Os Diários da Bruxa - Interativa escrita por Bétia


Capítulo 5
X — Nada além de uma pluralidade minha.


Notas iniciais do capítulo

Demorei mais voltei, galera, tô viva! Ksksd
Depois de várias escritas e reescritas, o capítulo tá finalmente aqui ♥ Então obrigada Flora, Sogno, Violet e sol por terem me aconselhado e apoiado tanto, sem vocês eu não teria nada pronto nem tão cedo.



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Afinal, quem era Ana? Eu me perguntava ao divagar, me sentindo enfim reconectada com a terra depois de tanto tempo, andando com os tênis balançando entre as mãos e um achocolatado constantemente pingando na minha blusa, como se num conjunto de consequência indubitável da minha distração.

 Em contrapartida, a inconstância das Butterfrees ou da mesma garota ainda não apagavam a frequência do Leavanny e Exeggutor da minha memória. Eles ressurgiam em minutos intercalados com a pergunta acima, em um silente loop que me rememorava da tragédia, o que me trazia ali quando eu ainda insistia em tentar explicar o inexplicável, de volta àquela caminhada cansativa em direção à Cherrygrove.

— ... E então ele me disse que eu não tinha capacitação. — Relatou Robyn, em uma conformidade singela. Já eu, não entendia muito como ele conseguia ser tão carismático e tão transparente ao mesmo tempo, me fazendo querer até acompanhar com uma rizada a provável ironia do seu relato.

 O pesquisador mantinha, ao mesmo tempo, os olhos cuidadosos sobre mim desde que eu percebi que os baques só me fizeram ver estrelas e que já estava pronta para outra. Ele parecia querer enganar a si mesmo ao pensar que o meu grande foco era realmente na sua história e que de nada mais me incomodava o ferrão encravado em minha coxa, muito embora a sua presença ali ainda fosse por conta de insistência minha.

 Mesmo assim, era doce da parte dele querer me formular uma boa distração quando ele deveria estar correndo para o Centro Pokémon, não me acompanhando. Eu era o próprio cavalo manco e masoquista da história, admito.

— Foi um bem alto, não foi? — Eu perguntei para sustentar o assunto, e ele me confirmou com um aceno de cabeça. — Malamadu. — E eu cantarolei, baixinho, muito provavelmente pensando que talvez o Robyn não gostasse do insulto que eu fazia ao seu colega de profissão.

— Então ele só odeia o mundo mesmo? — Indagou em meia surpresa, jogando as mãos nos bolsos frontais da calça, com as sobrancelhas levantadas me indicando uma súbita felicidade e vontade de riso.

— Pois é... — Confirmei sua teoria ao enfatizar a fala com uma relaxada dada de ombros, o que, convenhamos, foi uma péssima ideia, uma vez que o odor azedo de sangue de bicho de planta invadiu as minhas narinas, me tentando a relembrar o passado outra vez. — E eu só queria um Cyndaquill. Um Cyndaquill, doido. ‘Qué que custa?! — Miei, seguindo firme e forte, como pode ver. Me lamentando um pouco da falta que um pokémon extra fazia em minha equipe.

Pff... E eu só queria um emprego, mas te deixar levar um pokémon caro e raro de graça foi um absurdo, nada a ver isso! Meu Arceus... — Robyn dramatizou em seu sarcasmo acompanhado de gestos brandos. É claro que ele estava certo de rir da minha cara de pau de mendigar um inicial, eu mesma o fazia de tempos em tempos. Com a leveza de um clima antes tão pesado, trocamos sorrisos e baixas risadas.

 No final, o que acontece é que, até onde eu sei, para você ter um pokémon inicial criado por professores, ou você faz uma prova e concorre com uma galera pela chance de ter um, se esse for realmente o seu primeiro pokémon; ou dá uma graninha alta em troca da chance de ter um Chikorita, Totodile, ou Cyndaquill no time, o que eu não estava nada disposta a fazer, que fique bem claro. Então é óbvio que eu estava no time da malandragem de implorar um favor para os moços do laboratório.

Eh, eu tentei. Porém, vida que segue. — E confirmei minha derrota, olhando para o lado ao perceber que o Sam ainda andava orgulhoso por ter salvo o dia. Muito pelo contrário, eu ainda me sentia mal por findá-los, Leavanny e Exeggutor, daquela forma.

