Além do Castelo escrita por LC_Pena, SpinOff de HOH


Capítulo 11
Capítulo 11 Durmstrang/Beauxbatons


Notas iniciais do capítulo

Acho que o capítulo ficou um pouquinho maior e esse será o último com duas escolas juntas.



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Capitulo 11

Sala de treino, Durmstrang, 08 de setembro de 2021

A dor era um latejar irritante que aumentava e diminuía conforme exigia mais ou menos do seu corpo. Scorp tinha assistido as aulas e comido com o mesmo apetite de sempre, ignorando o dia inteiro aquela lembrança constante do que vinha a seguir.

O sonserino havia colocado uma das camisetas regatas folgadas que usava nos treinos com equipamentos da seleção, então Rebeca fez uma careta ao avistar o grande hematoma roxo pelo ainda maior buraco da manga da roupa esgaçada.

— Tem certeza que vai treinar assim? Ainda nem começou a ficar amarelado... - Ela tocou de leve no lugar machucado, mas Scorp nem sequer se afastou, ele estava levando aquilo melhor do que ela achava possível. – Okay, vamos ficar bem, eu tenho certeza.

O sonserino sorriu para aquela constatação inesperada e fora de lugar, porque sabia que Rebeca estava tentando acalmar a si mesma, já que se fossem levar essa loucura a frente, ela teria que ganhar seus próprios machucados. Se deixou ser abraçado de leve pela garota.

— Elas chegaram. Olha só como parecem duas pilantras prontas para acabar com a nossa raça. - O loiro sussurrou divertido para a namorada com os braços pendurados em seus ombros, deu um tapa de leve na bunda dela, coberta por um short rosa que dava pouca margem para a imaginação. – Vamos lá tirar esse sorrisinho da cara delas.

— É melhor bater mais forte do que isso, Malfoy, ou não vai ter a mínima chance na arena. - Arthuria falou a título de cumprimento, jogando o equipamento no chão aos pés do casal. – Como vai a costela? Dormiu direito?

A garota sueca perguntou, mas não esperou uma resposta, foi logo colocando a mão por baixo da camisa do seu aprendiz, sem pedir permissão e sem cerimônia. Pressionou o lugar com uma força média, encarando a reação do loiro, mas ele só conteve um pouco o fôlego.

— Bom, muito bom. Dizem que quanto mais mágico o sangue, mais rápida a cura, eu definitivamente estou inclinada a acreditar nisso. - A sextanista olhou maliciosa para a britânica a sua frente - atrás do garoto - que parecia que havia chupado um limão azedo. – Vai ter que se acostumar comigo apalpando seu namorado, ele gemendo, suando, essas coisas...

— Ou você pode ser um pouco mais profissional e guardar essa sua mão boba para si mesma, que tal? - Rebeca cruzou os braços irritada, mas recebeu um olhar de aviso de Scorp, porque aquela Durm iria ajudá-los a conseguir o que queriam e não estava pedindo absolutamente nada em troca!

— Posso fazer as duas coisas, usar a mão em mim e nele, mas por hora vou focar em te ensinar o básico do básico, ponha o capacete e o colete, por favor. - Arthuria fez sinal para os equipamentos aos seus pés. Rebeca pegou o capacete azul e pôs na cabeça, ajeitando o rabo de cavalo ainda com um olhar mortal para a sueca.

— O que vamos treinar hoje? Trocação? Esquiva? Ataque surpresa? - Svetlana falou animada, parando um cruzado a milímetros do queixo de uma Rebeca despreparada. A garota de treze anos riu animada. – Com quem eu vou lutar hoje?

— Não vamos lutar com ninguém hoje, Svetlana, pegue a luva, vamos treinar alguns socos. - A terceiranista fez um biquinho irritada, mas obedeceu a ordem de Arthuria de primeira. – Você fica com Malfoy, eu fico com Wainz, vamos começar no esquema de revezamento de cruzados e então dois jabs e uma esquiva, comece lento, depois vá aumentando a velocidade.

— Okay, chefe! Pronto, Malfoy? - Svetlana flexionou as pernas e posicionou as mãos a frente, na altura do peito. O sonserino flexionou um pouco as pernas também, testando a distância de seu punho com luva para o da garota com as luvas retas de treino. – Você precisa acertar minha mão esquerda com a direita e vice-versa. Preparado?

