Entre o amor e a guerra escrita por Ania Lupin


Capítulo 41
Surpresas




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Domingo, 19 de agosto.

Observava as ondas quebrarem contra a embarcação enquanto o sol brilhava forte no céu azul, limpo de qualquer nuvem. Deu mais uma mordida na barra de chocolate, já amolecida com todo aquele calor - branco era seu favorito e ele lembrada também daquele detalhe. Não podia, afinal, desfrutar de uma pena de algodão doce entre tantos trouxas.

Seu pai adoraria estar ali no meio, amante das coisas não mágicas do jeito que era. Comeu mais um quadrado do doce, tentando afastar os pensamentos da família de sua mente - mas o quanto sua mãe ficaria decepcionada com ela ao achar o bilhete? Será que sua decisão faria Guilherme mudar de ideia e não mais apoiar aquele relacionamento? O problema é que não tinha como dar qualquer outra resposta além do sim: deixar o sonserino sumir por sabe-se lá mais quanto tempo estava fora de cogitação.

Assim como enfrentar sozinha sua mãe justo com aquela novidade, e sem o bruxo do seu lado - totalmente fora de cogitação.

Apesar de trouxa, o barco era rápido, e a viagem de pouco mais de uma hora finalizou antes mesmo que se desse conta. Viajaram envoltos em um silêncio confortável, o loiro ao seu lado de olhos fechados na maior parte do tempo. Draco parecia tão exausto que em nenhuma das vezes que quis, de fato o acordou, o próprio navio atracando sendo o responsável pelo despertar.

Era estranho vê-lo entre não-bruxos - era estranho um Malfoy andar normalmente entre trouxas, como se fosse uma coisa natural. E Draco andava a puxando pela mão como mais um, o rosto com uma expressão quase calma apesar das olheiras e marcas roxas que o fazia receber alguns olhares estranhos.

"Cuidado com o degrau." foi avisada, o bruxo ainda segurando com firmeza sua mão - estava com sardas até na sua maldita mão, como não reparara naquilo antes? E como não reparara na fome que estava sentindo - apenas atiçada pelo doce que comera? Precisava começar a se alimentar melhor a partir de agora, sabia - a tontura que sentia era pela fome ou pelo calor?

Talvez pelo motivo número três.

"Por que não aparatamos direto para a ilha? Para sua casa?" perguntou quando se afastaram das demais pessoas, ele a puxando, para sua felicidade, em direção a uma loja que parecia vender comida.

A viagem de barco não havia sido longa, mas em compensação, a viagem até chegarem ao barco havia demorado algumas boas horas - e nem mesmo tinham parado para almoçar. Ele mesmo não comera nada além de um pedaço do chocolate da barra que Ginevra terminara no barco, e já eram quase quatro horas da tarde - ela estaria já no chão não fosse o chocolate, o pão, e os amendoins servidos no trem. Como o sonserino tinha sobrevivido apenas com café?

"Não existe nenhum bruxo nessa ilha, e eu não quero usar magia aqui, e ter a chance de ser localizado." escutou-o falar enquanto paravam em frente ao que parecia uma confeitaria. "Ainda mais tendo você comigo."

"Mas a casa está com o Fidelis-"

"Não pode ser rastreado." Não era o que lembrava de ter aprendido em Hogwarts. "Snape tem seus meios. Está com fome, não?" Seu estômago escolheu aquela hora para responder a pergunta, o rosto da bruxa se tornando vermelho como seus cabelos.

Morrendo de fome, sim, comeria a loja inteira, com certeza. Sem um centavo no bolso, também.

"Eu não tenho dinheiro." Pela primeira vez até então se deu conta daquela situação. A pouca comida fora entregue pelo loiro, assim como ele já parecia ter tudo comprado: passagens do trem, do ônibus, tickets para embarcarem no navio, logo Ginevra não precisou pensar exatamente em dinheiro - ainda mais em dinheiro trouxa. Sua cara de desespero realmente deveria estar hilária pela risada melódica que ouviu antes das próximas palavras seguirem.

