Entre o amor e a guerra escrita por Ania Lupin


Capítulo 47
Eu aceito




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Sexta, 21 de fevereiro.

Arthur Weasley amava muito todos os seus filhos. Cada uma daquelas cabecinhas ruivas - algumas já mais altas que ele próprio - era especial de seu jeito, e o amor que tinha era igual por todas. No entanto, Ginevra Weasley - em breve Weasley-Malfoy, santo Merlin - era dos sete, a única filha. Sua única menininha. Sua pequena - e também menor - cria grifinória, que tinha um temperamento tão difícil quanto a mãe e acabara de ter um filho em seus dezessete anos. Ao menos ela estava com dezessete, pensou ao engolir o líquido amadeirado já há alguns segundos na boca.

Olhava sentado para as cabeças tão vermelhas quanto a sua cercando aquela quase branca. Despedida de solteiro, claro, seus filhos iriam mesmo era matar aquele moleque de tanto beber - e então Gina mataria todos os seis. Seis, pois Harry havia desistido no segundo copo, já prevendo que o melhor seria nem tentar acompanhar e se juntando aos demais bruxos já adormecidos no chalé.

Ainda estava se acostumando ao fato de sua filha realmente amar aquela cria de cobra - porque sim, aquilo era amor, Arthur sabia. Soube ao vê-los juntos com o neto. Soube ao praticamente sentir o desespero da filha no dia do desaparecimento. Teve sua maior certeza no pedido de casamento, tanto do amor dela, quanto do amor do bruxo. Casamento, marcado para poucos dias depois do pedido - nem ele e Molly se casaram tão novos.

Tomou mais um shot de firewhisky e viu o primeiro filho desistir de acompanhar os demais bruxos - droga, tinha apostado com Guilherme que seria Percy! Justo o mais novo não tinha o menor estômago para álcool: Ronald corria para o banheiro enquanto o sonserino de quase mesma idade parecia nem um pouco afetado com o quinto copo da bebida. Quem diria que Rony não seguiria os passos dos demais irmãos, já se adaptando aos destilados antes de ter alguma barba na cara - provavelmente tinha dedo de Hermione ali.

Hermione queria matá-los por estarem bebendo justo hoje. Amanhã todos chegariam no início da tarde, e o outro lado com certeza desconfiaria da concentração mágica. Malfoy com certeza já imaginava isso - e com certeza já tinha um plano que trancara em sua mente apenas -, mas sua filha parecia nem desconfiar do problema que o casamento poderia causar. O próximo a negar o copo foi Carlinhos - mais uma surpresa -, Arthur tomando o sexto, enchido com destreza pelo seu futuro genro.

A cerimônia seria às quatro horas, quanto tempo levaria para o caos começar?

"Esperava mais de você, Fred!"

"Pelo menos tenho minhas duas orelhas!"

"Pelo menos eu tenho minha honra!" E o bruxo viu a honra de Jorge acabar no oitavo copo.

Ele mesmo parou no décimo, e no décimo quinto, Guilherme já mal se aguentava em pé. Era um pouco irritante o jeito calmo e contido que Malfoy se retirava da sala apesar de todo o álcool no corpo, entrando o mais silenciosamente possível no quarto em que dormiam já Ginevra e Leo - mulher e filho.

"Ele é forte como um dragão para beber tudo isso e continuar de pé." o mais velho dizia, a voz saindo enrolada.

"Faz jus ao nome, então. Sua irmã vai ser feliz com ele, não vai?"

"Vai, se Malfoy quiser continuar vivo - e isso é um consenso." Sim, era um consenso. "Amanhã tudo acaba, pai."

Arthur colocou o copo vazio sobre a mesa, esfregando os olhos com uma das mãos.

"Sim, amanhã tudo acaba."

...

Sábado, 22 de fevereiro.

Estar com Leo nos braços era relaxante - com certeza se não fosse por ele, Ginevra teria surtado naqueles últimos dias - naquelas quase setenta e duas horas de ausência do sonserino. Era engraçado um ser tão pequeno estar lhe ensinando algo que nem mesmo o bruxo conseguira em todo aquele tempo: paciência. Calma. Ficar agitada só o deixaria mais agitado, chorar só o faria copiar o gesto, e nenhuma das duas ações resolveria o problema - não, apenas aumentaria seu estresse se adicionados os gritos desesperados de um recém-nascido.

