Cicatrizes de Tinta escrita por Sarah


Capítulo 2
Capítulo 02




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O primeiro pensamento de Remus quando a mulher entrou no estúdio foi que ela tinha passado perfume demais. O segundo foi que ela era uma mulher bonita, por volta dos quarenta anos, com uma postura muito digna, seios fartos e cabelos pintados de ruivo, que combinavam com sua pele clara.

— Você tem certeza de que quer isso? — Remus perguntou, porque era o procedimento padrão. — Não há volta atrás — ele advertiu, embora a mulher parecesse muito segura ao largar sua bolsa num canto e sentar na maca.

Ela sorriu para Remus.

— Graças  a Deus não tem volta. Eu não vou querer voltar atrás.

A mulher desabotoou a camisa com um movimento fluído, revelando uma lingerie de renda e uma cintura fina. Logo abaixo do seu seio esquerdo havia um nome desenhado em letras de forma — Vincent Crabbe. Deus, Crabbe certamente fora um cara muito sortudo para ter seu nome desenhado no corpo daquela mulher, e muito estúpido para que ela acabasse ali, querendo se livrar da marca.

— Qual nome você quer que eu escreva, e onde?

Ela o olhou como se ele fosse muito tolo.

— Theodore Stewart. Sobre o nome antigo, é óbvio. Pelo que eu sei, é possível.

Ao menos o nome que ela queria desenhar era maior do que o da sua alma-gêmea, mas esse não era realmente o problema.

— Vai doer — Remus alertou. — Não apenas porque eu vou estar usando agulhas  na sua pele… Cobrir a marca vai destruir a ligação, e a ligação é uma parte de você.

Se a pessoa fosse muito nova, ou o vínculo muito forte, era o tipo de dor que podia enlouquecer alguém. Remus normalmente apenas desenhava um nome novo, e então a pessoa se encarregava de esconder a marca verdadeira.

Ele explicou as consequências que desenhar diretamente sobre a marca poderia ter — a agonia durante o processo, a depressão que quase sempre vinha a seguir, mesmo com um vínculo desgastado, a possibilidade de que tudo aquilo resultasse em arrependimento —, e durante todo o tempo a mulher apenas o encarou com um olhar firme e meio entediado.

— Sobre a marca — ela reafirmou assim que suas palavras cessaram.

Diante disso, Remus suspirou e começou a arrumar o seu material.

— Se você precisar que eu pare, basta dizer — ele falou quando estava tudo pronto.

— Vou ficar bem, amor — a mulher assegurou, sorrindo para ele. — Faz vinte e dois anos que eu não o vejo. Vincent me batia. Eu juro que não sei que tipo de coisa horrível existe dentro de mim para que ele fosse minha alma-gêmea. Mas, agora, depois de todo esse tempo, eu conheci essa pessoa, e Theodore me mostrou o meu nome marcado no corpo dele. Talvez seja outra mulher com o nome igual ao meu, mas Theodore diz que gosta de mim, e é gentil, e eu acho que mereço isso tanto quanto qualquer outra pessoa, querido.

Remus percebeu que concordava com ela. De fato, todo o incômodo que a mulher se permitiu demonstrar durante todo o processo foi manter-se com os punhos cerrados.

Quando tudo terminou, ela agradeceu e o beijou nas duas bochechas, deixando-o com marcas de batom, com uma quantia de dinheiro bastante considerável e uma indistinta sensação de tristeza.

.

.

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Remus estava se despedindo de uma moça um pouco mais velha do que ele, branca de dor depois de Remus ter escrito em cima do nome da sua alma-gêmea, quando James apareceu na outra ponta do corredor. A menina pareceu ainda mais pálida ao cruzar com ele, encolhendo-se dentro do seu sobretudo, embora James mal a tivesse encarado.

Não havia nada que Remus pudesse fazer para aliviar o desconforto dela, então limitou-se a sorrir para James e conduzi-lo para dentro o mais rápido possível. Ele sacudiu um punhado de neve do cabelo ao entrar, tirando o casaco e jogando-o sobre o sofá onde Sirius tinha dormido algumas semanas antes.

