Três dias e um quarto escrita por Yuki Max


Capítulo 4
Dia 2 – Surpresas, clichês e confissões doloridas como feridas abertas


Notas iniciais do capítulo

Olá, olá, *.*

obrigada por ler!!!!
Pra quem quiser, a música "3 Rounds and A Sound", Blind Pilot, vai bem com este capítulo!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/751802/chapter/4




Dia 2 – Surpresas, clichês e confissões doloridas como feridas abertas 


O que Hitoka Yachi mais odiava no mundo, odiava acima de qualquer coisa – exceto, talvez, o sentimento de que não fizera o bastante quando mais poderia ter feito, a certeza de que não tinha absoluto controle sobre sua vida e o reconhecimento da própria imaginação como centro gerador de caos – era o quão absurdamente fácil sua autoconfiança afundava-se em ansiedade sem que ela nada, absolutamente nada, pudesse fazer contra.  

As mãos agitadas desamassando repetidamente o vestido já perfeitamente liso, os lábios pressionando-se apertados um ao outro, os dedos inquietos coçando para afundarem-se na caótica bolsa de mão em busca do pequenino espelho para outra vez checar o cabelo: Yachi odiava, realmente odiava, como desde o momento no qual deixou a pequena sorveteria com Hinata e Kageyama no fim da tarde do dia anterior até o preciso instante no qual viu a si mesma, ofegante e expectante, refletida na vitrine de uma charmosa cafeteria no centro da cidade às exatas quinze para as dez daquela manhã não deixara um só instante – nem um mínimo instante sequer – de pensar no quanto gostaria de parecer para Kiyoko Shimizu tão bonita quanto Kiyoko Shimizu parecia para ela e no quão pouco provável era que isso acontecesse.  

E ela tentara, realmente tentara, negar que era isso – tão somente e inexoravelmente isso – a guiar cada um de seus passos desde a tarde anterior. Encarando o próprio reflexo, metida em seu melhor casaco e com os pequeninos pés apertados ainda menores no sapatinho negro, contudo, não havia mais forma de negar: estar bonita era tudo o que, durante as vinte horas em que seu relógio correra apressado para encontrar com o de Kiyoko, conseguira pensar.  

Uma hora e meia indecisa na lojinha de maquiagens. Outra meia hora com os olhos enormes nas brilhantes bijuterias. Vinte minutos para a preparação da saladinha que em menos de cinco minutos devorou. Quarenta minutos esvaziando quase por completo o pequeno guarda-roupas. Trinta minutos em frente ao espelho com pincéis em mãos. Vinte minutos afundando-se na pilha de roupas na cama, os lábios borrados e olhos formigando. Oitenta minutos com o estômago roncando, vagando inquieta entre perfis de redes sociais, perdida entre sorrisos que já chamara de seus e sorrisos que desejava que seus fossem. Noventa minutos mergulhada entre lençóis repetindo as imagens coloridas das fotos que, em preto-e-branco, em looping veria por trás de suas pálpebras cerradas por todo o restante da noite.  

Não que o resto da noite tanto tivesse sido.  

O resto da noite fora o bastante para apenas um par de sonhos e outro de olheiras. 

Antes mesmo de dar-se conta, seus olhos, pesados e doloridos, outra vez abriam-se.  

Um minuto quase completo foi o tempo que o despertador tocou, e cinco minutos arrastados dentro de cobertores foi o que precisou para definitivamente obedecê-lo e levantar-se. Os seguintes quinze mal calculados minutos foram plenamente gastos debaixo da água no chuveiro, entregando-se à lembrança contínua de tudo o que por momento algum esquecera enquanto da janelinha pequena do banheiro espiava o dia que ousadamente prometia sol. 

O cabelo, programado para penteado bonito com o secador velho, secou sozinho quase que por completo enquanto demorava-se a novamente esvaziar todo o guarda-roupas. E, enquanto o casaco bonitinho que ganhara no Natal anterior esperava, perfumado, sobre a cama bagunçada, com o estômago tal qual furacão repetiu os mesmos traços já treinados com os pincéis diante do espelho. Os fios loiros foram então trançados com cuidado antes que uma fita colorida os envolvesse em um laço e, também antes de envolverem os sapatinhos os pés pequeninos, também cuidadamente três curativos foram lá colados. Já de pé, espirrou o perfume outra vez no casaco e uma vez em cada um dos pulsos antes de apressada encaixá-lo de volta na penteadeira velha, onde, diante do espelho, checou uma última vez a maquiagem leve, o batom comprado no dia anterior brilhando nos lábios que abriram-se em um suspiro pesado...  

... O último que Yachi soltou dentro do pequeno apartamento que até dias atrás dividia com a ex-namorada.  

O próximo escapou apenas dentro do metrô. Ainda mais pesado que o anterior. 

E o outro, inacreditavelmente ainda mais pesado, apenas quando viu a si mesma, com a maquiagem nova, o casaco bonito e os sapatos apertados, refletida na vitrine da cafeteria cujo endereço, ainda em seu aplicativos de mapas, fora enviado na noite anterior por Kiyoko Shimizu. 

A partir de então, permitiu-se começar a inspirar, apenas, e soltar o ar bem devagarzinho.  

Inspirou e checou o horário.  

Inspirou e remexeu-se inquieta sobre os sapatinhos. 

Inspirou e lançou primeiro um olhar para dentro da cafeteria, depois ambos os olhos ao céu.  

Fazia um dia bonito, ainda mais bonito do que prometera ser quando espiado através da pequena janela do banheiro. Não dos preferidos de Yachi – tão mais inclinada a saias do que a casacos – mas, ainda assim, bonito o bastante para roubar a atenção de seus olhos por mais tempo do que normalmente roubaria. Há dias não via o sol brilhar daquela forma e, fosse por ele ou pela quantidade de ar com que preenchera seu peito, Yachi quase sorria ao notar o quão menos melancólica tornava-se Tóquio quando iluminada por ele.  

Ainda fazia frio, porém. Frio o bastante para que apertasse firme os braços em volta do corpo em busca de calor e deixasse o olhar vagar do céu para um dos chocolates-quentes expostos no colorido cardápio exposto em frente à pequena cafeteria.  

Raríssimas vezes estivera em restaurantes naquela região. Não era algo que seu apertado orçamento permitisse com frequência. O tipo de restaurante que exibia produtos sem preço nos cardápios não era o tipo de restaurante que alguém como ela – a quem os preços não poderiam ser considerados irrelevantes o bastante para sumirem do menu – frequentava. Mas não podia negar que, apesar das falhas no cardápio, aquele era o tipo de lugar que a agradava. O cheiro do café, a decoração intimista, as cores vibrantes nas poltronas, as xícaras grandes, os sorrisos quentinhos das pessoas do lado de dentro: Yachi sentia-se grata por começar o dia em lugar que tão doce parecia. Principalmente porque, no fim, não fazia a mínima ideia de como seria aquele encontro. 

O estômago pesou, o peito outra vez preenchendo-se de suspiros, pequenas asas farfalhando em seus pulmões. 

Encontro 

Encontro 

Encontro 

Inspirou outra vez, soltando o ar pelo nariz em risadinha baixinha. 

Era bobagem, ela sabia. Bobagem que estivesse tão nervosa e bobagem o quanto havia se preparado para aquele dia. A maquiagem nova, a salada, a insônia, o banho longo, a trança cuidadosa, o casaco bonito, os pés apertados: ela sabia, sabia muito bem, o quanto era bobagem desejar que aquele fosse o tipo de encontro que justificasse tudo o que fizera.  

