Além de uma vida escrita por Ania Lupin


Capítulo 23
Forks


Notas iniciais do capítulo

Mais um! O que estão achando?
;*



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Ponto de vista de Bella

"Alice, esse é um daqueles nossos favores sem perguntas." falava para minha irmã ao telefone, enquanto observava pela janela do ônibus a paisagem.

"Izzy-"

"Você me deve, Al." cobrei, vendo os pinheiros diminuírem e um lago começar ao lado direito da estrada. "Sem perguntas."

"O que eu falo para Edward?"

"Que eu estou com nossos avós. Que vovô quebrou a perna, que preciso ajudar e você não pode porque trabalha, invente algo e me conte depois, ok?" Já conseguia ver a reserva florestal dali.

"Isabella, ele não vai acreditar em nada disso." ouvi um suspiro do outro lado da linha. "Me diga que você vai ficar bem."

"Eu vou ficar bem." prometia, olhando para o mapa e informações espalhadas ao meu redor.

A casa era pequena, de dois quartos. Meu pai comprara com minha mãe logo que se casaram. Esse foi o único período do casamento deles.

A casa de dois andares de meus pensamentos estava materializada em uma foto. Rua 775 K - como chegar.

"Lembra-se de Billy Black, de La Push? Não? Ele costumava ir pescar conosco no verão."

Reserva Florestal e Praia La Push - trilhas, mapas e mais.

"Isso é bem legal - deles cuidarem de todas essas crianças assim, sendo tão jovens."

"Acho que sim." Jessica admitiu relutantemente. "Mas acho que a Sra. Cullen não pode ter filhos."

"Você não é Isabella Swan?" Olhei para ver um garoto bonitinho, com cara de bebê, o cabelo loiro claro cuidadosamente moldado com gel, sorrindo para mim de um jeito amigável.

"Bella."

"Sou Mike. Precisa de ajuda pra encontrar sua próxima aula?"

Jessica e Mike Newton - Rua 722 C.

"Eu estou com ela! Não, eu não acho que ela esteja machucada" ele disse pra alguém. "Ela fica repetindo 'Ele foi embora'."

"Bella, querida, você está bem?"

Cemitério Municipal - Rua 700-9.

O tempo naquele dia não estava molhado, pelo contrário, o sol brilhava intensamente do lado de fora. Tudo naquele caminho era tão familiarmente maravilhoso: as árvores, os troncos cobertos de musgo, os galhos pendurados formando uma cobertura, o chão coberto com plantas. Até mesmo o ar era familiar.

E era muito verde. Como se fosse um planeta alienígena.

"Eu vou ficar bem, Al." reafirmei, finalizando a chamada de vídeo.

O lago que corria ao meu lado junto à estrada era cristalino, tão diferente de meus pensamentos. Eu já estive nesse lago, eu já mergulhei nesse lago. Eu tinha total certeza daquilo.

Estar ali era completamente amedrontador.

—__

Ponto de vista de Alice

Não fazia sentido. O resultado do exame não fazia nenhum sentido.

Negativo.

Como? Como poderia ser negativo se desde sábado eu mal conseguia diferenciar o que era real do que acontecia só na minha cabeça? Se meu cérebro insistia em me colocar em falsas memórias com as pessoas ao meu redor - com Jasper, como se houvéssemos vivido um amor antigo, uma história que parecia tão verdadeira e tão sem o menor sentido.

Fazia parte de sua família, eu mesma era uma Cullen. Esme era minha mãe. E por Deus, nós nos alimentávamos de sangue! Alice, esse tumor está te dando uma imaginação doentia. Está te dando uma sensação de déjà vu ridícula, e uma imaginação além do limite do saudável.

Eram onze da manhã de segunda feira e eu me daria aquele dia de folga. Fizera todos os exames possíveis e imagináveis e acabara de largar o Ipad no edredom após ver negativo por negativo. Eu estava cem por cento saudável - mais do que poderia imaginar.

O barulho vindo de meu celular me avisou que meu vampiro me mandava mais uma mensagem, talvez a terceira no dia, todas ainda não visualizadas. Não queria sair da cama, nem mesmo para vê-lo, e sabia que seria necessário me mover se abrisse o aplicativo e as lesse. Não, eu estava bem demais no meu colchão.