James tinha ligado mais cedo falando que iria até ali, o que não era algo comum. Seu estúdio definitivamente não era o melhor ponto de encontro que Remus poderia pensar, mas James não tinha dado tempo para que ele fizesse qualquer oposição.  

O outro deu uma volta completa pelo lugar, sem nem parecer se dar conta de que estava fazendo isso, repleto daquela energia incontrolável que no colégio significaria que eles estavam prestes a fazer algo incrível, ou quebrar as regras, ou se meterem em encrenca; ou, mais possivelmente, tudo ao mesmo tempo. Por instinto, Remus sentiu sua própria adrenalina zunir no estômago.

De repente, James parou e apontou para um balde com vômito num canto.

Oh, droga — Remus se adiantou para se livrar daquilo

— Trabalho difícil? — ele perguntou, e Remus assentiu. — Porque ela decidiu fazer isso? Se você pode contar…?

— Eles eram primos, ela e a sua alma-gêmea. Ele morreu quando os dois tinham oito anos. Ela achou que não havia mais sentido e manter o nome.

— Parece compreensível — James falou enquanto Remus lavava as mãos.

— Sim — Remus concordou, voltando para perto do outro. — Você quer ir beber alguma coisa, ou…?

James dispensou sua pergunta com uma mesura.

— Quero que você desenhe em mim.

Remus sentiu sua boca seca. Cada músculo do seu corpo ficou tenso, e ele deu um passo atrás.

— Não. Nem pensar.

Ele nunca tinha visto a marca de James. Muito provavelmente Sirius teria ficado tão envergonhado em ver a marca dele quanto em mostrar a sua, então, mesmo que James não estivesse tão preocupado como Sirius sobre isso, ele também nunca havia mencionado o nome gravado no seu corpo, ou perguntado aos outros sobre suas marcas. Remus também sempre fizera o melhor para evitar aquele assunto quando dizia respeito a si mesmo, mas algumas vezes James escorregava e deixava escapar que gostaria de encontrar sua pessoa, e havia carinho na sua voz ao falar essas coisas. Não era possível que algo tivesse dado tão errado que ele queria apagar o nome, ou ter uma nova marca…

— Deuses, fique calmo, Remus — James falou, e o idiota estava sorrindo.

— Explique-se.

— Eu disse que queria um desenho, não um nome.

A expressão de Remus se torceu em descrença e irritação.

— Também não vou fazer isso.

Às vezes ele fazia desenhos, e era muito bom naquilo. Não era um tabu tão grande quanto escrever um nome falso, mas era considerado um desrespeito. A maioria das pessoas que queria um desenho eram muito novas e o faziam como uma rebeldia, uma forma de mostrar que sua alma-gêmea não era o centro do seu universo. James não era o tipo de pessoa que faria algo assim.

— Eu a encontrei, Remus. — Remus piscou duas vezes, sentindo-se gelado. Ele sempre se perguntara quem encontraria sua alma-gêmea primeiro, James ou Sirius. Ohh, graças aos deuses por ter sido James. — Ela é mais bonita do que eu conseguiria imaginar. E gentil. E, eu, droga, eu não esperava que realmente fosse me sentir desse jeito.

Remus nunca havia duvidado que ela seria perfeita, simplesmente porque James não merecia nada menos.

— Eu estou feliz por você, James, de verdade. Mas não entendo porque não estamos em um bar comemorando isso, ou qualquer coisa assim, em vez de aqui, com você querendo que eu coloque tinta na sua pele. — Céus, ele realmente precisava de uma bebida.

Em vez de responder, James sorriu mais amplo, e puxou a camisa para fora do corpo.

No canto esquerdo do seu tronco, bem no meio das costelas, estava escrito Lilian.

De alguma forma, aquilo parecia mais íntimo do que se James tivesse ficado completamente nu, mas ele não parecia incomodado.

— Você pode desenhar lírios ao redor do nome? Algo delicado?

Algo para tornar o nome ainda mais importante, então, e não para rivalizar com a marca. Remus percebeu que fora vencido. Não era exatamente uma novidade, James sempre ganhava, afinal.

— Você tem certeza? — perguntou, apenas porque era o que ele sempre fazia.

Obviamente, James balançou a cabeça em um sinal afirmativo.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por estar lendo! ♥



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