Não um encontro profissional.  

Não um encontro para trazer de volta a ex-namorada. 

Um encontro de verdade. 

Um como há tempos não tinha. 

Um que deixasse também a outra parte ansiosa. Um que justificasse seu coração disparado e sua boca seca. Um que começasse com lábios perfeitamente maquiados e terminasse com batons borrados.  

Bobagem, ela sabia. 

Aquele não era esse tipo de encontro.  

E nem deveria ser.  

Porque outra das coisas que sabia era que, independente de quantos minutos tivesse gasto na lojinha de bijuterias, o único adorno em seu corpo continuava a ser a já conhecida correntinha no pulso direito. E que, independentemente do quanto tivesse sonhado acordada com os sorriso discreto de Kiyoko, o sono inundou-se apenas com o sorriso aberto de cerveja brilhando enorme embaixo de luzes de festas.  

Mas, ainda assim, apesar de tudo, ela desejava.  

Porque era bobagem do tipo que ela não queria querer evitar. Daquelas que valem a pena mesmo sendo tão bobas. Daquelas que gelavam o fim do estômago e enchiam de verão seu peito.  

Era perigoso, claro – e disso ela também sabia –, esperar com sorriso tão brilhante pelo momento no qual os ponteiros dos relógios encontrassem o horário marcado. Perigoso esperar que Kiyoko também esperasse por tudo o que esperava. Tão perigoso que mal conseguia conter o coração apressado e as mãos suadas. Mas, ainda assim, mesmo assim, também assim, não se sentia tão culpada quanto sabia que deveria sentir-se por não deixar que as expectativas fossem embora. Não achava que fazia assim tão mal por querer estar bonita ao ponto de arrancar de Kiyoko sorrisos, nem que sorrisos apenas simpáticos. Porque, independentemente de qualquer pulseira ou sonho ou motivo que a levasse até ali, era por Kiyoko que esperava – apesar das aulas que perderia perdidas e do pouquinho de medo que ainda sentia – bonita como há meses não sentia-se.  

E isso valia a pena. 

Por isso, quando seu relógio finalmente encontrou-se com o relógio de pulso da garota que a passos rápidos se aproximou e, ofegante, segurou suas mãos, Yachi não pode evitar que um sorriso enorme invadisse seus lábios cobertos pelo batom novinho, um sorriso como há muito, muito tempo, mais tempo do que ela lembrava-se, não dirigia a um encontro. Sorriso que não deixou seu rosto em momento algum. Tornando-se cada vez mais largo. Recebendo quando em quando uma mordidinha envergonhada ou um bico divertido, mas, ainda assim, não sumindo em momento algum.  

E isso era para Yachi uma novidade. Uma enorme novidade.  

E não que desfamiliarizada a encontros fosse. Já estivera em muitos deles. Muitos. Tantos quanto uma garota lésbica de uma cidade pequena pode ter ao mudar-se para Tóquio. Mas, ainda assim, um encontro – ainda mais um profissional – recheado de tantos sorrisos, era algo a que ela não estava acostumada.  

Principalmente porque não eram apenas os seus lábios que sorriam... 

Kiyoko sorria ao acompanha-la no croissant de chocolate pedido junto ao café. Kiyoko sorria de seu rosto sujo de migalhas. Kiyoko sorria ao bebericar por engano seu café. Kiyoko sorria ao contar histórias dos colegas da faculdade. Kiyoko sorria ao elogiar seu batom. Kiyoko sorria ao pedir mais comida. Kiyoko sorria para suas piadinhas ruins sobre restaurantes sem preços no menu. Kiyoko sorria enquanto completava que restaurantes assim nunca escreviam “cardápio” nos cardápios. Kiyoko sorria para suas tentativas de adivinhar o que fariam naquele dia. Kiyoko sorria ao recusar-se a contar. Kiyoko sorria, com os olhos brilhando tão mais que o dia acinzentado do dia do lado de fora, ao prometer surpresa.  

Surpresa 

Surpresa era, sem qualquer sombra para dúvida, mesmo depois de muito procurar, a única palavra que, estupefata, Yachi conseguia encontrar para descrever o que sentia.  

Desistiu da procura, portanto. E aceitou. Aceitou de bom grado por tudo o que aquela garota de feição doce e voz séria planejara para aquele dia. 

Até mesmo porque, talvez mesmo insistindo, insistindo muito, insistindo com o máximo de sua imaginação perigosíssima, talvez nem mesmo assim teria conseguido imaginar para onde guiariam-na os dedos quentinhos de Kiyoko Shimizu quando entrelaçaram-se aos seus para apontarem para tantos lados diferentes e desconhecidos da Capital do Leste.  

Porque, ah, sim!, Kiyoko realmente entendia de surpresas. Não o inacreditável, ou o improvável, ou o impossível, mas o que verdadeiramente surpreendia: o descartado. E foi isso o que Kiyoko entregou a ela naquela mais uma vez ensolarada quarta-feira: justamente o que Yachi já havia descartado como possibilidade.  

Kiyoko entregou a Yachi um encontro. 

Um de verdade. Um daqueles que ela havia se culpado por desejar. 

Um tão clichê que nem mesmo Yachi pôde acreditar ser seu.  

Ou, ao menos, até sentir o gosto de pipoca amanteigada espalhar-se por sua língua e a mão fria de Kiyoko buscar pela sua enquanto na tela imensa outra das cenas do filme de suspense que há dias queria assistir passava. Ou até sentir todo seu corpo contrair de felicidade ao escutar tão perto de seu ouvido o riso baixinho de Kiyoko para alguma coisa à qual não prestara atenção. Ou, talvez, até rir envergonhada da bronca que juntas levaram por conta dos comentários que em voz alta faziam.  

Então aí, talvez só aí, pode finalmente acreditar que, sim!, Kiyoko a levara para o cinema.  

E quis, realmente quis, perguntar a ela o que planejara com aquilo, perguntar como aquilo contribuiria para a volta do amor há apenas dois dias de distância, mas, então, todo o tempo que tomara alimentando sua ansiedade parecia ser cobrado de volta por Kiyoko e, antes que pudesse formular suas perguntas, era invadida por perguntas dela. 

O que achara do filme. Qual seu gênero de filme favorito. Se tinha atores e atrizes prediletos. O que achara da trilha sonora. Se assustara-se também naquela cena. Se não achava injusto que filmes de suspense tivessem cenas assustadores quando em vez. Se tinha medo de filmes de terror. Se gostava de romances. Se também ficava preocupada quando lia “baseado em fatos reais” em todo início de filme, fosse de amor ou terror.   

Tantas e tantas perguntas, sem que nenhuma delas, contudo, tivesse qualquer relação com amores trazidos de volta. 

E, respondendo-as todas, via-se sem tempo para retrucar com suas próprias indagações enquanto outra vez era arrastada através de Tóquio, um sorriso – um enorme, dos que há tempos não invadia seu rosto – ocupando seu rosto ao perceber-se na fila de ingressos de uma parque de diversões. 

“Você é inacreditável”, queria dizer, em meio a todas as outras coisas que também queria dizer. Mas, assim como antes, só respostas saiam de sua boca.  

