Moonlight - Mar dos milagres escrita por Sojobox


Capítulo 3
Onde nasce a esperança


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora. Alguns imprevistos ocorreram, mas aqui está finalmente: a continuação da pequena aventura de Michel e Cris.

O que será que eles encontrarão naquele buraco, afinal? E o que nossa autora misteriosa achará disso? Leiam e descubram.

Boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/751812/chapter/3

 

 

Estamos de volta ao palco principal da nossa história. Um dia após o capítulo anterior, todos estão com suas rotinas normais, sem saber das nuvens negras que se aproximavam a oeste.

 

A data era oito de dezembro de dois mil cento e vinte. Nove e meia era o horário.

 

Quando tudo se imaginava estar perdido, a esperança aparece...

 

Era assim que sempre foi descrito a história sobre aqueles bravos heróis que salvaram o mundo tempos atrás.

 

Mas, nem sempre foi assim, houve aqueles que duvidavam de seus feitos, questionavam suas intenções e até mesmo os culpavam pelo ocorrido.

 

Depois de cem anos, os muitos se tornaram poucos, entre esses, um dos que mais eram fiéis a ideia, era sem dúvida o Cris.

 

Por mais que madame Silvia, sua ajudante Bruna, a pequena Suellen ou até mesmos os demais "pequenos" do orfanato tentassem fazer com que ele mudasse de opinião.

 

— Ele é mesmo um cabeça-dura — dizia Silvia enquanto colocava mais um pouco de açúcar no café.

 

— Sim, mas, madame... se me permite dizer, acho que é por isso que a senhora não desiste dele. — sua assistente comentou com um lindo sorriso no rosto.

 

— Hum. — Ela confirmou com a cabeça, embora não estivesse prestando muita atenção no que sua assistente disse.

 

— Ele vai entender mais cedo ou mais tarde o que precisa.

 

— Bruna, eu vi coisas que você nunca poderia imaginar ser possíveis, mais do que você jamais suportaria, não sem enlouquecer.

 

— Hum. Não sei, a senhora também não sabe o que eu já passei, então...

 

— Bruna, de onde você veio?

 

— Ah? Mas que pergunta boba é essa? A senhora sabe bem que vim para cá depois que um raio caiu na minha casa, soterrando meus pais; como eu não tinha mais ninguém, me mandaram pra cá.

 

— Entendo. — Silvia fechou seus olhos lentamente e começou a respirar levemente, como se tentasse se lembrar de algo. — A mesma resposta.

 

— Mesma resposta? Do que está falando? A senhora nunca havia me perguntado sobre isso. — Ela tocou a testa da idosa. — Tem certeza que não está com febre?

 

— Hahaha. Não, minha querida, acho que apenas vivi demais, só isso.

 

— Como assim viveu demais? Nem pense numa coisa dessas! A senhora não pode nos deixar. Ainda tem muito trabalho para fazer, cuidando dessas crianças.

 

— Mas tão pouco tempo...

 

— Acho melhor a senhora ir deitar um pouco. — Ajudou ela a se levantar da cadeira.

 

— Mas tão pouco tempo... — repetiu mais para si mesma do que para a jovem.

 

— Eu sei, eu sei, agora fica quietinha no seu quarto enquanto faço um chá para a senhora descansar.

 

Depois de algum tempo na cozinha, Bruna observava os órfãos correram de lá para cá.

 

Carlos, o caçula do orfanato com seis anos, chorava, pois tinha ralado o joelho enquanto apostava corrida com João e Gustavo, dois garotos de oito anos.

 

Ele até tinha potencial para virar um corredor profissional, e esse era seu sonho, porém toda vez que caía, começava a choradeira.

 

No campinho de terra ao lado estavam: Pedro, Rodrigo e Ricardo de um lado; Luís, Miguel, Leonardo de outro e Willian no gol. Todos estavam completamente focados no jogo ao ponto de nem perceberem o garoto chorando.

 

Serafim, um verdadeiro anjo, com seus cabelos loiros encaracolados, estava em seu canto, após ser ignorado por todos os grupos, somente observando o resto dos meninos jogando um futebol improvisado com uma bola de meias velhas e pedras como as traves do gol. Antes eles usavam latinhas, mas com a falta de dinheiro do orfanato eles tiveram que recolher todas as latinhas, garrafas, entre outras coisas do tipo para vender e conseguir algum dinheiro a mais, ainda que fosse só um pouco.