— Mas, e aí? O que você vai fazer agora? — Robyn me cercou, referindo-se a falta de outro componente ao meu enlaço. E eu tomei o meu tempo para responder aquilo, mais para ter certeza de que formularia uma fala inteligente do que qualquer coisa.

 De fato, eu não pretendia recorrer à uma captura convencional, como o pesquisador talvez de mim esperasse. Não que eu não tivesse tentado uma vez, há uns anos, mas não foi um negócio muito legal, constatei ao rememorar e olhar ao redor, concluindo ainda mais como interferir no equilíbrio de uma rota era errado quando uma família de Hoppips nos atravessou de mansinho.

 Tipo, alguma vez você já imaginou como seria estranho se alguém te tirasse da própria casa para viver batalhando em estádios? Talvez seja só um grande engano da minha parte esperar que os treinadores se preocupassem com coisas como essas, mas parece ser agoniante não ter a chance de dar adeus ao seu lar, familiares, amigos... Ter tudo simplesmente cortado pela raiz!

 Ou esse também poderia ser um grande ponto “negativo” de ser um tanto emotiva, pois eu sinto os olhos encherem d’água só de imaginar.

 Entretanto, eu sustentei o olhar perdido na estrada ao diminuir ainda mais os passos para os pokémons passarem, sem realmente saber como eu faria para entrar na Liga se não tivesse um outro participante comigo. Não pelo fato de haver algo de errado com o Sam ou, sei lá, por eu amar a pluralidade de equipes, nada disso! Mas sim pelas regras de Johto, que me deixavam de mãos atadas uma vez que, para evitar de que alguém sem comprometimento com jornadas e treinamento adentrasse no ramo só para esbanjar insígnias ou ter uma grana “fácil”, adotava este sistema para justamente distanciar-se motivos além dos esperados. No caso, impedindo assim que um participante iniciasse um desafio se estivesse fora do padrão esperado, como, por exemplo, sem dois ou três pokémons no time.

 Em meio a um suspiro e outro, voltando os olhos para o homem ao meu lado, eu afirmei em incertezas:

— Pular Violet.

 Por outro lado, eu vi quando o Sam bufou e apressou o passo, seguindo em frente ao saltar para longe e iniciar uma marcha insistente. É claro que ele esperaria que eu tivesse outra reação, arrumasse uma espécie de “tapa buraco” para suprir a falta, mas... Pensa comigo. De que adiantaria buscar qualquer pokémon para sair comigo em uma missão suicida? Samuel convivia comigo desde bebê, por isso não entendia o meu ponto de vista. Treinar um pokémon do zero com tão pouco tempo até aquela cidade seria loucura!

 Mas isso fora algo que crescera em mim com o tempo, se quer saber, todo esse cuidado e ideais. Sam, por outro lado, nunca passou a dar o mesmo significado às capturas como eu o fiz com decorrer dos anos. Entretanto, vejo como você deve estar se sentindo um tanto quanto alheio enquanto falo dessa teia de “ressignificados”, então, meu companheiro, senta ai que lá vem história.

Eu... Eu tive um Pidgey uma vez, muito bonitinho, pequenininho, fofinho. O capturei ainda em Kanto, quando íamos em direção à cidade de Celadon, bem serelepes em busca da nossa segunda insígnia. A esperança era que dobrar o time resultasse em um aumento de força ofensiva, mas também já é de se esperar que não foi bem isso que aconteceu.

 Com dois dias, o passarinho começou a definhar. Não comia, não voava, não dormia, só existia, usando de poleiro a alça da minha bolsa. Tinha saudades de casa, uma Joy me disse quando apressei o passo para procurar saber o que fazer com a enfermeira local.

 Agora você deve estar imaginando que eu o soltei no mesmo instante, mas não, não o fiz. Nós estávamos longe demais para voltar atrás. E eu sustentei ele comigo até que, em uma noite de nervosismo embalado na culpa, precisei correr em meio as lágrimas de volta para a rota seis. Assim que o sol raiou e eu percebi o Pidgey nem se mexia, eu não via mais nada no caminho. A única coisa que me rememora bem esse dia é cicatriz no braço de um ataque de asa de um Pidgeot.

— Drástico. — Robyn comentou, em seu próprio intervalo.

— E tu? — Eu devolvi, balançando a caixinha seca em minhas mãos ao parar em um instante, enfim fitando a pulsação da minha carne contra a legging escura e o ferrão, notando como isso parecia fazer a dor e a coceira aumentar em certa potência.