Qual era seu brinquedo favorito. Se tinha medo de altura. Se enjoava na montanha-russa. Se depois de toda pipoca do cinema ainda tinha espaço na barriga para algodão doce. Se era boa no tiro ao alvo. Se achava que seria traição as duas ex-gerentes do time de vôlei de Karasuno tentarem acertar cestas de basquete. Se sabia que aquela montanha-russa era atualmente a segunda mais rápida do Japão.  

E Yachi respondia a tudo sem hesitação, mesmo que quando em quando suas sobrancelhas franzissem em dúvida.  

Havia muito, muito, muito tempo que não falava tanto de si mesma e, sinceramente, sequer sabia se havia tanto a ser dito ou se o que diria seria realmente relevante. Kiyoko seguia, contudo, perguntando e piscando interessada para cada uma de suas respostas, interferindo vez em quando para entregar sua própria opinião ou pedir por mais detalhes, ouvindo-a como se realmente sua opinião fosse do mundo o mais importante.  

— Carrossel? 

— É ok... 

— Mas nada daquelas xícaras giratórias? 

— Acho que não... Giram muito rápido... muito rápido! 

— Carrossel também gira rápido... 

— Não o infantil!  

— É, o infantil não... Queda-livre? 

— Ok, também. 

— Mas é ainda mais rápido! 

— Mas é em uma direção só! 

— É! Para baixo, em direção ao chão a uma velocidade absurda. 

— Mesmo assim... uma só direção! 

— Roda-gigante? 

Corou um pouco. Rodas-gigantes eram um clichê tão grande em encontros em parque-de-diversão que não pôde deixar de sorrir pequenino. 

— Rodas-gigantes são legais. – sussurrou, corando ainda mais quando Kiyoko riu baixinho. 

— Elas são mesmo... – concordou, a voz risonha alongando ainda mais o sorriso de Yachi – Trem-fantasma? 

— Eu não tenho problemas... – deu de ombros, o olhar então a vagar pelo parque desviando-se até o rosto da garota a seu lado – Mas tem certeza que você quer ir? Você estava com medo no cinema, não é?  

— É diferente. – replicou, as sobrancelhas levantando-se indignadas e um pequeno bico surgindo nos lábios sorridentes – No cinema há um clima gerado pelo suspense. Em trens-fantasma você sabe o que acontecerá e está preparada! 

— Ok. A gente pode ir, então! Agora? – provocou, divertida, enquanto com a mão protegia os olhos do sol em falsa e exagerada busca pelo brinquedo. Busca encerrada bruscamente por um puxão em seu pulso. Não pode evitar sorrir quando Kiyoko gentilmente entrelaçou com os dedos seu pulso e em direção contrária a puxou.  

— Depois... – sussurrou baixinho, visivelmente envergonhada, correndo os olhos ao redor – Que tal montanha-russa? 

— Montanha-russa! – a resposta que escapou por entre seus lábios, animada, emoldura por sorrisos, expectante, em nada condizia com as voltas que seu estômago deu ao ouvir a sugestão de Kiyoko. Muitas delas, muitas mais do que provavelmente tinha a montanha-russa para a qual agora via-se arrastada.  

Por um instante, bem breve instante, precisou conter o impulso de perguntar se Kiyoko realmente ouvira o que dissera sobre brinquedos rápidos demais e com mudanças bruscas de direção, incapaz de acreditar que a garota a seu lado realmente propusera com tal expressão relaxada para que fossem para o brinquedo, dentre todos os outros no parque, que mais se encaixava nessa categoria e que mais, portanto, a fazia tremer de medo. Um olhar, contudo – apenas um – na direção de Kiyoko Shimizu foi o bastante para que mantivesse seu medo apenas para si mesma.  

Os olhos acinzentados brilhavam tão bonitos ao refletirem as luzes do brinquedo que pouco a pouco acendiam-se em reação ao entardecer que não pôde fazer nada a não ser deixar-se conduzir, torcendo para que a garota que ainda segurava seu pulso não percebesse o quão intenso tremiam suas mãos.  

Mãos que tremeram o tempo todo, desde o momento no qual puseram-se a esperar na considerável fila para embarque, até o instante no qual desembarcou com os olhos desesperados em busca de um banheiro no qual pudesse colocar para fora toda a pipoca, maçã-do-amor, refrigerante, algodão-doce e docinhos que comera nas últimas horas. Mãos que, mesmo trêmulas e suadas a ponto de deixaram-na envergonhada, não foram soltas em momento algum, permanecendo seguramente presas às mãos de Kiyoko Shimizu. 

E ela quis rir, verdadeiramente quis, mesmo com o estômago repetindo vertiginosamente todos os looping da montanha-russa, enquanto Kiyoko brigava com ela por não ter dito que não queria ir ao brinquedo e a arrastava até um banco, obrigando-a a sentar-se e respirar fundo. Não riu, contudo, porque, no fundo, bem no fundo, não conseguia acreditar o bastante que tudo aquilo era real para poder tão facilmente rir. Havia um lado seu que não podia acreditar que aqueles olhos zangados mas complacentes, aquela voz briguenta mas apaziguante e aquelas mãos reconfortantes mas firmes eram direcionados realmente para si. 

Manteve-se quietinha, portanto, a cabeça entre os joelhos e os olhos bem fechados, envergonhada. 

— Tem certeza que não quer vomitar? – dedos carinhosos escorregaram por seus cabelos, afagando-os suave. Acenou em negativo, apenas, certa de que responder com sua própria voz não seria uma boa ideia – Pronta para ir de novo, então?! 

O tom risonho a pegou de surpresa, arrancando de seus olhos uma piscada rápida e de seus lábios um riso inesperado. Os olhos subiram arregalados e confusos até o rosto de Kiyoko Shimizu e o sorriso não pode fazer nada que não alongar-se.  

Kiyoko ria misto de preocupação e provocação, as mãos em seus cabelos escorregando para a ponta de sua trança, os dedos brincando suavemente com ela, alisando os fios que a montanha-russa desarrumara. 

— Ou acha melhor tentar algo mais rápido desta vez? 

— Acho que quero meus pés no chão, por enquanto, obrigada. – apressou-se em responder, ambos os braços em volta da barriga e um sorriso incrédulo. 

— Justo. – sorriu Kiyoko, afastando os dedos de seus cabelos e levantando-se rapidamente.  

As mãos até então entrelaçadas a seus fios bateram algumas vezes nas roupas para limpá-las e, mesmo antes que tivesse convicção de que estava realmente bem o bastante para levantar-se novamente, Yachi era mais uma vez arrastada pelo parque.  

Tiro ao alvo.  

Sorrisos sobre falta de mira. 

Máquina de bichinhos de pelúcia. 

Discussões sobre fraudes em jogos de azar.  

Um pulo rápido na tenda de magia. 

Uma tentativa furada de desvendar um truque de carta. 

Show de mímica. 

Comparações dos tamanhos dos dedos das mãos entrelaçadas juntinhas. 

Cestas erradas na tenda de basquete. 

Comparações entre pesos de bolas de diferentes esportes e regras que nenhuma das duas conhecia direito. 

Yachi quase poderia dizer que, mesmo envergonhada pelo enjoo na montanha-russa, seu encontro continuara como antes estava.  

Quase 

As perguntas ainda estavam lá, de fato. Dezenas, uma para cada passo que juntas davam. Assim como estavam lá os olhos interessados, as piadinhas bobas, os sorrisos bonitos e os dedos que quando em quando encaixavam-se nos seus. Havia, contudo, e ela não podia mais ignorar por mais que firmemente tentasse, algo a mais. 

