Entre o amor e a guerra escrita por Ania Lupin


Capítulo 33
Meu lugar




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Sábado, 17 de fevereiro.

Se olhou uma última vez no espelho antes de colocar a capa grifinória por cima de tudo, tomando cuidado para não deixar nenhuma parte da roupa aparente - Merlin, ela realmente faria aquilo?

Eram oito horas quando encontrou as duas amigas na frente do porta retrato da mulher gorda, agradecendo por não achar nem Colin, nem Hermione, nem Harry e principalmente, nem seu irmão, no salão comunal antes de sair de lá num horário muito atípico - não que fosse gastar alguma explicação para sua saída, ainda mais no humor em que ultimamente andava. Por um instante se perguntou se teria que gastar explicações caso achasse algum dos quatro na festa - mas justo nas masmorras, quais as chances?

Sim, Ginevra realmente faria aquilo.

A capa foi aberta outra vez somente na frente da entrada da Sonserina, todas as três mostrando um visual tão incorreto para uma grifinória, tão com as cores da casa das cobras. Sua mão foi inconscientemente para o cropped de renda branco que Ravenis insistira tanto para ser usado, tentando inutilmente abaixar a peça e cobrir a pele exposta. Não bastava a saia verde muito mais colada do que o necessário para seu gosto, a camiseta que deixava a maior parte de sua cintura à mostra estava a matando de desconforto - poderia ter aberto, mas nunca tiraria aquela capa.

"Para de drama Gina, você está ótima!"

"Eu pareço uma-"

"Se disser vadia, eu te mato." avisou Raven, lendo a senha escrita no pedaço de papel que segurava. "Essa roupa é minha."

Foi quando a porta se moveu que o coração da ruiva começou a dar sinais.

"Aqui definitivamente não é meu lugar, talvez seja melhor eu voltar-"

"Negativo!" Sati quem segurou o braço da bruxa. "Você anda sem o sorriso que gostamos já faz um tempo, um pouquinho de diversão e sonserinos é tudo que uma bruxa precisa de vez em quando." E então, colocava os pés pela primeira vez naquele salão comunal - e meu Merlin, aquilo estava uma bagunça.

Sim, realmente estava fazendo aquilo.

Tinha esperado receber olhares pouco receptivos dos estudantes ali presentes - todos com alguma peça verde, aquilo era um dress code? - mas os olhos as receberam de uma forma bem diferente, especialmente os masculinos. Precisava admitir: os estudantes daquela casa sabiam mesmo como dar uma festa, o lugar estava muito mais animado do que as festas grifinórias ficavam, decorado de uma forma única com corações partidos e cupidos de papel atirando flechas por cima de todos. E da onde estava saindo a música? Sim, os bruxos de sua casa deveriam aprender uma coisa ou outra com as cobras, com certeza.

"Montague!" Ravenis andou até um moreno que Ginevra reconheceu como sendo do time de quadribol sonserino, lhe cumprimentando com um beijo, os dois voltando-se para ela e Sati com o sorriso registrado daquela casa - tão completamente bizarro.

"Vejo que trouxe boas companhias." o bruxo falou, já envolvendo a grifinória pela cintura.

"Gina e Sati, Graham Montague." Por um instante achou ter sido reconhecida pelo rapaz, e o próprio fez menção de abrir a boca quando Raven continuou. "Algum lugar onde uma bruxa pode conseguir uma bebida por aqui?"

Observou em silêncio os dois se perderem no meio da festa antes de se virar para Sati.

"Raven está pegando um sonserino?"

"Raven está pegando um sonserino."

"Wow." Tinha mesmo sumido naquele último semestre. "Pra quem gritava aos sete ventos que odiava toda pessoa vinda dessa casa," começou, passando os olhos pelo salão. "Ravenis não parece mais nutrir esse sentimento pelos bruxos descarados e sem um pingo de vergonha na cara."