— Sim, vamos lá. - Ele começou a socar as luvas de apoio da garota, tentando imprimir a mesma quantidade de força dos dois lados, mas depois de um par de golpes precisou parar por causa de uma fisgada na costela. – Só um minuto, preciso achar uma posição confortável.

— Não existe isso de posição confortável, quando se está lutando, na maior parte do tempo há dor e desconforto, a gente apenas tem que lidar com isso! - Svetlana era muito nova e às vezes parecia ter exatamente a idade que tinha, mas em outros momentos parecia que tinha crescido rápido demais. Não era suposto que garotas de 13 anos tivessem que aprender a lidar com a dor! – Flexiona mais esses joelhos, usa os bíceps para ampliar a alavanca, isso mesmo, começa o movimento de trás, isso, levanta a cabeça, não baixa a guarda... Isso, muito bom.

Scorp era uma pessoa determinada, seus amigos às vezes se surpreendiam com o quanto ele podia se ater a um compromisso com ele mesmo quando queria. Cesc sempre ficava impressionado com a sua capacidade de dar gelo nas pessoas e Tony o olhava como se ele fosse um alienígena por conseguir cumprir seu cronograma de estudos, mas a grande verdade é que, há mais de uma maneira de ser um bom sonserino.

Enquanto Tony demonstrava isso com sua agressividade natural - ele subiria rápido de posição na arena sem treino algum - atropelando qualquer um na frente dos seus objetivos, Cesc era exatamente o contrário, contornava qualquer obstáculo sem perder o prêmio principal de vista, porém ambos sempre chegavam a linha de chegada.

Scorp sabia que seu modo era um pouco diferente dos dois, ele era cauteloso, pensava nas etapas e nos pequenos avanços, um de cada vez. Não tratava-se de mirabolantes planos de 3 partes e sim de um avançar gradual que respeitava as diferentes etapas para se chegar aonde deve.

No caso, hoje precisava aprender a consertar sua postura, aprender a executar os golpes o mais perto da perfeição, uma, duas, cem mil vezes, se fosse preciso! Estava acostumado com treinos repetitivos, a pressão do Quadribol era horrível, mas havia ganhado muita bagagem com todos os exercícios e jogos.

Estranhamente, depois de um tempo a dor se transformava em algo irritante, porém distante o suficiente para ser ignorada.

O foco físico do sonserino agora era na queimação dos músculos ficando mais fortes, na postura consertada pela instrutora de 13 anos - com uma experiência de, sei lá, uns 12 anos de luta, no mínimo - nas instruções dadas por Arthuria as suas costas... O restante do mundo não existia mais.

O foco mental já era outra história.

Scorp não temia pelos adversários que teria que enfrentar até ser notado pelo top 20 dos duelos marciais. Era um processo lento, precisava se mostrar bom o suficiente para valer a pena lutar, ao mesmo tempo que guardaria alguma surpresa, já que eles não podiam desconfiar de jeito nenhum que ele poderia aguentar 5 minutos na arena.

Não precisava vencer ninguém, vencer implicaria em assumir o lugar do desafiado no ranking e se conhecia muito bem para entender que se ganhasse um poder, um status como esse, sua vaidade não o deixaria focar no prêmio principal: sua ida ao campeonato de poções.

Mais do que de ser poderoso, Scorp gostava dos frascos, das ampolas, dos cadeirões e essências desde quando nem sabia nomear nada disso. Mexia nas poções de beleza da sua mãe, misturava ela nas bebidas de seu pai, que logo o colocou no colo para ajudá-lo com suas pesquisas para bebidas mágicas diferenciadas no andar debaixo.

Antes dos 6 anos, Scorp já sabia nomear todo o estoque do pai com os olhos fechados, embora Draco Malfoy não o deixasse nunca sozinho no laboratório, nem o deixasse provar absolutamente nada, porque “a maior diferença entre a cura e o veneno é a dosagem, nunca se esqueça disso”.

Scorp não esquecera.

Seu pai repetia também, como um mantra, toda vez que um cheiro mais doce aguçava sua curiosidade infantil e o fazia levar o frasco até o nariz: “Pocionistas usam primeiro os olhos e depois o cérebro para descobrir os ingredientes, nariz e boca são os últimos a serem acionados.”