Enquanto Bella estava aparentemente bem sabe-se lá onde.

Um favor sem perguntas, como havia mesmo começado aquilo entre nós? Ah, comigo, claro. Me lembro como se fosse ontem, eu escondida no banheiro daquele bar, no provavelmente pior encontro da minha vida, ligando para minha irmã e rezando para ela atender o telefone.

"Eu preciso que você ligue pra mim em dez minutos e finja ser minha namorada."

"O que?"

"Izzy, sem perguntas, só faz isso!"

Desde então, favores seguidos de 'faça sem fazer perguntas porque você me deve' eram normais, e quase sempre engraçados no final. Mas acordar domingo com um bilhete de Isabella não havia sido nada engraçado, quanto mais descobrir que ela estava há quilômetros de distância enquanto eu lia o pedaço de papel.

Estou indo viajar. Me acoberta Al, preciso muito ir. Confie em mim. Sem perguntas, quando voltar te conto tudo.

Eu queria mata-la! Eu queria mata-la por sair desse jeito, por conseguir ir para longe e não precisar ficar fingindo que estava tudo bem! Por não ter que ficar se dopando com medicamentos para não alucinar por causa de um tumor que aquele maldito médico não conseguia enxergar! Que inferno, Isabella!

Ouvi chegar mais uma mensagem de Jasper.

Suspirei, enfim saindo de debaixo das cobertas. Vesti um roupão e destravei o celular.

Bom dia senhorita Thompson, te espero na minha aula ;) Havia sido a primeira. Sei que história não é sua matéria favorita, mas Alice Thompson, você já está nos 25% de faltas. Segunda. Al, está tudo bem? Terceira. Acho que estou começando a ficar preocupado. Quarta. Al, sério, me ligue assim que ver essas mensagens. Não era nem meio dia, e cinco mensagens. Era tudo que eu queria há um mês atrás, era o que mais me irritava no atual momento.

Eu não queria ligar.

Um conversível amarelo, parado na frente de casa.

Mas que droga, quantos comprimidos vou ter que tomar?

"Jazz, sou eu." Falei, fazendo meu melhor para minha voz soar normal enquanto começava a passar um café.

"Pequena, fiquei preocupado!" Não era como se eu não gostasse mais dele - eu gostava, e gostava muito - mas simplesmente não estava acostumada com aquele nível de preocupação. Nem com alguém tão presente em minha vida que não fosse Isabella. Muito menos com um cunhado hiper-ciumento e aparentemente inseguro - minhas palavras para a descrição de 'preocupado ao extremo e desconfiado de todos' dada por minha irmã, agora pela manhã. "Aconteceu alguma coisa?"

Me acoberta Al.

Que inferno, Isabella.

"Na verdade sim, Jazz." Uma das coisas que eu mais odiava fazer na vida era ter que mentir. "Ontem, bem de tardinha, nossa avó telefonou dizendo que vovô tinha caído," Mas não era por eu ser uma péssima mentirosa. "E que precisaria de ajuda, pelo menos enquanto ele estiver no hospital-"

"Mas ele está bem?" Não era por eu não saber contar um história falsa.

"Não muito, Jazz. Ele quebrou o fêmur, então talvez demore um pouquinho, por causa da idade dele, para ter alta do hospital. Isabella foi para Providence ontem à noite." Era sim pelo peso na consciência. "Pedi para ela ir, por causa do meu trabalho. Fiquei acordada até Izzy chegar essa madrugada, e acabei perdendo a hora. Mais tarde conversamos, tudo bem?" Porque na verdade, eu era a melhor mentirosa que conhecia, e todos sempre acreditavam nos meus contos.

Desliguei o telefone e voltei minha atenção para a água fervendo - não tinha como escapar de uma visita de Jasper naquele começo de semana, mas ao menos aquela manhã seria só para mim. Peguei minha caneca de café e tirei de dentro da terceira gaveta de nossa pequena cozinha meu baralho embrulhado num pano roxo já gasto. Colocando as cartas desembrulhadas na mesa, tomei um gole de café e tirei a primeira do monte. E a próxima. E a próxima. E a próxima.

Às vezes eu errava, como todos erram, claro. Mas quais as chances de eu errar tão feio, ainda mais depois desses últimos dias?