 

Vocês podem achar isso triste, mas saibam que esta é a realidade para a época, não somente do orfanato que observamos.

 

Bruna refletiu um pouco sobre isso, gostaria de não precisar pensar nessas coisas, gostaria de voltar a ser criança e não precisar se preocupar com tantas tarefas.

 

As meninas por exemplo: Carla, Paula, Larissa, Adriana e Márcia reunidas no canto, brincando com bonecas de pano surradas. Ignorando completamente o mundo ao seu redor. Já Renata, Andréia, Luana, Marlene, Rose e Denise conversavam sobre como os garotos eram bobos.

 

De certa forma, Bruna invejava-as. A responsabilidade por essas crianças, seu bem estar, sua alimentação, sua saúde, seus sonhos. Tudo estava nas suas mãos.

 

Isso é mais do que qualquer um poderia aguentar, caso não tivesse uma mente forte.

 

— Tudo era muito mais simples naquela época — falou Bruna enquanto mexia levemente em seu cabelo.

 

Assim que essas palavras saíram de sua boca, a jovem percebera que não via nem Suellen, nem Cris, muito menos Michel.

 

— Mas será possível que... — A assistente olhava de um lado para outro. — Talvez a madame esteja certa mesmo. Não temos muito tempo.

 

Ela terminou de preparar o chá e levou para madame Silvia em seu quarto.

 

Vamos voltar um pouco para saber o que aconteceu com os três perdidos. Ok?

 

Trinta minutos antes.

 

Silvia olhava da cozinha para Cris, enquanto ele procurava por algo ao lado do campo que o resto dos meninos começavam a tentar jogar futebol.

 

Enquanto isso, as meninas que estavam reunidas conversando na varanda, se separaram em dois grupos: um deles foi para frente da casa enquanto observavam os garotos. Já o outro grupo, permaneceu na varanda e começou a brincar com algumas bonecas que estavam nos cestos de doações.

 

Mas antes de qualquer coisa, a senhora reparou em Michel e Cris que estavam se afastando do orfanato em direção a floresta que existia ao lado.

 

— Mas o que eles estão aprontando agora?

 

Boa coisa que não é né, tia? É o que eu diria se estivesse lá com ela.

 

Na floresta

 

— Eu não aguento mais isso — disse Cris enquanto andava pela floresta. — Esses pirralhos... Eu finalmente achei, depois de tanto tempo procurando, eu consegui encontrar.

 

Assim como Michel e Suellen, Cris era uma das crianças mais velhas do orfanato com nove anos, mas não acho que a diferença fosse tão grande para que ele pudesse chamar os outros de pirralhos. Enfim...

 

— Espera, Cris! — Michel ainda estava bem atrás e não ouvira o que o colega disse.

 

— Anda logo, Michel — reprimiu o colega rudemente. — Temos que chegar lá o quanto antes.

 

— Eu sei, mas nem fazemos ideia do que nos espera lá embaixo, não seria melhor chamar a Suellen?

 

— Se chamarmos, ela vai contar para a tia Silvia e vamos ficar enrascados.

 

— Por qual motivo vocês ficariam enrascados? — disse a voz que se ouviu na floresta.

 

— Suellen! — disse os dois meninos ao mesmo tempo.

 

— Vocês estão aprontando algo. Vamos, falem de uma vez!

 

Michel olhou em direção ao amigo, aguardando uma reação para saber o que fazer.

 

— E então, vão me contar ou vou ter que pedir a tia Silvia que...

 

— Tá bem, tá bem. Nós contaremos — respondeu Cris antes de emendar uma proposta. —, mas promete que não vai contar nada para ninguém até que tenhamos terminado nossa aventura?

 

Com a resposta positiva da menina, eles começaram a contar o que acontecera no dia anterior e sua missão daquele dia.

 

Suellen exibiu algumas caras feias enquanto ouvia, mas não tinha muito o que fazer.

 

— Entendeu agora? — perguntou Cris.

 

— Sim, então — falou Suellen enquanto balançava seus braços —, quando nós começamos?

 

— Bom, primeiro amarraremos essa corda naquela árvore e... — Michel começou a dizer — Como assim nós?