Deixou os olhos vagarem pelos presentes mais uma vez. Reconheceu alguns alunos de outras casas - o que fez surgir um sentimento de alívio, por um momento a bruxa achando ser ela e as amigas as únicas infiltradas ali - entre eles o corvinal que ficara lhe encarando no Três Vassouras. Storms, certo? Muito lindo, precisava admitir. Tão lindo quanto o loiro sentado no sofá verde, parecendo entediado enquanto rodava um copo com bebida - firewhisky? Onde os estudantes conseguiam aquilo?

"É melhor não olhar muito pra esse aí não." Mas apesar das palavras de Sati, não conseguia desgrudar os olhos daquele rosto, daqueles cabelos bagunçados, do único que parecia não ligar para o código de vestimenta velado e usava um jeans azul escuro e uma camiseta branca por baixo da capa sonserina. "Parkinson é ciumenta."

Quando os olhos cinzas encontraram os dela foi quase um choque. Oh meu Merlin, de novo não. Ela não estava, outra vez, atraída por justo aquele sonserino, estava?

"Falaram que os dois não estavam mais juntos, mas não é o que ela dá a entender, praticamente jogada em cima dele." Foi só então que notou a loira ao lado de Malfoy, e outra vez um choque ao vê-la passando a mão em uma das coxas do bruxo, seu outro braço o envolvendo pelos ombros - um choque porque aquilo era errado.

Porque a garota não tinha o direito de ficar assim próxima.

Algo pareceu queimar no seu peito quando viu o loiro voltar a atenção para Parkinson - era como se não tivesse mais ar. Draco nem mesmo gostava da bruxa, por que a deixava ficar tão próxima, por que a tocava?

"Por que você continua com ela?"

"Era divertido no começo. Ela tem seus pontos positivos."

"Mas você não gosta dela."

"Pansy sabe como eu sou, e sabe como é nosso relacionamento. É pura conveniência. Como disse, tem seus pontos positivos, mas nunca passou de diversão, e eu nunca demonstrei o contrário."

"Gina?" Uma mão sacudia seu ombro. "Pare de encarar, Gina."

"Não estou encarando." Outra vez. "Onde consigo uma bebida aqui?"

Não esperou uma resposta da amiga antes de sair andando.

Aqueles pensamentos desconexos, outra vez! O que estava acontecendo com ela? Que diabos estava se passando em sua mente? Por que diabos aquele loiro estava invadindo seus pensamentos? Sim, com certeza esse sonserino estava metido em algo, estava fazendo algo com sua cabeça, porque era impossível, era totalmente não cogitável Ginevra sentir-se atraída por si só por aquela cobra!

Argh! Qualquer coisa seria uma boa distração!

"Gina?" Sorriu. Qualquer coisa, ainda mais se fosse uma coisa mais agradável de se olhar do que ele.

"Aeon."

—__

As coisas não andavam boas para ele naquele começo de ano, então sim, uma festa poderia lhe ajudar a relaxar pelo menos um pouco. Ao menos esse fora o pensado por Draco Malfoy - e aquilo realmente estava acontecendo, cercado de boa bebida e alunos que não estavam dando a mínima - até seus olhos acharem a última pessoa que esperava encontrar ali.

A filha da puta estava maravilhosa. Maravilhosa, não era à toa que vários bruxos estavam com os olhos grudados em Ginevra, vários despindo o pouco da roupa que a grifinória usava mentalmente, vários que ele queria matar. Sua vontade era empurrar Parkinson para longe - que merda a sonserina estava fazendo grudada nele? - e tirar a ruiva daquele meio - e de preferência, leva-la para seu quarto.

Se forçou a afastar seu olhar: nunca a levaria para a merda de seu quarto, e com certeza era melhor assim. Com certeza era melhor tê-la longe, e então quem sabe depois que tudo isso passar, depois da guerra ter terminado, quem sabe se lhe sobrasse alguma vida, alguma maldita centelha grifinória de coragem, tentaria se aproximar, tentaria fazê-la ver o quanto-

Seu punho coçou quando viu Storms andar em direção a sua ruiva, e quis soca-lo apenas mais quando ela fora tão receptiva quanto no dia em que os viu no Salão Principal, meses atrás, quando ainda nem sabia o quanto aqueles malditos lábios eram como a melhor das drogas. E Draco socaria a cara do batedor corvinal - sem pensar duas vezes - e acabaria com toda a festa sem pestanejar, caso não tivesse decidido que já havia fodido demais com a vida daquela bruxa. Para ele, a celebração estúpida terminaria em seu dormitório junto com o resto de seu firewhisky, por mais que a cada fechada de olhos se lembrasse das mãos erradas tocando aquele cabelo.

