Além de uma vida escrita por Ania Lupin


Capítulo 35
Na sua ausência




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Ponto de vista de Isabella

Aquela havia sido a primeira vez que me afastara dele - e não havia sido por temer pela minha vida, mas pela que crescia dentro de mim, pela nossa vidinha. Pela vida que eu anunciei depois de muito hesitar, depois de muita coragem reunida.

Edward me olhava em choque, e minhas mãos apenas abraçaram mais aquela pequena barriga, e era tão triste o silêncio, tão triste aqueles olhos tão assustados, tão desesperados. Ter a certeza, naquela tarde, naquele banheiro minúsculo de shopping, havia tornado a minha felicidade completa. Eu estava casada com o único amor da minha vida, eu ficaria com ele para sempre, e agora tinha descoberto que sim, que era possível! Que não seríamos apenas eu e ele, mas nós três, e a minha felicidade não cabia em mim. Mas aquela alegria claramente não era mútua.

"Edward, fale alguma coisa." Ele voltou a sentar no colchão - agora também destruído - quando inconscientemente dei um passo para trás com sua aproximação. "Desculpe." suspirei, ainda não conseguindo tirar as mãos da frente do ventre.

"Bella, faz pouco mais de três semanas que nós começamos a-." Sabia o que ele estava pensando: como? Como você tem uma barriga em três semanas? "Eu sei que é uma vontade, Isabella, mas-" Mas não era real, não era verdade, não tinha como.

Tirei o moletom que vestia, me deixando ser vista apenas com a pequena camiseta, que deixava aparecer uma pequena barriga redonda e já parecia apertada na parte de cima - meu corpo parecia ainda mais grávido do que naquela tarde. Mas foram os três testes que joguei na cama - que gritavam todos positivo - que deram a confirmação final.

"Como?" Meu olhar era tão sem respostas quanto o dele. "Quando você descobriu?"

"Apareceu hoje de tarde." E vi o que esperava ver nos olhos amarelos: Edward se sentia traído. Traído por não ser o primeiro a saber, traído por eu preferir sair com sua irmã e passar a tarde no shopping confirmando aquele pequeno milagre enquanto ele permanecia em casa, preocupado. "Eu sei que é impossível, eu sei." Finalmente tomei coragem para me aproximar, uma de minhas mãos indo para seu braço direito, tentando conforta-lo de alguma forma - tentando me confortar de alguma forma. Ele não queria aquilo, não estava nos planos dividir a vida com mais alguém? Ou ele achava que- "É como se eu estivesse com uns quatro meses, eu sei, mas você sabe que só teve você." Havia uma ponta de desespero em minha voz, ele sabia, não sabia? "Edward, só teve você."

"Eu não sabia." Tensionei no mesmo segundo, tanto pela resposta quanto pela mão gelada que tocou minha barriga. "Eu não sabia que era possível."

"Você não está feliz?" perguntei ao ver os olhos com aquela mesma expressão vazia. "É um bebê, Edward. É o nosso bebê. É o motivo dos meus enjoos, e tonturas, e eu ganhei peso, por Deus! Eu pareço saudável outra vez, por causa do nosso bebê! Por que você não está feliz?"

"Isabella," Edward respirou fundo antes de continuar, mas eu reconhecia aquele sorriso que não chegava até seus olhos - o sorriso que ele usou até o dia que decidi me transformar. "Eu estou feliz."

"Nós prometemos parar de mentir." rebati, me afastando aborrecida de sua mão gelada. "É uma vida que nós criamos juntos, é meu e seu, é o que eu sempre quis te dar em todos esses anos, uma família, uma família nossa-"

"Vamos supor que sim, isso seja um bebê." Enfim ele demonstrava sua irritação, tão errada para aquele momento perfeito. "Um bebê meu e seu, o que eu sempre quis também poder te dar - uma família de verdade." O vi engolir antes de continuar. "Não é humano, Bella." Então era aquele o problema? "Você é humana, e você está doente."

"Edward-"

"Eu não quero que você morra!" Suas mãos estavam apoiadas nos meus ombros, seus olhos cheios de desespero. Eu não iria morrer! Como que um bebê, como que o nosso bebê, poderia me causar qualquer mal? Por que ele não conseguia ver aquilo?

