HOLD THE LINE - Livro #01 escrita por Lyra


Capítulo 6
CAPÍTULO 6 - Mad World


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo está bem longo, espero que gostem de capítulos compridos. Boa Leitura a todos vocês.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/751085/chapter/6

Os pensamentos de Louise não conseguiam ser ocupados por outra coisa além da garotinha sem nome que estava escondida no porão dos Wheeler e do que poderia ter acontecido com Will Byers. Por mais que tentasse evitar, pensamentos ruins acabavam assolando sua mente e ocupando grande espaço, espantando qualquer tipo de sono que pudesse sentir e deixando-a em estado de alerta. O desaparecimento do irmão do melhor amigo e o surgimento de uma garota estranha no meio do nada não eram bom sinal, principalmente em um lugar tranquilo como aquele. Hawkins sempre foi o tipo de cidade onde nada acontece e agora que eventos estranhos começaram a surgir, é questão de tempo para coisas piores ocorrerem.

Sorrateiramente levantou da cama e foi em direção ao quarto do irmão mais novo, queria certificar-se de que Dustin estava em perfeitas condições e que nada ruim havia acontecido com ele. Por mais que não falasse com frequência, Lola jamais escondeu o quanto o menino era importante para sua vida. Pelo irmão mais novo ela era capaz de matar e morrer, não responderia por seus atos caso coisas ruins acontecessem com ele e vingaria por qualquer que fosse o motivo. É obvio que como todos bons irmãos, Lola e Dustin possuem desavença as vezes. Seja essas por pequenas bobagens do dia a dia, como quando Dustin come o último biscoito do pacote ou toma leite direto da garrafa, ou por coisas mais graves, como por exemplo as notas e o modo como Lola sempre interfere quando os meninos da mesma idade resolvem brigar com ele no colégio. Mas mesmo com essas brigas, o amor sempre supera.

Quando o menino nasceu, Lola não foi a melhor irmã do mundo na recepção. Não estava acostumada com a ideia de que não seria mais a única bebê da casa e que agora teria de dividir a atenção dos pais. Mas essa estranheza não durou muito tempo, quando percebeu que poderia servir de exemplo ao menino e que poderia molda-lo para ser seu companheiro fiel, a estranheza deu espaço ao amor, esse até em excesso algumas vezes. Ela contava as horas para voltar da escola e brincar com Dustin até a hora de dormir, estava sempre disposta a ajudar a mãe a arruma-lo e quando ele aprendeu a andar, o arrastava para cima e para baixo. O ensinou a andar de bicicleta, gostar de fliperamas e todas as coisas boas que irmãs mais velhas podem ensinar aos irmãos mais novos. De peste irritante, Dustin foi para o seu melhor amigo e confidente quase que em um piscar de olhos.

Havia muitos outros motivos que transformava Dustin na melhor pessoa do mundo de acordo com Lola, foi o irmão que esteve ao seu lado quando suas melhores amigas viraram as costas, foi ele que acreditou fielmente em suas palavras e não desconfiou em nenhum momento das coisas que fazia quando boatos maldosos começaram a surgir, era Dustin que lhe dava forças para seguir com a cabeça erguida pelo colégio depois de ter passado por maus bocados e foi o menino sua primeira preocupação quando os pais se divorciaram. O irmão mais novo é sua base, seu tudo, a melhor pessoa da família e jamais se perdoaria caso o perdesse ou perdesse essa forte ligação. Ele é a única pessoa que a prende em Hawkins por mais tempo do que o planejado, Lola jamais seria capaz de deixar a cidade sabendo que o adolescente ficou para trás junto com todos os problemas familiares que assolam os Henderson's.

— Lola... — Resmungou Dustin ainda sonolento quando Lola se enfiou embaixo das cobertas e o abraçou por trás.

— Pode voltar a dormir. — Ela avisou o aninhando em seus braços e o apertando com um pouco mais de força que o habitual, queria sentir que ele estava bem e vivo, que Dustin estava com ela.

— Foi só um pesadelo, Lola — O rapaz pousou um braço sobre os da irmã, aceitando o carinho. Estava acostumado a dividir a cama com ela quando tinha algum sonho ruim ou não estava se sentindo bem, porém essa era a sua vez de passar tranquilidade a menina — Sempre é...

[...]

Quando abriu os olhos pela manhã, sentindo os raios de sol baterem sobre seu rosto e o som agudo do despertador do irmão tocar estridente, o primeiro pensamento que veio em sua cabeça foi sobre Mike Wheeler e a garotinha sem nome. Estava preocupada e com sentimento de culpa em relação ao menino, no fundo sabia que fora uma péssima ideia ter deixado a pobre garota desconhecida aos cuidados de um menino de mesma idade. Jamais iria se perdoar caso algo ruim acontecesse com o melhor amigo do irmão, ou até mesmo com a garotinha assustada. Mas agora era tarde e a ideia já tivera sido posta em prática.

— Acorda, Dustin. Está na hora! — Ordenou Lola balançando o irmão mais novo enquanto saltava da cama.

Com os olhos pesados e ainda sonolenta devido a péssima noite de sono, Lola deixou o quarto do irmão e regressou para o próprio quarto. Naquela manhã a adolescente vestiu-se em tempo recorde, sem ao menos cogitar a ideia de banhar-se como era de praxe no começo de cada dia. Havia uma lista extensa de coisas para fazer dentro de sua mente que deveria cumprir antes de pedalar até o colégio como, por exemplo, ligar para Mike e passar pela casa dos Byers afim de saber das notícias relacionadas ao desaparecimento do Will.

As teorias em relação ao sumiço da criança estavam a deixando louca, via o pequeno Byers como seu próprio irmão devido ao tempo que passava na casa da família. Queria estar com Joyce e Jonathan quando eles recebessem a notícia, queria ajuda-los da melhor forma possível para encontrar o menino. Eles eram sua segunda família e por isso não os abandonaria em um momento delicado como aquele.

Louise correu apressada pela casa, caminhando de um cômodo ao outro para que pudesse finalizar mais rápido sua lista de afazeres, chegando a fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo. Colocou a jaqueta por cima do vestido florido enquanto preparava o lanche que ela e o irmão mais novo levariam para o colégio, ao finalizar calçou as botas na sala enquanto devorava um Waffle, terminando o Waffle e de calçar as botas, ela subiu para o andar superior e rumou até o banheiro, onde escovou os dentes e prendeu os cabelos quase ao mesmo tempo. Quando já estava devidamente vestida, com sapatos calçados e mochila da escola sobre os ombros, ela desceu outra vez e foi direto em direção ao telefone.