Os olhos que quando em vez encaravam-na sorrateiros, o sorriso que murchava, o cenho que franzia-se em preocupação, a distância dos brinquedos mais rápidos e, a mais gritante das diferenças, os dedos que às vezes desenlaçavam-se dos seus para com pressa buscarem do bolso da calça o celular que por alguns instantes roubaria de si a atenção dos olhos acinzentados. 

Não que antes não estivesse lá o celular. 

Yachi o vira sobre a mesa da cafeteria, e então rapidamente quando a deixaram. O vira, outra vez, brilhando intenso no escuro do cinema. E ainda algumas outras vezes durante nas filas dos brinquedos no parque. Sempre por apenas alguns instantes. 

Agora, contudo, ele parecia demorar-se um pouco mais nas mãos delicadas de Kiyoko. Às vezes por longos minutos, outras vezes mal voltando ao bolso antes de novamente ser tomado pela mão da garota. O barulho da vibração encontrando seus ouvidos com frequência tão grande que ela não mais podia continuar a dar-se ao luxo de ignorar. 

E Hitoka conhecia aquele padrão. Oh!, conhecia muito bem aquele padrão. Os dedos ágeis deslizando pela tela sensível, o fundo verde padrão, as figurinhas vez em quando pululando na tela: Yachi, definitivamente, sabia exatamente o que fazia a garota a seu lado. 

Mesmo que as perguntas continuassem, mesmo que os olhos ainda ouvissem atentos suas respostas, mesmo que os sorrisos ainda abrissem-se largos e mesmo que ainda tão queridas parecessem ser suas opiniões sobre todos os mais diversos assuntos, Yachi sabia, definitivamente sabia, que a atenção de Kiyoko já não era somente sua. Sabia que a dividia com a pessoa que fazia rolar a barra de mensagens do aplicativo de conversas. 

Inspirou fundo, os dedos mais uma vez soltos correndo ansiosos pela trança e pelo vestidinho, o cenho franzindo-se conforme cada uma de seus respostas tornava-se mais curta que a anterior, escapando por seus lábios como se queimando-os.  

Não tinha esse direito, sabia. Não tinha direito algum a reduzir suas palavras só porque, a seu lado, Kiyoko reduzia as dela. O melhor seria, sabia, aumentar, compensar, falar por ambas, preencher o silêncio. O melhor seria, sabia bem, que escondesse por trás delas o desconforto que, também sabia, não tinha direito algum de sentir. Não era como se, afinal, pudesse reivindicar algo. Ou, antes disso, não era como se pudesse reivindicar ainda mais do que já fizera.  

Suspirou alto, olhando culpada ao redor em seguida, receosa que Kiyoko percebesse. Não percebeu, contudo. Os olhos ainda presos na tela brilhante. 

Não, definitivamente não podia dizer nada!  

Kiyoko já fizera tanto... tanto! Passara o dia todo a seu lado. O dia todo a perguntar. A dedicar a si atenção. A procurar por assuntos de conversa. A sorrir para cada uma de suas respostas como se elas as mais surpreendentes fossem. A continuamente buscar por mais, por alguma coisinha que fosse nelas interessante. A segurar sua mão como se não fosse se importar nem mesmo se descobrisse que era lésbica.  

Fizera tanto! Esforçara-se tanto! 

Mas aquele era, no fim, o caminho natural para as coisas, não era? O único caminho possível para seu encontro... 

Sorriu resignada. 

Àquela altura, até ela mesma já teria se cansado de sua própria companhia. Não havia motivos para que Kiyoko dedicasse apenas para si atenção. Era injusto pedir por isso. Porque Kiyoko havia tentado, ela percebera. Realmente havia tentado.  

No fim, estava apenas tomando o tempo dela, e sabia disso. Um dia quase inteiro.  

E, ainda assim, apesar de tudo, Kiyoko ainda estava ali, acompanhando-a pelo parque, esforçando-se para continuar a sorrir e a perguntar.  

Devia sentir-se envergonhada por querer toda a atenção.  

Devia sentir-se grata pelo esforço de Kiyoko. 

Mesmo assim, não era assim que sentia-se. Talvez porque o peito apertara-se tão pequeno que agora quase já inexistente tornara-se, mas não podia evitar sentir que já não cabia no coração nada de gratidão nem de alívio. Só culpa, tanta quanto em sua pequeneza poderia caber.  

E, exatamente por isto, por ter culpa já a quase transbordar para fora do pequeno peito, foi que nada pode fazer para evitar que sua resposta para a sugestão de Kiyoko para que fossem na roda-gigante fosse um baixinho: 

— Eu acho melhor a gente ir embora. 

E, talvez por não de imediato ter notado que haviam sido seus próprios lábios a sugerirem tal coisa, também não foi de imediato que percebeu o que dissera nem de imediato que arrependera-se de ter dito. Precisou, antes de levar ambas as mãos em choque para a frente dos lábios, primeiro levantar os olhos até o rosto de Kiyoko Shimizu e nela sentir falta do sorriso que durante o dia todo ali estivera. Só então, só ao perceber o riso que tanto gostaria de ter mantido ali para sempre murchara por completo, substituído por choque, foi que Yachi realmente arrependeu-se do que dissera. 

Um suspiro engasgou-se, então, em sua garganta. E, se antes havia em seu peito espaço ainda para culpa, agora já não havia mais nada, nem sequer milímetro livre para nada. Tão pequeno e acuado estava que, não fosse a dorzinha aguda pulsando junto às batidas, podia jurar que o coração a havia abandonado de vez. 

Não a abandonara.  

Mas Yachi, pela segunda vez em menos de três dias, realmente torceu para que ele o tivesse feito. 

Desesperou-se. Os olhos baixando até quase cerrarem-se e as sobrancelhas apertando-se até quase doerem. O silêncio da garota que durante o dia todo a havia feito falar incrustando-se em cada mínimo pedacinho seu.  

— Desculpe, não foi isso que eu quis dizer... – sussurrou, os dedos infiltrando-se por dentro da trança bagunçada, a voz incerta em denúncia do quanto não sabia o que dizer – Não sei por que disse isso... É bobagem – a voz ainda mais mingou, a garganta fechando até quase sufoca-la. Piscou fundo, apertando os punhos e engolindo em seco na tentativa de reestruturar-se o bastante para continuar a falar. Precisava explicar-se, precisava dizer algo. Precisava preencher o silêncio até que Kiyoko algo dissesse – Estou adorado tudo aqui... Juro!... Faz muito tempo que não venho a um parque-de-diversões e sempre quis vir aqui com minha ex-namorada... Depois daqui podemos ir para as xícaras giratórias se quiser! Ou a gente pode até mesmo ir mais uma vez na montanha-russa! Quantas vezes você quiser... Eu não quero ir para casa! – cuspiu as palavras em um só fôlego, os olhos ainda fechados – Só pensei que você teria mais o que fazer... Alguém com quem gostaria de estar... Desculpe... Eu não queria tomar mais do seu tempo. Eu sei que não sou a melhor companhia do mundo... Desculpe... – sentiu a voz quebrar-se um pouco, mais uma vez como se enroscando-se à sua garganta – Não se preocupe comigo... É só frescura... Eu posso ser uma companhia melhor que isso... com certeza posso... Eu não quero ir embora se você não quiser... Desculpe... Eu... Não... Só... – inspirou fundo, rindo resignada para o quão absurdas as próprias palavras saiam ao deixar sua garganta – Desculpe... desculpe... desculpe... 