Uma viagem.

Um acidente.

Uma briga.

Merda.

—__

Ponto de vista de Bella

Estava parada em frente àquela lápide havia mais de uma hora. E nada. Nada de lembranças, nada de visões na minha cabeça, nada.

Ainda assim, toda aquela pequena cidade parecia ser tão íntima! Tudo que sabia, tudo que havia 'visto' até o momento era assustadoramente preciso: a casa, a minha casa, agora abandonada, um dia foi igual a que apareceu na minha mente; Mike Newton, quem eu reconheci pelo distintivo e pela semelhança ao jovem dos meus pensamentos - assim como Jessica Newton, agora sua esposa -, me olhou como se houvesse algo de muito familiar atrás de minha lente azul e peruca loira; o estacionamento da escola, assim como a mesma, continuava do jeito que me recordava.

Eu já cozinhei ovos mexidos naquele fogão, agora coberto de pó. Já dormi naquele último andar, já olhei para fora daquela mesma janela. Já conheci aquele policial e sua mulher antes do filho que a morena segurava pela mão, antes de seu casamento. Fizemos educação física juntos, saímos juntos, fomos ao cinema juntos. Já estacionei incontáveis vezes uma antiga caminhonete - minha antiga caminhonete - vermelha naquela mesma vaga.

Eu o vi pela primeira vez sentada naquela mesa. Jessica e Mike estavam comigo quando meus olhos foram para Edward e todos os seus 'irmãos' pela primeira vez - e era tão impossível, tão completamente improvável, porque na minha dita lembrança, havia uma pessoa a mais ali, uma pessoa que nunca poderia estar ali, que sempre esteve comigo, que cresceu comigo!

Como Alice estava ali no meio?

Sacudi a cabeça, meus olhos voltando para a foto que segurava. Havia sido audaciosa ao andar até a porta detrás de minha antiga casa, mas se fosse verdade, enterrado dentro do vaso ao lado esquerdo, estaria minha chave reserva. E com um pouco de jeito, a chave virou, e o cheiro de mofo invadiu minhas narinas quando entrei.

Meu quarto estava do jeito que via nos meus sonhos. Minhas fotos penduradas na parede da escada mostravam quem eu era junto de quem havia cuidado de mim como uma filha - Charlie. Não resisti e peguei uma foto desbotada, abandonada no chão.

E era para ela que olhava, quando cansava de observar o túmulo. Charlie sorria, e eu mesma dava um esboço de um sorriso, segurando um envelope amarelo. Quem poderia ter tirado aquela foto?

Coloquei a peruca de volta na mochila, já estava insuportável ficar embaixo do sol vestindo-a. Tomei um gole de água, soltando o cabelo enquanto pensava no que fazer. Queria respostas, mas por onde começar? O que falar? Com quem falar, quem procurar, quem assustar com a semelhança bizarra que eu tinha com Isabella Swan? Para quem contar que eu sabia quem era - que eu era - ela?

Ainda faltava um lugar para eu ir, antes de pegar o ônibus de volta para Manchester.

—__

Ponto de vista de Edward

Por favor se acalme.

Era impossível me acalmar. Era impossível manter alguma calma desde ontem, com Isabella se comportando de um jeito tão estranho no sábado, e simplesmente desaparecendo durante todo o dia anterior.

"Ela não foi para Providence." Era óbvio que ela não tinha ido para Providence - a passagens de ônibus compradas traçavam um destino para uma cidade muito conhecida por nós. "O avô dela não sofreu um acidente." E eu deveria ter descoberto aquilo no domingo de manhã, ao invés de apenas ter me rendido as minhas neuras segunda pela madrugada. Eu deveria ter ido correndo atrás dela. O que eu estava fazendo ainda em casa? "E essa merda de sol não abaixa nunca!"

Edward, acalme-se.

"Nós precisamos contar, Jasper." disse, tentando mais uma vez entrar naquele assunto com meu irmão.

Eu queria contar tudo, apenas mais a cada momento que percebia ela se recordando de algo. E foram tantas as vezes, tantas as coisas que Bella parecia lembrar. Tantas as oportunidades que poderia ter falado algo, tantas as vezes que poderia ter entrado mais a fundo em nossa dieta especial.