Minutos depois, já estirado na cama, considerou jogar contra quem fosse que estivesse entrando em seu quarto o copo vazio que ainda segurava. Não soube ao certo como apesar de todo o álcool se controlou, e agradeceu por não por em prática o ato ao ver a imagem que tanto queria ali, e que tanto não deveria estar assim perto de sua cama. Era patético o alívio que seguiu ao vê-la sozinha. Ela não era dele, não estava com ele, a bruxa poderia muito bem estar com quem quisesse e o sonserino não poderia interferir em nada - no entanto, não sabia mais quanto sua sanidade iria durar, e ver os lábios pelos quais ansiava diariamente beijando outro poderia conseguir fazer a mágica de zerar enfim todo seu bom senso.

Quase não conteve um sorriso: tê-la ali sem ninguém era a melhor coisa do mês.

"O que você está fazendo aqui?"

"O que eu estou fazendo aqui, na minha casa, no meu quarto?" falou arrastado, sentando-se e olhando bem para aqueles cabelos ruivos, a grifinória já tão perto, a porta já fechada - inferno. No quarto que você quis algumas vezes visitar, e ficava puta sempre que eu dizia não? "Bebendo, Weasley. Por que você não está com seu namoradinho?"

"Eu não tenho nenhum namoradinho, Malfoy." a grifinória bufou, se aproximando mais alguns passos. "Onde está a sua?"

Na minha frente.

"Não estou com ninguém, sardenta."

Será que era efeito de sua bebedeira o som vir tão baixo, ou a resposta que seguiu saíra mesmo numa voz fraca, tão diferente da sempre confidente com a qual estava acostumado? Acostumado - pensar sobre tudo que tinha se habituado nos últimos meses era o pior tipo de tortura.

"Acho que estou perdida."

Draco também estaria, se a ruiva continuasse a se aproximar - sua vontade era voltar para a cama e fechar os olhos depois de mais um copo de bebida -, pois ali estava ele, já de pé, já conseguindo provar aquele cheiro que o atormentava. Estava há quase um mês de volta naquele castelo, mas aquela era apenas a segunda vez que a tinha tão perto, e justo ali, justo depois da dose já considerável de álcool que tomara, justo na porra do seu quarto.

Por que não conseguia afastar aquela bruxa da merda da sua vida?

Por que ela não conseguia se manter longe?

Por Merlin, era só abrir a boca e falar qualquer coisa que a fizesse sair dali - estava com as amigas naquele meio, não estava? Mesmo se não estivesse, qual o problema da grifinória sair pelas masmorras agora que não havia nenhum maldito psicopata para se preocupar? E iria, tinha decidido que iria, falar qualquer coisa estúpida para tirar a bruxa de perto de si.

Mas como sempre, no último instante, toda a força construída ia embora apenas com um olhar. Nunca. Nunca conseguiria afasta-la. Apaixonado por uma Weasley. Se afundando em problemas de uma guerra que não ansiava participar, por uma sardenta. Bebendo pelo terceiro dia por saudades de uma traidora de sangue. Como queria que seu pai visse no que sua criação puro-sangue havia se transformado, o resultado de uma vida entre comensais adoradores de um maldito morto-vivo. Ali estava ele, de pé em frente a pobretona que usava uma capa grifinória - e Draco sentia falta até mesmo de vê-la com a capa de forro verde, tão grande que chegava a dançar na bruxa.

A capa agora vivia em sua cama. Patético.

Iria voltar a tentar esquece-la nos lençóis quando a cena vista no vestuário ali se repetiu. Os olhos sempre cheios de vida ganharam uma expressão confusa antes de parecerem perder a emoção, e por um maldito momento aquele sentimento que lutava tanto para não nutrir se fez outra vez presente: esperança.