"Eu estou bem, Edward! Olha pra mim! Eu estou mais saudável do que semana passada, eu estou melhor do que no dia de nosso casamento!" Por que ele me olhava daquele jeito? Por que ele nos olhava daquele jeito, por que seus olhos não conseguiam demonstrar amor, felicidade, qualquer coisa boa com aquela notícia?

Mas uma pontadinha fez minha atenção ir por completo para minha barriga, minhas mãos automaticamente voltando para meu ventre. Aquilo, aquela sensação fazia ser verdade, fazia tudo aquilo ser ainda mais verdade. Aquele sentimento era mágico, fazia meu coração disparar de felicidade, e minha mão acariciava as camadas que nos separavam com todo o amor que tinha - eu estou aqui, estou aqui meu pequeno.

"O que foi?" A pergunta veio quando tentei levar a mão gelada de volta para nosso filho - nosso filho, que estava ali, se fazendo presente.

"Eu senti mexer, está mexendo!" Mas quando Edward ouviu aquelas palavras, sua mão paralisou no ar. Ele não queria chegar perto, ele não queria tocar aquilo. E pela sua expressão, o vampiro estava bravo - comigo, com ele, com o destino que não andava lhe dando trégua. "Por Deus, você sabe que é nossa criança!"

"E você sabe que sendo nossa criança," Me matava por dentro o tom que Edward estava usando ao falar de nosso bebê. "O seu corpo não é compatível. Tanto por estar doente quanto por ser humana!"

"Mas eu estou bem!"

"Você está bem agora! Enquanto isso pode se mexer sem te destruir por dentro!" Fechei os olhos, duas lágrimas finalmente caindo. Isso. Senti ele me puxar e deixei, sabendo que qualquer resistência seria inútil e poderia piorar ainda mais aquela situação. "Olhe aqui." Edward disse, levantando minha camiseta na frente do espelho do quarto. "Olhe bem aqui."

Passei a mão, tentando limpar aquela sujeira - demorou três tentativas até eu perceber que aquela parte preta - roxa? - na parte direita mais alta da barriga crescida não era algo sujo, mas uma mancha na pele. Meus olhos absorveram um pouco da expressão de meu marido ao perceber enfim o que era aquilo: um hematoma. Mas não era desespero pelo que poderia ser feito ao meu corpo, não, eu poderia estar coberta de hematomas no final!

Desde que fosse forte o suficiente para chegar até o final.

Edward tirou de dentro de meu armário uma mala e começou a jogar tudo que cabia de meu guarda-roupas dentro da mesma, me fuzilando com o olhar quando coloquei por cima de tudo as sacolas que havia deixado no sofá. Em minutos estávamos em sua casa, e fiquei aliviada ao não ver nenhum outro vampiro além de Carlisle na entrada. Realmente não queria enfrentar a reação de minha irmã, ou sentir o desespero de meu marido refletido em Jasper, ou receber o olhar de pena de Esme, quanto menos escutar Rosalie brigando com Edward - e metendo Emmet no meio da briga, de algum jeito.

Dei um sorriso tímido para o médico quando este me falava para sentar na cama que havia naquele quarto que nunca entrara. Poderia ser facilmente o quarto de um dos melhores hospitais, com todos os aparatos que havia em um, e até mais. Precauções que o médico vampiro tomara ao nos descobrir vivas, humanas, que todos esperavam nunca precisarem utilizar.

Por mais que a notícia já tivesse sido dada, a surpresa de Carlisle ao ver minha barriga - e então ao toca-la - era clara, e quase engraçada para mim. Todos reagiriam daquela forma? Ao menos ele teve a delicadeza de me dar o menor dos sorrisos, que permaneceu em seus lábios enquanto me examinava, tão diferente de meu marido, que parecia estar no meu enterro.

Haviam sido feitos exames de sangue, de urina, uma tentativa de ultra-som, uma tentativa de coleta de material embrionário - após eu ser convencida que seria benéfico ao bebê ter algumas informações que só uma coleta poderia proporcionar - e meu sogro finalmente admitiu o óbvio - que foi reforçado por mais um movimento em minha barriga.