Draco Malfoy havia criado todo um manual de regras de convivência no laboratório, havia o silêncio no ambiente, o respeito pelos ingredientes, a paciência com os processos... Sua infância havia sido diferente da dos amigos, sabia disso, mas de certa forma gostava das coisas do jeito que eram.

A dose certa de tudo sempre guiou seus caminhos, percebia isso quando se colocava como contrapeso para o exagero de Cesc e Tony, os dois, a sua maneira, eram as pessoas mais extravagantes de todas.

Se fossem garotas, seriam considerados exuberantes, porque dominavam o ambiente sem falar, as outras pessoas simplesmente não podiam resistir, sempre olhavam para ver o que eles estavam fazendo, de quem estavam rindo, como reagiriam a tal acontecimento....

Nenhum dos dois notava o efeito que tinham nos outros, não era que ignorassem, eles simplesmente não notavam de jeito nenhum que viravam o centro das atenções, juntos ou separados, porque ninguém resistia aos dois.

Seja para admirar, provocar ou julgar, ninguém era indiferente a Cesc Fábregas e Tony Zabini.

Quanto a ele... Era discreto por opção e natureza, ter todos os olhos sobre si impediria que conseguisse ver o quadro total das coisas e o deixaria extremamente desconfortável. Gostava de estar invisível, no anonimato, no controle da situação e quando era conveniente, mostrava uma ou duas habilidades.

A surpresa era uma coisa bem legal e não se sentia nem um pouco ofendido por ver que as pessoas não o achavam capaz de algo, teria fracassado se deixasse todo o seu jogo as claras.

Dessa vez, sabia que havia feito o caminho inverso, as duas Durms focadas em treiná-los tinham conhecimento que ele não queria ser como elas completamente, sabiam que ele estava apenas usando aquilo tudo para algo que realmente importava.

Duelos marciais era um estilo de vida como qualquer outro esporte, as pessoas falavam enquanto comiam, discutiam suas divergências nos corredores e tinham seu próprio dialeto. Até a postura de um duelista o destacava na multidão, sempre em guarda, sempre pronto para levar um golpe sem se dobrar.

Scorp não queria fazer parte do grupinho, queria os valores necessários para sua inscrição com Rebeca no campeonato de poções e para as compras de materiais, porque esse foi seu foco desde o primeiro dia, quando lhe foi apresentado a possibilidade de entrar para o time:

Ir para o campeonato internacional de Poções na natureza.

Havia um ranking para poções também, claro, e antes de ir para as aulas havia folheado o livro dos campeões para ver quem eram os 20 melhores da escola e não se impressionou com o que viu. Haviam muitos especialistas, gente que era muito boa fazendo um tipo de poção ou elixir e isso dizia muito que tipo de pocionista eles eram.

Porém não havia nenhum como ele ou Rebeca na equipe.

Rebeca era uma química nata, tinha toda a tabela de equivalência de medidas na ponta da língua. Se você colocasse todos os equipamentos e ingredientes na sua frente, ela executava duas, três poções ao mesmo tempo sem nem consultar o livro de receitas para saber o ponto certo, porque ela via tudo pela cor, pelo espiralar da fumaça e até mesmo pelo som das bolhas.

Ela era uma em uma milhão e Scorp sentia como se nunca fosse cansar de vê-la em ação.

Já ele era um apaixonado pelos ingredientes, havia decorado a NIIP - a tabela de Nomenclatura Internacional de Ingredientes para Poções- antes dos 8 anos, aos 10 já havia visto com os próprios olhos 90% de todos os ingredientes permitidos pelo Ministério Britânico ao menos uma vez e aos 11 anos, antes de embarcar para Hogwarts, já ajudava seu pai na compra dos insumos frescos: tratava, porcionava, maturava, desidratava até que tudo estivesse no ponto exato para aquela etapa da bebida, para aquela função específica no quadro geral.

Etapas e visão geral, esse era o seu estilo de vida.

Scorp piscou confuso ao sentir o toque de Arthuria no ombro, sinalizando o fim do treino. Sevtlana parecia um pouco cansada, mas atenta, suor escorrendo pela sua testa, o contorno negro ao redor dos olhos levemente borrado, então o sonserino se colocou na sua postura normal, sentindo sua respiração apenas um pouco mais acelerada e a camisa de treino completamente encharcada.