"Eu tenho para nós dois, bruxa." o loiro falou ao empurrar a porta de vidro, o tocar de um sininho pendurado em cima desta anunciando a entrada dos dois. "Maioridade, herança de meu avô, lembra disso também, não lembra?" Considerou por um momento entrar numa discussão sobre o quanto aquele dinheiro não era dela - mas qual seria a alternativa? Voltar para sua casa, grávida e sozinha? Abandonar o bruxo, sozinho? Passar fome? "Vamos bruxa, o que você quer?"

Suspirou, derrotada. O dinheiro era dos dois. Dos três. Dos três, e começava a se desesperar com o pensamento: ele ainda não sabia, ela ainda não havia contado, santo Merlin, e se Draco reagisse mal? E se ele a mandasse embora, e se falasse que não queria aquilo, e se- O melhor com certeza era não pensar, não agora. Não iria dar tal notícia no meio de um loja, afinal.

Mais uma vez teve vontade de gargalhar com aquele pensamento: e daria como, dando um sapatinho verde, radiante com a notícia de um filho com dezesseis anos e no meio de uma guerra?

"Gin?"

Chorar agora não, mas que droga. Doces, focaria nos doces. Apesar das dezenas de diferentes, seus olhos cresceram no de sua fruta favorita. Estava já em frente ao balcão quando o atendente se dirigiu a ela.

"Prego, signorina?" Segunda situação que só agora se dava conta.

"Uma tortinha de morango?" Ela não falava uma palavra em italiano - e até agora havia conseguido se comunicar na sua língua sem grandes problemas.

"Non capisco." Até agora, porque não precisava entender muito para deduzir que aquela pessoa não havia compreendido uma palavra sua. Droga, como o sonserino estava se virando ali?

"Un caffè doppio, per favore," A pergunta foi respondida sem precisar ser vocalizada por ela, Draco pedindo seja lá o que estivesse pedindo com a mesma fluência que a ruiva quase tinha em Latim. "E una torta di fragolli e panna." Continuou a observar encantada as palavras saindo da boca do bruxo: ele ficava ainda mais charmoso falando naquela língua estrangeira - como conseguia? "Mais alguma coisa?" Sacudiu a cabeça negativamente, tentando esconder sem sucesso o pequeno sorriso que surgira nos lábios. Maldita fantástica doninha saltitante, que a fazia se perder de amores nas mais pequeninas coisas.

"Mangi qui o porti via?" o vendedor perguntava, já pegando a tortinha que a bruxa queria e a colocando dentro de um saco ao receber uma resposta do loiro, pagando o senhor com uma nota de papel - nunca vira aquela.

"Tenga il resto." o viu responder, ainda encantada com o novo vocabulário, enquanto recebia o saco com seu doce de morango, o bruxo pegando apenas uma bebida que viu ser um café servido em um copinho de isopor.

"Prego signore."

Não esperou sair do local para dar a primeira mordida, Draco negando quando oferecido um pedaço, parecendo procurar algo nos bolsos do jeans.

"Você fala italiano."

"E Latim também. Surpresa?" ele respondeu, tirando uma chave do bolso e apertando um botão ao chegarem próximos de um veículo preto, o copo de café já vazio indo parar no lixo. Só quando o viu abrindo a porta que chegou a conclusão - que antes lhe pareceu um pensamento tão absurdo.

"E você tem um carro." Bateu a porta, o sonserino já colocando a chave na ignição - era assim que chamavam aquela parte, não?

"A casa não é perto do porto, afinal."

Era irritante como até mesmo aquilo o sonserino fazia com perfeição - até mudar de marcha era charmoso. Ou eram os olhos dela que viam as coisas daquela forma? Afinal, paixão era uma coisa totalmente perturbadora - e sabia que, além de amar, ainda estava completamente apaixonada pelo bruxo. Pelo comensal. Tinha estourado uma guerra, e ali estava Ginevra, pensando no quanto seu namorado ficava sexy trocando de marcha.