"Você está grávida, Bella." ele disse, colocando a mão gelada em cima de um pequeno hematoma que agora aparecia em meu baixo ventre. Por um momento agradeci pela mão esconder meu novo roxo antes de Edward conseguir vê-lo - porém era apenas eu a silenciosa para ele. "Mas eu não consigo penetrar o saco embrionário com agulhas. Nem vê-lo com um ultrassom. Você está com um princípio de anemia, metade do cansaço que está sentindo é por causa disso. Os exames também indicaram uma desnutrição leve-"

"Mas eu estou me sentindo ótima!" minha voz saiu mais desesperada do que gostaria, metade do desespero por tudo que meu marido ouvia, metade por finalmente entender que o corpo-

"Tem uma costela flutuante trincada. A que fica em cima desse outro hematoma." Que meu corpo era, muito possivelmente, incompatível com o feto. Com meu filho. Que no final a escolha poderia ser entre ele ou eu - e já tinha a minha resposta para aquilo.

"Eu estou me sentindo bem, Carlisle." afirmei, mais para mim mesma do que para os dois vampiros no quarto.

"Eu sei, querida." ele já abaixava minha camiseta, colocando de volta contra minha barriga uma bolsa de gelo - meu corpo era quente demais, o feto poderia estar se mexendo tanto nos últimos minutos por estar incomodado com a alta temperatura. "E nós vamos tentar manter você assim, ok?"

Aceitei a coberta que era posta em cima de mim, esperando finalmente ter alguma reação de meu esposo quando Carlisle deixou o quarto. Claro que me decepcionei ao ver o filho seguindo o pai, saindo do cômodo sem nem mesmo um último olhar. Descansei as mãos sobre minha barriga, desta vez não recebendo nenhuma pontada em troca.

"Ok."

É bebê, acho que seremos só nós dois por um tempinho.

Ponto de vista de Edward

"Como não me preocupar?"

Bella está viva, filho.

"Ainda." Desabei na cadeira do escritório, frente a meu pai. "Ainda. Eu quero a verdade, Carlisle." Passei minhas mãos pelo cabelo, apreensivo.

"Quanto tempo você acha que pode ter o feto?" Feto. Meu filho. Aquilo que se mexia dentro de Isabella, aquilo que a deixava tão mais perto do fim.

Por um momento sorri, me lembrando da noite que dividimos semanas atrás. Será que fora aquela noite a responsável?

Hoje faziam exatas duas semanas.

"No máximo catorze dias."

"Mínimo?" Quando havia mesmo destruído o sofá?

"Três dias." respondi, um pouco desconfortável em falar sobre aquilo. "Três dias e meio."

"Minha aposta é nos quatorze dias. Seria uma gravidez de pouco mais de um mês, então Isabella teria que aguentar de duas a no máximo três semanas a mais."

Fechei os olhos, me afundando mais na cadeira. Duas semanas, pelo menos. Mais catorze dias, pelo menos.

"A desnutrição, visto tudo que ela anda comendo, é preocupante. Não era para ela apresentar esse quadro." Carlisle confessou, pela primeira vez aparentando preocupação. "O feto com o tamanho aproximado de um humano de quatro meses trincou uma costela. Eu não sei o que pode acontecer até o final da gestação."

Queria entrar no quarto onde estava minha esposa e arrancar aquilo de dentro dela com os dentes - e me sentia um monstro todas as vezes que pensava na possibilidade. Poderíamos seda-la e fazer a operação, tirar de dentro dela o que com certeza a mataria, transforma-la, acabar com tudo aquilo. Tinha certeza de que Alice concordaria com a ideia, o que faria Jasper concordar, e conseguiria o voto de meu pai sem dúvida. Quatro contra três.

Você ama seu filho, Edward?

Novamente meu sorriso saiu amargo. O que era aquilo dentro dela? Era mesmo uma criança, um bebê? Ou após morrer, veríamos um monstro sair?

Era horrível admitir o que sentia.

"Não." respondi, derrotado.

Era horrível não conseguir amar aquela parte de mim.

Ponto de vista de Isabella

Aquela cozinha nunca foi mais usada do que nos últimos dias, com certeza. Da sala, conseguia ver Esme preparar um provável smoothie, que serviria para complementar o almoço que eu mal estava conseguindo engolir. Levei mais um pedaço de torta de frango até a boca antes de sentir mais um provável chute, minha cara mudando para uma de dor no mesmo segundo.