— Vamos manter assim por hoje, antes que sua namorada acabe tendo um treco, parando no hospital. - Arthuria falou tranquilamente, de costas para uma Rebeca ofegante, com as mãos apoiadas nos joelhos e equipamentos jogados de qualquer jeito no chão. – Como foram as coisas por aqui?

Scorp respirou fundo uma, duas vezes, três vezes, como Cesc sempre exigia que fizessem antes, durante e depois dos exercícios - o capitão sempre dizia que Romeo havia ficado burro, porque não oxigenava o cérebro direito antes da sua era - não havia sentido dor e a respiração era uma das poucas coisas que nunca era demais, a menos que houvesse algum veneno no ar...

— Ele tem condicionamento físico, sabe ouvir instruções, tem atenção a postura... Estou impressionada, não esperava essa disciplina em um britânico. - Svetlana falou soando como um adulto profissional e isso foi meio desconcertante de ouvir.

— Eu sou campeão mundial de Quadribol, não sei porque vocês me subestimam tanto. - Scorp disse com desdém, mas sabia bem o porquê, todos no mundo bruxo sabiam o porquê: os atletas britânicos eram todos 70% talento bruto e só 30% treino duro, o que justificava a surpresa com sua capacidade de treinar forte, sem intervalos.

Claro que comparado aos latinos e africanos e sua criatividade, eles pareciam robôs cheios de regras, mas nenhum bruxo britânico que se prezasse iria gastar o mínimo de tempo que fosse treinando para uma atividade para a qual não tem talento, não faziam nada apenas para “se exercitar”. Era assim em Hogwarts, nas faculdades, na vida...

Todos só se dedicavam ao que eram bons e abriam mão de todo o resto, com exceção da atual seleção da escola escocesa, que havia juntado o melhor de todas as Casas e feito uma equipe com uma visão mais holística. Scorp estava satisfeito de ter vindo dessa geração com características mais abrangentes e multitarefas.

— Eu não sou atleta, ainda estou vendo pontos pretos dançando na minha visão, é normal ver pontos pretos na visão? - Rebeca resmungou com dificuldade e medo de levantar a cabeça, tinha quase certeza que desmaiaria se fizesse isso.

— Tem problema se os pontinhos estiverem dançando com tutu, eles estão dançando com tutu? - Arthuria perguntou com uma falsa seriedade, fazendo Scorp e Svetlana rirem e Rebeca resmungar algo inapropriado por baixo do fôlego. – Aqui, beba isso, hoje é por minha conta, mas na próxima vez vocês dois vão pagar pelos próprios energizantes.

— Não tem problema tomar poções nesse esporte? Não é ilegal? - Sabia que as regras da Confederação de Quadribol Internacional não se aplicava a todas as modalidades, mas Scorp achou que pelo menos essa seria respeitada.

— São poções de treino, a azul repõe minerais e água perdidos no suor, a verde acelera o metabolismo mágico, faz os feitiço mais robustos, com menos falhas de execução. - Arthuria havia convocado quatro garrafas azuis geladas, com um rótulo em espanhol e a logomarca “FerrZ” estampada. – A primeira você deve tomar sempre após o treino e nas competições, a segunda só nos treinos com varinha.

— Podemos pular para essa parte? - Rebeca resmungou, deu mais um gole na sua bebida refrescante - tinha um gosto residual esquisito, mas ao menos estava bem gelada - depois voltou a falar. – Sinto que vou me dar bem melhor usando a varinha.

— Concordo, porque pior não dá para ficar. - Arthuria falou com deboche, não gostava que se metessem no seu plano de treinos. – Descansem um pouco, amanhã vamos ver alguns golpes de perna, vamos trabalhar nessas repetições por toda a semana, até que eu sinta que os golpes foram assimilados pelo seu código genético, okay? Os filhinhos dos dois vão ter que nascer sabendo os movimentos.

— E então finalmente vamos começar a fazer treinos com varinha? - Scorp limpou o suor do rosto com o dorso da mão de novo, parecia que agora que tinham parado, ele estava suando o rio Tâmisa na camisa.

— E então vamos a caça, primeiro vamos encontrar alguns adversários para vocês fazerem de saco de pancadas. - Arthuria falou prática, fazendo Svetlana aquecer as mãos ansiosa com a perspectiva. – Mas por hora foquem em aprender os golpes, porque nem sabemos se vão estar vivos semana que vem.