Não que, nos momentos longe do filho, a bruxa não tivesse mandado para o inferno toda a sua aparente calma, gritando e chorando e fazendo todos os planos desesperados possíveis: iria procurá-lo, iria escapar da proteção da família durante a noite e rumaria para a mansão Malfoy e tiraria seu sonserino de lá - e pro inferno todos os comensais em seu caminho. Mas o fato desses momentos não serem muitos, assim como todo o cansaço que ainda sentia naqueles primeiros dias, deixou que os planos fossem apenas planos e não práticas, e sua sanidade mental foi mantida até o retorno da maldita fuinha. Olhou para o pequeno novamente quando sentiu a mãozinha que segurava seu dedo suavizar - quase dormindo.

Leo Weasley Malfoy tinha Weasley apenas nas pequenas sardas em seu nariz, sendo Malfoy em todo resto - por maior que fosse a insistência de sua mãe sobre aqueles olhos serem iguais aos dela quando pequena - e desde quando Ginevra tivera olhos puxados para o cinza? Negativo, nem mesmo na expressão: aqueles olhos azuis gritavam Draco todos os segundos - e talvez fora isso que no fim a fizera manter sua calma. Eram quase da mesma tonalidade clara, e a olhavam com o mesmo amor que via no loiro - e com toda a impaciência também, em certos instantes.

As pequenas órbitas tinham acabado de fechar quando a amiga entrou na cozinha.

"Não canso de olhar para ele." Ginevra falou, ainda hipnotizada com os fios loiros - tantos e tão finos. Realmente não cansava, e provavelmente nunca cansaria de olhar para aquele pequeno pedaço dos dois. "Leo é perfeito."

"Ele é tão quieto." escutou de Hermione, que puxava uma cadeira com todo o cuidado, acomodando-se ao lado da bruxa mais nova.

"Como o pai." O quanto Leo seria parecido com Draco na personalidade quando crescesse? "O que foi?" perguntou quando os olhos foram para a grifinória, que a observava com um sorriso descrente.

"Não sei se já te falei, mas você e Malfoy juntos foi a surpresa da minha vida." Hermione confessou, aproximando-se mais dos dois. "E então veio o pequenino - que eu só fiquei sabendo quando chegamos aqui. E agora vocês vão se casar. Não existiam chances disso acontecer, e eu sou boa com probabilidades: quem imaginaria uma criança Weasley-Malfoy?"

"Nós somos mais parecidos do que todos pensam saber." Ginevra admitiu, sorrindo ao ver o filho enfim dormindo nos braços. "Só bastava um pequeno empurrãozinho." Empurrãozinho de um bruxo nojento, e há muito já distante da vida daqueles três.

Lembrava com clareza da noite em que Draco enfim explicou como tudo aquilo começou. Uma aposta, da qual ele muito se desculpou - outro improvável, um Malfoy se desculpando, e ainda para uma sardenta -, que havia tomado um rumo muito, mas muito errado. Jurou não saber que as intenções de Flint eram as piores possíveis, assim como jurou que nunca em sua vida compactuaria com tal ato forçado, enquanto suas mãos não saíam da pele que os separava de Leo.

Se Ginevra havia acreditado? Claro que havia. Se havia ficado brava? Sem dúvida.

"Eu realmente fui uma aposta?"

"Era apenas por diversão! Você acha que eu teria tentado te forçar a fazer qualquer coisa que não gostasse?"

"Você me forçou a te beijar!" E o loiro congelou naquele instante, provavelmente tentando lembrar se aquele primeiro real beijo no meio da chuva havia sido consensual apenas em sua cabeça. "Você me forçou com esse seu maldito cheiro, e esses olhos ridiculamente atraentes - e você sabe o quanto tinha sido difícil não te beijar até então? Maldita doninha."

"Bruxa sardenta." E a mão que não segurava a caneca cheia de chocolate quente foi com tudo para o braço esquerdo do sonserino.