Seu bruxo.

Tão não-mágico.

"Pode falar." Nem mesmo percebeu que o encarava.

"Você está tão trouxa." As palavras saíram antes dela pensar.

"Mataria qualquer outro que me falasse isso." Assim como a resposta dele. O viu apertar um botão no painel que ficava no meio dos dois, e uma música italiana começou a sair pelos auto-falantes laterais. A pergunta só veio após alguns minutos de silêncio."Não está arrependida de ter fugido comigo?"

"Não ainda." Ginevra olhava para o mar quando respondeu, o sorriso - por mais estranho que fosse sorrir naquela situação - nunca deixando os lábios. "Nós não brigamos, afinal."

"Ainda." o bruxo completou.

"Essa foi a vez que me senti mais normal com você." admitiu depois de mais um tempo de quietude, os olhos continuando a observar o mar ao seu lado direito. "Não precisei me esconder. Não precisei ter medo de pegar na sua mão. Pude te beijar no meio de outras pessoas." As mãos amassavam mais o saco pardo vazio - inconscientemente -, os olhos indo de uma azul para o outro. "Eu sei que não deveria estar me sentindo feliz com tudo que está acontecendo-"

"Faz tempo que não me sinto tão feliz como agora, Ginevra." E o sorriso só aumentou - em ambos. "E não, não estou me sentindo mal por isso. Eu vou me deixar continuar pensando apenas em nó dois, e que você está aqui do meu lado, e não vou me sentir mal até sentarmos para conversar - então tenho mais algumas horas de pura felicidade." O sorriso não foi mais embora - de nenhum dos lábios.

Ok, ela poderia fazer o mesmo - por enquanto.

...

Haviam passado uns bons minutos conversando sobre as coisas mais simples - você não acha mesmo que chocolate branco é chocolate, acha? - quando sentiu a velocidade diminuir, o carro começando a chacoalhar um pouco mais. O asfalto virara paralelepípedos, e o tremer do carro não parecia agradar muito o bruxo, pela cara feita.

"A poção está perdendo o efeito." ele falou antes que viesse qualquer pergunta, explicando a carranca, desencostando as costas do estofado.

"Precisa que eu dirija?" Foi quase engraçado o olhar recebido. "Draco, meu pai é um amante de trouxas, é claro que eu sei dirigir um carro."

"Você está sem seus documentos." Estava? E a primeira coisa que fez foi checar sua mochila - única coisa que trouxera consigo, junto de uma muda de roupa - e era óbvio que estavam lá dentro!

"Claro que não estou-"

"Seus documentos trouxas." O que? "Você acha que eu te chamaria para viver comigo e não providenciaria o mínimo?" A mochila voltou para o chão do carro, os olhos chocolate observando os cinzas, desconfiados. "Eu já havia considerado a possibilidade, Gin. Só não sabia se teria coragem o suficiente para falar." o bruxo confessou. "Mas sua coragem grifinória é irritantemente contagiante."

Não demorou para a estrada de paralelepípedos se transformar em uma de terra, a cidade e qualquer construção ficando para trás. Em minutos, tudo que via era árvores, areia e mar - e então, uma casa de pedra.

"Chegamos." Draco parou o carro com um tranco - com certeza ótimo em poções, mas não o melhor dos motoristas, como havia pensado no começo daquela viagem. "Sim, é isolada e simples." ele continuou após alguns minutos de silêncio, provavelmente encarando a quietude da ruiva como algum sinal de reprovação.

Mas o silêncio era por tudo, menos reprovação - como se ela, justo ela, fosse desdenhar aquela paisagem perfeita. Saiu do carro segundos depois que este parara, caminhando para perto do mar - alguma vez tinha revelado o quanto gostava do mar? Uma memória lhe veio a cabeça e lhe mostrou que sim, tinham falado sobre a adoração que Ginevra tinha por aquele cenário.