‘Desculpe’, queria ela dizer de novo. E ‘desculpe’ mais uma vez. E mais uma. E outras tantas, até que, de alguma forma, realmente não sentisse-se mais culpada.  

Os olhos que encontrou ao fitar o rosto de Kiyoko Shimizu, contudo, foram o bastante para que calasse-se de vez: antes tão cheios, os olhos cor de lua haviam minguavam devagarinho. Devagarinho. Até sumirem por completo em um expressão dúbia de dor e confusão. 

Estragara tudo – percebeu, o sorrisinho resignado crescendo em seus lábios.  

A ex-namorada certamente riria se estivesse ali, os olhos verdes tão bonitos brilhando emoldurados por sobrancelhas levemente arqueadas dizendo-lhe como nada daquilo era novidade. Como aquilo era, inegavelmente, apenas mais uma prova do talento nato que Yachi tinha para estraçalhar qualquer divertimento de qualquer pessoa com seu vitimismo. O que – por mais que Yachi quisesse negar – era inquestionavelmente verdade. 

Ela, definitivamente, estragara tudo com Kiyoko. 

Queria ir para casa. Realmente queria. E teria ido, verdadeiramente teria, se suas pernas tivessem se movido.  

Não moveram-se.  

Limitou-se, portanto, a lançar novamente ao chão os olhos, mantendo-os lá por tempo o bastante para mais uma vez querer desculpar. Para outra vez enfiar entre os cabelos ambas as mãos. Para outra vez sentir-se ridícula em seu casaquinho perfumado e sapatinhos apertados. Mantendo-os lá mesmo quando sentiu suave em seu ombro um toque, levando-os até o rosto da garota a seu lado apenas quando, devagarinho, o toque percorreu a manga de seu casaco até acabar em seus dedos, delicadamente desenlaçando-os de seus cabelos e enlaçando-os a suaves outros dedos, bem apertado. 

— Você é uma companhia incrível... – ouviu baixinho a voz de Kiyoko, tão baixinho que Yachi pensou nem tê-la ouvido – Eu... desculpe... você não tem que me pedir desculpas. Não é o que você pensou... Eu que tenho que pedir... Desculpa, Yachi, era só o Suga, era bobagem minha!... Não tem ninguém com quem eu gostaria de estar aqui além de você... Hitoka, foi minha culpa... Você não tem por que desculpar-se... Não é sua culpa, Hitoka... 

Os lábios em pequeno sorriso, o cenho ainda franzido e os olhos tão brilhantes quanto lua-cheia: a expressão de Kiyoko foi a última coisa que viu antes de cerrar os próprios olhos. Bem apertados. 

Pela segunda vez desde o término do namoro, Hitoka Yachi chorou. 

E não foi nada bonito. Nadinha.  

A maquiagem tão bonita desfazendo-se em manchas por seu rosto e suas mãos. Os soluços altos, engasgados. O nariz escorrendo. As pernas trêmulas mal segurando-a de pé. O cabelo enroscando entre seus dedos e colando em suas lágrimas. O rosto avermelhado. Os repetidos vergonhosos pedidos de desculpas. A manga do casaco bonito sujando-se de rímel. Os ombros chacoalhando em trancos. 

Nada, nadinha bonito.  

E, mesmo assim, mesmo que nem de longe lembrasse a garota bonita que desde o dia anterior quisera parecer para Kiyoko, Kiyoko manteve-se a seu lado o tempo todo, as mãos firmes esfregando de leve seus ombros, os dedos longos acarinhando suaves sua trança desfeita, até que do choro dolorido restassem apenas os olhos vermelhos, o batom borrado e os suspiros demorados. 

E mesmo que tão diferente estivesse de como gostaria de estar, pela primeira vez no dia, Yachi sentiu-se verdadeiramente leve.  

Leve o bastante para parar de fingir não saber de onde verdadeiramente vinha toda a culpa que escorria de seus olhos. 

— Eu menti pra você. – anunciou, a voz ainda cortada por soluços, rouca, os olhos baixinhos de vergonha, incapazes de encararem Kiyoko enquanto decidia que, também pela primeira vez, deveria ser sincera com a garota a seu lado. 

Um risinho pequeno alcançou seus ouvidos. 

— Eu sei. 

— É... eu sei. 

Os olhos lua piscaram, confusos, antes que a voz suave de Kiyoko mais uma vez invadisse seus ouvidos: 

— Sabe que eu sei? 

— Acho que sim... Mas achei que era só complexo de mentiroso... Que sempre acha que os outros sabem que está mentindo. 

Outro riso, mais alto, soou a seu lado e, desta vez, Yachi permitiu que seu próprio riso juntasse-se a ele. E, ainda rindo, deixou-se ser arrastada até um pequeno banco.  

Sabia o que Kiyoko queria ao sentar-se à sua frente e tomar uma das suas mãos entre as dela, encarou-a tão firme quanto podia, portanto, e esperou. A carícia em suas mãos demorou-se, contudo, e Yachi aproveitou para suspirar alto algumas outras vezes para garantir que não mais choraria.  

— Acho que ainda não quero contar a verdade. 

Os olhos castanhos-mel arregalaram-se enormes, surpresos pelo que acabara de escapar pelos lábios pouco abaixo deles.  

Não planejara dizer aquilo. Definitivamente não planejara. 

Mas, diferente de praticamente tudo o que já planejara dizer para Kiyoko, aquilo não era, no fim, uma mentira. A maior surpresa, contudo, não foram suas sinceras palavras. A maior surpresa foi a resposta que receberam, tão sincera quanto elas: 

— Tudo bem, não precisa. 

Seus lábios riram sozinhos desta vez. 

— Mas eu vou te atrapalhar se mentir de novo, não vou? 

As sobrancelhas escuras de Kiyoko franziram-se por um tempo, como se em dúvida sobre como reagir àquela pergunta. 

— Eu estou interessada em qualquer coisa que queira me contar, Hitoka. Sendo verdade ou mentira. Eu vou te ouvir. Você disse o que disse por algum motivo, e eu respeito que você tenha seu motivo, então vou te ouvir. Independentemente do que diga. – a voz sonora permaneceu baixinha enquanto, com cuidado, Kiyoko desfez a trança bagunçada e com delicadeza começou a refazê-la – Você se deu ao trabalho de pensar em uma história que não fosse a verdadeira para me contar, então, eu... o mínimo que posso fazer é ouvir o que você escolheu me contar. Eu quero ouvir isso também... Porque é o que você, você de verdade, resolveu dizer. Mesmo que a história não seja verdadeira, você é e seus motivos para contar mentiras também são. Isso é o bastante. Eu vou ouvir tudo o que você disser. Tudinho. Independente do que seja.  

Yachi inspirou fundo, os olhos fechando-se devagarzinho e os lábios abrindo-se em riso silencioso. Mesmo que não devesse, sentiu uma pouquinho da culpa por mentir esvair-se.  

— Essa é a psicóloga Kiyoko falando? – perguntou, receosa da resposta. 

— Não existe uma psicóloga Kiyoko para você. – riu a garota, falsamente ofendida – Ela está envolvida demais com a história e a dona dela para lembrar-se de teorias e métodos. – acrescentou – É a amiga Kiyoko, só. 