— Alô! — Atendeu a Sra. Wheeler do outro lado da linha, fazendo com que Lola fizesse uma careta. — Quem é?

— Hum, sou eu, Louise... Henderson — Falou a menina um tanto nervosa.

— Lola! — Comemorou a Sra. Wheeler contente por ouvir a voz da adolescente, ela ainda acreditava que a amizade entre Lola e Nancy permanecia cem por cento. Tanto que todas as vezes que via a adolescente no trabalho ou na rua, a convidava para ir até sua casa. — Como é bom ouvir a sua voz.

— Também é bom ouvir a sua, Sra. Wheeler — Mentiu Louise coçando a nuca e forçando sinceridade no tom de voz. — Eu queria saber se o...

— A Nancy? Vou chama-la — Interrompeu a mulher antes que a menina pudesse terminar a frase, fazendo com que Lola desse um sorriso nervoso.

— Não, eu queria saber do... — Infelizmente a Sra. Wheeler não estava mais ouvindo o que a Lola dizia ao telefone, pois seus berros abafados chamavam por Nancy — Merda...

— É a Lola, Nancy — Explicou a Sra. Wheeler parecendo mais feliz que o habitual. — Ela quer falar com você.

— Não, não quero — Crispou Lola entre os dentes enquanto fazia caretas.

— Comigo? — Perguntou Nancy com a voz distante.

— É! — Assentiu a Sra. Wheeler animada — Lola, querida. A Nancy está aqui... Toma, fala com ela. Fala com a sua amiga.

— Alô? — Perguntou Nancy confusa do outro lado da linha.

— Sua mãe está perto? — Rebateu Lola com outra pergunta.

— Sim — Confirmou Nancy.

— Merda! — Reclamou Louise sem esconder o desagrado.

— O que você quer? — Perguntou Nancy irritada.

— Perguntar uma coisa para o Mike...

— O que você quer com o meu irmão?

— Não é da sua conta, passa logo para ele.

— Mike! É a Lola no telefone! — Gritou Nancy sem ao menos afastar o telefone na boca.

— Cadela escandalosa — Xingou Lola afastando o objeto da orelha.

— Lola! — Mike atendeu o telefone depressa — Não é da sua conta, Nancy! Saia daqui! — Disse o menino para a irmã que estava perto. — Pronto, pode falar.

— Como ela está? — Perguntou Louise preocupada.

— Ainda não fui vê-la, separei o café da manhã. Já tem um plano? — Mike estava tão preocupado quanto Lola com o que fariam a seguir.

— O mesmo de ontem, faça com que ela de a volta na casa e fale com a sua mãe. Ela é adulta, saberá o que fazer. — Disse Lola fazendo algumas espirais com a caneta azul em um bloco de notas próximo ao telefone amarelo de disco — Assim que terminar o teste do Kamisky passo na sua casa, prometo.

— O que falo para a minha mãe agora, ela vai querer saber o que conversamos.

— Diga que é algo sobre o trabalho de ciências ou qualquer outra matéria, queria confirmar uma coisa com você em relação ao trabalho. Tenho que desligar, até mais tarde — Antes que o menino pudesse dizer alguma coisa em resposta, Lola desligou o telefone e voltou com a sua correria pela casa, dessa vez em direção a saída. — Tchau, mãe! Tchau, Dustin!

[...]

A corrida de bicicleta até a casa dos Byers fora brutal, como tudo o que Louise vinha fazendo pela manhã. Afinal, quanto mais rápido estivesse presente na residência, mais ajuda conseguiria oferecer e, quem sabe, mais rápido encontrariam Will.

— Merda! — Choramingou a menina ao notar que havia chego quase que no mesmo instante que o delegado Jim Hopper no local.

Louise não estava nada surpresa com a presença do homem no recinto, principalmente por ser ele o responsável por liderar as equipes de busca. Ele não estava fazendo nada mais do que o seu trabalho. O único problema é a preocupação exagerada que Jim costuma sentir por ela algumas vezes, sendo quase impossível ficar sem uma bronca vinda por parte dele.

— Delegado! — Cumprimentou a menina descendo da bicicleta e caminhando ao lado dele no momento em que desceu da viatura.

— Não deveria estar na escola, Louise? — Perguntou Hopper sem ao menos olhar em sua direção.

— Não deveria se preocupar em buscar um menino desaparecido? — Perguntou Lola sorrindo de escárnio. Jim estava prestes a bater na porta com os nós dos dedos, mas parou ao ouvir a pergunta, olhando com desprezo para a adolescente — Eu tenho tempo, okay!

— Espero que não tenha feito nada estúpido na noite passada — Resmungou o homem dando algumas batidas com os nós dos dedos sobre a madeira da porta.

— Se considera ouvir David Bowie noite inteira enquanto estuda química algo estúpido, então sim — Mentiu a menina com naturalidade.

— Não é estúpido, só deprimente —  Disse o delegado sem desviar os olhos da porta.

A senhora Byers não demorou para atender os visitantes, abrindo a porta de modo afoito, estando desesperada para saber atualizações sobre o caso do filho desaparecido. As olheiras fundas, vestes manchadas, cabelo bagunçado e cansaço aparente, revelavam a imagem de uma mulher que não conseguiu pregar os olhos durante a noite. Vê-la daquela forma fazia com que o coração da Lola pesasse, principalmente por tê-la conhecida nos melhores dias.

— Estamos esperando a seis horas — Repreendeu a mulher assim que abriu a porta, sem ao menos dar tempo para que Hopper dissesse alguma coisa. Louise tomou a dianteira e lhe deu um abraço rápido, tentando passar conforto a ela — Lola.

— Eu vim assim que pude — Explicou o delegado entrando logo atrás da menina.

— Seis. Horas. — Frisou a Sra. Byers assim que a menina soltou dela, voltando a dar total atenção ao delegado.

— Confia um pouco em mim, 'tá! — Pediu o delegado claramente irritado com a pressão que Joyce exercia sobre ele.

— Jonathan! — Louise não hesitou em abraça-lo por mais tempo, sabia que o melhor amigo era o que mais estava sofrendo com tudo aquilo. Parte por se sentir culpado pelo sumiço do irmão já que estava trabalhando, parte por ser o único homem da casa graças ao abandono paternal. — Como você está?

— Melhor agora — Sussurrou o menino a abraçando com mais força que o habitual.

Aquelas palavras serviram para aquecer o coração da Louise e fazer com que sentisse realmente útil para todos. Definitivamente não poderia largar o melhor amigo sozinho com toda aquela responsabilidade e pressão. Jonathan manteve o abraço enquanto voltava a atenção para Joyce e Hopper conversando, assim como a mãe e a melhor amiga, ele também queria saber o que descobriram até o momento.