Rebeca revirou os olhos, mas Scorp deu um sorriso de assentimento para suas duas instrutoras Durm. O humor negro de Arthuria podia ser irritante às vezes, mas era um modo de jogar a verdade na mesa e isso sempre foi algo que lhe agradou.

— Vamos, Beca, ainda temos dever de Herbologia para terminar. - Scorp informou com cuidado, mas isso não impediu a sonserina de gemer sua chateação.

— Eu não quero mais brincar disso, eu só quero morrer em paz... - O loiro a ajudou a colocar um dos braços ao redor dos seus ombros com diversão, porque conhecia Rebeca Wainz: no dia seguinte ela estaria focada e irritada em partes iguais e não há combustível melhor para um sonserino do que essa combinação.

~AdC~

Sala de estudos número 3 do dormitório Dépayser, Beauxbatons, 08 de setembro de 2021

Fred estava tendo uma tarde produtiva: Aritmancia era obrigatória na França, mas ao menos eles usavam o mesmo sistema que Hogwarts e os números não precisavam ser traduzidos. Era um exercício chato de fazer contas e mais contas, tentando tropeçar em algum cálculo que fizesse algum sentido prático.

Mas ao menos havia uma reunião urgente do Ocaso mais tarde, com todo o grupo dessa vez e isso só podia significar coisa boa.

Suspirou pesado, porque ainda faltava muito tempo para isso e acabou atraindo a atenção de Heidi Lowen, a artilheira sonserina do sexto ano, a qual ainda devia um encontro desde o jogo louco no inverno passado. A garota sorriu para ele daquele jeitinho sonso dela e quando ele retribuiu o gesto, ela se sentiu animada a se aproximar.

— Olá, Weasley, há quanto tempo! - Ela se sentou na cadeira mais próxima e fingiu olhar o livro que ele estava estudando com interesse. – Que mundinho pequeno esse que nos coloca tão próximos mesmo quando a vida quer nos ver distantes...

Ele franziu o cenho e a garota riu travessa, porque sabia que não tinha sido a vida que o havia afastado dela e sim o seu breve casinho com Hugh Westhampton, aquele traste corvinal que não podia ver um rabo de saia.

— Fiquei surpreso ao te ver embarcando na carruagem para cá, mas não muito, porque você ficou maravilhosa nesse uniforme. - Ele respondeu com um certo toque de galanteria, porque Lowen não era o tipo de garota que um cara poderia deixar de olhar uma segunda vez. – Foi feita para Beauxbatons... Tem alguma parte veela?

— Só se for a parte em que me transformo em harpia quando fico brava, infelizmente. - Ela deu de ombros, consertando seu pequeno chapéu de suspiro azulado, a sonserina realmente havia combinado com todo aquele frufru. – Mas isso é só um detalhe... Você ficou sabendo do passeio para a estação de esqui no próximo final de semana? Sem ser nesse, no outro, na verdade...

— Não, mas você está perto de me fazer ganhar o dia, me conte mais sobre isso, por favor. Achei que só poderíamos sair em outubro! - Fred fechou o livro e apoiou o queixo em uma das mãos, com um sorriso convidativo. Heidi o olhou de lado, tentando ver se ele estava sendo sincero ou só se divertindo as suas custas.

— Não é sair, sair de verdade, sabe? Há uma estação de esqui aqui por perto que costumava ser só bruxa, mas como estamos na baixa temporada, ainda pode ser, então os professores nos deixam ir até lá. - Heidi falou sorrindo coquete. – Eles fazem feitiços climáticos de inverno, servem chocolate quente e você pode até esquiar como um trouxa, o que te parece?

— Parece divertido... Nem tudo precisa de feitiço para ser mágico, você bem sabe. - A menina sorriu para a resposta maliciosa.

— Dizem que é um lugar muito romântico, o casal Flamel se apaixonou naquele lugar, fizeram até uma fonte em homenagem a eles... - Ela suspirou sonhadora, mas Fred já não estava mais prestando atenção ao que a garota estava falando. – Talvez você possa finalmente me pagar aquele...