Sorriu para a resposta, reabrindo os olhos e receosamente fixando-os no rosto atento da garota que terminava de amarrar a ponta de sua trança com o laço colorido. 

— Obrigada. – sussurrou baixinho, ganhando em resposta um novo sorriso, um aceno despreocupado e carinho silencioso em ambas as suas mãos. 

Não disse mais nada. E, no fim, realmente espantou-se por também mais nada dizer a garota sentada tranquilamente a seu lado. Aquilo, assim como os sorrisos, o encontro surpresa e as perguntas interessadas, era também algo a que não estava acostumada: com carinhos suaves, olhos aconchegantes e sorriso brando, realmente não seria por mais pressionaria, não teria a si direcionadas mais perguntas do que estava disposta a responder, não teria seus forçados seus limites. 

E aquilo era o bastante para que Yachi entendesse o que viria em seguida. O que deveria vir em seguida. 

Encheu os pulmões e expirou fundo, lançando ao céu que tornara-se já noite os olhos. 

“Coragem, Yachi”, pensou, inspirando fundo, “Coragem”.  

— Todo encontro no parque pede por uma confissão na roda-gigante. – quase sorriu ao perceber o quão pouco condizente com o aperto em sua garganta era a voz firme que dela saiu. Os lábios contiveram-se em linha reta, contudo, enquanto os olhos castanhos-mel focavam intensos no imenso brinquedo colorido que abria-se imponente para o céu.  

“Coragem”, repetiu para si mesma ao levantar-se. “Coragem”, pensou ainda outra vez ao tomar apertado entre suas mãos as de Kiyoko para conduzi-la na direção das luzes intensas brilhando do outro lado do parque. “Você consegue!”, completou, colocando-se na fila à frente da garota que durante o dia todo seguira.  

Podia jurar que sentiu os dedos de Kiyoko apertarem de leve os seus quando embarcaram, e, por um instante, duvidou se era realmente aquele o caminho que devia tomar. No instante seguinte, contudo, quando sentou-se no pequeno banco de metal perfeitamente cercado, isso não importou mais. Talvez fosse a vista da pequena janela que, quase como mágica, fazia Tóquio e tudo nela parecer tão menor do que quando estava com ambos os pés no chão, ou talvez fossem as luzes da cidade a invadirem o pequeno espaço e iluminarem de forma quase etérea a beleza de Kiyoko, mas, no fim, tudo o que Yachi pôde pensar era que todas as suas ressalvas, preocupações, culpas e medos eram pequenos demais quando tão alto estava. Pequenos, tão pequenos, que não eram mais capazes de preencherem por completo seu peito que a cada instante, a cada mínimo instante, tal qual balão inflando-se na subida ao céu, maior parecia ficar. 

— A primeira vez que Shouyou brigou sério comigo – começou, a voz embriagada pela quantidade de ar em seus pulmões – foi quando me afastei dele uns nove meses atrás. – sorriu pequenino, lembrando-se o quanto surpreendera-se com o quanto de palavrões cabia dentro do tão pequeno amigo – Eu achei que ele não fosse perceber, porque, de verdade, eu mesma não percebi até que ele dissesse. Só quando ele apareceu na porta da minha casa com o rosto tão vermelho quanto uma pimenta e a boca tão suja que até deu medo, eu percebi o quanto, por mais que gostasse de passar meu tempo com minha ex, sentia falta de ficar com ele, só com ele. – os olhos desviaram-se para o outro lado da janela, ganhando tempo para que conseguisse de novo organizar o que queria dizer, ignorando completamente a expressão de dúvida que instaurara-se no rosto de Kiyoko – Ele estava bravo, de verdade. Disse que não ia se afastar de mim por causa de ciúmes. Que ninguém ia me tirar dele e que ninguém ia tirar ele de mim. Só quando eu vi ele bravo assim, tão bravo como nunca achei que ele ia ficar na vida, eu pensei ‘nossa, eu estou me afastando’. – os olhos encontraram momentaneamente com os de Kiyoko, encontrando ali a fagulha de compreensão que tanto tinha medo de encontrar – E daí, antes mesmo que eu pudesse perceber, tudo o que eu conseguia pensar era “mas se eu gosto tanto dele, por que estou me afastando?”. Então... bem... então tudo começou a ficar um pouco mais difícil pra mim... – inspirou fundo, desviando novamente os olhos para a cidade a seus pés, incapaz continuar a encarar os olhos compreensivos de Kiyoko – Eu... sei... eu sei que... – inspirou fundo, os lábios tremendo de receio, os olhos ainda mais abaixando-se, correndo empenhados ao redor, procurando em qualquer canto algo que a ajudasse a dizer o que devia dizer. Inspirou fundo outra vez, mordendo os lábios antes de optar pelo único caminho que conseguia encontrar – Sabe quando você sabe de algo mas prefere fingir que não sabe? Já faz um tempo que eu sei de algo que prefiro fingir que não sei. Porque parece que se eu disser em voz alta, vai se tornar verdade, e, se eu manter só pra mim, eu posso fingir que não é bem assim e fingir que não sei de nada, fingir que não estou o tempo todo pensando nisso... fingir que não é importante... fingir que estou imaginando tudo... fingir que está tudo bem... – inspirou outra vez, os dedos apertando firme o banco – Conhece a crença de que as coisas só começam a existir de verdade depois que damos nome a elas? É base de quase toda religião, de quase toda mitologia. Enquanto não tiver nome, não é verdade, não existe. Então eu... então eu não quero dar nomes... Porque talvez, talvez daí, não se torne verdadeiro, não é?! 

— Hitoka... 

— Mas às vezes fica difícil de ignorar. Mesmo que eu não tenha dado nome algum... Como quando eu encontro com Shouyou. Ou quando fico sozinha. Ou quando... 

— Hitoka... 

— ... ou quando... Quando você me olha dessa forma... – continuou, ignorando a interrupção – Porque eu vejo sabe? Eu consigo ver, desde ontem, que você está com esse nome, o que eu quero tanto evitar, na ponta da língua. Mas eu acabei ficando tão boa, tão boa nisso de fingir, que eu consigo continuar respondendo a todas as suas perguntas, e mentindo para você, mesmo percebendo como você enxerga por trás de cada uma das minhas mentiras.  

— Hito- 

— Porque talvez precise delas. Sabe? – remexeu-se desconfortável – Das minhas mentiras. Talvez precise tanto que, mesmo te contando a verdade, eu vá continuar acreditando nelas... – outra vez levantou os olhos até os de Kiyoko – Mas eu vou fazer isso mesmo assim... Vou contar mesmo assim... Porque... Porque eu prometi uma confissão... E talvez porque, no fundo, bem no fundo, contar isso seja outra das coisas que eu preciso mas não admito. – riu baixinho, pelo nariz, sem graça, constrangendo-se diante da seriedade da garota à sua frente. Inspirou fundo, então, ainda outra vez. E outra. E outra. Até que a seriedade de Kiyoko tornasse também sua. Tão pesada que obrigou-se a cerrar firme os olhos. E assim, de olhos bem apertados, continuou: – Não foi um término legal. Nunca foi, na verdade. Nenhuma das vezes que terminamos foi legal. Nenhuma vez. E foram tantas, tantas, tantas vez... Nunca havia sido legal, mas, dessa vez, o término foi pior que os outros. – apertou os lábios juntos, evitando que tremessem – E eu entendo que foi minha culpa. Eu não devia ter feito o que fiz. Entendo que não devia ter olhado escondido o celular dela. Entendo que não devia ter lido as mensagens. Entendo que não devia ter aparecido numa festa para a qual não havia sido convidada. Mas eu precisava fazer isso... Eu precisava! Por que, se eu não fosse, se eu não visse... se eu não visse com meus próprios olhos, se eu não dissesse aos outros, se eu não apontasse, se eu não confirmasse que não era a única a ver... se eu não estivesse lá eu não teria certeza. Eu mais uma vez pensaria que era coisa da minha cabeça! E eu não queria mais sentir isso... Não queria, de novo, e de novo, e de novo, me sentir do lado de fora de mim mesma, me sentir como se não pudesse confiar no que via, no que pensava, no que lembrava... – expirou pesado, mordendo os lábios antes de continuar – Então, eu fui. Fui na festa. No sábado à noite. Mesmo que Shouyou me dissesse para não ir, mesmo que dissesse para ficar com ele e Kageyama... Eu fui mesmo assim... 