Mas toda a irritação passou ao ver aqueles olhos sempre tão sérios, tão frios, a olharem transbordando de sentimentos. Draco tinha consciência do quanto seus cinzas ficavam expressivos ao olharem para ela? Eram eles que lhes davam a certeza de todo aquele maldito amor - como ela ainda conseguia duvidar de tais sentimentos hora ou outra?

"Pode perguntar o que você está querendo, Mi." a bruxa falou quando voltou a si e percebeu a amiga a observando em silêncio. "Conheço bem essa cara." E a ruiva sabia também qual seria a pergunta.

"Qual o plano?" Assim como tinha prontamente a resposta.

"Criar nosso filho." Afinal, tinha alguma outra coisa mais importante do que aquilo no momento para ela? Para eles? "Escondidos, até essa guerra acabar. Draco queria ir para longe - para bem mais longe que a Europa, já que mesmo numa ilha italiana conseguiram nos achar -, mas não quero me afastar ainda mais do resto de minha família. Ele pareceu entender isso em nossa última discussão." Ele com certeza tinha entendido que a bruxa não iria para Nova Zelândia, ainda mais sem saber quando poderia voltar a ver seus pais - ainda mais sabendo que numa guerra, sempre existia a possibilidade de ser a última vez.

Naquela última noite antes do desaparecimento do sonserino poderia ter sido o último beijo dos dois, e só pensar na possibilidade já lhe causava um aperto enorme no peito.

"Tenho certeza que você o fez entender." Hermione falou com um sorriso, se divertindo com a última frase da bruxa.

"Eu não sei o que quero fazer além disso, deveria estar pensando, deveria ter pensado em todo o tempo que tive na Itália - mas eu não consigo pensar em nada não-trouxa para fazer, e eu sei que seguir algo fora do nosso mundo não seria muito sustentável agora com minha nova família. Sei que não vou conseguir voltar para escola, ainda mais agora com Leo, não conseguiria nem mesmo se todo o caos acabar, e meu futuro marido também descartou essa possibilidade - porque, segundo ele, não tem necessidade de se matar numa escola que não te ensina o básico de defesa." O que a levava a pensar se, num futuro onde seu lado da guerra ganhasse, haveriam muitas discussões até concordarem em mandar os filhos para Hogwarts. "Quem sabe não acabo abrindo uma loja como os gêmeos fizeram." continuou, tentando evitar aquele último pensamento: os filhos. Era tão cedo, mas era tão bom conseguir pensar num futuro tão distante com um dos amores da sua vida. "Dinheiro da parte de Draco definitivamente não falta."

E a próxima frase a surpreendeu um pouco - e ela achando que as surpresas em sua vida haviam acabado.

"Harry defendeu Malfoy. Ele contou para Rony sobre Flint e fez questão de manter os gêmeos na linha quanto a novas comidas, assim como manteve Carlinhos distante do sonserino para evitar mais alguma surra."

"Explicado o porquê de meus irmãos estarem aceitando tão bem o relacionamento." Sendo que bem se traduzia em melhor do que ela imaginou algum dia e muito melhor do que ao longo do dia em que seu agora noivo reapareceu no meio da praia - os olhares irritados e as piadinhas quanto ao loiro continuavam a todo o vapor.

A próxima confissão não foi uma surpresa, mas fez Ginevra comemorar internamente mais uma pequena vitória.

"Malfoy me chamou de Hermione."

Não que tivesse ocorrido alguma discussão ou objeção quando a ruiva anunciou quem seria a madrinha do filho: Draco apenas retrucou que o padrinho era Blaise, e aquilo era a única coisa não negociável - e ela o deixou acreditar que realmente não era.

"Disse pra ele que Granger seria formal demais para a madrinha do nosso filho. Leo ficaria confuso - apesar de que seu nome é bem difícil para uma criança pronunciar - vamos começar com tia Mi, ok?" E por um instante, se divertiu com as emoções passando pelo rosto da amiga: confusão, entendimento, Hermione tentando se certificar de que entendera certo e apontando um dedo para si. "Desse jeito você vai ser família para sempre, independente do que aconteça. Você aceita, não aceita?" E o sorriso que ela tanto gostava de ver nos lábios daquela sabichona.