"O que foi?" Ir para perto foi automático, assim como foi uma mão levantar o queixo da ruiva - a pele dela era tão suave, apenas aquele toque já era inebriante. "O que foi, bruxa?"

Mas por mais que aqueles olhos chocolate estivessem colados nos dele, a jovem não estava ali - não, estava longe, o olhar distante como daquela primeira vez - e não poderia abraça-la, e precisava tirar aquela mão do rosto cheio de sardas. Ridículo, amava cada uma daquelas pintas ferrugem. Amava aquela maldita bruxa, e se algum dia pudesse verbalizar tais palavras novamente, talvez nunca mais parasse de dize-las.

Foi repentina a mudança na respiração, a confusão mudando para um crescente desespero.

"Respira." A ordem saiu firme, mas com certeza não fora ouvida pela grifinória.

Sabia qual era aquele memória, sabia muito bem do que ela estava se recordando - mas diferente da fatídica tarde, a bruxa simplesmente não respirava mais.

"Respira, Weasley!"

Aquela tarde na qual ele não estava - e de repente veio o som que tinha prometido fazer de tudo para nunca mais ter que escutar, e com os soluços quebrados veio a respiração desesperada. Merda, ela iria hiperventilar se continuasse a puxar o ar naquela velocidade, e o que mais queria era falar aquela maldita palavra: procure, procure, procure, eu estou aqui, você está bem.

"Olhe ao seu redor Ginevra, está tudo bem!" Foi quando Draco a sacudiu que a confusão voltou, a bruxa claramente não entendendo que diabos estava acontecendo. "Respira."

A viu inspirar e expirar uma, duas, três vezes, e pareceu uma eternidade até a jovem conseguir normalizar o ritmo, as mãos limpando os olhos molhados que voltaram a achar os dele no segundo seguinte. E Draco tinha duas opções para escolher - e não poderia escolher a que acabava com ele a beijando, por mais que quisesse.

"Que merda você está fazendo aqui nas masmorras?" Se obrigou a perguntar com raiva, o copo cheio de bebida largado em cima de seu baú sendo percebido só naquele momento. Além de tudo, a ruiva estava bebendo - ótimo! "Firewhisky, Weasley?" Aquele vidro sim ele queria arremessar contra uma parede. "Sério?"

"Quem é você para me dizer o que posso beber?" Orgulhosa, teimosa e irritantemente explosiva - ao menos aquilo deveria ser o suficiente para tira-la do maldito quarto. E mais uma vez - como nos velhos tempos - Ginevra apontava o dedo para ele. E mais uma vez o sonserino seguia a mesma linha de pensamentos. Ela era bonita? Linda. "Hein Malfoy, quem é você?" Ele queria quebrar aquele dedo? Muito. "E que merda vocês colocaram na minha bebida?" Queria arrancar aquele dedo fino irritante cutucando bem o seu esterno - como sempre. "Querem me dopar e me dar de oferenda para seus amiguinhos comensais?" Era incrível como ela sempre conseguia tira-lo do sério quando queria - até mesmo quando parecia lembrar-se de palavras ditas há tempos atrás.

"Saia do meu quarto." Não fez questão de medir sua força ao segurar aquela mão pequena, muito menos ao puxa-la para fora do dormitório. "Agora. Aqui não é seu lugar, pobretona." A expressão de dor passou despercebida por ele, que também ignorou por completo a jovem massageando o pulso quando este foi enfim solto, batendo a porta ao coloca-la para fora.

Definitivamente precisava de mais firewhisky. Merda.

Cinco minutos depois voltava para a festa, dois copos vazios nas mãos, a grifinória não sendo mais achada na multidão.

—__

Colin observava de longe sua amiga sair correndo pela entrada daquele salão comunal, poucos minutos depois mais um bruxo conhecido saindo do mesmo dormitório.

"Não foi uma boa ideia não interferirmos, Blai." disse o que achava desde o primeiro minuto que vira Ginevra entrar porta adentro do quarto que o namorado dividia com Malfoy. A resposta obtida foi apenas mais um encolher de ombros, seu sonserino dando mais um gole na garrafa de cerveja amanteigada. "Você anda quieto."