— Ficar rodando, fazendo uns bicos rápidos, pesquisando... Ainda não sei bem ao certo. — Ao contrário de mim, ele respondeu rápido, observando meio bobo o último Hoppip seguir vento adentro e se perder depois das árvores ao redor da trilha. Hoje era um dia de sol, muito embora os raios só transitassem até o solo quando as copas mais altas balançavam, permitindo assim a passagem de alguns filetes até a gente.

Uhm, legal. — E falei, sem me ocupar em pensar em nada melhor para dizer, voltando a focar nos grãos de areia e como meus pés pareciam que se encaixavam ali. Eu, depois de tudo, ainda pareci sentir falta do doce na boca.

 

“...”

 Mesmo que Robyn estivesse incomodado com as suas próprias questões, ele não deu nenhum piu até que estivéssemos em Cherrygrove. Então nos despedimos quando ele decidiu que iria ao Centro Pokémon antes de tudo.

 Eu, entretanto, decidira que passar no mercado de especiarias e itens de batalhas seria uma melhor escolha, uma vez que, o que ele não sabia, é que eu não me curaria com uma ida ao hospital e uma receita médica. Aliás, subitamente chovia.

 Correndo de volta para o CP, eu decidi nas pressas que ficar aqui por uns dias seria a melhor coisa que eu poderia fazer. E me arrepiei quando uma leve brisa me acertou, estava estranhamente frio, uma vez tal fenômeno ocorria por dias a fio e noites adentro; gentileza essa de um treinador que tentava ensinar ao seu Flareon como fazer chover com um TM pirateado, diziam as más línguas.

 E dei uma piscada meio sonolenta, meio preguiçosa, cortesia dos dias de chuva ininterruptos, abrindo os olhos quando já não poderia focar em nada na minha frente além das pastas e pós, tampouco imaginando o quanto arderia usar aquilo de primeira.

 A etiqueta do potinho da frente sinalizava para uma loja de ervas em Ecruteak e o seu design, particularmente, era muito bonitinho, uma vez que o ele parecia uma caneca de vidro e uma senhorinha em desenho, que deveria a ser mascote, acho, sorria ao indicar o grande nome: Urtigas e Limão.

 O background verde com pequenas Meganiums se perdia em quadrados brancos que davam os modos de usar para os quais tampouco me preocupei em ler, apenas confirmando o efeito daquilo logo mais: Curar coceira, principalmente aquelas iniciadas por ataques de inseto.

 Em seguida, eu via os outros vidrinhos gêmeos marcados por uma fita crepe no centro, indicando, respectivamente, pós de cura e energia. Mas, ao mesmo tempo, não entendia de onde eu tirava a força para mergulhar os dedos na pasta e então seguir para esses dois, mordendo o lábio ao passar rente aos ferimentos e no buraco levemente oco deixado pela corte que o Robyn fizera entre o Leavanny e seu ferrão. Eu imaginava estar seguindo ainda tudo no automático hoje...

 A monotonia, entretanto, uma hora ou outra me atacou, e eu gastei o resto do meu dia dentro do quarto, enrolada em minhas cobertas e conversando em um grupo de treinadores online, até que, no fim de tudo, Sam falou:

‘Cê não tá nem um pouco preocupada em ter uma infecção para quem tem algo enfiado na perna há tanto tempo. — E eu me bolei mais para o seu lado, gemendo um pouco porque o ferimento ainda doía.

— Nem um pouquinho. — Afirmei ao me apoiar em suas costas, vendo-o rolar os olhos para a minha voz divertida.

— Aí não tá na hora de tirar isso daí, não?

Ahn ahn. — Neguei, sem tirar os olhos do aparelho. Enquanto, ao que parecia, uma luz surgia sobre sua cabeça.

— Noite de lua? — Indagou.

— Lua cheia. — E a frase tomou o próprio sentido junto com o muxoxo que o gato deu e que o vento soprou.

 

“...”

 Minha vó uma vez me contara: Nunca incomode uma garota em dias de lua. O que eu, pequena, nunca imaginei que entenderia tanto. De fato, eu realmente não aprendi o sentido que ela dava para aquela frase pelo jeito que ela sempre me dissera, muito embora eu desejasse.

 Quando você nasce, ela dizia, algum elemento veementemente vincula-se a ti, o guiando pelos caminhos mais tortuosos da estrada da vida. E isso, de alguma maneira inexplicável, ocorre mais forte com quem escancara as portas da alma e se permite ser uma junção entre o seu âmago e ele.