"E você acha que eu, filha de trouxas, perderia a chance de ser madrinha justo desse sangue puro?"

Claro que não perderia, assim como era claro para Ginevra que Draco não se importava mais com aquele fato, e o crescimento em tão pouco tempo daquele que ela sempre enxergou como um garoto estragado para qualquer coisa de fora de seu mundo a fez sentir um orgulho enorme no peito.

"Vou cuidar como se fosse meu." A amiga prometeu antes de envolver os dois num abraço.

"Eu sei que vai, Mi." Não havia melhor escolha.

...

Respirou fundo uma, duas vezes, e quando fez que sim com a cabeça, as mãos da cunhada voltaram para suas mechas vermelhas.

Ginevra não era das garotas a mais feminina - e ela sabia disso, e ela não se importava. Não se importava com maquiagem ou com cabelos arrumados antes de tentar impressionar o garoto que estaria hoje entre os convidados de seu casamento - era quase engraçado pensar naquilo. Os olhos verdes que quis por tantos anos seriam apenas mais um par entre os poucos presentes na cerimônia intimista. Apenas os cinzas importavam agora: o cinza tempestuoso de seu noivo, e o cinza quase azul de Leo.

"Pronto." e as mãos enfim saíram de seu cabelo - mais comprido que o habitual após o ano passado na Itália.

Olhou mais uma vez para o filho dormindo nos braços de sua mãe antes de tomar coragem de se levantar e ir até o espelho. Se controlou para não fazer uma careta ao ver o vestido no seu corpo e focar apenas no cabelo e na maquiagem. Não que tivesse o vestido dos sonhos em mente - por Merlin ela tinha dezessete anos e casamento nunca havia passado por sua cabeça antes da última semana -, mas gostaria de estar ao menos um pouco mais magra para poder usar algo que lhe desse o mínimo de cintura: a barriga do pós-parto ainda era mais presente do que gostaria - e por mais que a cinta diminuísse muito, para ela sempre tão magra e tão pequena aquilo era demais -, e isso não lhe dava outra alternativa a não ser um vestido que desviasse a atenção para outras partes de seu corpo.

"Você está tão linda." Se focasse apenas em seu rosto, as palavras de sua mãe não soariam tão mentirosas.

"Wow." E aquela maquiagem cinza azulada ajudava muito em deixa-la contente: combinaria tanto com os olhos dos homens de sua vida que não tinha como não gostar.

Ao menos uma coisa boa: seus peitos nunca estiveram tão ótimos numa roupa.

"Nem parece que teve um filho faz uma semana." escutou a cunhada exagerar: ah, parecia sim. "Já eu, estou prestes a explodir." Fleur continuou, indo para seu lado com a mão na barriga.

Ginevra também estava prestes a explodir: explodir de nervoso. Segurou sua mão direita com a esquerda, tentando fazer as duas pararem de tremer enquanto encarava seus olhos castanhos, se forçando a permanecer quieta ao sentir um arrepio percorrer sua espinha. Nervosismo pré-casamento, com certeza. Nervosismo por estar a minutos de prometer ficar para sempre ao lado do maldito sonserino que fizera aquele amor gigantesco surgir em seu coração. Nervosismo por pensar na possibilidade do loiro desistir de tudo aquilo no último minuto. Por que diabos ele estava se casando com ela, que complicara tanto sua vida, afinal?

"Você está ótima Fleur, não é mesmo Gina?" Por Salazar, que ele ainda estivesse ali presente naquela casa. E era oficial: ela estava ficando tão paranoica quanto o loiro.

"Gina?" olhou para Colin quando sentiu a mão do bruxo cutucar seu braço.

"Sim?" Tinha certeza que precisava responder alguma coisa, mas o que o moreno estava falando mesmo? Fleur explodindo? "Sim, está ótima!" respondeu, a voz saindo muito mais empolgada do que o necessário enquanto a ruiva voltava a encarar seus olhos castanhos no espelho. Sardas, seu rosto parecia ter ainda mais sardas após aquela temporada na Itália - suspirou, Draco com certeza se incomodaria alguma hora com aquelas sardas, ele a deixaria algum dia por estar tão coberta por tantos pontos acobreados que sempre o ouviu desprezar.