Blaise não precisava falar para o grifinório entender o motivo do silêncio, a razão da preocupação do bruxo: bastava observar aquele loiro que virava mais uma bebida enquanto cobria a boca de Parkinson com a sua.

"Ele parece estar se recuperando rápido." Sabia que não havia necessidade do comentário, e sabia o quão mentirosas as palavras foram - não tirava a razão de Zabini em levantar-se e rumar para o quarto, e agradecia por ele não ter batido a porta, a deixando entreaberta como se dando permissão para o moreno segui-lo. "Não foi a intenção. Mas vê-lo com outra pessoa depois de eu ter passado semanas com Ginevra-"

"Ele não está com outra pessoa, Colin!" A garrafa se espatifou contra a parede, fazendo o grifinório fechar os olhos, se amaldiçoando por não ter ficado simplesmente quieto.

Sabia que era a última pessoa que poderia falar qualquer coisa da situação em que ele mesmo pusera todos, mas era difícil, tão difícil ver quem tanto gostava se machucar outra vez. Tudo outra vez. Porque Ginevra se lembrava - e se não, simplesmente não conseguia ficar longe daquela maldita cobra! De todos os quartos, como entrara justamente naquele, justamente no dele? Puta que o pariu!

"Me desculpe." disse, outra vez envergonhado na frente do namorado. "Se quiser que eu saia-"

A resposta veio com o sonserino enfim batendo a porta ao empurrar Colin contra ela, o calando num beijo quase desesperado. Respondeu na mesma intensidade, aliviado por não ter sido aquela a vez em que finalmente acabara com o que ainda restava entre os dois. Lembrava-se sempre da noite do baile, quando colara publicamente pela primeira vez os lábios em outro bruxo - naquele que agora lhe provocava arrepios com a língua em seu pescoço. Brigas com Blaise era o que menos desejava, no entanto entrar em conflito com Zabini era o que mais fazia nos últimos tempos, graças a sua imprudência - estúpida coragem.

Recuperando em algum momento suas memórias, a amiga algum dia o perdoaria?

"Ele parece estar se afundando cada vez mais, Cols." A voz de Zabini só voltou a encher o quarto quando os dois já descansavam na cama, minutos depois. "A única coisa que faz é passar suas tardes ou estudando, ou fazendo algo para Snape." Observava o loiro falar enquanto prendia novamente o cabelo - já tão grande - de volta em seu coque habitual. "Mal come. As olheiras estão maiores a cada dia. O pai, que ainda está em Azkaban, deixa a mãe à beira de um ataque de nervos - o que o deixa a beira de um também. Então vem a ruiva, e acaba com o pouco de sanidade que resta nele."

"Eu sinto muito por ter tentado fazer isso sozinho." Se desculpava novamente - já nem mesmo lembrava de quantas vezes dissera aquelas palavras nas últimas semanas. "Você não precisava assumir a culpa-"

"Precisava sim. Draco ia querer seu pescoço." o sonserino confessou, já voltando a vestir a camisa. "Draco ia querer seu pescoço por tirar a única coisa boa que tinha na vida, por mais que tivesse pedido por isso. O jeito que ele a olha agora é de partir o coração. Meu amigo é praticamente treinado para achar a maldita cabeça de fogo no meio de todos os bruxos e sempre que vejo os olhos cinzas nela, vejo algo morrer mais dentro deles." Um suspiro - ao menos estavam conversando, tentou ser positivo. "E eu sei que o bruxo que está beijando Parkinson no meio da bosta dessa festa está beijando a sua amiga, e apenas a sua amiga. Se Pansy se deixar levar por ele outra vez, vai acabar se afundando." Enfim os olhos azuis encontravam os dele. "Se eu continuar me preocupando com ele todos os segundos, nós vamos acabar afundando." A risada que seguiu foi amarga. "Às vezes acho que Draco sabe que todos perto dele vão acabar afundando. E é por isso que ele está se afastando cada vez mais."

