu trabalhava em uma das grandes fábricas de peças como ferreiro, e Kirina cuidava de Mira. Só que apesar de trabalhar muito, o salário que recebia mal dava para comer. Eu tinha dito para Kirina não sair de casa aquele dia. Eu tinha deixado claro que eu conseguiria nos manter, mas ela era teimosa, mais até que eu. Assim naquele dia, ela não voltou para casa.

Depois de muitas buscas, encontrei Mira chorando perto do Rio, ela mal devia ter quatro anos. Eu pedi ajuda para a polícia, eu implorei. Mas, eu não era prioridade, havia casos mais graves, do que o desaparecimento de uma pessoa da cidade da Fuligem. 

O corpo dela foi encontrado cinco dias depois, por pescadores. Não houve investigação. E até hoje eu não sei o que aconteceu. Mas, eu culpo a polícia. Culpo esse governo, que preferiu dar prioridade para uma briga entre dobradores no centro.

Kento acenou me tirando do transe.

— Você está bem?

Eu olhei para ele, tentando encontrar alguma semelhança com aqueles policiais. Mas, eu não encontrei.  Ele parecia ser uma pessoa gentil, principalmente por causa dos seus ferimentos.

— Estou. Eu só estou lembrando de todas as vezes que eu precisei da polícia, e ela me ignorou. Dizendo que tinha prioridades maiores.

Ele abaixou a cabeça.

— Eu sinto muito. – Ele disse com pesar. – Apesar de ser o principal comissário de Republic City, não tenho tanto poder assim, como pode ver. É o conselho que determina. – Ele deu uma pausa para se corrigir – Determinava, a preferência nos atendimentos.

Isso só parece uma desculpa. Mas, isso não importa mais. Como eu bem vejo, nem eles escaparam da ira do Haru.

— E você está aqui por causa disso? – Eu perguntei secamente.

Ele me olhou preocupado.

—Sim e não. Como chefe da polícia, eu tenho algumas informações que podem ser uteis a ele. Mas, só estou aqui, por que eles levaram o meu filho.

De repente todo o rancor que eu começava a nutrir por aquele homem se dissipou, e eu apenas comecei a vê-lo como um pai, que assim como eu, estava aqui para proteger o seu filho.

— Eles também estão atrás da minha filha.

Ele não pareceu surpreso.

— Ela é uma dobradora também? – Ele perguntou.

— Sim, mas não é só por isso.  É por que ela representa a decadência do Haru.

— Decadência?

— Sim, ela é a Avatar de verdade,  e isso seria um golpe na imagem que ele quer passar.

Seus olhos se arregalaram.

— Eu ouvi falar sobre ela. Eu realmente recebi ordens para ficar de olho na garota que salvou aquele helicóptero no festival do ano passado.

— Sim, ela salvou. E me salvou também. Na verdade, ela me protege mais do que eu a ela.

E assim eu conversei com aquele homem por várias horas, e entre tantas semelhança e diferenças eu ainda não sabia que ele seria apenas mais um dos  mais improváveis aliados que eu estava prestes a fazer.


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Notas finais do capítulo

No início desse livro pretendo mostrar duas visões. Daqueles que estão em Republic City, e aqueles que estão na União do Fogo.