— Já chega! - exclamou Remus

Levantei os olhos para ele.

Eu estava sentada no banco da janela do meu quarto, pelo milésimo dia consecutivo. Eu não estava me sentindo muito disposta para fazer qualquer coisa que não fosse encarar os campos ingleses.

— Remus, me deixe em paz. - murmurei

— Não. - ele disse - Eu não aguento mais te ver aqui sentada nesse estado vegetativo.

Revirei os olhos.

— Eu estou bem, Remus. - bufei - Eu só gosto de observar a natureza.

Ele me encarou, irritado.

— Tome um banho, coloque roupas limpas. - ele disse - Nós vamos para a feira.

— Eu não quero ir! - protestei

— Eu sou seu irmão mais velho. - ele disse - Você precisa me obedecer quando papai e mamãe não estão.

— Mamãe está na cozinha. - murmurei

— E ela me disse para te tirar de casa! - ele disse - Banho! Já!

Suspirei e me levantei.

— Eu te odeio. - eu disse

Ele riu.

— Eu sei. - ele deu de ombros.

…

O sol brilhava na feira e todos os passantes pareciam estar com um bom humor inusitado. Alguns deles me observavam, com curiosidade. Todos sabiam do que havia acontecido com Rose.

— Eu odeio essas pessoas. - murmurei

— Você odeia todo mundo, agora? - Remus riu

Assenti.

— Aposto que eles ficaram infelizes ao descobrirem que o Sr. Potter salvou Rose a tempo. - eu bufei - Perderam a oportunidade de fofocarem sobre um novo escândalo.

— Lily, todos ficaram muito preocupados com Rose. Muitos levaram tortas para nós, todos foram muito gentis com ela depois do ocorrido. - Remus disse - Todo mundo ama Rose.

— É sério? - perguntei

Remus assentiu.

— E James? - perguntei - Aposto que ele é o novo herói da cidade.

Remus suspirou.

— Ele é. - ele disse - Mas ele não foi visto na cidade desde então. Ele tem ficado somente em Darcy.

Suspirei.

— Todos provavelmente me odeiam ainda mais agora. - eu disse

— Ninguém sabe da briga de vocês dois. - Remus disse

Assenti.

— Lils… - Remus cantarolou - Foi tão ruim assim ter saído de casa?

Ri.

— Não. - eu disse - Obrigada, Remus.

Ele assentiu.

— Ora, ora, ora. - ouvi uma voz conhecida dizer.

Olhei para de onde ela havia vindo e vi Lucius Malfoy me encarando, com um sorriso presunçoso. Sua autoestima era tamanha que parecia esconder o olho roxo e o corte nos lábios, resultantes da briga com James.

— Lily Evans finalmente voltou para a feira. - ele disse

— Deixe ela em paz, Lucius. - disse Remus

— Eu não tenho medo de você, Remus. - ele disse, se aproximando.

— O que você quer? - eu disse

Ele deu de ombros e se aproximou de mim, segurando meu rosto com sua mão direita – que fiquei feliz ao constatar que também estava extremamente machucada.

— Você já deve estar começando a se arrepender de ter recusado o meu pedido de casamento, não é? - ele sussurrou

Ele estava tão próximo que o ar que saiu de sua boca dançou pelo meu rosto.

Eu gostaria de dizer que tomei a decisão mais inteligente, naquele momento. Eu poderia ter dito algum comentário sarcástico, ou até mesmo poderia ter me afastado em silêncio. No entanto, não foi bem isso o que aconteceu.

Dei um grito após minha mão ter atingido o rosto de Lucius com toda a força que eu tinha.

— Isso é pela minha irmã! - exclamei

Minha mão o atingiu novamente.

— E isso é por James!

Ele também gritou e me empurrou no chão, voltando para sua ferraria correndo.

— Lily! - exclamou Remus, se abaixando para me ajudar.

Assenti, começando a chorar.

— Você se machucou? - ele perguntou

Neguei com a cabeça. O que era parcialmente verdade, levando em conta que minha mão latejava com o impacto.

Remus deu uma risada nervosa e me abraçou.

— Eu o perdi. - solucei - Eu perdi James.

— É claro que não, Lily. - Remus me confortou - Vocês só tiveram uma briga.

— Eu fui horrível com ele desde o primeiro dia. - eu disse - Se ele fosse sensato, ele estaria me odiando no momento.