—__

Domingo, 18 de fevereiro.

Estava desde manhã sentado embaixo daquela árvore, sua ressaca combinada com toda a sua ausente paciência o fazendo mandar todas a suas obrigações para o inferno enquanto repousava debaixo das folhas, ao lado do lago que recém descongelava após a temporada de neve. O lugar se transformara em seu ponto favorito de todo o colégio desde o encontro que o fizera querer beija-la pela primeira vez - e desde seu retorno no fim de janeiro, o frequentava diariamente para manter o mínimo de sanidade que lhe restava. Ali lembrava da bruxa antes dos beijos, antes de todo aquele maldito sentimento, era um tipo bom de lembrança - eram lembranças suportáveis.

O diferente era que a bruxa não mais o visitava com seus livros como anteriormente fazia - ainda tentava decidir se o fato era de todo ruim, visto que sua estabilidade diminuía a cada encontro com a ruiva. Mas naquela tarde parecia ser diferente, ele queria sim encontra-la e queria mata-la, por mais que aquilo acabasse com seu bem estar mental. Que merda a ruiva estava fazendo dentro da porra da Floresta Proibida? As gotas fortes molhavam mais seus cabelos quando ele pôs-se de pé, indo em direção ao ponto vermelho que se aproximava de uma das estufas.

A nossa maldita estufa. A que ele não pisava desde dezembro, perdendo algumas aulas por não conseguir passar da porta de ferro - já bastava ter que entrar no vestiário, já bastavam os corredores, já bastava a maldita sala de Severo.

Talvez fosse a ressaca que não o deixava raciocinar direito, talvez Draco simplesmente não quisesse mais pensar. Quando deu por si, corria em direção ao ímã vermelho de problemas, que já saía da estufa 4 com uma mochila nas costas - que merda ela estava fazendo dentro da floresta no meio daquela tempestade?

O grito que a grifinória soltou - abafado por um dos últimos trovões - veio acompanhado por uma cotovelada doída em suas costelas. Impediu no último instante um sorriso de surgir, orgulhoso com a defesa da bruxa, sua mão esquerda mais uma vez segurando-a pelo pulso com mais força do que o necessário enquanto fazia seu melhor para ignorar o cutucão que incomodou algumas das pequenas cicatrizes.

"Que merda você está fazendo no meio dessa chuva, Weasley?" Ao menos daquela vez percebeu a tempo a pressão desnecessária quando a jovem puxou a mão, os olhos irritados o preparando para o grito que seguiria.

"Quem disse que eu te devo alguma explicação, Malfoy?" Ela estava encharcada, os fios vermelhos grudados nas bochechas, na testa, no pescoço. A mochila, que com o susto tinha ido parar no chão, já voltava para as costas da bruxa enquanto ele a via massagear o pulso, e seus olhos cresceram quando acharam no meio das sardas uma marca roxa. "Sim, foi você quem fez isso ontem." A ruiva praticamente cuspiu as palavras, mostrando melhor os dois hematomas no lado interno do antebraço. "Orgulhoso de me marcar, isso te faz sentir mais homem? Quer fazer outro?"

Sua reação causou surpresa nos dois lados, Draco apenas computando o que fazia quando suas mãos já tocavam aquele pulso tão fino com uma nova delicadeza, os dedos deslizando pela pele molhada enquanto tocavam com quase medo os locais arroxeados. Engoliu uma risada amarga, justo ele quem prometera nunca mais machuca-la fora responsável por aquilo mais uma vez e de um jeito tão covarde. Realmente deveria se afastar, ao invés de fica-la esperando em todos os lugares possíveis - pois era isso que acontecia, era aquilo que ele fazia dia após dia naquele maldito colégio.

"Não foi minha intenção." disse, afastando-se com o esforço de sempre enquanto recebia um olhar desconfiado, o barulho da chuva que novamente aumentava quase encobrindo as próximas palavras.

"Está tudo bem." Não estava tudo bem - tudo estava longe de estar bem.

Foi quase engraçado com o próximo trovão fez de seu último pensamento uma mentira, o cheiro de baunilha o intoxicando quando braços envolveram seu pescoço e aquele emaranhado vermelho se enterrou no seu peito.