 Vovó, como pode ser visto em tão pouco, era um poço de conhecimento memorável e inigualável, sendo fluida como a água. Seus movimentos eram tão planejadamente graciosos que até quando fria como o gelo parecia intercalar suspiros de leveza e relevar várias coisas, decididamente apegada a seus gestos sempre minuciosos. Sendo assim uma mulher digna de grande admiração, aposto que você adoraria conhecer mais sobre ela.

 Já eu, em outra via, seguia o quase insistente e inconsistente balanço da terra, tão distante de mim mesma quanto ela era. Me erguia em compassos, como uma tempestade do mais fervoroso magma, espalhando fissuras e deixando crateras arregaçadas por todos os lados ou tremendo tudo com o estardalhaço de um terremoto, alterando até as superfícies dos objetos mais sólidos e brandos.

 E, todavia, ainda era incorrigivelmente fiel à lua, bordada na sutil carência gravitacional e acompanhada pelo peso dos segredos da terra, tal qual sua superfície fragmentada e guardiã escondia. Como a própria satélite dos amantes, eu também estava só, ainda que por vezes cercada por tantas de tantos brilhos e faróis.

 Então, era isso que me remetia a frase de voinha, como se as garotas em dias de lua não fossem nada além do que uma pluralidade minha, assim como as próprias (poeiras das) estrelas.

 E principalmente em dias como esse, quando eu poderia agir de forma indomável a cada hora mais próxima da grande fase da lua, como se a história de ninar fosse só mais uma das consequências da minha própria magia. Então, como os próprios lobisomens, estava chegando a hora em que eu precisava me esconder da humanidade e talvez me acorrentar nos matos, admito.

 Com esse pensamento mais clichê impossível, eu pulei a janela do quarto após me despedir de um Sam dorminhoco com um abraço de urso, deixando a chave do cômodo entre as suas patas por aquele ser provavelmente o lugar mais seguro para ela. Me acalmava a serenidade com a qual ele permanecia no sono, pois eu a tomava como se a um passe para a não-preocupação hoje.

 E adentrei na chuva, imersa no primeiro momento ao projetar uma grande figura de carinho pelos pingos fluindo pelo espaço, enquanto eu já não me importava mais comigo, ou com a lentidão da andança atrasada pelo espinho.

Fitando as minhas chinelas, eu forcei a seguir com passos largos para longe do Centro Pokémon, a chuva estando forte como nunca antes. Eu não via o mar, mas o relevo no qual o prédio se erguia claramente declinava até esse. Em seu lado lado oposto, à minha direita, podia ver surgir um amarelado passadiço abrir caminho por entre as unidas árvores até um possível lago.

 Escorregando por entre o calçado e o corredor de madeira, eu pensei em voltar para dentro ao enfim perceber o quão desregulado era o rumo que tomava a minha respiração, quando eu tampouco notara que estava respirando tão fundo.

— Vamos seguir o curso do rio até chegar na rota 30. — Eu falei para mim mesma, ao mesmo tempo em que não entendia bem a minha própria lógica. Mas não questionei, pensando que talvez essa conclusão me apontasse para uma solução em que houvessem menos pessoas e perguntas no final, uma vez que eu nunca aprovaria a ideia de correr pelas bordas do corpo d’água em situações normais.

 Em algum momento nada importante, eu perdi uma das havaianas para a chuva e o insistente vento, não parando para voltar atrás porque eu previa, era quase óbvio, que chegava o momento.

 Eu já não me prendia ao fato de estar descalço e com os rebeldes cabelos escorrendo pelo rosto a acompanhar o balançar das copas, de forma que nem notava o frio. Mas naufragava em pensamentos ao imaginar que eu poderia vir a virar um espírito de fogo manco logo mais. E isso nem de longe era coisa mais otimista que eu poderia usar para me distrair. Mas, entre remoer a certeza do encontro com a lagoa e esse, era melhor ele.

 E alcancei o temido lugar em um minuto ou outro, já no fim do passadiço. O meu medo agora não era correr e pular sua grade, uma vez não havia nada além do rio mais a frente, mas sim de sair naufragando e não conseguir me levantar depois do pouso, tanto quanto permanecia remoendo um imaginário baque em qualquer parte ou coisa e acabar não sobrevivendo para contar história depois.