A casa de pedras fora construída quase na areia, apenas um metro de grama e terra a separando do início da praia. Ficava no que parecia ser o final daquela praia, protegida por enormes pedras a sua esquerda, e uma montanha com mata baixa na parte de trás. A ruiva chutou os sapatos que usava, abandonou as meias e os pés tocaram os pequenos grãos, ainda quentes pelo sol da tarde.

"É linda." disse ao fechar os olhos, o final de uma onda tocando de leve sua pele.

"É mesmo." escutou o loiro concordar - mas não, ele não falava da praia, nem da casa, estivesse prestando atenção teria notado os olhos cinzas nunca deixarem o cabelo cor de fogo que voava desordenado com a brisa marítima.

Quando voltou a olhar para onde antes estava seu namorado - namorado, o termo ainda causava estranhamento - achou o bruxo já de pé na varanda, destrancando a porta da casa, e não tardou a seguir para a entrada. Não foi a única, e nem a primeira a chegar.

"Você tem um gato?" Draco Malfoy acariciando o lombo de um felino laranja era uma cena que não esperava ver.

"Strega um belo dia apareceu e não saiu mais." A resposta veio com o click que anunciava a porta destrancada.

"Strega?"

"Bruxa." ele disse, e demorou alguns segundos para a ruiva perceber que o sonserino traduzia o nome dito. "O apelido combina com a cor do pelo." contou com um meio sorriso. "Lar, doce lar." e finalmente escancarou a porta, a convidando para entrar - e ela não tardou, assim como a gata. "E então, o que acha?" a pergunta veio com um beijo na bochecha.

Deixou-se explorar a pequena casa por um momento - realmente, era simples, mas perfeita para eles dois. Para eles três, se corrigiu. Da entrada, que era uma pequena sala com um sofá e uma TV - uma TV! Teria que rir um pouco daquilo depois - conseguia ver a cozinha, e duas portas fechadas, que assumiu ser um banheiro e um quarto. Um quarto.

Um beijo, agora nos lábios, a fez voltar sua atenção para o loiro - sim, sentira falta do maldito.

"Preciso guardar a sua varinha, Gin." ele disse, a fazendo se lembrar da conversa tida no carro. Entregou um tanto quanto relutante sua única defesa, observando-a ser escondida e trancada em uma gaveta, junto com a do bruxo. "É natural usarmos - é praticamente automático. Eu mesmo me pego tentando vez ou outra. Uma das chaves fica com você." Colocou no bolso da calça o pequeno molho dado, imaginando as outras chaves serem dos cômodos da casa. "Não precisa ter medo, ok? Ninguém consegue entrar aqui a não ser a gente - ninguém nem mesmo tem vontade de passar da ponte que atravessamos para chegar aqui."

"A gente, Zabini, Snape, e Creevey." ainda disse o nome do amigo com desgosto.

"E todos, como você sabe, são de total confiança - afinal, eu confio neles." Era um bom argumento.

Andou até a mesa de centro, onde seus olhos acharam um papel com sua foto - mas sem seu nome.

"O que é isso?" pegou-o antes de vir a permissão - claro, seus documentos trouxas. "Virginia Onoratto." O próximo detalhe a deixou ainda mais surpresa. "Casada? Com quem?"

"É um vilarejo pequeno." Foi a justificativa que veio, Draco já outra vez atrás dela, parecendo nervoso. "Você está brava?"

"Não." Até tentou definir o sentimento com alguma palavra, mas nenhuma parecia caber a situação. "Eu quero conversar, Draco. Já é quase noite," via pelo relógio pendurado que marcava sete horas, apesar do sol que ainda brilhava do lado de fora. "Acho que escapou o suficiente de todas as minhas perguntas por hoje."