Merlin, fazia tanto tempo que as coisas não estavam assim bem.

"Está tudo bem." Como não abraça-la de volta? Nem mesmo tentou se conter, no segundo seguinte puxando o corpo pequeno para mais perto do seu, seu queixo descansando na cabeça ruiva enquanto sentia o coração acelerado de ambos. A bruxa odiava tempestades, então que diabos fazia no meio de uma dentro da floresta proibida? "Está tudo bem, Ginevra." reforçou ao senti-la tremer, tirando sua capa e a envolvendo com a maldita cor que mais gostava de ver na grifinória.

"Você é louco, Malfoy? Vai congelar-"

"Quieta." Teve certeza de que nunca mais congelaria em sua vida quando viu o pequeno sorriso nos lábios da ruiva - poderia nadar no meio da neve que ainda sentiria seu peito quente perto dela. Maldição.

Ele poderia beija-la, tão próximos estavam. Deveria se apossar daqueles lábios, explicando entre beijos o que acontecera naquele maldito mês, o quanto sentia falta daquela maldita pele, e que tudo ficaria bem, pois eventualmente, ainda mais com sua ajuda, ela lembraria de tudo - o sonserino se certificaria de recorda-la todos os malditos dias de sua vida.

E em pensamento, deixou-se fazer tudo aquilo, tentando não se deixar conquistar por aqueles olhos confusos e amedrontados enquanto se afastava. Ginevra surtaria, a chance daquilo acontecer com uma maior explicação era real - como contar que se relacionaram, como dizer que até dezembro, amava o bruxo que mal suportava olhar agora?

Tremia ao voltar para o castelo, o frio aumentando a cada passo longe daquele fogo vivo.

—__

Quinta, 1 de março.

Uma das coisas que andava sentindo falta era ter alguém para conversar.

Não, não que a jovem fosse sozinha: amigos realmente não faltavam ao redor de Ginevra. Ainda assim, algo a incomodava profundamente em relação a Colin ultimamente - e simplesmente não conseguia descobrir o que. Não sabia se era pelos olhares estranhos que eventualmente o via lançar, ou pelos fatos que o bruxo lembrava durante suas conversas - e ela não -, mas algo havia acontecido com a amizade dos dois. Talvez fosse ele finalmente se ressentindo pelo acontecido do primeiro ano. Ou talvez fosse ela o problema, visto que nem mesmo para Hermione conseguira contar o feito daquele último mês. E a ruiva queria muito dividir seu feito mágico de sucesso com alguém, afinal, não era todo bruxo que se rebelava contra o sistema e se tornava um animago ilegal aos quinze anos.

Mas não havia para quem quisesse realmente contar, e escrever em diários definitivamente não era uma opção, então ali estava a grifinória, sentada naquele pedaço de tronco velho frente ao lago já descongelado, falando sobre seu feito para todas as plantas que quisessem ouvir. Nem mesmo se sentia estúpida, visto que sua tolice se dava muito mais pela vestimenta errada do que pelos seus amigos mudos.

Sabia desde aquele domingo que ao menos em algo concordava com sua ex-paixonite: Draco Malfoy era, definitivamente, bizarro - e desde quando mesmo olhava para os olhos verdes e não sentia nada? A ruiva esperava muitas coisas ruins do sonserino - parando para pensar, somente ruins -, então a capa que usava naquela tarde de fim de inverno era uma real surpresa, assim como fora uma surpresa agradável ele retribuir o abraço que dera por impulso, antes de sumir por mais de uma semana de seu campo visual. Se fechasse os olhos, ainda conseguia sentir os braços firmes e o aroma cítrico - e era ridículo, pois nem mesmo gostava daquele maldito cheiro! Nem mesmo queria aquela maldita capa, então o que havia a possuído para sair passeando vestindo justo ela?

Precisava devolvê-la, era isso.