 

Ela sabia que nada adiantaria tentar impedi-los. Voltar e contar a tia Silvia poderia ser tarde demais, eles poderiam se machucar nesse meio tempo.

 

Não que ela estando com eles pudesse protege-los de alguma forma, nem mesmo controlar mana ela aprendeu ainda, mas ela não conseguiria deixar que seus dois melhores amigos entrassem naquele buraco sem que ela fosse junto.

 

Não é exatamente anormal alguém que tenha nascido naquela época não ter nenhum tipo de controle sobre a mana.

 

Normalmente, ao chegar aos nove anos, os poderes manifestam-se pela última vez. Na verdade nenhum dos “pequenos” despertou seus poderes ainda. Talvez nunca despertem.

 

Se eu fosse ela, não me preocuparia tanto com isso, afinal, não há necessidade de ter esse tipo de poder. Naquela época só iria trazer coisas ruins, não é como a minha geração, onde desenvolver melhor suas habilidades pode significar literalmente mais um dia de vida.

 

Porém, Suellen é o tipo de pessoa que se preocupa mais com os outros do que com ela mesma. E ter Michel e Cris, os “gênios da mana”, ao seu lado afligia ainda mais esse seu lado.

 

Michel e Cris eram as únicas crianças do orfanato que tinham despertado seus poderes. Para ser mais exata, quando ainda eram bebês.

 

Cris apareceu na porta do orfanato dentro de uma cesta de piquenique, duas horas depois um curto-circuito causado pelos poderes do bebê deixou o orfanato sem luz até o outro dia.

 

Já Michel apareceu numa caixa de papelão na baía de Guanabara, quem avistou o menino foi a ajudante do orfanato Bruna, não muito depois de tomar um banho causado por uma pequena onda formada com a mana dele.

 

Gente... Não sei vocês, mas se eu tomo um banho causado por um bebê, eu jogo ele no mar. Se ele foi capaz disso, pode se virar sozinho. Sou má mesmo. Podem me criticar.

 

Depois correria para salvá-lo, é claro. Sou má, mas nem tanto.

 

Depois de perceberem que não conseguiriam impedir que Suellen viesse com eles, começaram a amarrar uma corda em uma árvore próxima para que pudessem voltar à superfície.

 

Com tudo pronto, eles começaram a descer: Cris foi na frente com um pulo, seu amigo estava logo atrás descendo rapidamente, Suellen, ao descer caiu em cima de Michel.

 

— Desculpa! — disse imediatamente após sua queda.

 

— Ai, ai... — Michel tentava levantar enquanto falava. — Não tem problema, mas pode sair de cima de mim, por favor?

 

— Ah! Desculpa! — A menina levantou-se de forma rápida com um sorriso cabulado. — Eu... eu...

 

— Oi! Sem querer interromper os pombinhos aí, mas tem como vocês virem aqui rapidinho? — a voz de Cris estava fraca, vinda de longe.

 

O túnel estava mais claro, pela luz do sol que entrara pelo buraco, mas quanto mais aprofundavam pela passagem a luminosidade ficava mais escassa.

 

Curiosamente, o túnel ficava maior com o andar dos nossos personagens. A passagem começava com pouco mais do tamanho das crianças e naquele momento já estava com cerca de cinco metros.

 

Não me pergunte como isso é possível, talvez isso seja o que as pessoas chamavam naquela época de “carro de palhaço.” Eu acho...

 

Até que por fim, eles chegaram onde Cris os aguardava.

 

— Então é aqui que você estava? — disse Suellen enquanto tirava os braços entorno do braço esquerdo de Michel, que estavam “grudados” durante sua caminhada até aqui.

 

— Vocês não viram nada, olha só isso. — Cris estalou os dedos e uma leve faísca elétrica surgiu.

 

— Você pode controlar sua mana agora? — perguntou Michel ao colega.

 

— Eu tenho treinado. Ainda não posso fazer muita coisa, mas posso iluminar esse lugar pelo menos — respondeu Cris sucintamente. — Afastem-se!

 

Depois que seus amigos deram uma boa distância, ele bateu palmas e um grande raio caiu iluminando o local.

 

Dava para ver uma parede estranha com diversas marcações.

 

— Nossa! Você consegue fazer até isso! — disse Suellen admirada.

 

— Você nem me chamou para treinar contigo — reclamou Michel.