Merlin, ele com certeza iria fugir antes deles tornarem o casamento oficial, tinha certeza! Aquele maldito sentimento incômodo dentro dela lhe dava certeza daquilo, e da última vez, sua agonia estava muito, mas muito certa.

"Garotas, um minuto sozinho com a noiva, ok?" A voz do amigo a distraiu dos pensamentos, e virou-se em tempo de ver a porta sendo fechada atrás de sua mãe - que saía sem reclamar do quarto onde estava a única filha apenas porque tinha Leo dormindo em seu colo. "Ok, o que está acontecendo Gin?" O que está acontecendo era que a bruxa com certeza seria abandonada no maldito altar improvisado no meio da areia da praia, e teria que criar sozinha o filho que cresceria para ser o pai cuspido sem nem mesmo terminar a droga dos estudos.

E só agora que tal detalhe a atingia com tudo: por mais que agora soubesse fazer poções como ninguém, Ginevra estava dois anos longe de conseguir seu diploma: o que ela faria sem o apoio financeiro do noivo? Merda, ela estava tão fodida. Merda, ela precisava parar de xingar.

"Você está aérea desde que cheguei." o amigo continuou, o olhar sério. "E esse é o único dia que vou ter longe do inferno daquele colégio e provavelmente já gastei todas as horas que poderia passar ao seu lado hoje. Então vamos lá, sinceridade comigo: que diabos está acontecendo?"

E ela foi sincera, se sinceridade for dizer a primeira coisa que lhe vinha a cabeça.

"Eu acabei de ter um filho e vou me casar com um ex-comensal da morte no meio de uma guerra."

Silêncio. E então, um projeto de sorriso no canto esquerdo dos lábios do grifinório - e um no canto direito dos dela. E Colin tentou abrir a boca para falar algo, mas só saiu um suspiro, a boca sendo tampada com a mão - e Ginevra não tampou a dela.

"Eu vou," E ela ria, tanto quanto o amigo. "Eu vou me casar com um comensal!" Ria tanto que precisou se sentar na cadeira onde antes estava fazendo sua maquiagem. "Eu vou me casar com aquela maldita doninha saltitante!" Que Merlin não deixasse nenhuma lágrima cair, ou Colin acabaria com sua vida por arruinar a maquiagem que levara tanto tempo para ser feita. "Eu tive um filho com ele!"

"Leo tem sardas!" o moreno mal conseguiu vocalizar, quase debruçado de tanto rir.

E ela gargalhou junto com o moreno, nas risadas tentando dissipar todo o nervosismo que estava acumulado dentro de seu peito. Ginevra se casaria com um fugitivo com a marca negra no antebraço, com os fios platinados e sobrenome que cresceu odiando. Ginevra se casaria no meio de uma guerra, sem ninguém da família do noivo presente. Ginevra tinha dezessete anos e era mãe de um menino com os cabelos mais claros que já vira na vida. E se Ginevra não tivesse rido tanto nos últimos minutos, com certeza teria tido um ataque de pânico com a junção de todas aquelas informações em sua cabeça.

"E agora que você parou para pensar nisso?" a pergunta veio quando os dois enfim estavam em condições de falar novamente, a mão da bruxa suja de um cinza cintilante quase indo parar no vestido branco - se sujasse o vestido, talvez Colin realmente a mataria.

"E se Draco se cansar de mim, Cols?" suspirou, limpando a mão no lenço que havia sobre a penteadeira. "Não é como se eu tivesse alguma coisa para oferecer pra ele, por Merlin estou vivendo as custas do bruxo por quase um ano e-" Parou de falar quando seus olhos acharam os do bruxo. "Por que está me olhando assim?"

"Porque você está falando coisas que não fazem o menor sentido, bruxa."