— Procuramos por toda parte, fomos até Carstersville. — Explicou Hopper olhando tudo ao redor, como se ainda procurasse pistas na casa.

— E...? — Perguntou Joyce sem tirar os olhos do homem.

— Nada — Respondeu Hopper com pesar.

Aquelas palavras foram doloridas demais para todos os que tinham esperança de receber uma resposta positiva, mas principalmente para Joyce. Por mais que a mulher tivesse tentando ser forte, não conseguiu repreender um gemido pesaroso e algumas lágrimas. Louise teve vontade de correr até ela e abraça-la, mas foi impedida por Jonathan que apertava com força seu ombro, o qual ficou levemente dolorido com o apertão do rapaz.

— A Flo disse que você recebeu uma ligação. — Continuou Hopper querendo saber mais detalhes sobre o novo evento.

— É! — Assentiu Joyce o guiando em direção ao telefone preso na parede.

A matriarca da família Byers parou ao lado do casal de amigos e cruzou os braços sobre o peito, institivamente Louise esticou sua mão tocando-lhe as costas, tentando mostrar qualquer suporte que pudesse dar. Assim que os dedos da adolescente tocaram seu corpo, Joyce retirou a mão da garota do local e segurou entre as suas.

— A tempestade fritou isso, hein — Zombou Hopper analisando o telefone queimado.

— A tempestade? — Perguntou Joyce descrente de que fosse realmente aquilo.

— Vai dizer que não acha isso estranho? — Perguntou Louise de modo severo ao ver o sorrisinho no rosto do policial. Aquele não era o momento para piadas e zombarias.

— É verdade, é estranho mesmo — Assentiu o delegado devolvendo o telefone no gancho.

— Da para rastrear quem fez essa ligação e contac... — Jonathan começou a perguntar preocupado, porém foi interrompido pelo policial.

— Não! Não funciona assim — Explicou o delegado com olhar distante. — Não. Você tem certeza que foi o Will? A Flo disse que você ouviu uma respiração.

— Não. Era ele — Choramingou Joyce extremamente preocupada enquanto apertava fortemente a mão da Louise. A adolescente tinha quase certeza de que sairia com alguns hematomas pelo corpo — Era o Will. E ele, ele estava com medo. E aí, uma coisa...

— Provavelmente foi trote, alguém tentando assustar você. — Explicou o delegado.

— Quem faria uma barbaridade dessas? — Perguntou Louise arregalando os olhos. Por mais que tivesse passado maus bocados, a crueldade humana ainda a surpreendia.

— Já passou na TV. Esse tipo de coisa atrai os loucos, sabe? Pistas falsas, os trotes... — Começou o delegado, mas foi interrompido por Joyce.

— Não! Era ele. Hopper, não foi um trote. Era ele. — Insistiu Joyce confiante com sua teoria sobre o telefonema da noite passada.

— Joyce! — O delegado não parecia estar levando aquilo muito a sério. Lola duvidava que o mesmo estivesse levando até a investigação com a preocupação necessária que deveria estar sendo tratada. Mas não o irritaria mais com suas perguntas, pelo menos não naquele momento.

— Como assim? Que tal confiar em mim? O que que é? Você acha que estou inventando? — Joyce havia soltado da mão da adolescente e gesticulava frustrada com o delegado da cidade.

— Não estou dizendo que está inventando, só estou dizendo que é um momento sensível para você — Explicou o homem com calma.

— E você acha que eu não conheço a respiração do meu filho? — Perguntou a mulher irritadiça pela forma como ele estava lidando com tudo — Não reconheceria a da sua filha?

O clima pesou quando a falecida filha do Hopper foi citada na conversa. Todos na cidade conheciam a triste história sobre o que aconteceu com a garota e como isso destruiu o casamento do policial e sua ex-mulher. Sem dizer uma única palavra, o delegado afastou com passos pesados.

— Tia Joyce, acho melhor a senhora se acalmar — Falou Lola quebrando o silêncio gerado. Ela abraçou a mulher de modo fraterno. — Já tomou seu café?

— Lola... — Joyce estava prestes a resmungar alguma coisa para a preocupação da adolescente, mas calou quando Hopper voltou a fazer perguntar.

— Já soube do Lonnie? — Perguntou o delegado voltando-se para o trio.

— Não — Respondeu Joyce frustrada. Lola recordava a quantidade de vezes no dia anterior que a Sra. Byers havia tentado contatar o ex-marido através de ligações e nenhuma fora correspondida.

— Já faz muito tempo, eu vou falar com ele. — Jim vestiu o chapéu e caminhou em direção a porta pela qual havia entrado.

— Qual é, você está perdendo o seu tempo — Gritou Joyce em resposta.

— Louise! — Hopper ignorou o grito da senhora Byers, chamando a adolescente.

— Mas...

— Vá com ele, é melhor ir — Disse a Sra. Byers interrompendo o discurso que Lola estava prestes a proferir em rebatida. — Pode ajudar o Jonathan a colar os cartazes mais tarde.

— Henderson! — Gritou Jim do lado de fora da casa.

— Droga — Retrucou a adolescente.

Infelizmente, seguir o delegado Jim Hopper era necessário, principalmente quando o mesmo estava com o humor péssimo. Caso o contrário, ele faria com que o resto da vida da adolescente fosse um inferno devido a desobediência, sendo capaz de seguir todos seus passos, ou pior, mandar o oficial Callahan fazer o trabalho.

Entre resmungos e passos arrastados, típicos de uma adolescente contrariada, ela o alcançou. Foi capaz de chegar a tempo de vê-lo balançando Jonathan pelos ombros, esse gesto feito pelo policial fez com que uma curiosidade crescesse dentro dela para saber sobre o que conversavam.

— Até que enfim — Reclamou o delegado ingressando na viatura. — Entre no carro, não tenho a manhã toda.

— Tchau, Jonathan! — Antes de ingressar na viatura, Louise abraçou o melhor amigo com força, tentando passar o máximo de boas vibrações possíveis.

— Até daqui a pouco! — Despediu o Byers mais velho retribuindo o abraço.

[...]

O passeio de viatura foi silencioso entre ela e Hopper. Teria sido totalmente silencioso caso o delegado não tivesse que responder os chamados do rádio vindos da delegacia ou dos seus dois melhores oficiais. Entretanto, nenhuma daquelas chamadas chamou a atenção da adolescente para que prestasse atenção, principalmente por nenhumas delas servirem com o caso de desaparecimento do Will Byers.