Calou-se, a garganta seca impedindo-a de continuar.  

Engoliu uma, duas, três vezes em seco, cruzando os dedos em seu próprio colo, os polegares se apertando um sobre o outro, mãos quase como se em oração.  

No silêncio ensurdecedor do brinquedo, pôde ouvir baixinho seu nome ser chamado algumas vezes. Tapou os ouvidos com ambas as mãos, portanto. Porque ainda era sua vez de falar. Porque ainda não havia dito tudo o que poderia dizer. 

— E eu fiz o que eu precisava fazer. Eu vi, eu gritei, eu apontei. Ela com outra. E eu garanti que não era a única vendo... Garanti que ela não pudesse dizer depois que eu estava inventando tudo... Mas eu... E eu nunca esperei que, quando tivesse tantos olhos olhando junto comigo, aquilo realmente se tornaria tão mais verdadeiro e tão mais difícil de ignorar... Que seria tão mais difícil de ver... de vê-la com outra pessoa quando tantas outras pessoas viam-nos. Eu não sabia que ter certeza do que eu via doeria tanto... – apertou mais firme as mãos em volta dos ouvidos, estranhando o som da própria voz, como se presa dentro de sua cabeça – Não sabia que quando ela dissesse “você está inventando de novo!” e alguém desconhecido rebatesse um “como assim, cara,?! Tá todo mundo vendo!” doeria tanto... Eu não sabia que saber de verdade seria tão ruim... E por isso eu entendi, de verdade que entendi, quando ela disse que eu a estava fazendo de boba na frente dos amigos. Porque eu assim que eu sentia tudo. Tudo parecia tão bobo, tão irreal... E entendi quando ela apertou firme meu braço e me empurrou para fora da festa... Porque eu realmente queria sair dali... Porque eu realmente precisava de todas as forças, as minhas e as dela, para ir embora... – devagar, bem devagar, soltou os próprios cabelos que nem percebera estar segurando, e, com calma, pousou outra vez ambas as mãos, inertes, sobre o colo – Só em casa, só quando voltei sozinha para aquele apartamento vazio que a gente dividia junto, foi que eu percebi que a gente tinha terminado. Então eu fui para a casa do Shouyou e lá fiquei até de manhã... – sorriu resignada, dando de ombros – Quando voltei para casa, as roupas dela não estavam mais no guarda-roupas. Não é a primeira vez que ela faz isso. Sumir assim. Mas ela sempre volta. Sempre. Depois de um tempo como se nada tivesse acontecido. Então, no fim, já que é sempre ela quem volta, decidi que dessa vez, só dessa vez, quem ia fazer alguma coisa era eu. Eu, não ela! Eu! Voltar por decisão minha, não dela! Então achei um número em um papel amarelo no Restaurante Central... – sorriu outra vez – que prometia exatamente o que eu precisava. Quando eu liguei, era uma amiga da escola e, no fim, eu acabei em uma roda-gigante com ela contando justamente o que eu não queria contar porque dói demais e porque eu não queria que ela me olhasse desse exato jeito que ela está me olhando agora... Com pena... Porque eu não quero que mais ninguém me olhe desse jeito... Porque eu mesma já me olho assim e mal consigo me suportar... 

— Hitoka-chan... 

— E eu tenho que dizer pra ela... – cerrou os olhos – ... que aquele papel amarelo é horrível. Que as únicas pessoas que ela vai atrair assim são as desesperadas. Que ela precisa urgentemente contratar os serviços de um bom designer...  

— Hitok- 

— Que eu até mesmo ofereceria meus serviços... Mas não consigo porque, no fim, apesar das minhas críticas, o papel amarelo cumpriu com perfeição o objetivo. Trouxe uma cliente... uma meio ruim... mas trouxe... 

— Hito- 

— Ou talvez nem tão ruim assim... no fim, o amor vai voltar mesmo, mesmo sem a ajuda prometida no papel. Porque ela sempre volta, sabe?! Ela sempre volta... Então talvez eu seja a melhor cliente possível... 

— Yach- 

— É garantia absoluta de sucess- 

— Yachi! Para! 

Os olhos castanhos-mel abriram-se de súbito, assustados, arregalados, fixos na garota que, de pé, com o olhar fixo no seu, gritava: 

— Eu não quero trazer ela de volta! Não quero! Me ouviu?! Eu não quero você com ela! 

Os lábios que pela manhã com cuidado cobriram-se com o batom novo separaram-se em choque. E uma bufada enorme de ar invadiu os pulmões de Yachi de uma só vez. 

Nunca, absolutamente nunca, vira Kiyoko Shimizu daquela forma.  

Furiosa 

Tão, tão exaltada, que mal continha-se dentro do pequeno espaço do banco suspenso, os olhos tão coléricos que, mesmo sabendo não ser para si tal fúria, encolheu-se pequena em seu casaco, absolutamente calada.  

No instante seguinte, contudo, fosse por seu claro medo ou pelo quanto o carrinho balançara com a súbita movimentação, Kiyoko voltou a sentar-se, os olhos baixos e a voz quase como sopro: 

— Desculpe... 

Não respondeu.  

Não tinha o que responder.  

E nem Kiyoko pareceu realmente esperar por resposta.  

O silêncio que invadiu o restante do percurso foi mais do que o bastante para que Yachi percebesse que tudo o que tinha a ser dito – por ela e por Kiyoko – havia sido dito durante as duas voltas pelo céu de Tóquio. 

Depois de tudo dito, restava, a ela e a outra, apenas o emudecimento. E, por mais que aquilo tenha sido exatamente o que desejara – de Kiyoko nada além dos ouvidos –, agora, assistindo-a tão quieta a caminhar em direção à saída do parque, poucos centímetros a sua frente, depois de desembarcarem ambas do brinquedo, não tinha mais certeza se era aquilo o que planejara para o fim da noite que há pouco caíra. 

Porque, por mais que seu peito ainda disparado estivesse pelo inesperado grito de Kiyoko, havia em cada centímetro de seu corpo o desejo de perguntar o porquê de tanta fúria, o porquê de não querer mais uni-la à ex-namorada. E, tão intenso quanto fora o grito da garota a seu lado, sua própria garganta coçava de vontade de gritar a ela para que dissesse algo, para que dissesse tudo, para que opinasse, para que perguntasse, para que falasse, falasse qualquer coisa, mesmo aquelas coisas sem propósito que vinha dizendo ao longo de todo aquele dia, falasse nem que fosse o que não queria de forma alguma ouvir.  