"Colin, estamos falando de um Malfoy aqui-"

"Exato! Do seu maldito Malfoy! Vocês estão juntos por quase dois anos e você parece não enxergar o que até eu já consigo ver, Ginevra." o grifinório falou num tom exasperado. "Ele nunca vai te largar. Nunca, como você não consegue ver isso? Não volte a ser a garota insegura do seu quinto ano, Gin. Eu não posso te dar conselhos sobre como manter Draco Malfoy, e sinceramente você está longe de precisar. Você salvou a vida do sonserino e o suportou por mais de um ano, quem deveria vir me pedir conselhos de como não te perder é ele."

E seus lábios ficaram retos. E então, vieram as lágrimas - e não, o amigo não parecia querer matá-la por acabar com a obra de arte cinza antes ainda - quase - perfeita em seu rosto.

"O bruxo te ama, sua boba." Colin reafirmou, tentando confortar a amiga num abraço. "Mas você sabe disso, não sabe?"

"Obrigada por estar sempre ao meu lado, Cols."

"Me agradeça sendo feliz e parando de me dizer tantas besteiras." o bruxo disse enquanto se separavam, ele já deixando o rosto da grifinória totalmente limpo com o movimento de sua varinha, soltando com a mão livre o resto da trança que já estava semi desfeita. "Agora vamos, sem mais lágrimas. Temos que arrumar outra vez sua maquiagem e cabelo, e temos menos de duas horas para isso." continuou, a colocando sentada numa cadeira frente à ele. " Sorte você ser a noiva e poder atrasar."

Sorte mesmo era ter um amigo daqueles.

...

Então era isso, finalmente. Um casamento. Com dezoito anos.

Era ridículo, mas aquela era a maior certeza de sua vida: realmente queria passar o resto de seus dias com a sardenta e o resultado daquele maldito amor. Em pensar que, não fosse por um bruxo desprezível, talvez nada do que tinha agora existisse. Talvez nem mesmo sua vida mais tivesse.

"Um casamento no meio de uma guerra, é sério isso?" escutou o cunhado mais velho - Merlin, ele tinha seis cunhados! - debochar enquanto abotoava o último botão da camisa, fazendo uma careta no último movimento graças aos dedos ainda não completamente curados.

É, ao menos era sua mão direita.

"Paguei com a minha língua Weasley, eu sei." respondeu, se olhando uma última vez no espelho antes de colocar a capa preta por cima da roupa. Ok, até que estava apresentável, a cor escura embaixo do olho esquerdo já mal aparecendo.

Não havia sido exatamente fácil lidar com os irmãos restantes após todos os ânimos se acalmarem na última terça e a atenção focar exclusivamente nele, o comensal que havia engravidado a única menina de Molly Weasley - sabia que deveria ter mantido Leo para sempre em seu colo. Claro que em um dos momentos do dia os gêmeos colocaram alguma coisa em sua comida - que levou a resultados não muito prazerosos em sua pele -, e claro que o segundo mais velho - justo o mais forte dos bruxos daquela família - lhe deu um aviso por todos os integrantes ruivos.

Mais uma lágrima de Ginevra, e eu vou fazer pelo menos vinte vezes pior.

Não foi muito agradável ir para o chão, ainda mais quando a queda fez piorar ainda mais sua mão direita - mas precisava admitir que havia sido justo. Por tudo que fizera naquela vida, e por todas as situações em que colocara a bruxa, tudo que sofrera até então havia sido menos pior do que esperava.

E ao menos o hematoma, agora roxo, depois de ter passado por todas as cores possíveis, era quase invisível. Não fosse sua pele tão branca, poderia passar despercebido o soco que quase o desacordara. Ao menos não haviam colocado nada em sua bebida na noite passada, e ao menos seu fígado, tão regado a álcool no ano anterior, parecia ainda saber muito bem fazer seu trabalho.

"Em pensar que você quase matou um de seus padrinhos." a voz de Zabini o fez voltar para o pequeno quarto que dividia com os dois bruxos.

"Em pensar que eu acreditei em você por quase dois meses, mesmo depois de ver o quão errado aquele obliviate tinha dado." confessou enfim para o outro sonserino, os dois trocando um sorriso. Deixaria aquele conjunto de erros no passado. "Não que eu fosse matar seu namoradinho trouxa."