Para a infelicidade da Louise, o delegado estacionou a viatura na frente do colégio e a esperou ingressar dentro do colégio. Por mais que tivesse insistido que não fizesse aquilo e de que a carona só serviria para que mais boatos sobre ela fossem espalhados pelos corredores, Hopper não se deu convencido. Jim queria ter certeza de que a protegida ingressaria no colégio e não daria meia volta, pedalando como se não houvesse amanhã até a casa dos Byers. Ele estava cheio de problemas e uma adolescente rebelde não seria mais um.

Ao descer da viatura e pegar sua bicicleta, Louise sentiu todo o peso do mundo ocupar seus ombros enquanto cruzava a rua em direção ao colégio. Muitos alunos a encaravam com desgosto, não tardou para que cochichos maldosos começassem a espalhar junto com teorias. Agachou para prender o cadeado a bicicleta, tentando ignorar o burburinho que formava ao redor. Mas ao tentar levantar do chão, acabou sendo empurrada por duas adolescentes, sendo forçada a cair de lado no chão duro enquanto ambas saiam rindo. Aquele seria um longo dia, isso era a única coisa que tinha certeza.

Sem dizer nada, Lola ingressou no colégio segurando firme as alças da mochila e com a cabeça erguida. Já estava acostumada com todos os olhares maldosos e fofocas horrendas, mas isso não significava que não doía. A questão é que Louise sempre fora uma mulher forte, decidida e orgulhosa, jamais deixaria transparecer para os inúteis do seu colégio o quanto eles a machucavam com suas palavras. Pois acreditava que quanto mais demonstrasse, menos a deixariam em paz.

Com o humor pior do que havia levantado pela manhã, Louise rumou para o banheiro feminino, onde tentaria ajeitar o visual. Por mais que estivesse perfumada, sentia-se suja por não ter escovados os dentes e precisava dar um jeito em seus cabelos, os quais ficaram ainda mais bagunçados depois do passeio de viatura até o colégio com a janela aberta. Depois que fizesse aquilo, passaria em seu armário para pegar os livros de história para estudar anoite e depois seguiria para a sala de química, onde faria o teste do Kamisky da melhor maneira possível antes de cabular aula para ajudar o Mike.

Entretanto, antes que pudesse ir até seu armário após deixar o banheiro feminino. A visão de Louise foi logo para Jonathan, o melhor amigo havia acabado de chegar no colégio após receber uma carona da senhora Wheeler a pedido de sua mãe. O rapaz e todo o drama que estava enfrentando eram importantes demais para que Louise ignorasse, sem pestanejar ela correu em sua direção com um meio sorriso na face.

— Oi, Lo. Imprimi uns cartazes! — Falou o rapaz mostrando a grande quantidade de folhas impressas com a foto do Will embaixo dos braços.

— Me de alguns — Pediu a menina pegando uma boa quantidade das folhas — Vou ajuda-lo a colar por aí, sei de ótimos pontos.

— Obrigado — Agradeceu o rapaz sorrindo por uma fração de segundos.

Eles caminharam em direção ao grande painel dedicado exclusivamente para a colagem de cartazes no corredor e começaram a pregar o primeiro da resma. A dupla teria trabalho para espalhar toda aquela quantidade de cartaz pela cidade, cobrindo a maioria dos lugares possíveis, mas para encontrar Will tudo valia a pena.

— Ele está tão lindo nessa foto — Elogiou a menina acariciando o rosto do pequeno no cartaz. — Acho engraçado como ele fica vermelho quando o elogio.

— Você sempre o deixa envergonhado — Jonathan soltou um riso baixo, ficando um pouco mais humorado, porém ainda assim preocupado com o pré-adolescente.

— Claro, é a minha função como melhor amiga e convivente naquela casa — Brincou Lola acariciando o braço do melhor amigo. — Vamos encontra-lo.

O sorriso estampado na face da Louise murchou quando ela viu Nancy aproximar, encarando do outro lado do corredor, estava o novo grupo de novos amigos que as duas ex melhores amigas estavam andando. Quando a menina parou ao lado do Jonathan, os lábios da Louise rapidamente crisparam e suas expressões se transformaram em completo repúdio.

— O que você quer, Wheeler? — Louise praticamente cuspiu as palavras, agindo como sempre agia na frente da outra depois que pararam de se falar, como se Nancy fosse a pessoa mais asquerosa que pudesse encontrar na face da terra.

— Eu só... — Nancy começou a falar, mas foi interrompida por Louise.

— Desembucha... — Disse a menina ficando na frente do Jonathan, o protegendo de qualquer mal que a outra pudesse causar com seu corpo. Jamais permitiria que o melhor amigo passasse pelas mesmas merdas que havia passado com ela.

— Está tudo bem, deixe ela falar — Murmurou Jonathan pousando a mão no ombro da Louise.

— Eu queria dizer, sabe, é... Eu sinto muito... — Falou Nancy quase gaguejando as palavras, improvisando todo o discurso e deixando Lola ainda mais frustrada com ela. — Por tudo isso.

— Vai dizer que eles também? — Perguntou Lola olhando com desprezo para o seleto grupo no final do corredor, os quais desviaram o olhar rapidamente, antes de voltar a encara-la.

— Todo mundo está pensando em vocês — Falou Nancy docemente, ignorando completamente Louise e encarando Jonathan com pesar.

— É? Que legal, obrigada pela preocupação. Agora pode voltar com eles. — Louise gesticulou para que a menina desse a volta e regressasse do local onde veio.

— Louise... — Chamou Jonathan tentando acalmar a melhor amiga — Ela só está tentando ser gentil.

— Não, está tudo bem. — Murmurou Nancy gesticulando como se não houvesse problemas a grosseria da Louise — Isso é um saco. E tenho mesmo que ir, teste do Kamisky.

— Até logo, até mais ver, bon voyage, arrivederci, até mais, adeus, boa viagem, vá em paz, que a porta bata onde o sol não bate, não volte mais aqui, hasta la vista baby, escafeda-se, e saia logo daqui. — Despediu-se Louise enquanto a menina se afastava do casal de amigos.

O adolescente a olhava com um misto de preocupação e surpresa estampado na face. Ele conhecia todos os detalhes meticulosos dos motivos que a fizeram ir de melhores amigas para inimigas mortais em menos de alguns meses, porém não esperava que Louise fosse reagir daquela maneira, principalmente por Nancy ter sido legal em tirar um tempo para mostrar apoio a família. Jonathan pensou em dizer alguma coisa para Louise em relação ao modo como tratou Nancy, mas preferiu não a estressar mais do que necessário.

— Você também não deveria fazer o teste? — Perguntou o rapaz preocupado.

— Oi? — Louise o encarou surpresa, como se tivesse sido acabada de ser tirada de um devaneio.