"Me dê um minuto, ok?" Estava preparada para contestar ao vê-lo começar a se afastar quando Draco abriu a porta do que era sim, como pensado, o banheiro. "Eu realmente preciso tomar mais uma maldita poção anestésica."

O viu fechar a porta antes de rumar para a cozinha. Da pequena janela - que abrira para tentar diminuir o calor do cômodo -, conseguia ver um campo que dava para uma enorme montanha, e seu coração se encheu de um conforto ao reconhecer as pequenas flores que dominavam uma parte da grama - margaridas. Algo macio roçando em sua perna a fez voltar sua atenção para o chão da cozinha.

"Gata." pegou a bichana no colo - ela até que tinha seu charme.

"Mew." não esperava outra resposta. O barulho de uma cadeira sendo puxada chamou sua atenção, a felina voltando para o chão frio da cozinha e Ginevra indo sentar-se na cadeira frente a que o bruxo ocupava no pequeno espaço de jantar, notando o rosto pálido um pouco mais relaxado.

"Faça seu pior."

Era engraçado: agora, podendo perguntar tudo que queria, nada daquilo que desejava saber parecia mais tão importante. O rapaz havia ferrado com sua memória? Indiretamente sim, havia. Ela tinha falhado em quase todos os NOM's? Sim, de uma maneira tão ridícula que McGonagall a reprovara com o olhar durante dias - mal conseguira um razoável em Transfigurações, uma de suas melhores matérias. Mas ali estava agora, com todas suas memórias e seu maldito conhecimento de volta, com a certeza que o maldito bruxo a sua frente retribuía todos os seus sentimentos, e além de tudo, grávida.

Valia a pena brigar?

"O que aconteceu em janeiro?" começou com aquela pergunta, apoiando os cotovelos na mesa.

"Creevey me disse que você tinha parado de comer, de dormir, de-"

Talvez valesse, pelo menos um pouco.

"Eu lembro disso, Draco." o cortou já aborrecida, se lembrava novamente muito bem de seu mês de tormento. "O que aconteceu com você em janeiro? Por que não mandou uma maldita coruja? Onde você estava, para me deixar acreditando que nunca mais voltaria?" Porque sim, também tinha a viva memória de no final, sua mente ter se convencido que o colar que guardava no pescoço seria sua última - e única - recordação tácita do sonserino.

"Na mansão de minha família, assim como todo o maldito exército de comensais. Todos, Ginevra." o ouviu enfatizar, uma mão se aproximando da sua. "Não tinha condições de mandar uma coruja nas primeiras duas semanas, eu realmente não saí do meu quarto, mal levantei da cama. Como já disse hoje de manhã, houve um ataque no Natal, eu estava com feridas abertas e tive uma infecção - e só descobri quando não conseguia mais ficar de pé. Quando acordei haviam passado duas semanas. Quando consegui me levantar, três."

Deixou-o pegar sua mão, que descansava sobre a mesa - sim, tinha imaginado que aquele houvesse sido o caso. No início, toda vez que pensara em janeiro sobre o sonserino, se convencia que sim, ele voltaria, e que a ausência de notícias da parte dele era por alguma situação semelhante a contada - que ela tentou não se aprofundar em sua imaginação.

"Não tinha como mandar nenhuma coruja, Gin. Me chame de paranoico - sempre soube que eu era - mas não correria o risco de associar nenhum de vocês - principalmente você - a mim. A mansão estava cheia de comensais, imagine um deles pegando um pergaminho que dissesse 'Ginevra Weasley, estou voltando, me espere nua na estufa número 4." Mas a piada não surtiu o efeito que o sonserino esperava - a não ser que a intenção fosse a carranca. "Eu me tranquilizava pensando que Snape sabia, e que algum de vocês iria atrás dele para saber de algo antes de fazer qualquer coisa."