"Pequenino, você precisa ficar parado para não machucar a sua mãe." Rosalie falava, voltando a colocar uma bolsa gelada em minha barriga enquanto me dava o garfo que havia ido ao chão.

"Eu não estou com fome, Rose." Recebi um olhar não muito amigável de minha nova amiga. "Eu não vou comer pra vomitar tudo outra vez."

"Você está perdendo peso rápido. Fazem só quatro dias que você está aqui e-"

"Não, Rose." praticamente implorei, a cortando. "Por favor, já basta ele."

Edward estava distante desde a descoberta. Definitivamente não era o comportamento que eu esperava, e talvez nem que ele estivesse esperando, mas eu tentava entender o desespero do vampiro ao me olhar no espelho - eu não me olhava mais desde ontem. Sexta feira os vômitos voltaram, e nada mais parava no meu estômago. Sábado, apesar de todo o frio passado, os movimentos de meu pequenino eram mais frequentes, e muito mais dolorosos - e minha barriga, maior e muito mais machucada. Hoje eu já pesava cinco quilos a menos do que quando cheguei - e meu marido finalmente desistira de ficar em casa.

"Acho que estou destruindo meu casamento." E minha vida. E a vida dessa criança, que pode estar fadada a crescer sem pais.

"O primeiro ano é o mais difícil, é o que dizem." Rose tentou me consolar, desistindo de me oferecer a comida. "Edward vai entender, Bella. Ele vai entender e vai amar essa criança." Suspirei, o cansaço me vencendo outra vez. "Todos nós vamos amar essa criança."

Eu não conseguia ficar muito tempo de pé na terça. Menos outros três quilos, menos energia, com muita fome - e com muito enjoo -, e com muito frio. Aposentei as bolsas de gelo, já tendo me acostumado com os chutes e vendo que elas não adiantavam muito desde o último dia - e eu estava precisando tanto de calor.

"Filho meu, meu bebê," Mas apesar de tudo, eu acariciava aquela barriga com todo o amor que tinha. "Filho do coração," Acariciava e cantava com todo o amor do mundo. Iria dar todo o amor que podia agora. "Fique assim, perto de mim, pra que eu lhe cante esta canção." Porque eu sabia que, se tudo continuasse assim, era só o agora que eu teria com minha filha.

"Al?" Parei de cantar quando notei minha irmã no quarto, seus olhos iguais aos do vampiro que eu quase nunca mais via. Mas eu não me senti triste com o olhar, pelo contrário, tudo estava tão calmo. "Obrigada, Jasper."

"Emmet esta com Edward." ele respondeu antes que eu pudesse perguntar o motivo da ausência daquele dia. "Ainda estou supervisionando essa aqui." continuou explicando. "Só por precaução." Sim, precaução. Eu era um sangramento ambulante, mais uma vez.

"É a música que mamãe cantava." Alice reconheceu, colocando uma bandeja ao meu lado e sentando-se um pouco mais distante na cama. "Trouxe café e torta de maçã, o que acha?" Senti meu estômago roncar ao sentir de perto aqueles aromas.

"Acho que o cheiro vale o esforço." respondi, já experimentando um pedaço do doce recém feito por Esme - ainda estava quente, estava ótimo! "Como está Edward?"

"Caçando." minha irmã respondeu com descaso. "Você não acha-"

"Eu não o vi o dia inteiro ontem." Tomei um gole de café, já sentindo o enjoo voltar. Falar de Edward e falar com Edward andava sendo difícil naqueles dias, não para mim mas para todos.

"Ele estava ao seu lado a noite inteira." Foi Jasper quem confessou, e a informação conseguiu me surpreender. "Ele fica ao seu lado todas as noites, Bella."

Mais um pedaço de torta. Eu iria conseguir fazer aquilo ficar dentro de mim naquela manhã - eu precisava fazer aquilo ficar no meu estômago.

"Ela gosta da voz de Edward," contei, tentando me distrair da vontade de vomitar aqueles dois pedaços. "Quando o pai fala, ela se acalma." Descansei uma das mãos na barriga novamente.

"Ela?"

"Acho que é uma menina." respondi Alice, que por um segundo me olhou contente - agradeci mentalmente meu cunhado, mais uma vez.

"Posso?" ela aproximou a mão, e eu a coloquei embaixo da minha, um arrepio com o primeiro frio da manhã.