— Espera um minuto, fonte dos Flamel? Você não está se referindo a fonte que tem aqui em Beauxbatons não? - Heidi olhou levemente irritada, porque aquele tom incisivo não tinha nada a ver com o flerte que ela queria.

— É outra fonte, Weasley, uma aqui e outra na vila, aparentemente os franceses adoram homenage... Ei, aonde você vai? - O garoto havia levantado da mesa, jogando suas coisas de qualquer jeito na mochila. – Fred Weasley II, se você sair agora, pode ter certeza que nunca mais...

Ele a interrompeu com um beijo na boca, que a fez se calar, estupefata.

— Eu entro em contato mais tarde, juro. - Ele disse divertido e não ficou para ver a expressão da sonserina. Tinha que ser rápido antes que ela caísse na real e o azarasse pelo atrevimento.

Saiu da sala comunal do Dépayser correndo, mas assim que se viu em uma ala mais movimentada do palácio, assumiu um passo cadenciado, em busca daquela garota absurda que tinha como companheira de “aventura”.

Não encontrou Anne, mas avistou sua amiga gostosa, porque aquela garota de sobrenome grego era isso pura e simplesmente: gostosa, com todas as letras e o pior é que a maldita parecia saber disso, pelo jeito que inclinava o quadril para se encostar charmosamente em uma das marquises do corredor.

O cara que estava conversando com ela não tinha a menor chance, havia sido pego na teia.

— Senhorita Roussos, preciso falar com você por um instante, poderia nos dar um minuto, cara? - Fred interrompeu a conversa dos dois e enquanto a garota o olhou curiosa, o rapaz apenas o olhou com desdém. – Ça va bien, mon ami, arriverdeci!

O garoto saiu enfezado e Fred o acompanhou com o olhar até que virasse a esquina. Cara idiota, não tá vendo que essa garota está só jogando com ele?

— Você fala italiano? - Ela perguntou naquele sotaque exótico, não exatamente francês, algo entre isso e outra coisa completamente diferente, talvez grego. – Eu sou um terço italiana, sabia?

— Eu não fazia ideia, isso é muito bacana, mas será que você poderia me dizer onde posso encontrar a senhorita Beaumont? - Fred não quis parecer rude, mas nem devia ter se preocupado, porque a garota o olhou de cima abaixo com um sorrisinho enigmático, depois começou a andar sem nem olhar para trás.

— Claro, me acompanhe, por favor. - A senhorita Roussos estava hoje com o cabelo solto em ondas escuras e seu chapeuzinho dava um ar surreal a ela, mas o tom de voz foi sério, de quem não estava para brincadeira.

Fred a acompanhou no mesmo passo decidido, a garota era bonita e elegante como todas as outras alunas de Beauxbatons, mas ela tinha um jeito enérgico que o fazia pensar em escaladas em montanhas e protestos agressivos em tribunais.

Anne também tinha um pouco disso nela, bem menos do que a grega, claro, mas ainda assim era notável e explicava porque as duas eram amigas.

— Então... Você e Anne tem passado muito tempo juntos, não é? - A senhorita Roussos começou com um tom de voz tranquilo, mas nem assim conseguiu deixar de soar como uma interrogadora dos Inomináveis.

— Estamos trabalhando em um projeto de pesquisa juntos. - Fred falou displicente, ganhando um olhar questionador da morena. – Ultrassecreto.

— Sei... - A garota continuou andando, mas dessa vez tomou uma rota familiar para o grifinório.

— Estamos indo para o campo de esgrima? - Fred perguntou animado, já que da última vez que esteve ali, não teve tempo para prestar atenção no esporte, nem nas instalações. Precisava começar a tirar suas próprias conclusões, se queria ter algo a dizer no lance entre os esgrimistas e os jogadores de Quadribol de Beauxbatons. – Será que Anne vai estar lutando?

— Campo... Com certeza ela iria adorar te ouvir falando assim. - A garota respondeu divertida, porque só um jogador de Quadribol para pensar que todo lugar em que se pratica um esporte é um campo.

Os dois adentraram a arena de esgrima, que, como sempre, estava transbordando de atividades. Não importava a hora do dia, o lugar estava sempre movimentado, porque os alunos de Beauxbatons tinham uma verdadeira obsessão pelo esporte.

— Qual desses encapuzados seria Anne? Consegue identificá-la? - Fred perguntou curioso, porque todos pareciam iguais com aquelas vestes estranhas e máscaras no rosto.