Kiyoko permaneceu em silêncio, contudo. Durante todo o tempo que levaram para alcançar a saída do parque. E enquanto caminhavam lado a lado em direção à estação do metrô. E até mesmo enquanto juntas sentavam-se no trem que cortava a cidade em direção à universidade. Silêncio, apenas. Mesmo que quando em quando separassem-se em um suspiro profundo os lábios ainda comprimidos em raiva. Mesmo que quando em quando inclinasse-se em sua direção as mãos gentis como se para tocá-la. Mesmo que durante todo o tempo o cenho tenha permanecido torcido.  

Silêncio, só. 

E silêncio, só, também quando desembarcaram na mesma estação. E também apenas ele quando, de repente, percebeu-se apertada nos braço da garota mais velha em abraço tão longo que a fez sentir que podia outra vez chorar. 

Não chorou. Permaneceu firme, os olhos bem secos e os soluços todos escondidos dentro do peito agitado. Manteve-se quieta, fielmente, mesmo quando o silêncio finalmente rompeu-se: 

— Hitoka, – começou Kiyoko, a voz bem baixinha, os braços bem apertados em volta de seus ombros – eu... eu adorei saber que você gosta de filmes de suspense, mas não de terror. Que histórias de detetives são suas favoritas porque você gosta de juntar peças e de jogos de adivinhação. Que acha um absurdo a falta de minorias em Hollywood. Que tem um pouquinho de vergonha de admitir mas às vezes chora em comédias-românticas. – os olhos castanhos-mel arregalaram-se, confusos – Que adora pipoca amanteigada, mesmo que não goste do cheiro nem da sensação pegajosa nos dedos. Que evita refrigerantes no cinema porque não quer arriscar sair no meio do filme pra ir ao banheiro. Que gosta de intercalar doce e salgado, mas não de misturar um ao outro. Que é gentil o bastante para dizer que gostou do sorvete horrível que escolhi só para não me magoar. Que tem medo de montanha-russa e de brinquedos rápidos que mudam muito de direção. Que diminui os passos para não esbarrar em pessoas distraídas. Que olha feio pra quem joga lixo no chão. Que pressiona os dedos quando nervosa. Que sorri quando contrariada. Que fecha os olhos quando muito feliz. – um suspiro fundo escapou por entre os lábios de Kiyoko enquanto ainda mais firme a abraçava – Eu adorei conhecer tanto de você... Adorei encontrar em você a garota que eu tanto amei na escola e adorei conhecer em você a pessoa que vai além dela e gostar dela também. E eu não consigo imaginar, nem fazendo muito esforço, a existência de alguém que não te ache incrível. De verdade. Não consigo... 

Não chorou. Segurou orgulhosa o choro bem guardadinho por trás dos lábios trêmulos presos firmes entre os dentes. E, sem choro, tudo o que pode entregar como resposta foi um manear enfático da cabeça em negação e um soluço mudo. Porque sabia, realmente sabia, que se abrisse os lábios para dizer quaisquer coisas, nunca mais pararia de dizê-las.  

E já havia dito tanto, tanto mais do que devia... 

E porque sabia, dolorosamente sabia, que quanto mais dissesse, menos merecedora das palavras de Kiyoko tornaria-se. Que quanto mais dissesse, mais as próprias palavras ecoariam em sua própria mente, altas o suficiente para calarem tudo o que ouvira de Kiyoko.  

Yachi portanto, só permaneceu, inerte e muda, nos braços de Kiyoko, com cada centímetro do peito dividido entre o esforço por não chorar e o esforço por acreditar que Kiyoko tinha razão ao dizer tantas coisas boas sobre si. Os dois tão difíceis que quase partiam-na ao meio. 

E ela poderia, provavelmente, ter para sempre permanecido ali, inerte e muda, no abraço quente de Kiyoko Shimizu se não fosse a própria Kiyoko a afastar-se e, com um sorriso tão quente quanto os braços e olhos tão brilhantes quanto as poucas estrelas nos céu da capital do Leste, e anunciar, a voz empolgada a queimar seu peito em surpresa: 

— Me recuso, me recuso terminantemente, a aceitar que esse dia termine desse jeito! – os olhos de estrela arregalaram-se enquanto decididos os lábios moviam-se – Que tal um pouco de diversão? 

Diversão 

Diversão 

Diversão 

A palavra preencheu cada um dos pensamentos agitados de Yachi durante todo o tempo durante o qual era arrastada pelas ruas já não tão movimentadas da cidade que teoricamente não deveria nunca dormir. Não tinha certeza se estava pronta para novas surpresas de Kiyoko e, definitivamente, não tinha certeza se realmente queria o que aquela palavra poderia significar. Queria voltar para casa. Queria um banho longo. Queria comer um chocolate. Queria ficar quieta em silêncio. Queria estar sozinha. Queria, talvez, desabafar novamente com Hinata. Queria repetir para si mesma dezenas de vezes as palavras de Kiyoko até se convencer. Queria deixar de culpar-se por ter entregado sem querer que era lésbica. Nada do que, ela sabia, poderia ser qualificado com a palavra escolhida por Kiyoko.  

Todos os pensamentos, contudo, e todas as desconfianças e todas as preocupações, esvaíram-se no instante no qual colocou ambos os pés dentro de um pequeno bar charmoso com luzes no mínimo e aquecedor no máximo. E tudo o que pensou sobre o que verdadeiramente gostaria de estar fazendo desfez-se no momento em que em uma das mesas encontrou sorrisos que há muito tempo não via... 

... mas que, caramba!, faziam muita falta. 

Era a vida, claro que era. Faculdade, trabalho, aulas, dinheiro. Tudo sempre tão atrasado e sempre tão importante, mas que, então, pareceram tão insignificantes que mal pode conter o aceno incrédulo e o suspiro de felicidade indignada. Porque, de alguma forma, mesmo que parecesse correr sempre tão apressado, o tempo então pareceu não ter passado nadinha, como se tivesse parado no instante no qual se despedira dos amigos do clube na porta da Karasuno anos atrás e, sorrateiro e maroto, tivesse pacientemente esperado para voltar a correr apenas naquele exato momento quando, do lado oposto de uma mesa cheia de canecas de cerveja, sorriam para ela Sugawara, Nishinoya e Asahi. Os mesmos sorrisos, ela notou, que sorriam juntos, anos atrás, quando nem faculdade, nem trabalho, nem aulas, nem dinheiro e nem passagem alguma de tempo realmente importava.  

E, de verdade, naquele instante, era realmente como se não importasse. 

Com sorrisos brilhantes tão aconchegantes à sua frente e toque tão confortável de dedos tão quentes às suas costas, nada mais realmente parecia assim tão relevante. 






Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Olá de novo!!
Obrigada por ter lido! ♥ Espero que tenha gostado.
Sei que foi um capítulo pesado, pelo tamanho, inclusive! XD
E, de todos, acho que foi o capítulo que mais me deixou apreensiva, então espero que ele não tenha ficado confuso. Li e revisei tantas vezes que não sou capaz de julgar isso... hahahha

enfim! Obrigada por ter lido!
Nos vemos semana que vem com o dia 3? Teremos uma dose bastante recomendada de Karasuno! (e ahh! o dia 3 é dividido em dois capítulos, então não se assuste quando ver o "parte 1" no título!)

beijo, beijo, =*
Yuki



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Três dias e um quarto" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.