"Essa é sua tia Alice." E eu não era a única a não gostar daquela temperatura no momento, percebi quando senti também o primeiro movimento daquela manhã. "Outch!" Aquele havia doído, com certeza o mais forte de todos aqueles dias. Alice retirou a mão no mesmo segundo, se levantando preocupada - talvez mais preocupada do que deveria. "Está tudo bem, está tudo bem Al!" reassegurei, tanto minha irmã quanto a mim. Estava tudo bem? Algo dentro de mim parecia ter se partido, mas eu precisava que estivesse tudo ok. "Acho que estamos um pouco temperamentais hoje." Minha voz não conseguiu esconder a dor.

"Eu vou chamar Carlisle."

Não vi mais Alice naquele dia.

"Vai ficar tudo bem, meu amor." falei, finalmente sentindo os movimentos pararem. O que você tanto quer, pequena? Por que está tão agitada? "Se você vai dormir, ao seu lado estarei." Desisti do café e da torta, voltando a me deitar. "Meu bebê pode sonhar, que toda noite eu velarei."

Abri a água um pouco mais fria do que o habitual - o meu corpo era realmente quente demais para ela. Apesar de não ser tão agradável um banho morno naquela estação, aquela temperatura de água caindo sobre meu corpo conseguia a deixar calma. Deixei a água mais fria que meu corpo cair sobre minha barriga enquanto me ensaboava, demorando um pouco mais que o habitual no banho. Se passaram seis dias desde minha pequena descoberta, e minha barriga já havia duplicado - e os hematomas, triplicado. E a presença de Edward, rareado, ainda mais.

Um dia, meu marido foi para o hospital com Carlisle. No outro, foi ver a casa que Esme construía para nós em um terreno próximo. Então foi ver um berço - com aquela desculpa, eu quase gargalhei na cara dele. Eu o via algumas noite - quando imaginava que, com a pouca luz, era mais suportável ver o que um dia foi a mulher forte que ele tanto amou - nos poucos minutos que ele me dava antes de eu pegar no sono. Naquele dia, Edward estava caçando com Emmet - e não voltaria até a próxima manhã.

Então, quando murmurei as próximas palavras, esperava Rosalie entrar no banheiro nos próximos segundos.

"Droga, a toalha." E não meu esposo ausente.

Me virei para a entrada do box transparente e tomei um susto ao ver Edward parado na frente do chuveiro com algo branco na mão. A toalha. Até a água quase fria que ainda caía em cima do meu corpo começou a ficar quente demais, e eu sentia meu rosto pegando fogo.

Então eu ganhei aquela expressão de sempre - tão mais visível com a luz acesa - e o que eu mais queria era ter a toalha nas mãos.

"Meu Deus, você está tão magra." Daquela vez ele verbalizou o desespero. Queria me esconder, esconder aquela barriga cheia de hematomas que ele tanto detestava, esconder os ossos do quadril, aparentes demais, minhas coxas, que um dia foram grossas. Escolhi me virar - a pior decisão. "Meu Deus, Isabella." Isabella, ele quase nunca me chamava de Isabella. Sua voz era carregada de uma surpresa desagradável - minhas costas sempre ficavam cobertas, e agora ele também sabia o quanto minhas vértebras estavam visíveis.

"Por que você me olha assim?" Porque você está morrendo. Porque ele acha que é o responsável por estar te matando. Porque ele te deu o responsável por estar acabando com sua vida. "Edward, são só mais algumas semanas." Reuni forças para me virar e encarar seus olhos, minha mão esquelética abrindo a porta do box. "Você antes me achava tentadora demais para meu próprio bem." disse, tentando amenizar o clima pesado, falhando nitidamente. Quem acharia um esqueleto tentador? Um cachorro?

Um lobo, talvez. Peguei a toalha, um pequeno sorriso surgindo com aquela piada - Jacob de antigamente, talvez. E no instante seguinte ao sorriso, o vampiro virou-se para ir embora.

Não sei como consegui a tempo - eu andava tão fraca que me movimentava muito mais devagar que meu normal -, mas segurei na mão fria antes que o vampiro pudesse se distanciar.

"Bella, por favor." Mas ele não se virou, e lá no fundo aquilo me feriu. Só piorou quando a mão gelada afrouxou meu aperto quente de seu pulso. "Estarei no quarto."