"Definitivamente não precisava chegar fazendo todo aquele drama, cobrinha." Vagamente lembrou do escândalo que fizera no quarto que dividia com Zabini na noite em que descobrira o autor do feitiço que quase fodera com sua vida - e fodera muito com a vida de sua ruiva -, estando preparado para surrar o bruxo menor até a morte após bater a porta. Era tão óbvio que Blaise não lançara aquele maldito obliviate, como não percebera antes aquilo?

"Eu estava bêbado, agora vá pro inferno." falou enquanto arrumava uma mecha loira que insistia em cair bem em cima do olho esquerdo - já havia desistido de lembrar de cortar os fios, mas precisava lembrar de passar uma pomada mais forte para domar o cabelo já tão maior que em seu sexto ano. Seu sexto ano parecia ter sido há anos atrás, haviam mesmo passado menos de dois anos desde aquela noite com Flint?

"Vou é ver como está meu namorado no meio de todas aquelas damas assanhadas." ouviu de seu padrinho antes desse começar a sair pela porta. "Difícil namorar com gente bonita, você deve saber." E lembrou-se do ciúme estúpido que sentira de Potter naquelas primeiras semanas - sim, sabia muito bem o que era estar com a maldita mais maravilhosa daquela escola.

Só lembrou que dividia aquele quarto com mais alguém ao sentir uma mão apertar forte seu ombro esquerdo.

"Colin Creevey lançou um obliviate na minha irmã, Malfoy?" Mas não era nele que o Weasley mais velho queria bater - e foi estranho como, pela primeira vez, os dois compartilharam uma mesma vontade sem relação nenhuma com a guerra.

"Bater nele só depois do casamento, Weasley," avisou, já sabendo que Zabini se colocaria no meio daqueles socos. "Ou a sua irmã me mata."

"Ginevra, tão pequena e tão temida."

Se deixou sorrir, arrumando uma última vez os trajes antes de rumar para o altar. Antes de sair da casa, olhou para a porta onde estaria ainda a ruiva, e imaginou se haveria tempo: já eram três horas.

"Pensando duas vezes sobre o casamento, Malfoy?" escutou de Guilherme, que saía atrás dele.

"Nunca."

E realmente, jamais pensaria duas vezes em realizar aquele sim. O que pensava era quanto tempo demoraria para eles começarem a ser atacados - porque era claro que eles seriam atacados. Porque era o único motivo para ele adiantar tanto aquele casamento - eles já eram casados de todos os jeitos que considerava válido, e não era um simples voto que validaria mais aquela união.

...

Terça passada, 18 de fevereiro.

Estava cansado, estava exausto, e estava realmente precisando daquele sono, mas apesar de deitado na cama, limpo, alimentado, salvo, Draco não conseguia tirar os olhos das duas pessoas que teve a certeza de que nunca mais iria ver naquelas últimas horas. Não conseguiu conter o sorriso ao sentir as pequenas mãos do filho contra a pele de seu peito, e este só aumentou ao ver a mão esquerda sardenta usando o que há tanto tempo ficara escondido em seu bolso. Verde realmente combinava com a bruxa.

"Eu vou matar os gêmeos." Ginevra ainda resmungava, sempre observando a pele branca exposta do sonserino - pele já tão cheia de cicatrizes: espinhos do diabo, sectumsempra e tantas outras -, ainda segurando um saco com gelo contra o hematoma que se formava no rosto do mesmo. "Assim como vou matar Carlinhos."

E era incrível como Draco não queria matar ninguém, não naquele momento. Não ali na cama com sua futura esposa e seu filho perfeito. Poderia ter até apanhado mais, ter comido algo que fizesse sua maldita pele cair, ter todos os malditos cabeças-vermelha contra ele: nada naquele momento o faria perder a calma interior que alcançara - o alívio gigante por ter a oportunidade de continuar ao lado dos dois.

Graças a seu pai, lembrou-se - mas no instante seguinte se fez esquecer. Não tiraria sua felicidade de agora com suposições sobre a vida - ou morte - dos dois: não era como se fosse poder ir atrás deles e continuar vivo, e tentaria confiar nas palavras de seu sogro.