Entretanto, decidi que fazer algo era melhor do que não fazer nada. Em minha garganta, formou-se um nó em conjunto com os primeiros passos. As mãos tremiam ao avistar os primeiros lances da lua, o suor escorria de tão abafado que o local parecia estar. Se me pedissem para ler algo, eu não conseguiria, de tanto que minha visão embaçava no desespero e nas crescentes lágrimas de algo que eu só poderia lhe descrever como comoção.

O que eu faria? Eu me perguntava para não ceder ao colapso. No compasso, eu parei e olhei para os lados, imaginando se haveria algo ali para me ajudar. Mas nada parecia útil, eu só via o preto sem fundo e nada mais. Nada tipo, sei lá! Uma corda, correntes, e essas coisas úteis.

 Então pulei, sem esperanças de algo prazeroso ao seguir de encontro com o cenário tempestuoso, correndo para longe da água e do verde lodo antes que a adrenalina consumisse as minhas veias. Mas não pense que eu não estava com medo, eram só cinco segundos de coragem insana que por mim se alastravam. Nada além disso, pois ainda continuavam comigo todos os companheiros sentimentos depreciativos, e mais fortes ao discernir o meu julgamento a cada passo. E, acredite, não me passava nem sinal de wi-fi...

Mas, logo agora, porque eu me prendia a isso?

E desliguei os sentidos para me focar além das perguntas, naquilo que realmente importava, afundando no breu que me consumiu ao cerrar os olhos. Sabe, eu não queria estar ali. Queria estar em qualquer lugar, com as mesmas preocupações de quando eu tinha treze anos e não precisar encarar a realidade dos fatos. Talvez, imaginando qual garoto gostaria de mim também.

 Mas não, ao enfim focar a minha vista no horizonte outra vez, eu via um pokémon estranho dirigir-se a mim com uma rapidez inimaginável. Então eu paralisei, sem mais nada de bravura para me indicar o que fazer ou me obrigar a correr alguns passos para trás; a névoa que o acompanhava talvez inebriando minha coerência também. Eu não podia tão simplesmente desviar os olhos, era como se eu estivesse ligada a suas íris cor de fumaça, inevitavelmente destinada a permanecer ali.

 E fechei os olhos mais uma vez, titubeando ao escorrer para o lado e caindo logo mais, por cima de uma rocha. Mesmo assim, evitando imaginar, talvez, a minha dor, a figura se esticou para pegar impulso e, por entre uma e outra transformação, o seu rosto não passou de uma boca com vários dentes e grandes olhos acinzentados. Era isso! Acabou!

 Então eu mudei. Com uma provável esperança de defesa, eu olhei para a lua, enfim cheia, sem segurança alguma, na medida em que a decadência dos ferimentos tomou forma de pequenas estrelas na minha pele tão negra quanto o próprio céu obscuro. E os corpos celestes escorreram até a ponta do ferrão de madeira quando as vinhas tomaram posse da minha perna, em nanosegundos de escalada que converteram-se na minha escapatória.

 Meus membros se estendiam em cada movimento do nado cada vez mais perto, criando folhas e gotejando para lá e para cá ao criar curvas e segmentos, sinal de que algo grande estava acontecendo.

 Ao fixar meus pés, ou raízes, ao chão, a regularidade da criatura parou, agora parecendo tão pequena a meu ver quanto a próprias vegetações de companhia. Ao inclinar os olhos para a coisinha lá no fundo, eu pude enfim cair do céu quando, por um segundo, me indaguei se aquele cara em sua carapaça era mesmo o Robyn. E me abrasei pela gratidão de mais cedo, desregulando minha imposição para voltar a estar vulnerável, perdida, nua; me permitindo assim afundar no corpo que refletia em cacos a grande lua que velava a escuridão do espaço como um lustre.


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Notas finais do capítulo

Então, o capítulo foi bem simplesinho, pew pow.
No fundo, no fundo, a intenção era essa. E que você lesse meio sem entender a parte final também, pq sim, foi tudo muito rápido e o foco da Jú não parecia parar em nada por mais de 30 segundos. Uma das características que ela assume perto do ápice da lua cheia é essa overdose de força e a tendência a mudar de ideia, de opinião, de atitude. E é basicamente por isso ela segue o passadiço, mesmo que ela narre um pouquinho do medo que tinha de ir para o rio.
E, aha! Eu imaginei que vocês gostariam de saber mais da Ana e Robyn do passado, mas ainda não é hora :( Vamos por partes.
Aliás, eu queria usar esse espacinho para falar mais da Jú, Robyn e Sam. Estou feliz em ter abordado algumas questões, mesmo que tão pequenas, no capítulo. :D