A senhorita Roussos levou alguns segundos para esquadrinhar a quadra com seus olhos experientes em localizar a melhor amiga e, assim que avistou o jeito agressivo, mas elegante de Anne, apontou para o britânico localizá-la também.

— Ali, no terceiro tablado, a com o colete azul. - A francesa, grega e italiana - ela havia dito que era um terço italiana, será que havia mais alguma coisa? - mostrou onde a amiga estava e depois apontou para outro esgrimista talentoso. – E ali, vindo na nossa direção, está Leiris... Você já teve o desprazer de conhecer o ex-namorado de Anne?

— Sim, já o conheci. - O garoto em questão tirava cada parte do seu equipamento com um gesto arrogante e os desconjurava com algum feitiço não-verbal e sem varinha. Ou talvez já tivesse deixado tudo enfeitiçado para fazê-lo parecer foda. – Você é um terço italiana e ele deve ser um terço vampiro... Leiris, que prazer revê-lo, estava aqui contando a senhorita Roussos como tive a honra de conhecer o campo de esgrima na sua presença.

Fred disfarçou rápido seu comentário maldoso com uma tirada tão cínica que fez a garota ao seu lado dar uma risadinha disfarçada. Sebastian olhou para os dois com um desdém calculado, mas depois se decidiu por dar um sorriso ladino, sem muito humor.

— Não esperava vê-lo tão cedo por aqui, monsieur Weasley, imaginei que estaria distraído com o nosso imponente estádio do outro lado da escola. - O esgrimista, que conseguia ser mais pálido e entojado do que os Malfoy, falou de um jeito condescendente, como se o estádio fosse algum brinquedinho de criança.

— Até estaria, se não tivesse esse assunto inacabado com Anne... Ah, ali vem ela. - Fred olhou por cima do ombro do garoto ao dizer isso, porque de fato Anne havia tirado o capacete e estava pronta para se unir ao grupo estranho. Todos se viraram para ver a francesa chegar, então ela apressou o passo.

— Oi, Anne-Marie, oi, Fred. O que vocês estão fazendo aqui? - A garota perguntou enxugando o rosto delicadamente com um lenço bordado, o que fazia dela a atleta mais elegante que Fred já tinha visto na vida!

— Seu nome é Anne também? O que aconteceu na época em que vocês nasceram? Alguma Anne inventou um novo queijo ou salvou a França de um bruxo das trevas horrível? - Fred falou com bom humor, olhando para a senhorita Roussos ao seu lado.

— Anne eu não sei, mas o meu nome eu ganhei porque minha mãe tinha dois pais para mim e dois sobrenomes de duas nacionalidades distintas e achou que eu deveria ter o primeiro nome duplo o mais francês que pudesse pensar, para equilibrar as coisas. - Ela deu de ombros e Fred a olhou confuso.

— Você tem dois pais? - A garota fez que sim com a cabeça, acostumada com a surpresa dos outros. Fred maneou a sua, a olhando de um jeito impressionado. – Eu tenho apenas uma mãe e um pai e às vezes tenho vontade de ir viver com os lobos... Não imagino a loucura que deve ser a sua vida!

Anne-Marie deu risada, porque o monsieur Weasley II não demonstrou nenhum problema com o fato dela ter dois pais e isso era o maior teste que alguém poderia passar em sua presença.

Sebastian Leiris havia perdido no teste há alguns anos, infelizmente.

— Okay, deixando tudo isso de lado, conseguiu falar com o monsieur Dussel, Fred? - Anne perguntou como se o assunto deles fosse algo para o ouvido de todos, então o grifinório seguiu o curso, mesmo sob o olhar atento de Leiris e Roussos.

— Dussel foi irritante como sempre, ele não se lembra de nada que seja muito relevante e destacou como habilidade especial o seu título de campeão de Quadribol. - Fred revirou os olhos e Anne sorriu compreensiva. – Uma porta teria sido mais útil, ao menos abre e fecha para algum lugar!

— E por que veio me procurar então? - Anne perguntou confusa, já que haviam dito que só se encontrariam para falar da caixinha quando houvesse alguma novidade.

