O Sistema é Um Porre escrita por Captain


Capítulo 1
Cena Aleatória #1


Notas iniciais do capítulo

E... ação!



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As pessoas chegam para você num papo social, coisa comum, rotineira e soltam na conversa coisas que elas esperam que você automaticamente concorde, e mais automaticamente ainda, adicione argumentos já conhecidos e decorados – aos quais elas pretendem concordar de volta. Um desses assuntos, quando os argumentos começam a ficar um pouco mais pessoais, mas sem descartar a parte do “sei que você irá concordar comigo nessa” elas soltam que os pais nunca os deixaram ir para a faculdade, ou então que nunca deixaram fazer o curso que eles realmente queriam, ou ainda, qualquer coisa sobre “não posso ter o presente que quero porque alguém me travou no passado, minha mãe, meu pai, é porque eu tinha vários irmãos” qualquer coisa. Esperando que com isso você irá dizer ah, é, eu também, meu pai queria muito que eu fizesse direito, mas o que eu queria mesmo era a faculdade de cinema. E com isso, pronto, agora existe um fantasma na sala do que aquela pessoa era capaz de ser, que ela não usou completamente o potencial dela, que é muito mais do que aparenta. É isso que elas querem que você pense. É isso que elas pensam sobre si mesmas durante a vida inteira delas, caramba. Entram num lugar prepotentes, com o nariz para cima, interpretando o tal fantasma. Mas a única coisa que eu consigo tirar de um discurso desse é que eu acabei de conhecer mais um que não consegue assumir os próprios erros, filhinho de papai demais. Saca? Não precisa ser rico, só precisa esquecer de assumir os próprios erros. Pior, esquecer que erros podem ser cometidos por si mesmo.

Eu espero, espero de verdade, que cada um deles olhe para trás um dia, com a lama no pescoço e perceba “meu Deus”, fui eu que caminhei até esse poço, ninguém me empurrou! É um momento doloroso, mas esclarecedor. É o momento em que você encontra motivação para pelo mesmo assumir toda aquela merda e dizer que a culpa é minha, é minha, é minha. E logo depois de fazer a coisa certa, vai sentir um alívio como nunca antes e pensar que poderia ter feito isso quando a lama ainda não tinha te soterrado quase por completo. Não que eu esteja dizendo que não é tão ruim assim ter que lidar com as consequências. Na verdade, é bem ruim sim, mas aquele sofrimento que você consegue ver de onde vem, pelo menos faz algum sentido. Saca? 

 — Sei. – Um sorriso sacana. – Também acabei de perceber que você tem um cacoete. Eu falo muito “sabe? Entende? ” E você fala “saca? ”. É meio que o mesmo cacoete eu acho. Diferente, mas igual. Entende?

— Que nem os nossos nomes.

O incidente dos nomes sendo mencionado. Aquela porra de incidente que causara aquele tumulto. No fim, um deles voltaria para casa, o outro não. E aquele suspense todo por causa de nomes iguais.

— Pelo menos os apelidos são diferentes.

— É.

— Nic?

— Que?

— Quem você acha que mais merece viver?

Nic ficou perplexo, do tipo puto.

— Que porra... Você não se cansa de ser inconveniente, não?

— Como assim? É justamente o mais divertido! – E aí, Dado começou a dissertar. Nic havia feito a pergunta de um milhão. – Pensa. Você está numa festa, uma garota chamou a sua atenção na roda, chega uma altura da noite em que você tem finalmente a chance de conversar à sós com ela. Mas garotas bonitas sabem que são bonitas, certo? Então ela meio que espera que você diga certas coisas para ela, coisas que ela está acostumada a ouvir. Não que ela não queria ouvir de novo e gostar de novo do cara que as disse. Mas isso não conquista alguém àquele ponto...

— Que ponto? – Nic interrompe. Existe intimidade o suficiente agora, ele conclui. Mas a interrupção não é por isso. Ele de fato não sabe que ponto é esse, embora um bom palpite já esteja rondando sua mente. Quis interromper também porque com Dado você tinha que cuidar para não deixar ele controlar completamente o assunto e acabar te manipulando a admirá-lo, como Nic vinha deixando sem querer. Além disso, queria tirar a impressão de bundão que havia deixado no início. Uau, vai mesmo conseguir tudo isso com uma interrupçãozinha tosca, Nic? Não, mas era um início.

— Ah, você sabe. Aquele ponto em que ela passa a gostar de você e surge um brilho nos olhos, bem discreto, que diz, você é um cara diferente, um cara que eu não posso controlar com um sorriso charmoso que tenho usado para controlar homens burros a vida inteira. Esse ponto, sabe?

— Tá, pior que sei. Eu sou escritor, não é como se eu conseguisse engatilhar o olhar delas de só mais um, nem se eu quisesse.

— É isso aí, Nic. E existem pontos mais longes que esse. E é aí que entra a parte divertida de ser inconveniente. Você tem que fazer perguntas a ela, perguntas que normalmente não seriam feitas por alguém que ela acabou de conhecer numa festa. Com a maioria nem precisa exagerar. Mas presta atenção. Quando digo perguntas, não quero dizer coisas esquisitas que fará com que ela queira se afastar, fique com medo ou algo do tipo. Com perguntas digo coisas meio constrangedoras, mas que implicam em respostas engraçadas. Do tipo que vai fazê-la dizer “ai meu Deus” e levar a mão ao rosto, tímida. Aí ela confessa algo meio embaraçoso. Pronto, é o suficiente.

— Suficiente para quê?

— Para estar no controle! O controle que só os caras superconfiantes dos filmes tem.

— Ok. Não vou dizer que não faz sentido. Mas parece o tipo de coisa que na prática não funciona.

— Tá. Pensa o que quiser. Se algum dia tiver a oportunidade, eu te provo. Até lá não vou quebrar a cabeça tentando te convencer. – Dois problemas aqui, Dado. Primeiro, sua falta de paciência. Segundo...

Ele levantou os braços em menção de colocá-los atrás da cabeça. Mas parou no meio do caminho e os abaixou, incomodado. Nic também se ajeita no assento. Não haverá o algum dia para um deles. Mas quando Dado percebe a bola fora, ele parece chateado demais para tentar quebrar o gelo com mais uma pergunta inconveniente. Então é a vez de Nic fazer o teste, não sou um bundão.

— Eu acho que eu mereço viver mais do que você.

Talvez ele tenha pegado pesado demais. Será que podia voltar atrás e dizer “brincadeira! ” Mas soaria forçado.

— Que? – Dado voltou à superfície.

— Nada.

— Ah, a pergunta. Bom, fico feliz por você Nic.

— Dado, olha, me desculpa, eu não devia...

— Não isso. Fico feliz que esteja abandonando essa necessidade de mascarar de mim o que você pensa de verdade. Achei que teria que fazer um discurso do tipo, pode falar a verdade, eu sei que desde o momento que eu contei que estava desempregado e prestes a me matar você pensou que merecia mais o resultado positivo do que eu.

— Negativo.

— Hã?

— Se o resultado der positivo significa que eu tenho o vírus. Tem que dar negativo.

— É, isso. – Dado riu com gosto. Mas não havia sido engraçado. Esse cara sabia ser... sei lá. Diferente.


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Notas finais do capítulo

O objetivo de postar aqui também é para que a partir das opiniões de vocês eu consiga lapidar a história e transformá-la em algo massa pra caralho. Então, me diga, o que achou? Alguma observação? Teorias do que está acontecendo?
Nos vemos no próximo capítulo, até mais!