— O teste, Lola! — Explicou Jonathan.

— Ah, é! Tenho que ir... Vou ficar com uns cartazes... — Louise pegou alguns extras, mesmo já tendo uma boa quantidade em mãos — Até mais tarde — Ela ficou na ponta dos pés e depositou um beijo tenro na bochecha do melhor amigo — Se cuida.

Ao se afastar, Louise deu uma olhada breve para trás antes de ingressar na sala de aula, conseguindo ver a tempo o melhor amigo deixando o colégio. Pensou em correr atrás do mesmo e o segui-lo para onde fosse, mas a ideia passou quando o professor ordenou que ingressasse na sala de aula.

[...]

Fora complicado para Louise prestar atenção nas perguntas do teste de química. Por mais que o professor tivesse passado perguntas fáceis, pelo menos na sua, nada humilde, opinião de aluna número um, vez ou outra as fórmulas de química sumiam do cérebro e davam espaço para os pensamentos ruins relacionados com o que Will poderia estar passando por estar perdido ou então sobre o que a menina desconhecida achada na floresta poderia estar fazendo naquele instante, ou pior, do que ela poderia estar fugindo. Malucos? Assassinos? Família abusiva? Poderia ser qualquer coisa, até mesmo mais de uma.

Um grande aliviou tomou conta do seu corpo quando a menina deixou a sala de aula assim que terminou o teste de química, como se costume, foi a primeira a entregar o gabarito de resposta. O professor chegou a cogitar se Louise queria permanecer um tempo a mais para saber sua nota, entretanto ela tinha outros planos para seguir e, pela primeira vez, preferiu esperar para receber a nota junto com os outros alunos na próxima aula.

Deixar o colégio discretamente não foi uma tarefa complicada, na verdade, Louise estava tão acostumada a caminhar como um fantasma pelos corredores do colégio que acreditava que nenhuma pessoa sentiria sua falta. Talvez, as únicas pessoas que perceberiam a ausência da Louise após a primeira aula, seriam aquelas que a atormentavam quase em tempo integral, afinal a diversão deles não estaria mais ali e teriam de encontrar outro pobre coitado para importunar.

Louise tinha consciência de que a pedalada até a casa dos Wheeler deveria ser rápida, que não deveria parar no caminho para nada, seguir adiante para auxiliar Mike e montar um plano sobre o que deveriam fazer em relação a menina desconhecida. Mas o desespero para encontrar Will era maior, o que obrigava Louise a parar a cada dez metros para colar os cartazes pelos postes e quadro de avisos que encontrava no meio do caminho. Já havia passado da hora do almoço quando os cartazes acabaram e a menina se deu conta de que estava atrasada para encontrar o pré-adolescente.

Pedalando o mais rápido que pode e se xingando mentalmente, ela não hesitou em pular da bicicleta quando alcançou o gramado da casa dos Wheeler, largando o meio de transporte escondido no meio de uma das moitas de qualquer jeito. Sorrateiramente, ela ingressou pelos fundos da casa.

— Mike! — Gritou o chamando após ingressar pelos fundos — Hum, garota careca!

— O nome dela é Eleven — Falou Mike descendo as escadas que davam para o andar superior, mais precisamente para os quartos — Venha, estou mostrando minhas coisas para ela.

— Espero que não tenha demorado, fiz a tarefa o mais rápido que pude — Explicou Louise seguindo o menino pela casa.

— Pensei que não viria — Disse Mike levemente chateado com o atraso.

— Eu te fiz uma promessa, não fiz? — Perguntou Lola retoricamente arqueando uma das sobrancelhas. — Cuspi na sua mão, confia em mim!

Caso alguém cogitasse a ideia de que Louise voltaria até a casa dos Wheeler para ajudar Mike, ela riria como se não existisse amanhã. Regressar até a casa da família de Mike era a última coisa que almejava desde a briga com Nancy, aqueles corredores continham muitas lembranças que pretendia esquecer, lembranças de uma vida divertida que fora destruída graças ao desejo de Nancy por popularidade.

Uma maldita dor tomava conta do seu peito quando as memórias do passado regressavam para sua mente, não imaginava que seria tão dolorido voltar para a casa dos Wheeler depois de tanto tempo distante, depois de anos evitando todos os convites de Karen para os almoços e jantarem em família. Havia centenas de outras memórias, muitas delas sem ser relacionada com Nancy e que Louise poderia usar como desculpas para aceitar uma ou outra visita da Karen. Mas, infelizmente, a dor da perda de uma amizade da infância era mais forte do que qualquer outro sentimento nostálgico que pudesse ter.

— Espera, antes de entrar tenho que dizer uma coisa... — Mike esticou a mão, impedindo que ela continuasse. — Não podemos falar sobre a El para a mamãe.

— Por que? — Perguntou Lola preocupada. A princípio, falar sobre a menina para a mãe do Mike era o plano principal.

— Ela está com problemas...

— Que tipo de problemas? — A garota cruzou os braços sobre o peito e olhou desconfiada, dependendo de como fosse, entraria em contato direto com o Hopper. — Grandes problemas?

— Sim — Mike assentiu. Gesticulando silenciosamente, ele fez o sinal de uma arma na mão e apontou entre os olhos da Lola, fazendo com que a menina desse um pulo quando fingiu puxar o gatilho.

— Hopper precisa saber disso — Falou Lola levando a mão ao coração, aquilo era pior do que todas as teorias que poderia ter criado.

— Não, você não pode dizer nada — Falou Mike quase desesperado.

— Mike, estão tentando matar essa menina. Ela é só uma criança — Gesticulou Lola preocupada enquanto tentava manter o tom de voz normal.

— E vão nos matar também — Sussurrou Mike nervoso — Por favor, Louise. Não fale nada para o Hopper.

— Merda, Mike! — Lola levou as mãos para os cabelos e os jogou para trás — Tudo bem, não falarei nada.

— Ótimo — O pré-adolescente assentiu levemente contente com a resposta e ingressou no quarto, onde havia deixado Eleven sozinha por alguns minutos — A Lola está aqui.

Os olhos da pequena que estavam fixos nos brinquedos do Mike, deixaram de observa-los cheios de curiosidade e viraram para a adolescente que acabara de ingressar no recinto. Por uma fração de segundos, a garotinha abriu um sorriso para a mais velha. O qual rapidamente foi retribuído com a mesma intensidade.

— Oi, El! — Lola aproximou com cuidado, ainda temia que a menina saísse correndo de perto deles. — O que o Mike estava mostrando?

— Meus brinquedos — Falou o menino voltando ao local de antes — Continuando, esse é o Yoda.