A rejeição doía. Desisti de tentar fazê-lo ficar, minhas mãos se ocupando em me envolver com a toalha - seremos apenas nós duas mais uma noite, pequenina, tudo bem? Afinal, Edward nunca permanecia no quarto por muito tempo. Já sentia as lágrimas nos olhos, prontas para cair, já sentia meu rosto se contorcer em uma expressão de choro, e já me encostava na parede - onde escorregaria até o chão e ficaria até Rose aparecer. Então senti dois braços impedirem minha última ação, e uma mão carinhosa secava as lágrimas que caíam.

Ainda existia algum amor naquele olhar, e senti meu coração acelerar ao perceber o sentimento. Meu Deus, eu queria tanto beija-lo! Eu queria tanto que ele quisesse aquilo, que me quisesse novamente, que conseguisse me olhar novamente sem toda aquela dor.

"Edward, isso tudo vai passar." sussurrei, abraçando aquele corpo tão frio quanto o meu no momento. "Isso tudo vai passar, e nós vamos ser felizes novamente. Eu vou viver." afirmei, por mais que já achasse que, mesmo com todos os meus esforços, aquela parte era uma mentira.

Mas quando tentei aproximar meus lábios dos dele, Edward virou o rosto.

Sim, a rejeição doía.

"Olha o que eu fiz com você, Isabella." Vi os olhos dourados estreitarem, quase duas fendas. "Olha o que eu fiz." Você me deu uma possibilidade de família. Você me deu uma coisa que eu amo tanto quanto amo você. Você me fez a mulher mais feliz desse mundo. Isso que você fez. "Mesmo tento uma alma, eu sou um monstro. Eu estraguei tudo. Eu não quero viver sem você, não outra vez." Se pudesse, ele estaria chorando, e meu coração quebrava ainda mais - tinha mais alguma coisa para quebrar no meu peito?

Foi uma surpresa quando no segundo seguinte, os lábios estavam nos meus, as mãos geladas tocando todo meu corpo com uma nova delicadeza - como se eu fosse quebrar. O toque era carregado tanto de necessidade quanto de medo, tão diferente de nossa última vez, tão semelhante as que seguiram após a primeira. Ofeguei quando as mão que antes me seguravam vagaram para baixo. Pelas minhas costas, minha cintura, meu quadril. E quando as mãos voltaram para meus ombros, para meu rosto, eu não segurei mais a toalha.

Foi um movimento tão rápido que quase me deixou tonta - num segundo estávamos fora do box, no outro, ele estava dentro do chuveiro me beijando, ensopando sua roupa debaixo da água morna, seu corpo frio tentando acalmar o meu que parecia pegar fogo.

"Desculpe," Sentia o mais leve dos beijos no meu pescoço. Reuni toda minha coragem - e força - e deixei minhas mãos vagarem, como antes as dele haviam feito. Deus, ele ficava tão desejável molhado daquele jeito. "Desculpe por sempre te machucar. Eu-"

"Senti sua falta." Repeti as palavras que ele me disse semanas atrás.

"Eu amo você." ele murmurou enquanto sua boca achava mais uma vez meu pescoço, e me fazia derreter em seus braços. Segundos depois Edward me segurava no colo, de frente para ele, contra a parede do banheiro, não dando a mínima para a bagunça que fazia com toda aquela água. Seu toque era tão frio, mas eu me sentia queimar contra aquelas mãos. Eu retribuir o beijo com tanto desejo quanto ele era tudo que Edward precisava para continuar. Mais alguns segundos, e ele estava na mesma situação que a minha, as peças de roupa molhadas deixando o piso ainda mais escorregadio, mas o corpo frio contra o meu não fez diminuir meu calor.

Naquela noite, peguei no sono na cama ainda molhada, minha barriga descansando pela primeira vez contra o corpo do meu vampiro.

Ponto de vista de Edward

Passar o dia caçando não havia feito milagre algum com meus sentimentos - pelo contrário, parecia que a cada gota de sangue algo queimava mais dentro de mim. Ela estava morrendo, Isabella estava morrendo, meu filho - nossa filha, como já vi que ela insistia em dizer - estava a matando, matando sua mãe aos poucos, quebrando-a de dentro para fora. E eu era um monstro, eu havia feito aquilo, eu havia cedido ao nosso desejo e feito aquilo - e ao mesmo tempo que queria amar o que estava crescendo dentro dela, sentia repulsa ao ter qualquer bom sentimento por aquela parte de mim.