"Nós precisamos contar a elas sobre nós. Elas não vão reagir de um jeito ruim, eu lembro tão bem de Isabella-"

"Eu não lembro de Alice!" Mas Jasper estava tornando aquilo tudo tão difícil. "Eu não lembro, Edward! Eu nunca contei para ela!" Mais uma vez o clima tornara-se tenso, e agradeci por estarmos sozinhos na casa naquele começo de tarde. "Você já parou para pensar que essa é a chance das duas terem uma vida normal? Você já pensou nisso, irmão? O quão egoístas estamos sendo? O que vamos força-las a saber, a lembrar?"

"Já." Já havia pensado em tudo aquilo. Já havia considerado todas as possibilidades. Poderia simplesmente sumir - como já havia feito antes. Poderia contar tudo - como já havia feito antes. E poderia simplesmente concretizar o plano inicial, traçado há tantos anos atrás, e ir para a Itália, para onde eu, e apenas eu, deveria ter ido.

Depois de tanta agonia, de tantos anos sofrendo mais do que imaginava ser possível, era egoísta - eu sabia -, mas a única coisa que queria era que Isabella fosse enfim igual a mim. Queria tanto aquilo, tanto poder aproveitar todo o tempo possível sem me preocupar em quebra-la, com a possibilidade dela mesma se quebrando, que não havia passado pela minha cabeça a ideia seguinte.

"E se elas não quiserem, Edward?" Bella querer ser uma vampira foi o tópico que mais havia gerado intrigas entre nós no passado. Nos meus pensamentos, era impossível ela não querer mais aquela possibilidade - mas a negação poderia ser, sim, real. "Você já pensou que elas podem não querer ser como a gente?"

Não. Eu não tinha pensado.

"Você vai manter a sua Bella humana outra vez? Você vai arriscar? Ficar ao lado dela, vê-la envelhecer, perde-la outra vez? Acha que vai ter a mesma sorte duas vezes?"

"Eu teria a eternidade para procura-la."

Você pode não ter a terceira chance, Edward.

"Eu nunca a transformaria porque eu quero." confessei, olhando novamente para o relógio. O sol ainda brilhava às duas da tarde, mas não teria problema algum se me mantivesse dentro do carro. Carro que estava sem gasolina, era aquilo que ainda me prendia dentro da casa. "E é por isso que eu preciso contar. Para ela ter uma escolha. Eu não vou me afastar, Jasper. Você não vai se afastar. Mas por Deus, Isabella está em Forks agora," respirei fundo, tentando juntar todo o autocontrole que me restava. "Eu preciso contar."

—__

Ponto de vista de Bella

Eram cinco da tarde quando pisei na praia da reserva. Fechei o casaco que usava, esfregando os olhos aliviada por finalmente tirar as lentes de contato.

Talvez fosse coisa de minha cabeça. Talvez eu nem fosse tão parecida com a garota da foto, existia a possibilidade de até nisso minha mente estar me pregando peças, não existia? Ela já estava tão louca. Tão pouco confiável.

Suspirei, andando pela beira do mar. Eu tinha mais o que, meia hora antes de precisar sair dali? O ônibus passaria, segundo o motorista da ida, às seis em ponto, e eu chegaria a tempo na cidade para pegar o primeiro ônibus da volta.

Poderia passar no povoado e comprar alguma lembrança para minha irmã - eu tenho certeza de que ela não me daria paz por algum tempo, após essa viagem repentina. O toque de Edward mais uma vez se fez presente, e mais uma vez coloquei a chamada no silencioso. Ignora-lo durante todo o dia, respondendo apenas com mensagens, estava sendo horrível, mas eu simplesmente não poderia atende-lo e explicar o barulho de mar que faria-se ao fundo. A minha voz me denunciaria em segundos - eu era a pior mentirosa que conhecia.

Me virei para as pedras e comecei a caminhar de volta a elas quando o vi pela primeira vez - nessa vida. Eu conhecia aquele moreno, que parecia me olhar curioso, como se estivesse se esforçando para encaixar alguma coisa, resgatar alguma informação do fundo de sua memória.

Sim - eu já nadei naquela praia com ele.

"Bella?"

"Jacob."


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