Por cima dos óculos escuros, olhei pro mar. Era um dia que qualquer turista iria amar: praia, sol, calor. Perfeito!

Me alonguei um pouco e peguei o protetor solar, começando a espalhar pelos braços.

Olhei pro mar e vi uma figura sair da água, com uma prancha em mãos. Parecia caminhar em minha direção. Ignorei e continuei com o meu trabalho de passar protetor.

De repente, uma sombra tampou meu sol:

— Olá! Está sozinha? — Mirei pra cima e vi um rapaz loiro e bronzeado, completamente molhado, me olhando com um sorriso enviesado. O encarei, ainda compreendendo a situação. Aquele surfista estava mesmo falando comigo? — Seria muito incômodo se eu pedisse pra você ir para outro lugar? Por favor?

Tentou parecer simpático, mas continuava com aquele sorriso. Cara, por que comigo? Por que ele simplesmente não foi escolher outra pessoa? Conheço tipos como o dele e minha intuição começou a gritar: fica longe dele!

— Sim, seria incômodo, sim. — Tentei ignorá-lo e voltei a passar protetor.

Ele me encarou, talvez surpreso com a resposta. Rá, estava achando que eu simplesmente ia conversar com ele? Muito enganado, caro surfistinha bronzeado.

— Olha, não é por nada não, mas eu só ia pedir pra você sair, porque....

O rapaz não terminou sua explicação, pois uma bola atingiu minhas costas a toda velocidade. O objeto bateu em mim e rolou um pouco para o lado. Uma dupla de rapazes veio correndo até nós e pegou a bola, voltando para o jogo de vôlei a alguns metros de distância. Minhas costas ardiam onde a esfera acertou.

— Porque a bola ia acabar te acertando. — O surfista me encarava com um sorriso divertido e eu bufei.

Comecei a pegar minhas coisas e a esteira de praia. Me levantei e comecei a caminhar em direção à praia Leste.

— Desculpa, nem cheguei a me apresentar. — O cara começou a andar ao meu lado. Apressei o passo, porém ele fez o mesmo. — Sou Dakota, mas pode me chamar de Dake. E você?

Dei meu olhar mortífero por cima dos óculos de sol.

— Alguém — Tentei dar uma de evasiva e sai andando, sem olhar para trás.

O rapaz estacou na areia.

— De nada, viu? — O ignorei e continuei andando.

...

Lia uma revista, enquanto permanecia estirada na esteira, tentando pegar um bronzeado. Porém, hoje parecia não ser o meu dia. O sol sumiu e o céu começava a nublar. Tudo me dizia que hoje seria ensolarado, ótimo para se ir à praia. Porém, pelo visto, minha intuição me enganara.

Um vento começou a soprar, quase folheando as páginas da revista e eu a segurei firme para não voar. Meu cabelo açoitava o rosto. Maravilha, agora vai chover! Só porque eu achei que ia fazer calor...

Me levantei e comecei a guardar minhas coisas.

— Quer ajuda? — Ouvi a mesma voz de mais cedo e respirei fundo. Calma, não precisa ser grossa. Só respondê-lo de jeito e ele vai embora.

— Não precisa — retornei com voz amena. Estava guardando as coisas na bolsa, quando minha revista começou a voar.

O loiro largou a prancha na areia e saiu correndo atrás. Terminei com minhas coisas. Poucos depois, o rapaz voltou.

— Obrigada — agradeci, para não parecer uma mal-educada.

— Por nada. — E ele abriu um sorriso de dentes brilhantes e alinhados. Ele vai tentar alguma, quer ver?  — Mau dia pra vir à praia, hein?

— Pois é. — Concordei junto de um aceno de cabeça e enrolei minha esteira. — Boa tarde pra você — desejei mecanicamente e comecei a ir embora. Quando os pingos começaram a cair.

Iniciei uma corrida. Talvez desse tempo de eu chegar ao meu carro, que estava na praia Oeste, antes que a chuva aumentasse.

— Ei, moça! — o rapaz gritou e eu olhei pra trás. Os pingos iam aumentando. Ele parou ao meu lado e ergueu a prancha de surfe sobre nós. — Assim não nos molhamos. — E continuou com aquele sorriso de dentes brilhantes dele. Ele estava sendo simpático ou é impressão minha?

— Meu carro está longe, vou demorar um pouco pra chegar até lá.

— Não tem problema. Senão você vai chegar lá encharcada. — O encarei um pouco e ele permaneceu do mesmo jeito. Nos encaramos um pouco e eu soltei um “tudo bem”.

Começamos a caminhar em direção a onde estava meu carro. Acreditava que ele ia puxar conversa no meio do caminho e, talvez, tentasse alguma investida. Mas me enganei. De novo. Dake, como se chamava, começou a contar sobre sua vida. Parecia apenas uma daquelas pessoas que não se importava em falar da própria vida para os outros. Se sentia à vontade com isso.

Finalmente paramos em frente ao meu carro.

— Não tão seca assim, mas tá aí — disse com um ar engraçado e destranquei a porta. Me virei para ele.

— Obrigada, Dake.

— Por nada...

— Deborah. — Acabei falando meu nome. Não era nada demais. Além disso, não saberia se eu voltaria outro dia e o encontraria novamente. E ele não era má pessoa, apesar do que minha intuição me dizia.

Dake sorriu.

— Achei que ia ter que ficar o tempo todo te chamando de “garota dos óculos de sol”. — Acabei não contendo um sorriso com essa graça dele. — Até a próxima, Deborah.

— Como você sabe que vamos nos esbarrar de novo?

— Intuição — respondeu com um dar de ombros. A chuva ainda caía e eu entrei no carro.

— Se eu fosse você, não confiava muito nela.

— A minha intuição nunca falha — soltou meio cheio de si e com um último sorriso.

Dei tchau a ele e liguei o carro. Observei sua figura ir sumindo aos poucos, debaixo da mesma prancha de surfe, enquanto a chuva caía e atrapalhava minha visão de sua silhueta.

A intuição dele poderia não falhar. Mas a minha, sim.