 

— O que você acha que aconteceria se juntássemos os meus raios e as suas águas? — Cris respondeu a própria pergunta. — Teríamos Michel assado.

 

Suellen ficou em silêncio observando os dois.

 

— Não me diga que está pensando na possibilidade? — perguntou Michel.

 

— Ah? Não é isso. Eu estava pensando o que era aquilo na parede.

 

— Falando agora, eu reparei algo também. — disse Michel enquanto coçava os cabelos.

 

— Aquilo é uma fogueira elétrica no canto? — questionou Suellen. — O que isso está fazendo aqui embaixo?

 

— Tem do outro lado também — falou Michel.

 

Cris usou seus poderes elétricos e acendeu as duas. Logo o local se iluminou. Agora podiam olhar com atenção.

 

Na frente deles, uma gigantesca parede que emitia uma energia estranha os impedia de prosseguir.

 

— Chegamos até aqui para nada. — lamentou Cris enquanto olhava para o local.

 

— Esses símbolos, eu reconheço. — Suellen olhava quase hipnotizada para a parede.

 

— Ah? Você conhece? Eu não consigo entender nada o que está escrito ali — disse Michel — Deve ser japonês.

 

Esse comentário, embora simples, desfez o transe hipnótico.

 

— Escuta aqui. Só porque eu consigo ler, não significa que é japonês. — a jovem repreendeu o amigo. — Não é porque eu irei me tornar uma Mangaká famosa quando crescer que eu só sei ler japonês.

 

Eu não sei vocês, mas eu adoro mangás desde criança, minha mãe lia para mim todas as noites antes de dormir.

 

— Ignore-o, Suellen. Diga o que consegue entender.

 

— Ne obliviscaris... Et aperire ostium nam eos qui credebant.

 

— Ok... E agora dá para traduzir seu japonês? — Michel perguntou ironizando a amiga.

 

— Isso não é japonês, é alguma outra coisa...

 

Não, isso não é japonês, isso é... Japonês. Fala sério né.

 

— E o que isso quer dizer? — perguntou Cris.

 

— A porta se abrirá... para aqueles que acreditam.

 

— Porta? — Cris olhou para a parede com curiosidade. — Espera! Isso aqui é uma porta?

 

— Como assim ela vai abrir se acreditarmos? — questionou Michel.

 

Possivelmente algumas pessoas podem ter imaginado, mas a porta era feita de mana pura. O que tornava impossível abrir de formas... convencionais. Não que eu ache que simplesmente acreditar que possa abri-la iria funcionar, mas nunca se sabe.

 

A tentativa parecia inútil, simplesmente acreditar que pode abrir algo.

 

Por isso, tentaram fazer de tudo um pouco com a porta: empurraram todos juntos com força, chutaram, atacaram raio nela, pediram por favor, ordenaram, choraram, fizeram a dança da chuva.

 

Nada disso deu certo, óbvio. Mas não impediu de tentarem mais algumas coisas idiotas, coisas que pouparei meus leitores de saberem, e eu de escrever... Afinal, se eles não têm vergonha alheia, eu tenho.

 

— Não adianta nada, já tentamos de tudo — disse Suellen cansada.

 

— Não podemos desistir — falou Cris. —, agora que chegamos até aqui.

 

— Tem alguma ideia então? — perguntou Michel.

 

Cris não tinha nenhum plano, mas precisava abrir aquela porta de qualquer maneira. Finalmente uma aventura apareceu na sua frente e ele não iria largar assim tão fácil.

 

Enquanto Cris e Michel estavam pensando em uma ideia que ainda não tiveram.

 

Uma que não seja idiota, espero...

 

Suellen passou a mão sobre o seu coração que estava muito acelerado.

 

Uma luz azul começou a brilhar debaixo da camisa da menina. Vinha de um colar com uma pedra em formato de coração da mesma cor com cerca de quinze centímetros, que estava escondido por baixo da camisa.

 

Ao perceber a luz, a menina puxou o colar e o local ficou com um tom azulado.

 

— Esse colar — observou Cris ao olhar para a menina e depois para Michel, então novamente para Suellen. — Vocês dois estão nesse nível já?

 

— Hã? Do que está falando? — indagou Michel.

 

— Nada, não.