A senhorita Roussos e Sebastian Leiris continuavam atentos a conversa, de vez em quando a garota soltava alguns olhares de desdém para o senhor vampiro arrogante, mas ainda assim, estava prestando atenção a tudo que diziam, Fred não podia falar o que havia pensado na frente deles!

— Uma colega de Hogwarts me contou sobre essa estação de esqui que alguns alunos vão no final de semana e eu estive pensando... - Ele começou levemente intimidado, porque o ex-namorado de Anne sabia ser inconveniente. O que esse vampiro ainda estava fazendo ali? – Você gostaria de dar uma volta pela outra Fonte Flamel comigo?

Anne abriu a boca em dúvida de como proceder, queria parecer confortável com o convite para um encontro, ainda mais na frente de Sebastian, mas... Espera, ele disse outra fonte? Deu uma vasculhada na mente do britânico para confirmar o destaque na palavra.

Outra fonte Flamel? - Ela perguntou alarmada e Fred sorriu satisfeito.

— Outra fonte Flamel. - Ele foi enfático novamente e a garota sorriu encantada, aparentemente eles perderam uma pista com Dussel, mas ganharam outra com a fonte!

— O que tem de tão impressionante nessa fonte Flamel em um vilarejo trouxa estúpido? A nossa é muito mais interessante, dizem que tem poderes de embelezamento e...

— Então por que você não vai se afogar lá, Sebastian? - Anne-Marie falou em um fôlego só, porque não tinha tempo a perder com o ciúmes infantil do garoto. Havia alguma coisa acontecendo entre esses dois e não era o romancezinho bobo que Leiris estava pensando! – Ei, eu também quero saber tudo sobre essa fonte, por que não organizamos uma excursão?

— Anne-Marie, eu não acho... - Anne foi interrompida pela amiga altamente curiosa, porque aquela garota doida quando desconfiava de algo, não largava de jeito nenhum!

— Bobagem, você acha demais! Então está combinado, vamos todos para a Fonte Flamel no próximo final de semana! - A morena bateu palminhas animadas, ante o olhar do trio mais confuso e frustrado daquela arena. – Menos você, Sebastian, você não foi convidado.

— Como se eu tivesse tempo a perder indo ver algo mais patético do que o nível da sua reputação. - O garoto pálido de olhos escuros falou com desdém e Anne-Marie só sorriu para ele, igualmente sarcástica.

— Como se você pudesse sair do palácio com o Sol brilhando lá fora! - O garoto revirou os olhos e deu as costas para a garota grega com as mãos na cintura. Assim que ele se afastou o suficiente, Anne-Marie se virou para a dupla que se entreolhava em pânico a suas costas. – Que babaca mais inconveniente, como se alguém quisesse a presença dele estragando todos os nossos planos!

— Pois é, quem iria querer algo assim? - Fred falou com ironia, recebendo uma cotovelada de Anne na altura das costelas. Anne-Marie sorriu maliciosa para os dois.

— Ao contrário do que toda gente pensa, três é um número maravilhoso para um encontro. - Anne-Marie falou divertida para o casalzinho, que obviamente estava aprontando alguma coisa. – A gente se vê no final de semana, Fred. Anne... Até mais tarde.

Assim que a morena foi embora, dando tchauzinho a mais de um garoto animado com sua presença na arena, Anne Beaumont se virou para Fred com um olhar suplicante no rosto muito bonito.

— A gente devia contar para ela, Anne-Marie é minha melhor amiga e eu nunca escondi nada dela antes! - A garota parecia desesperada, mas Fred já estava começando a ficar imune a seu encanto.

— De jeito nenhum! Uma garota intrometida na equipe já é mais do que suficiente! - Anne o olhou ofendida e ele complementou, como se ainda precisasse falar mais alguma coisa, esse ogro! – Estou falando sério, Anne, mantenha essa garota longe dos nossos assuntos.

— Sim, senhor, vou dar o meu melhor. - Respondeu desdenhosa, mas assim que Fred a deixou sozinha, se lamentou internamente.

Porque ele não havia visto o tamanho da curiosidade e determinação de Anne-Marie em sua mente!


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Notas finais do capítulo

Scorp e Rebeca suando a camisa para fazer poções (?) e Fred II tendo que driblar a marcação cerrada de uma grega, italiana, francesa curiosa demais para seu próprio bem. Onde mais vocês veriam isso?

Bjuxxx



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