"Eu fui." a ruiva confessou enfim, ganhando um olhar surpreso do bruxo. "Eu fui todas as semanas atrás de Snape." E todas as vezes se passaram como um filme em sua mente - toda segunda, algumas sextas, ia até o professor de Poções, que provavelmente não mais a aguentava olhar. "Todas as vezes ele me disse que você voltaria." Mas em nenhuma das vezes as palavras do comensal a tranquilizaram - teria ela pego traços da paranoia do sonserino? "Não falei com Colin nem com Blaise sobre isso. Snape também nunca explicou nada, apenas dizia que você voltaria quando fosse o tempo. Achei que estivesse falando aquilo apenas para não ter mais um problema para lidar."

"E então Creevey lançou uma tentativa de obliviate um dia antes de eu voltar."

"E ninguém fez nada." a voz saiu ressentida, assim como o olhar, uma certa irritação voltando como antes naquela manhã.

"É aí que você se engana. A sangue-" Ginevra agradeceu internamente quando o viu conter o xingamento. "Granger tentou reverter o feitiço, inúmeras vezes - e todas as vezes minha pouca esperança desaparecia mais um pouco. As tentativas falharam, como você pôde ver. Ela, Creevey e Zabini discutiram mais algumas possibilidades na sala precisa, mas em maio todos pararam de tentar reverter." ele terminou, a olhando num pedido silencioso de desculpas.

"Por que?"

"Você parecia melhor." Melhor. Talvez aquela tivesse sido a pior coisa que ele tivesse lhe dito em todo aquele tempo - com certeza a pior de todo o dia.

"Eu parecia melhor." E a irritação que conseguira conter até agora explodiu. "Eu parecia melhor, Draco? Sério, melhor? Parecia melhor pra você uma garota que não se lembrava de droga nenhuma? Que confundia todas as matérias? Que se isolava por estar se sentindo uma maluca?" A mão foi retirada da dele como se queimasse. "E por Merlin, você não fez nada! Você não me falou nada! Você voltou para o meu lado e ficou quieto! Era por isso que para você eu parecia melhor? Porque eu ao seu lado era um pouco mais confortável?"

"E o que eu deveria ter feito?" Agradecia também por ele - sempre tão estourado quanto ela - ainda estar conseguindo permanecer minimamente calmo. "Você acha que chegar em você e contar que éramos um casal ajudaria em algo? Contar que seu amigo ferrou com sua memória faria você magicamente lembrar das coisas, que-"

"Eu passei um semestre achando estar louca!" Porque ela, definitivamente, havia perdido o controle. "Eu passei fevereiro praticamente isolada enquanto você dava uns pegas na Parkinson no corredor!" Mais um olhar surpreso, seguido de outro arrependido, Ginevra perdendo aquele último enquanto se levantava e ia em direção a pia. Strega sabiamente saiu pela janela, local onde a bruxa tentava focar toda sua atenção para ver se a vontade de arremessar qualquer coisa no sonserino já muito debilitado passava. "Ou você acha que não vi essa parte?" continuou após alguns minutos, respirando fundo para tentar manter o controle da voz. Não, não choraria daquela vez. "Que antes daquele nosso primeiro beijo estúpido, eu não me certifiquei que você não estava mais com ela?"

Xingou mentalmente quando escutou sua voz falhar na última palavra, a irritação aumentando ao não conseguir impedir os olhos de ficarem úmidos novamente. Tentou contar até dez - porque respirar claramente não estava ajudando - para conter a vontade de jogar o copo de água que tomava na cabeça do bruxo. Se estava irritada antes, lembrar do fato que ele - tão arrasado por estar sem ela - havia ficado com aquela sonserina a deixava prestes a pegar fogo de ódio. Sábia, mas muito sábia decisão deixa-lo guardar sua varinha - ela já teria o azarado algumas boas vezes com o pedaço de madeira na mão.

"Realmente, você parecia devastado se esfregando na loira-"

"Você beijou Potter!"