 

O colar que Suellen exibia era originalmente de Michel, mas agora era dela, um presente valiosíssimo que simbolizava realmente o quanto um gostava do outro.

 

Uma história romântica, sobre um amor puro de duas crianças, realmente linda. Que farão vocês lembrarem do seu primeiro amor.

 

Não que eu saiba algo sobre romance, não tenho tempo para essas coisas. Tenho que... terminar esse livro, por exemplo.

 

Se eu contar essa historia agora, não acabarei essa parte, então vamos deixar para outro momento, prometo que conto no próximo capítulo.

 

A luz cessou. Os três olhavam para o colar.

 

— O que foi isso? — todos disseram em uníssono.

 

— Está tudo bem contigo, Su? — perguntou Michel.

 

— Estou. Não sei bem o que aconteceu agora, mas não podemos desistir. Eu acredito. — Ela colocou uma das mãos a frente.

 

— Se você acredita, eu também vou. — Michel colocou uma das mãos na parte de trás da cabeça e abriu um largo sorriso. Em seguida colocou a outra em cima da mão da amiga.

 

Os dois olharam para Cristiano aguardando ansiosos.

 

— Ahn? — Cris ficou surpreso e levemente tímido — Idiotas, é claro que eu acredito. — Por fim colocou a sua mão em cima da dos amigos.

 

Um ruído estridente preencheu o túnel.

 

— Que barulho terrível! — disse Michel depois de tampar os ouvidos.

 

Logo em seguida, a porta abriu no meio. O som continuou até que a passagem ficou liberada.

 

— É sério isso? — Cris coçava a cabeça, sem entender o que aconteceu.

 

O colar cessou novamente sua luz, embora ninguém tenha reparado quando este voltou a brilhar.

 

Nem eu.

 

— Bom, vamos nessa. — Cris fez um sinal para ambos avançarem com ele.

 

Michel o seguiu de perto e Suellen também, até um determinado ponto.

 

Ao chegarem do outro lado, Cristiano logo reparou no pedestal ao centro da sala, na verdade não havia muito mais a ser visto além de inúmeras inscrições no mesmo idioma que estava cravado na porta.

 

— Não. — Suellen tocou com a mão esquerda sua cabeça — Tem algo errado. — após cair de joelhos, colocou o braço entre sua barriga — Tem algo maligno aqui.

 

Sem perceber o que acontecia com a colega, Michel ficou curioso e foi até o centro da sala com o amigo.

 

O pedestal era simples, provavelmente feito de madeira, continha uma esfera escura no epicentro.

 

— Eu vou tocar! — anunciou Cris, sem dar tempo para negarem.

 

Ao encostar no objeto, a esfera começou a clarear, ganhando uma luminosidade amarela.

 

Aparentemente sua habilidade era sugar a mana do usuário, já que Cris era um usuário de eletricidade a cor ficou amarela.

 

Não que essa seja a única habilidade desse troço ali. Por experiência própria eu posso dizer, fiquem longe de algo que suga mana.

 

Cris retirou a esfera do pedestal e a levantou por cima de sua cabeça.

 

Só eu que acho que eles não deveriam ter feito isso?

 

Ambos olhavam encantados para o objeto.

 

— Deixa eu também, deixa! — Michel se empolgou com o possibilidade de poder testá-lo.

 

— Sem chance, deixa a Suellen primeiro.

 

— Ahn, por quê?

 

— Seja educado e deixe ela pri...

 

Cris iria terminar de falar, quando viu a amiga no chão. Ele correu até ela com Michel.

 

Quando chegaram, perceberam que a menina estava desacordada. Ambos tentaram acorda-la sem sucesso.

 

— Su! — Michel segurava a colega com força. Com ela em seus braços, o jovem percebeu o quanto a menina estava suando, embora dentro do túnel estivesse frio. — Acorda, Su!

 

— Michel — Cris cutucava o colega sem parar. —, aquela estatua estava ali antes?

 

— Que estátua?

 

Ao se virar, Michel notou uma estátua de cerca de um metro e sessenta de altura, completamente coberta com um manto branco.

 

— Vocês não deviam estar aqui! — disse a estátua.

 

A voz era firme e demonstrava autoridade.

 

Sinceramente, não sei o que é mais bizarro, a estátua poder falar, ou falar português.

 

— A estátua falou?! — disseram ambos ao mesmo tempo.