— James não te odiaria por nada no mundo. - Remus disse - Você só precisa pedir desculpas.

— Como eu faço isso? - perguntei

— Você nunca pediu desculpas antes? - Remus riu

— Não para James. - eu disse

Remus me encarou, incrédulo.

— Você já brigaram milhares de vezes! - ele exclamou - Você nunca pediu desculpas a ele?

Neguei.

— Você é inacreditável. - ele riu

Ri também.

— Só diga a ele o que está no seu coração. - ele disse - Peça desculpas sinceras e ele vai entender.

Assenti.

Remus passou a mão pelo meu rosto, secando minhas lágrimas.

— Eu preciso ir até Darcy. - eu disse

Remus assentiu.

— Antes, você precisa dar um jeito na sua mão. - ele disse

Olhei para minha mão direita. Os nós dos meus dedos estavam sangrando levemente.

— Belos socos. - Remus sorriu

Sorri.

— Obrigada.

Ele me ajudou a levantar e me levou pra casa.

…

Remus olhou para o céu, onde nuvens pesadas e cinzentas se aproximavam cada vez mais. O barulho de um trovão retumbou pela sala.

— Lily, você não pode sair agora. - Rose disse

— Rose, eu preciso. - respondi

— Uma tempestade se aproxima! - Rose exclamou

— Eu corro! - protestei

— James pode esperar mais um dia. - Remus disse

— Mas eu não posso. - eu disse

Remus e Rose se entreolharam.

— E se você for até lá e James não te perdoar? - Remus sugeriu - Você vai ter que voltar o caminho todo na chuva!

— Eu pensei que você tinha dito que ele me perdoaria. - rebati

— Ele vai. - ele disse - No entanto, você sabe tão bem quanto eu que ele consegue ser um pouco orgulhoso.

Suspirei.

— Então é ainda melhor que eu vá agora! - eu disse - Ele é um cavalheiro. Ele nunca me deixaria voltar para casa na chuva e eu terei a noite inteira para convencê-lo a me perdoar.

Remus bufou.

— Corra. - ele disse - Rápido.

Dei um beijo em sua bochecha e outro na de Rose.

— Eu amo vocês! - exclamei

…

Darcy não era exatamente perto de minha casa. Eu selei um dos nossos cavalos com rapidez, mas a chuva parecia cada vez mais próxima de cair. O machucado da minha mão fazia com que eu não conseguisse me segurar forte o bastante na sela, fazendo com que eu não conseguisse ir tão rápido quanto gostaria. Quando comecei a avistar a mansão, os trovões estavam cada vez mais frequentes.

Quando cheguei ao pé da varanda, eu já conseguia sentir pequenas gotas de chuva caindo sobre mim. Na varanda, porém, estava sentado James. Ele tinha um livro nas mãos, mas me encarava quase sem piscar.

— Oi. - eu disse

Ele não respondeu.

— James, eu sinto muito. - eu disse

Ele continuou me encarando.

— Esse é o maior tempo que nós dois já ficamos sem nos falarmos desde que nos conhecemos e eu estou odiando cada segundo. - eu continuei - Eu não te acho um monstro. Na verdade, você é a pessoa mais nobre que eu conheço.

Meu cabelo já estava completamente grudado no meu rosto e minhas roupas já estavam encharcadas.

— Você é a pessoa que mais me conhece e entende. - eu disse - Mais que Remus, mais que Rose e muito mais do que Petúnia. Eu não sei o que vou fazer se você resolver nunca mais falar comigo, embora eu sei que é isso que eu mereço.

James deu uma risada fraca.

— É mesmo. - ele murmurou

Sorri.

— James, eu sinto muito. - repeti

James assentiu, devagar.

— Sai logo da chuva. - ele bufou

James pediu que um dos criados levasse meu cavalo até os estábulos. Fui até ele, que continuava parado no mesmo lugar na varanda.

— Eu estou mesmo perdoada? - perguntei.

Ele sorriu.

— Eu te perdoei da primeira vez que você disse que sentia muito. - ele disse

O encarei.

— E você me deixou na chuva, abrindo meu coração, para nada? - exclamei

Ele riu.

— Eu gostaria de ouvir o discurso que você havia preparado. - ele deu de ombros - Não me desapontou nem um pouco.

— Você é inacreditável. - ri

Ele concordou, ainda rindo e me olhando fundo nos olhos.