Eu iria mata-la, novamente. E tive certeza de sua morte ao vê-la nua no box, tão frágil, tão magra, sua barriga já enorme tão cheia de hematomas. Como se não bastasse, a marca de uma mão em cada uma de suas coxas, apesar de já estarem sumindo, ainda eram visíveis aos meus olhos. Minhas mãos, marca feita por mim no momento que poderia ter mudado aquele destino, no momento-.

Respirei fundo, colocando mais alguns fios de cabelo de Isabella atrás de sua orelha - ela sorria ao meu toque, mesmo dormindo. Ela teria perdido nosso filho caso não tivesse me controlado? A transformação iria faze-la perder a criança, ou a transformaria em uma eterna grávida? Ela teria me odiado para sempre em ambos casos.

Era difícil sentir algo se não nojo quando ela me tocava - nojo de mim. O que tornava tudo muito mais fácil, muito menos urgente, muito mais delicado, compatível com o estado frágil como cristal que o amor da minha existência se encontrava. Minha garganta agora sempre queimava quando eu a tocava, um lembrete constante do quão cuidadoso e focado precisava ser. E mesmo morrendo, mesmo naquele estado quase cadavérico que estava, Isabella ainda sorria. Como conseguia se manter assim com tudo que estava acontecendo? Como conseguia me deixar toca-la, eu praticamente a abandonando naqueles últimos dias?

Naquela noite enquanto deitava ao seu lado, deixei a barriga - já tão enorme - entre nós, encostada em mim. O frio a acalmava um pouco, não? Uma menina. Uma menina que eu teria que amar sozinho - que eu precisaria me forçar a amar sozinho. E se fosse um monstro o resultado daquilo? E se ao invés de sair uma criança com as feições de Isabella, saísse-

Foi um movimento quase imperceptível, mas o sorriso se transformou em uma carranca no mesmo segundo. E pela primeira vez, coloquei minha mão na barriga de minha esposa, e o que havia ali se acalmou antes de fazer uma nova mancha arroxeada. Pela primeira vez também havia silêncio o suficiente ao nosso redor para eu poder escutar aquele som. Era por isso que Bella se sacrificava tanto, por isso que ela achava que aquilo valia tanto a pena?

O som dos dois corações batendo juntos foi a coisa mais linda que ouvi. Fechando os olhos, era como se nada que via fosse verdade, como se a situação fosse a de uma gravidez normal, sem dor alguma, sem problema algum. Fechando os olhos, eu pude sentir amor pela primeira vez por aquele segundo coração que batia. Como eu poderia ir embora, caso aquilo realmente fosse uma alma inocente? Como poderia seguir o destino de Isabella, e deixar aquela criança sem ninguém? Ela não tinha culpa das decisões da mãe, ela não tinha culpa de minhas decisões erradas.

"Eu não sei se você consegue me escutar." comecei, ainda de olhos fechados. "Mas eu preciso que você fique mais quietinha, ok? A sua mãe é frágil, e você pode machuca-la muito. Então vamos tentar não machuca-la ainda mais, por favor." Bella sorria novamente, uma de suas mãos parando em cima das minhas.

Por um segundo, minha garganta voltou a queimar - muito pior do que das outras vezes - e eu comecei a examina-la com cuidado, em busca de alguma ruptura, algum novo ferimento, onde estava todo aquele sangue que me dava aquela angústia gigante, aquela fome? Tinha de haver sangue em algum lugar! Mas então minhas mãos pararam de toca-la, e a sensação sumiu por completo. Experimentei encostar novamente minha palma em sua barriga, e a sensação se fez presente tão forte quanto antes, minha mão recuando como se queimasse.

E queimava. Queimava de um jeito infernal. Era como se eu não em alimentasse há meses.

Foi quando eu fiz a conexão: aquele bebê tinha tanto características de Isabella quanto meu. E ele estava morrendo de sede.


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Notas finais do capítulo

Esse foi oficialmente o capítulo que mais amei escrever - fluiu muito, até ficou maiorzinho!

Beijão a todos que estão lendo e sintam-se a vonts pra deixar seu comentário ;)



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