 

— Devolvam! — A estátua apontou para a esfera nas mãos de Cris. — Devolvam, ou serão punidos.

 

Eu não queria dizer, eu te disse, mas... Na verdade queria sim; eu te disse.

 

— Não vou devolver nada! — Cris se agarrou firmemente a esfera. — Uma estátua não manda em mim!

 

— Quem disse que eu sou uma estátua? — a “ex-estátua” falou retirando o capuz de seu manto, revelando uma linda jovem de olhos puxados de aproximadamente quinze anos. — Talvez isso seja impossível de evitar.

 

A jovem começou a se aproximar lentamente dos dois garotos. Em seu olhar uma visão fria quase congelante era vista pelos meninos.

 

Enquanto a jovem avançava Cris pensava:

 

“Tenho que fazer algo, tenho que fazer algo...”

 

— Eu não vou deixar! — Cris se colocou a frente dos amigos — Não se aproxime mais! Ou.

 

— Ou? — a jovem perguntou sem deixar transparecer nenhuma emoção.

 

— Eu usarei toda a minha mana para acabar com você! — enquanto Cris falava, uma fina linha amarela apareceu cobrindo o seu corpo.

 

Essa é uma técnica extremamente simples de se realizar, embora muito poderosa, que expele toda a mana pelo corpo do usuário, permitindo um poderoso ataque final; normalmente treina-se bastante para poder usar de forma eficaz, já que, após o seu uso, a pessoa ficaria sem mana.

 

Claro que neste caso, ele liberou instintivamente sem saber o que está fazendo.

 

A jovem parou, apenas observando a energia que saía do garoto.

 

— Me mostre... me mostre se a sua luz é forte o suficiente para me alcançar. — A adolescente desafiou o garoto com seu olhar frio.

 

— Toma essa! — Cris colocou as duas mãos para frente e uma grande luz amarela se fez presente.

 

Michel observava surpreso e encantado com a capacidade do amigo de usar suas habilidades.

 

— Trovão Final!

 

Um raio gigantesco saiu em altíssima velocidade de suas mãos, em direção a garota ameaçadora a sua frente.

 

A jovem fechou os olhos e antes do golpe acertá-la, colocou a mão direita em seu manto.

 

O raio atravessou a sala até a parede do outro lado, fazendo uma enorme onda de poeira se espalhar pelo local.

 

— Eu avisei — Cris tentava se manter em pé com toda força que lhe restava. —, eu acertei.

 

Ao terminar de falar isso, virou-se para Michel, fez um sinal positivo e disse silenciosamente para o amigo: “Eu consegui.”

 

Michel sentiu uma mistura de sentimentos. Ficou muito feliz ao saber que o colega conseguiu aprimorar seu controle a esse nível, mas também ficou com inveja, pois sabia o quanto ainda estava longe de conseguir fazer isso.

 

— Nada mal — disse a jovem que reapareceu intacta entre Cris e Michel —, mas não é o suficiente.

 

Tudo aconteceu tão rápido que Michel não conseguiu ver nada. Nem o momento que ela apareceu em sua frente, nem o momento em que sacou a espada de seu manto, muito menos quando a usou para acertar o amigo.

 

Só conseguiu reparar em algo quando ouviu o barulho da espada encostando-se no couro da bainha. A partir desse momento, tudo passou em câmera lenta. O sangue do colega espalhando-se pelo chão, a garota guardando a espada no manto, Cris caindo lentamente até que seu rosto encostasse o chão poeirento.

 

Michel não acreditava no que via, seus olhos observavam atônitos os olhos sem vida de seu rival.

 

— Cris!!!

 

— Sua vez — disse a adolescente completamente sem emoção, como se tivesse acabado de cortar uma fatia de mortadela ao invés de órgãos internos.

 

Hum... Um pãozinho com mortadela agora cairia bem... Ops! Desculpem-me foi insensível da minha parte, mas que deu fome deu.

 

Michel pensava em diversas coisas em sua cabeça:

 

“Não consigo ver nenhuma emoção em seus olhos”, “Será que ela não tem alma?”, “Ela vai me matar!”, “Tenho que fugir agora, mas minhas pernas não se movem!”, “Mexam-se, mexam-se, droga!”

 

Ao dar o primeiro passo, a jovem foi interrompida por algo que agarrou em sua perna. Era a mão de Cris.