— Faça ou não faça. Tentativa não há! — Da melhor maneira que pode, Louise fez uma imitação do mestre Yoda com a primeira frase que veio na cabeça. Tanto Mike quanto Eleven a admiraram com um misto de curiosidade e pena, fazendo com que suas bochechas ardessem de vergonha — É o Yoda...

— Seu Yoda continua péssimo — Zombou Mike risonho.

— Pelo menos eu tento — Reclamou Lola apoiando os ombros no batente da porta.

— Voltando... — Falou Mike dando atenção aos brinquedos, estando muito interessado em apresentar as coisas para Eleven — Ele controla as coisas com a mente, assim...

Na tentativa de imitar o mestre Jedi controlando as coisas com o poder da força, Mike empurrou a maioria dos brinquedos com ambas as mãos enquanto fazia barulho com a boca, fazendo com que parte dos objetos caíssem para fora da mesa e Louise abafasse o riso com a mão. Para ela estava sendo divertido ver a empolgação com que Mike apresentava o mundo para a nova amiga. Para sua felicidade, todas as teorias ruins feitas em relação ao Mike e Eleven estavam erradas, o menino conseguiu controlar a situação e, pelo visto, estava sendo um ótimo tutor em relação as coisas do mundo.

— Ah! Esse é meu dinossauro Rory, foi um presente da Louise — Explicou Mike mostrando o dinossauro que Lola havia dado a ele no seu aniversário de nove anos. — Ele tem um alto-falante na boca para poder rugir.

Os brinquedos deixaram de ser interessantes para Eleven e ela começou a andar pelo quarto, os seus olhos continham uma curiosidade infantil da qual Louise nunca vira. Era como se ela não soubesse o que eram metades daquelas coisas, como se a menina tivesse ficado trancafiada em algum lugar longe de tudo e todos. Talvez a teoria sobre os pais abusivos e sequestro estivesse certa.

Sorrateiramente ela e Mike aproximaram da garota perdida, seus olhos estavam fixos sobre o prêmio da feira de ciências ganho pelos meninos. Um dos orgulhos que Louise possuía quanto ao irmão e os amigos. O olhar da Louise caiu sobre a foto, recordava do dia que havia sido tirada e até mesmo do projeto, também recordava que teria ganho um prêmio na feira de ciências se os novos amigos da Nancy não tivessem quebrado seu projeto no dia anterior.

— São os meus troféus da feira de ciência, ficamos em primeiro todos os anos. Assim como a Louise. — Explicou Mike apontando para Lola — Exceto no último quando ficamos em terceiro, o senhor Clark disse que foi totalmente político.

— No último também não ganhei, aqueles babacas destruíram minhas coisas — Crispou Lola irritadiça.

A lembrança quanto aquela feira de ciências era uma das mais dolorosas para a adolescente, considerando esse o pior dia da sua vida. Naquele ano seria oferecido para o primeiro lugar uma chance de frequentar um curso de ciências oferecido pelo museu de história natural de Nova Iorque, era um curso de férias onde os melhores alunos aprenderiam sobre ciências naturais colocando a mão na massa. Desde que soube do prêmio, Lola dedicou sua vida ao projeto, passou meses pensando e aprimorando tudo, para que no final dessem resultados positivos e saísse de nível profissional. A menina nunca tinha ficado tão empolgada com algo, como foi o caso desse projeto. Mas, infelizmente, todo o seu trabalho foi perdido no dia em que montou o estante para a apresentação.

No dia marcado para o evento, Louise foi alguns minutos mais cedo para o colégio, pegando carona com Jonathan. Com ajuda do melhor amigo, eles montaram tudo para que surpreendesse os jurados da competição. Por ter de buscar Will e os meninos, Jonathan acabou tendo que sair por alguns minutos e deixar Lola sozinha com o projeto, o que acabou sendo um erro. Quase que no mesmo instante em que o menino saiu, Tommy H, Nicole e Carol apareceram no colégio. Lola tentou ignorar a presença deles, mas foi em vão quando decidiram que tinham de destruir o que quer que ela tivesse feito. A menina tentou de todas as formas proteger o que era seu, proteger sua chance de sair da cidade, mas foi em vão. Em poucos segundos seu projeto foi destruído pelas mãos do trio.

Tomada pela raiva, cheia de fúria, decepção e sonhos despedaçados. A adolescente não hesitou em começar a socar Carol e Nicole, porém eram três contra dois, Tommy H acabou segurando a menina para que as duas pudessem bater nela. Eles só pararam com a chegada de Steve Harrington, o qual teve que socar Tommy para que ele soltasse Louise. O quarteto saiu correndo, deixando Lola caída no chão. Por não ter provas que foram os três, o assunto não foi levado adiante pela direção do colégio e a chance do acampamento de ciência escapou entre seus dedos.

— Conhece o Will? — Perguntou Mike fazendo com que Louise deixasse de prestar atenção em seus devaneios e voltasse a dar atenção para a menina em sua frente, ela apontava assustadiça para o Byers na foto. — Você o viu? Ontem anoite? Na estrada?

Antes que Eleven pudesse responder qualquer pergunta feita por Mike, o barulho do carro da Sra. Wheeler aproximando da casa fez com que eles se assustassem. Os olhos do trio ficaram arregalados, Lola foi a primeira a correr até a janela para contar o tempo que tinham até que Karen entrasse na casa.

— Merda, Mike! Sua mãe! — Falou Lola preocupada, não tinha uma desculpa na ponta da língua dessa vez.

— Eu sei, droga! Temos que ir! — Mike agarrou na mão de Eleven e a puxou para fora do quarto, Louise aproveitou para correr atrás das crianças, para que também pudesse se esconder.

Quando estavam prestes a alcançarem o final da escada, a Sra. Wheeler ingressou na casa. Ela carregava Holly no colo e conversava com uma vizinha, pedindo Pizza e Macarrão.

— E agora? — Perguntou Louise aos sussurros para Mike.

— Eu não sei — Respondeu o menino também aos sussurros enquanto corriam para o andar superior.

— Teddy, é você? — Perguntou a Sra. Wheeler preocupada quando escutou os passos.

— Sou eu, mãe — Gritou Mike enquanto corria com Eleven e Lola para cima.

— E eu, Sra. Wheeler — Respondeu Louise automaticamente.

— Louise? — Perguntou a mulher surpresa.

— O que você está fazendo? — Perguntou Mike arregalando os olhos.

— Eu enrolo ela, esconde a El. — Murmurou Lola antes de responder a senhora Wheeler — Sim, eu trouxe o Mike em segurança.

— Mas a Joyce disse que estava na escola — Disse Karen levando as comprar para a cozinha — Que o Hopper havia a levado.