"Vamos fazer o possível para tirá-los com vida da Mansão."

"Não tem cabimento fazerem isso com você." Agora ele havia aprendido realmente o que era ser grato por algo. Estava agradecido por estar ali, apesar da dor que ainda era suficiente para incomodá-lo. Apesar de ser um maldito fugitivo, a melhor parte de sua família deitava junto dele. "E meu pai não fez nada. Nada!" Deixaria-se pensar apenas no quanto aquela maldita era maravilhosa, mesmo irritada daquele jeito - principalmente irritada.

"Bruxa, está tudo bem." falou, uma das mãos alcançando alguns fios vermelhos e os colocando para trás da orelha - Merlins, haviam sardas até ali - antes de ver os olhos castanhos marejados. "Gin-"

"Eu realmente achei que tivesse te perdido, Draco." a mulher desabafou, uma lágrima que caía sendo seca pelo dorso de sua mão.

"Desculpe."

"Quando achamos meu pai e ele contou o pouco que sabia - que parecia a voz de Bellatrix, que talvez você tivesse sido capturado! Era óbvio que você tinha ido contra a sua vontade, e eu quis matar cada um que me falou o contrário - porque é claro que alguém ia me falar que você era um maldito traidor!" O pequeno entre eles arregalou os olhos assustado, e por um momento o bruxo achou que o choro seguiria. Não conseguiu impedir o orgulho de surgir no peito ao ver o filho manter a calma, mesmo com a voz alterada da mãe. "Eu pensei em te procurar."

"E deixar Leo órfão?" perguntou, vendo o filho envolver um de seus dedos com a mão.

"Foi por causa dele que só pensei." ela confessou.

"Graças a Merlin por Leo, então." Mas o rosto da bruxa continuava carrancudo. "O que foi?" E ela abriu e fechou a boca duas, três vezes, até o sonserino mandar todo o agradecimento de antes para o inferno e bufar. "O que foi, Ginevra?"

"Por um momento, por um instante," A garota parecia envergonhada. "Eu achei que você tivesse desistido. Achei que tivesse desistido de nós."

Desistido, queria rir ao ouvir aquilo. Como ele poderia desistir depois de tudo que passaram juntos? Como teria coragem de desistir agora? Morreria antes de desistir dos dois, aquela maldita guerra tiraria sua vida, e ele ainda estaria ao lado dela, lutando.

"E doeu tanto desconfiar disso." Aquela guerra ainda tiraria sua vida, era um fato.

Mas talvez ele pudesse acabar com aquela guerra estúpida - ou pelo menos tentar.

"O que acha de sábado?" disse, dando um sorriso torto para a bruxa. "Eu consigo avisar Zabini, então todos que importam para nós dois estarão presentes." Mas a bruxa ao seu lado apenas lhe deu como resposta uma expressão confusa. "Por Merlin, Ginevra! Case comigo no sábado, e pare de ter dúvidas sobre o maldito amor gigantesco que sinto por todas essas sardas." falou já aborrecido, e no segundo seguinte, sua dor era relembrada quando a ruiva se jogou em seus braços.

...

Sábado, 22 de fevereiro.

Talvez Ginevra ficasse irritada com ele quando descobrisse que tudo fora planejado. Que Draco traçara tudo aquilo muito antes de sua família escutar sobre o pedido e começar a entender o quanto aquilo tudo poderia dar certo. O quanto uma guerra ali, com todos os envolvidos, poderia dar a vitória para um dos lados - que ele já tanto esperava ser o da Ordem.

Olhou uma última vez para a porta, na esperança de ver algum traço da ruiva antes do altar, mas a madeira continuava fechada.

"Vamos logo, fuinha!" escutou do cunhado mais velho, que já caminhava muito à sua frente.

"Só Ginevra pode me chamar assim, sardento." murmurou, começando a andar para a areia.

Daria tempo, com certeza. Pegaria Leo nos braços, se casaria com sua ruiva e os tiraria dali antes da primeira maldição cortar o ar.


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Notas finais do capítulo

Falta pouco para o fim agora ;)



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