"Beijei sim, porque eu queria tirar você do meu organismo!" Praticamente jogou o copo vazio dentro da pia - que por um milagre não se espatifou em mil cacos. "Mas nem beijando minha antiga paixonite eu consegui isso, sonserino maldito! Ah, mas que inferno!" E ali estava ela, escondendo o rosto mais uma vez nas mãos. Virou-se ao sentir dois braços envolverem sua cintura, e por um momento pensou sim em tentar escapar - não queria um maldito abraço, não queria derreter sua raiva se encostando naquele cheiro que tanto sentira saudade.

"Eu vou passar a minha vida me desculpando se for preciso, ok?" Sentiu lábios na sua testa, e suas mãos voltaram para baixo, revelando os olhos molhados. E como antes - como sempre - a mão tão maior do sonserino secou seus olhos com uma delicadeza que sim, fez toda sua maldita raiva evaporar. "Eu nem devo ter o direito de perguntar isso, mas foi só uma vez?" A pergunta veio depois de alguns segundos de silêncio. "Foi só um beijo?" Mas Draco continuou antes que pudesse vir qualquer resposta. "Eu me esfreguei com a Parkinson exatamente cinco vezes. Sinto muito que você tenha visto algumas delas." Foi surpreendente como o bruxo leu a pergunta que era feita pelos olhos chocolates. "Não, eu não transei com ela, Ginevra."

"Foi só um beijo." enfim confessou. "Eu estava confusa."

"Eu estava quebrado." Foi a confissão da outra parte - e ao ver a tristeza que os olhos cinzas mostravam, não teve mais dúvidas. "Quando disse que seria difícil, quando perguntei se você tinha mesmo certeza da onde estava se metendo," Sim, o sonserino sentira sua falta. "Era disso que eu estava falando. Eu sei que te machuquei muito, e eu peço desculpas outra vez por isso." Sim, o sonserino a amava. "Mas Gin, eu faria tudo de novo. Eu faria tudo outra vez para te manter a salvo - por mais que nos machucássemos no final." Eram só três palavras. "Eu sei que isso definitivamente não era o que você gostaria de ouvir-" Depois de tudo que tinham passado, não era tão difícil assim de se falar.

"Eu estou grávida."

Surpresa.

...

Era estranho saber enfim, como o pai se sentira todos aqueles anos. Porque queria acreditar que aquela era a explicação do comportamento de Lucio: sua família. Defender sua família.

"Eu estou grávida."

Nos seus poucos anos de vida, nunca parara para pensar - ainda - em como seria construir sua própria família. Imaginava que um dia acabaria achando alguém e se casando, e então teria um filho - provavelmente -, mas em seus dezessete anos, nunca parara pra pensar realmente em como seria aquilo. Como teria sido se tudo tivesse corrido normalmente em sua vida? Se não tivesse aquela guerra, se não tivesse sido obrigado a se tornar um participante ativo daquele inferno? Teria algum dia reparado na ruiva? Teria seguido o curso que a sociedade considerava normal? Se casado após seus vinte e tantos anos, planejado uma família, recebido a notícia com um par de sapatinhos?

"Draco, por favor fala alguma coisa."

Suas mãos, que ainda seguravam a cintura da bruxa, afrouxaram o aperto no mesmo instante. Aqueles olhos chocolate estavam assustados, a ruiva o encarando apreensiva, em busca de alguma reação, de alguma palavra. Deveria ter reparado antes nas mão inquietas durante todo o dia, no toque vez ou outra naquela barriga ainda tão normal, tão não-grávida.

"Foi por isso que você veio comigo?" Maldição, definitivamente não esperava receber aquela notícia ali, com aquela idade, naquela situação, do mesmo jeito que não queria que aquelas fossem suas primeiras palavras.