A menina fez uma careta, iria precisar de uma boa história para que Karen engolisse aquilo. Mas não tinha o que fazer, foi uma sorte que a mulher não tenha visto sua bicicleta jogada na grama no quintal. Mesmo hesitante, ela desceu as escadas, deixando que Mike resolvesse as coisas com Eleven. Com passos tímidos, foi até Karen e a abraçou com ternura enquanto pensava no que dizer em sua defesa e do Mike.

— Oi, tia — Cumprimentou Lola a abraçando forte — Estive com muitas saudades.

— Sabe que nossa casa sempre esteve de braços abertos para você. — Explicou a mulher retribuindo o abraço — Lembra da Holly?

— Claro que lembro — Lola soltou da mulher e foi até Holly, a menina estava mais linda do que ela recordava e muito maior também. — Oi, como você está grande. Quer vir no colo da tia?

Mesmo que estivesse temerosa com a aproximação da Lola, a pequena aceitou o convite e subiu em seus braços. Um riso fraco escapou dos lábios da adolescente quando sentiu o peso da criança, mas não a soltou novamente. Sentia falta de quando Dustin tinha aquele tamanho e ela podia carrega-lo para cima e para baixo.

— Você sempre teve jeito com crianças — Disse Karen sorrindo — Vai ser uma ótima mãe quando chegar a hora.

— Espero que demore — Disse Lola sorrindo para Holly.

— Mas vocês ainda não me disseram o que estão fazendo aqui a essas horas — O olhar da Karen foi da Lola para o Mike num piscar de olhos. — Vamos! Os dois!

A preocupação com o filho e a adolescente eram evidentes. Ela retirou Holly dos braços da menina e gesticulou para os ambos a acompanhassem até a sala. A mulher colocou a pequena sobre o tapete e esperou para que Mike e Louise sentassem no sofá para que pudesse sentar, tentando dessa forma tirar qualquer informação deles.

Automaticamente a perna da Lola começou a tremer devido ao nervosismo enquanto observava os móveis intactos da família, a casa continuava a mesma, tudo impecavelmente bem arrumado e limpo. Lola cogitou a ideia de elogiar o recinto, mas calou-se ao dar de cara com as expressões severas da Karen que esperava por respostas.

— Então... — Disse Karen olhando do Mike para Lola.

— A Lola me trouxe em segurança — Começou Mike antes que a menina pudesse dizer algo, principalmente sobre Eleven — Eu acordei e a minha cabeça doía demais, a minha garganta estava arranhando e eu queria dizer, mas da última vez que eu fiquei doente, você me obrigou a ir para a escola.

— É verdade, senhora Wheeler — Assentiu Lola concordando com a mentira. — Por favor, não fica com raiva dele.

— Michael! Não estou com raiva de você — Disse Karen após ouvir a explicação — E estou feliz que a Lola tenha o acompanhado até em casa, que estão aqui, em segurança. Com tudo o que aconteceu com o Will, isso deve estar sendo horrível para vocês. Olha só, — Ela esticou uma mão tocando a do Mike e a outra a da Lola — Quero que se sintam à vontade para falarem comigo, eu não quero que sintam que tenham que esconder alguma coisa de mim. Podem contar comigo, 'tá bom?

— 'Tá bom — Assentiu Lola confusa com o que havia acabado de acontecer.

Antes que pudessem dizer qualquer outra coisa, ocorreu um barulho no andar superior que as crianças tinham certeza que fora feito pela Eleven. Assim como os dois, Karen também olhou para cima, como quem procurasse a fonte do problema.

— Tem mais alguém com você? — Perguntou a mulher curiosa.

— Não! — Responderam em uníssono.

— É um trabalho de ciências que estou testando, sabe como é... — Falou Lola dando com os ombros — Mike não foi no colégio, mas não podemos deixar de estudar.

— Acho melhor voltarmos para ele, caso a mamãe não se importe — Disse Mike ficando em pé ― Ele é muito interessante.

— Mas é surpresa — Completou Lola rapidamente, antes que Karen quisesse olhar sobre o que tratava. — Se a senhora não se importar, é claro.

— Não, podem subir. — Gesticulou a mulher os liberando — Ficará para o jantar, Lola?

— Claro, porque não? — Para aquela pergunta só havia uma resposta correta.

— Louise! Espera! — A Sra. Wheeler chamou a adolescente antes que terminasse de subir as escadas com Mike. — Será que podemos conversar?

— Hum... Claro! — Assentiu Lola um tanto confusa.

— Não fale nada sobre a El — Pediu Mike aos sussurros — Aconteça o que acontecer.

— Tudo bem e confia em mim. — Assentiu Lola retrocedendo o caminho.

[...]

Karen estava na cozinha esvaziando as sacolas de compra quando Louise regressou para próximo a ela, assim que viu a adolescente parada com receio no meio do caminho, ela apontou para uma das bancadas próximas. Compreendendo o recado, ela deu mais alguns passos para a frente e, em silêncio, começou a ajudar a senhora Wheeler com as compras e o jantar. Todos sabiam que Louise não é uma boa cozinheira, mas não significa que não seja proativa, estando sempre disposta a ajudar em qualquer que seja o assunto.

— Soube que brigou com a Nancy — Disse a Sra. Wheeler após alguns longos segundos de silêncio, um sorriso tenro pairava em sua face. Diferente do que acontecia com Lola, a qual praticamente congelou — Todos sabem, Lola. E está tudo bem. Sei que isso é apenas uma fase, vocês não são bobas em jogar anos de amizades fora.

Por mais que a tentação de dizer o que realmente havia acontecido para que ela e Nancy não estivessem mais conversando tomasse conta do seu ser, Louise não queria colocar a menina em problemas. No fundo sentia-se tola por isso, por proteger Nancy das broncas da mãe, mas ao mesmo tempo queria que Nancy descobrisse sobre a verdadeira face das suas novas amizades por si mesma, desejava que quebrasse a cara sozinha e viesse com o rabo entre as pernas pedir desculpas para ela.

Louise soltou um suspiro e acenou com a cabeça, tentando um sorriso como resposta. O que acabou gerando uma careta meio esquisita. Mas, felizmente, Karen não insistiu no assunto da amizade entre ela e Nancy.

— Joyce estava te elogiando, ela e Jonathan estão gratos pelo apoio que vem dando a família nesse momento de crise — Disse Karen quebrando novamente o silêncio, um sorriso breve brotou nos lábios de Lola no momento que revelou isso — E também estou grata por estar com os meninos, principalmente com o Mike. Sei que é um momento difícil. Gosto de saber que ele confia em alguém.

— As crianças são especiais para mim, sempre estarei ao lado delas — Falou Louise com sinceridade.