Sacudiu a cabeça, outra vez arregaçando as mangas que insistiam em cobrir suas mãos enquanto voltava a atenção para o pergaminho de Latim: sim, precisava se livrar logo daquela vestimenta, mas era melhor nem ver o bruxo enquanto seu cérebro insistisse em funcionar daquele jeito estranho com ele perto.

Aquilo era alguma poção de amor que a jovem com certeza ingerira sem querer. Ou pior, uma que o rapaz lhe dera de propósito. Por que qual era a explicação para sentir-se daquele jeito perto do sonserino? Ficara nervosa por três malditas vezes ao lado daquela cobra, mas seu nervosismo não era por conta dele ser um dos bruxos mais arrogantes que conhecia. Não, a palpitação que vinha com a proximidade dos dois era quase boa. Draco era gostoso de se olhar.

Amortentia ou algum similar, sem sombra de dúvida.

"Weasley." Sentiu-se ridícula quando a palpitação se fez presente apenas ouvindo aquela voz arrastada, dobrando quando o bruxo teve a audácia de acomodar-se ao seu lado.

"Esse é o meu lugar." disse seca, se forçando a fixar os olhos no pedaço de papel ao invés de deixa-los no par de tempestades que o rapaz carregava.

"Essa é a minha capa." Touché.

"É isso que você veio buscar?" Droga. Morreria de frio até voltar para o castelo - com certeza gostava tanto daquela peça pelo calor que proporcionava, esquentando-se mesmo usando apenas sua camisa por baixo.

Mas então o bruxo a parou, as mãos pálidas a impedindo de se livrar da veste sonserina, o toque delas em seus ombros fazendo sua pele queimar.

"O que você quer então, Malfoy?" perguntou, sentindo um arrepio percorrer sua espinha ao enfim perder sua batalha interna e se perder naqueles olhos cinzas.

O que havia ali no fundo, que tanto lhe prendia a atenção?

"Paz." A resposta a fez sentir uma pontada no peito - paz? "Só me deixe ficar aqui um pouco, Weasley. Por favor." Não eram palavras que ela esperava sair daqueles lábios, com certeza. Por favor? Outra vez foi um esforço tirar os olhos dos dele, os claros parecendo tão cansados, tão mais tempestuosos com as olheiras que pareciam crescer a cada encontro na pele branca.

Paz, por favor. Quase uma súplica.

"Você é realmente um bruxo estranho." Sacudiu a cabeça, voltando sua atenção para o pergaminho em seu colo. Ok, ela conseguiria terminar a lição mesmo com toda a distração sentada ao seu lado.

"Peculiar, eu diria." A bruxa escutou enquanto voltava a molhar a ponta da pena no tinteiro. "Latim?"

"Estou atrasada."

Silêncio. Foi quanto a pena voltou a tocar o tinteiro que o sonserino se mostrou mais uma vez estranhamente solícito.

"Quer ajuda?" É claro que não precisava de ajuda - era ótima em Latim!

"O que você quer em troca?" Mas aquele sorriso-

Por mais que o loiro estivesse pálido, por maiores que fossem suas olheiras, por mais magro que ele aparentava ter se tornado, algo parecia acender naquele rosto com aquele repuxar de lábios, por menor que fosse o gesto. E assustadoramente, algo dentro de Ginevra definitivamente acendia também, e queria ver mais vezes aquele sorriso.

Porque era a primeira coisa realmente confortável que via há semanas, por mais que viesse de uma das piores cobras daquela casa.

"Divida esse lugar comigo."

Disse sim antes de pensar. O sonserino poderia ter pedido qualquer coisa e a resposta nunca seria outra, teve aquela certeza estranha ao voltar a olhar para as órbitas cinza azuladas - assim como teve certeza que via algo além de toda a arrogância típica daquele garoto. E aquele sentimento lhe enchia o peito com um conforto assustador.

"Então, qual parte você está estudando?"

Nem viu a tarde passar, muito menos se concentrou no que falavam, sua mente focando muito mais na mão fria que roçava vez ou outra na sua do que em qualquer gramática.

Cítrico, no final, era um cheiro agradável.


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Notas finais do capítulo

Gente, curtiram?
Espero que tenham boas opiniões desse último capítulo!

Beijos,

Nia



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