"Eu sei que nós somos muito novos," As palavras saíam atropeladas, Ginevra claramente nervosa. "E que estamos no meio de uma guerra, e que por Merlin, você é praticamente um fugitivo," Não percebeu, mas suas mãos tremiam tanto quanto as que tocavam seus braços. "Mas eu juro que não sei como isso aconteceu." Por um momento pensou em responder que sim, ele sabia - estava bêbado naquela noite da torre, e nem mesmo se passou por sua cabeça fazer qualquer feitiço antes de deitar-se entre os fios vermelhos. Merda, a culpa ainda era dele - mais uma coisa que a impunha. Porra. "Eu tomei uma poção no dia seguinte, não era para ter acontecido nada! E achei que não fosse acontecer nada, mas nada acontecia, e eu comecei a ficar tão estranha - e queria tanto, mas tanto continuar culpando toda a minha preocupação como a causadora dos sintomas. Ontem não deu mais para adiar saber." O final tinha um tom de desculpas que apenas o fez sentir-se ainda mais culpado por toda a situação. "Meu Merlin, nós nem mesmo somos casados, eu nem mesmo sei se você quer-"

"Quero." conseguiu falar antes que pudesse haver mais algum pensamento errôneo por parte da pessoa mais importante de sua vida - de uma delas, agora. Porque sim, ele queria aquele bebê, ele queria qualquer coisa que a jovem quisesse lhe dar - aquela só não era a melhor hora para aquilo. Mas como nos últimos meses, se viraria com o que tinha. "Eu quero essa criança, Gin. Eu quero vocês dois. E eu quero me casar com você." Se certificou de que ela soubesse de tudo aquilo. "E eu vou me casar com você, assim que essa merda toda acabar, ok?" A puxou para um abraço, encostando o queixo nos fios vermelhos - ela ainda cheirava a baunilha. "Você estava com medo de me contar isso?"

"Apavorada." A voz saiu mais calma, apesar dele continuar a sentir o coração acelerado. "Está arrependido de ter me chamado?"

"Nunca. Está arrependida de ter vindo?" Sorriu ao vê-la negar com a cabeça. Quebrou o abraço segundos depois, achando novamente os olhos castanhos, aquele rosto tão mais relaxado. "Eu amo você, Gin. Vai ficar tudo bem." Porque sim, iria ficar tudo bem. Ele daria um jeito de deixar tudo bem. "Nós três vamos ficar bem. Só confie em mim, ok?"

"Eu confio." Até respirou mais aliviado com a resposta. "Acho que preciso de um banho." Quase reclamou quando a jovem se separou dele - não estivesse precisando tanto de alguns minutos sozinho para pensar, teria proposto sua companhia.

Só quando a porta se fechou foi que Draco deixou-se encostar-se na parede, as mãos cobrindo o rosto.

Puta que pariu. Soltou uma respiração que nem mesmo se dera conta que segurava enquanto deslizava para o chão, e enfim permitiu-se fazer uma coisa que há anos não fazia. Porque ele estava fodido pra caralho. Não por causa de dinheiro, não porque eram muito novos - incrivelmente, não se achava nem um pouco novo para ser pai ao final daquela conversa. Afinal, suas preocupações eram muito maiores das normais de um bruxo de sua idade - sentia-se muito mais velho do que dezessete. Além de não ter um pingo de dúvida sobre com quem gostaria de ter um filho: poderiam passar-se dez, vinte anos, aquela maldita ainda seria sua única escolha.

O problema era ele - como sempre. O problema era que aquele filho era dele: comensal, fugitivo, assassino. O problema é que agora ele sabia que faria tudo e qualquer coisa, por pior que fosse, para manter aqueles dois em segurança - porque eles eram a sua maldita família. Tão como o seu pai fizera durante toda a vida.

E Bellatrix sabia. Sabia dela. Sabia disso, provavelmente.

Enxugou irritado as lágrimas que insistiam em sair, contendo um soluço. Sim, o bruxo estava, oficialmente, fodido.


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Notas finais do capítulo

E aqui está mais um capítulo! Onde resolvi colocar um teco do meu básico de italiano - desculpe algum erro, rs.

Beijão e tenham um ótimo feriado,

Ania.



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