— Você não precisa passar por isso sozinha, Louise ―—Falou a Sra. Wheeler tocando a mão dela com ternura — Pode desabafar comigo, sobre qualquer coisa.

— Eu sei — Assentiu Louise afastando a mão num gesto impensado, o olhar piedoso que Karen lançava para ela fazia com que se sentisse estranha. Odiava receber aquele tipo de olhar, não necessitava daquilo. Era uma garota forte, conseguia enfrentar todos os problemas sozinhas.

[...]

Durante o resto do tempo Louise permaneceu em silêncio, tentou rir de uma ou outra piada feita pela senhora Wheeler enquanto a ajudava com o jantar, mas estava extremamente nervosa. Sua intenção a ir para a casa da família era ajudar Mike a resolver os problemas com a Eleven, foi esse um dos motivos que a tornaram um membro honorário no grupinho do irmão mais novo, não estava em seus planos ajudar a preparar o jantar, muito menos, preparar sozinha um bolo de carne.

Estava andando em terrenos perigosos, qualquer palavra que dissesse poderia ser usada contra ela mesma, ou pior, transformaria sua vida escolar em um inferno maior ainda devido aos novos amigos da Nancy. Tinha certeza de que se abrisse a boca e deixasse uma mísera informação sobre o monstro que Nancy vinha sendo escapar, as coisas ficariam terríveis para seu lado. Não era como se aquilo fosse possível, mas não queria testar os limites da maldade humana.

Para a felicidade da Lola, ela conseguiu escapar da cozinha e, principalmente, de Karen quando o irmão mais novo chegou na casa do melhor amigo acompanhado do Lucas. Sem hesitar, ela largou tudo o que estava fazendo e subiu as escadas com os garotos, dando a desculpa de os ajudaria a terminar o projeto de ciências para a próxima exposição.

— Desculpa a demora, o que eu perdi? — Perguntou Louise sendo a última a ingressar no quarto do Mike e trancando a porta atrás dela. — Sua mãe está me deixando maluca.

— Mike acabou de dizer que a ela sabe sobre o Will — Falou Lucas rispidamente. Pelo tom de voz era visível a sua frustração por Eleven permanecer com eles.

— Sim, ela sabe — Assentiu Lola cruzando os braços sobre o peito.

— E você age como se não fosse nada demais? — Rebateu Lucas irritadiço.

— Óbvio que não! — Lola revirou os olhos e levou a mão até a testa — Custa escutar por alguns instantes antes de ficar todo nervosinho?

— Escutem! — Mike chamou a atenção dos amigos antes que Lola e Lucas começassem a discutir. Ele correu até a foto do grupo na estante e a retirou do local — Ela apontou para ele, nessa foto. Ela sabia que ele sumiu, dava para ver...

— Dava para ver? — Perguntou Lucas descrente.

— Acha mesmo que foi coincidência termos achado ela na mesma noite que perdemos o Will? — Perguntou Louise aproximando da menina perdida — Praticamente no mesmo lugar? Logo na Floresta das Trevas.

— Isso é estranho! — Concordou Dustin acreditando firme nas palavras da irmã.

— E ela disse que pessoas más estão atrás dela — Continuou Mike olhando para cada um dos meninos em sua frente — E, talvez, as pessoas más sejam as mesmas que pegaram o Will. Ela sabe o que aconteceu com ele.

— E porque ela não conta para a gente? — Perguntou Lucas com os braços cruzados sobre o peito. Irritadiço e cheio de fúria na voz, ele caminhou em direção a menina sentada na cama ao lado da Louise, a qual estava em pé. Sem pestanejar começou a gritar com a menina — Você sabe onde ele está? Você sabe onde está o Will?

— Para, você está assustando ela! — Louise empurrou Lucas para longe da garotinha quando o menino começou a chacoalha-la pelos ombros. Não permitiria aquele tipo de comportamento. Infelizmente o empurrão fez com que Lucas caísse de bunda no chão e ficasse ainda mais frustrado com a presença dela no recinto. — Desculpa.

— É pra ficar assustada! — Respondeu o menino ignorando o pedido de desculpas e com um único impulso.

— Mas não precisa falar assim com ela! — Rebateu Louise ficando na frente de El, impedindo que o rapaz aproximasse novamente. — El, se você sabe onde o Will está, por favor, conta.

— Isso é loucura! — Lucas gesticulou nervoso e virou-se para Mike ao notar que a pergunta feita por Lola não daria resultado — Temos que levar ela para a sua mãe.

— Não! — Respondeu Mike rispidamente — A El disse que contar aos adultos nos colocaria em perigo.

— Que tipo de perigo? — Perguntou Dustin falando pela primeira vez desde o começo da discussão. Por conhecer o irmão como a palma da sua mão, Lola sabia que ele estava nervoso com toda aquela briga, pois estava agindo da mesma maneira de quando seus pais brigavam até o momento do divórcio.

— O nome dela é El? — Perguntou Lucas ignorando a pergunta do Dustin.

— O nome dela é Eleven, El é apelido — Disse Mike para Lucas.

— Mike! Que tipo de perigo? — Perguntou Dustin erguendo o tom de voz, estando um pouco frustrado por ter sua pergunta ignorada pelos amigos.

— Perigo! Perigo! — Respondeu Mike rispidamente, tentando colocar um ponto final naquela discussão.

Da mesma maneira como havia explicado para Louise mais cedo, Mike fez sinal de revólver com uma das mãos e apontou entre os olhos do Dustin por alguns segundos, em seguida mirou para Lucas. Mas antes que pudesse fazer o gesto de tiro, Lucas bateu em sua mão a empurrando para baixo.

— Não. Não. Não! — Disse Lucas nervoso enquanto gesticulava abertamente — Vamos voltar para o plano A. Vamos contar para a sua mãe.

Decidido que seguiria com o primeiro plano, Lucas caminhou em direção a porta do quarto. Mas assim que abriu, uma força maior e sem explicação aparente fechou a porta antes que ele pudesse sair. Ele tentou abrir pela segunda vez, mas novamente essa força fez com que a porta trancasse.

— El... — Lola deu um passo para trás, afastando da menina quando percebeu que era a responsável por tal "mágica".

Os três meninos viraram na direção da garotinha, estando tão assustadiços quando Louise ao perceberem que estavam com uma própria mutante do X-Men diante deles. A menina estava com uma das mãos esticadas em direção a porta e a sua narina esquerda sangrava.

— Não! — Falou Eleven em pé, finalizando o assunto.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, em breve postarei o próximo capítulo. Beijos, Lyra



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "HOLD THE LINE - Livro #01" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.