 

— Não... vo... dexa. — As palavras saíam diferentes do que ele gostaria, provavelmente devido as diversas hemorragias que teve. — Michel, save... Sulle...

 

Neste momento Michel percebeu que o medo de uma morte eminente o fez esquecer de sua amiga desacordada em seus braços. Só ele poderia salvar ela agora.

 

— Ainda está vivo? — A jovem olhou de soslaio.

 

— Desculpe por deixar você aqui. — falou enquanto reunia forças não sei de onde, para carregar Suellen. — Eu voltarei com ajuda.

 

— Do qe... está faland... Quando volt... eu já... vencido...

 

— O que acha que pode fazer com o seu corpo nesse estado? — perguntou a adolescente de forma clara.

 

Michel começou a correr o mais rápido que pôde carregando Suellen, sem olhar para trás em nenhum momento. O que não impedia as lágrimas jorrarem de seu rosto.

 

— Acha que vou permitir? — uma aterrorizante aura de mana transparente podia ser vista pelo braço da jovem — Sumam!

 

Um gigantesco tornado arremessou os dois para fora do túnel.

 

Certo. Só um momento agora, vou recuperar o fôlego.

 

Algum tempo depois.

 

Michel acorda deitado sobre a grama. Ao se levantar, ele observa o redor, tentando lembrar o motivo de ter dormido no meio da floresta.

 

Nuvens negras cobriam o céu, uma tempestade estava para começar no centro do Rio de Janeiro, porém para Michel uma tempestade já havia acontecido.

 

Então, as dolorosas memórias vieram a sua mente como um flash. Imediatamente, começou a procurar pela amiga Suellen, mas não a encontrou em lugar nenhum.

 

Ao tentar se levantar, sentiu uma dor aguda na cabeça, onde um pequeno galo se formou, provavelmente bateu-a em algum lugar depois de ser jorrado para fora do túnel.

 

— O túnel! — O jovem foi até o local onde deveria ficar a entrada, mas...

 

Aonde deveria estar a abertura, haviam diversas pedras cobrindo a passagem. Sem dúvidas o tornado causou um desmoronamento, e agora o túnel estava inacessível.

 

Embora fosse óbvio isso, Michel tentou desesperadamente abrir caminho tirando pedra sobre pedra, o que foi inútil, é claro.

 

Ele não estava em condições para levantar as pedras grandes e mesmo que tivesse adiantaria de algo? Agora certamente seu amigo estava morto.

 

— Não!! — Seu choro foi inevitável, suas palavras subsequentes também.

 

— Se eu fosse mais forte. Poderia salvá-lo.

 

Depois de um trovão agitar o céu, começou a chover.

 

O garoto ficou observando a chuva cair sobre seu corpo, queria que a tempestade o levasse para bem longe, não importava para onde, só queria sair daquele lugar.

 

A chuva só aumentava, suas roupas ficaram rapidamente encharcadas, madame Silvia daria uma bronca nele quando voltasse.

 

— Espera. Tia Silvia! — O menino lembrou do orfanato. — Quem sabe Suellen esteja lá.

 

Tirou novamente forças não sei de onde e avançou em direção à sua casa.

 

Seu corpo estava cheio de cortes leves, como se tivesse sido cortado por uma faca pequena, nada muito profundo, mas doía o bastante para limitar seus movimentos e velocidade.

 

A chuva também não ajudava, tornava o chão ficar mais escorregadio, o que fez Michel tropeçar algumas vezes ao longo do trajeto.

 

Mesmo com todos os contras, ele avançava até sua última esperança.



No meio do caminho, ele percebeu algo estranho, havia muita fumaça no céu naquela direção. Mesmo sem saber o motivo, seu coração ficou mais apertado. Chegando cada vez mais perto, o pânico tomou completamente conta dele ao ver a causa.



E então seus olhos se voltaram para as chamas que preenchiam até o céu.

 

Chamas que queimavam não só seu presente, mas principalmente seu passado.

 

Até o próximo.

 

Você pode fazer a diferença? Então faça.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

No próximo capitulo:
 
Queimando o passado

E ai o que acharam desse capítulo? Quero saber a opinião de vocês. Merece uma recomendação? Ou pelo menos um favorito?
Não se esqueçam de comentar, eu não mordo. kkk