Desviei o olhar, um pouco encabulada, e reparei o livro que ele havia deixado na mesinha da varanda.

— Eu não acredito… - eu disse

Ele se virou para onde eu estava olhando.

— Droga. - ele murmurou

— Você está lendo Jane Eyre! - eu exclamei

Ele riu.

— Eu só estava…

— Lendo Jane Eyre! - exclamei, dando uma gargalhada

Tentei pegar o livro mas ele se colocou no caminho, me segurando.

— Me solte, James. - eu disse, com a barriga começando a doer por causa do ataque de risos.

— Você está delirando! - ele ri - Deve ser por causa da chuva.

— Com certeza. - eu respondi, colando minha testa na dele.

Ele sorriu enquanto tentávamos fazer nossa respiração voltar ao normal. Sua mão se entrelaçou na minha e deu estremeci ao sentir ele apertar o machucado.

— Oh, eu sinto muito, Lily. - ele disse

Sorri.

— Está tudo bem. - eu disse

Ele se afastou um pouco de mim e levou minha mão para perto de seu rosto.

— Sirius mencionou algo sobre você ter batido em Lucius Malfoy hoje… - ele sorriu

Ri.

— Ele estava lá? - perguntei

Ele assentiu.

Suspirei.

— Obrigada por defender minha honra. - ele disse, suavemente.

— O prazer foi meu. - eu disse

Ele sorriu e beijou cada nó machucado da minha mão, com a maior delicadeza do mundo.

— Eu estou ficando doido? - escutamos uma voz dizer vinda da porta. - Eu poderia jurar que estou vendo Lily Evans na minha varanda. Justamente a garota que meu amigo James jurou nunca mais conversar.

James riu.

— Me deixe em paz, Sirius. - ele respondeu

Sirius riu.

— Quem poderia imaginar que você voltaria a vê-la, não é? - ele perguntou e deu uma piscadinha para mim.

James suspirou.

— Você precisa tomar um banho. - ele disse - Você vai ficar resfriada se continuar com essas roupas.

Ele se virou para Sirius.

— Você pode pedir para a Sra. Sprout cuidar dela? - ele pediu

Sirius assentiu.

— Mas é claro. - ele disse

James sorriu para mim novamente.

— Nos vemos depois. - ele disse

Assenti.

Ele deu mais um beijo na minha mão e a soltou, e eu segui Sirius para dentro da mansão.

…

Eu me olhei no espelho. Não havia nenhuma chance de eu sair do quarto vestida daquele jeito. Eu estava completamente maravilhosa.

James tinha alguns vestidos guardados em Darcy. Eles eram de uma de suas primas, mas haviam vindo acidentalmente com a mudança. Como nenhuma delas havia pedido os vestidos de volta, ele havia deixado-os em um dos armários – caso algum dia alguma donzela tomasse chuva a caminho da mansão e precisasse usá-los. E esse dia chegou.

Suspirei e ouvi uma batida na porta.

— Lily? - ouvi James chamar - Você está bem? Você está ai há algum tempo.

— Eu estou bem! - respondi rapidamente

— Você está com algum problema? - ele perguntou - Você quer que eu chame a Sra. Sprout?

— Não! - exclamei

— Você está vestida?

— Sim. - respondi

— Eu vou entrar. - ele disse

Dei um grito.

James abriu a porta e ficou boquiaberto por alguns segundos. Em seguida, porém, ele pigarreou e deu uma risada.

— Você não está horrível. - ele disse

Ri.

— Obrigada.

Ele assentiu.

— O jantar está pronto. - ele disse

— A chuva parou. - eu disse - Eu deveria ir pra casa.

James franziu as sobrancelhas.

— Não seja boba. - ele riu

— Eu estou falando sério! - esbravejei

— As estrada deve estar toda lamacenta. - ele argumentou - Você quer quebrar a perna do seu belo cavalo?

Franzi o nariz.

— Não. - murmurei

Ele sorriu.

— É só um vestido. - ele disse

— E um jantar… - respondi

— E uma biblioteca gigante? - ele sorriu

Bufei.

— Isso é golpe baixo. - eu ri

Ele estendeu o braço para mim, com um olhar interrogativo.

Suspirei e entrelacei meu braço no dele, tentando não pensar no quanto ele cheirava bem e falhando miseravelmente.