No Taste escrita por Haruyuki


Capítulo 1
No Taste


Notas iniciais do capítulo

Feliz Aniversário Yuuri Katsuki.



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Abro meus olhos, sentindo uma forte dor de cabeça. Começo a tossir e cuspir água, com meu corpo todo dolorido. Vejo uma forma se mover à minha frente, e sinto suas mãos calorosas no meu rosto. Fecho meus olhos, e me sinto ser tocado por outro par de mãos, que massageiam minhas costas, e eu boto para fora mais água, soltando gemidos. Escuto duas vozes, mas não consigo entender o que dizem. Me sinto ser carregado nos ombros de alguém, e é a última coisa que eu lembro.

~x~

Abro meus olhos, tossindo fortemente. Sinto uma pequena mão me tocar na testa, e logo um pano úmido frio é colocado no mesmo lugar. Giro meu rosto, e vejo um grande par de olhos castanhos brilhantes me olhar com curiosidade por entre um grande par de óculos de armação azul, e me assusto, me levantando.

Uma mulher gorda me toca no ombro, e eu noto que ela me olha com preocupação. Ela fala algo, mas eu não entendo. Ela olha para o menino gordinho, dono dos olhos brilhantes e fala algo. O menino responde algo e sai correndo para fora do quarto.

A mulher apalpa a cama duas vezes e eu me deito. Percebo que estou usando roupas largas, e que estou muito suado. Ela me dá um pouco de sopa e água, e eu volto a cair no sono.

~x~

Acordo me sentindo muito melhor. Sinto algo segurar minha mão e quando me levanto, vejo o menino de antes dormindo ao meu lado, tranquilamente.

“Olá?” Escuto, e vejo na porta uma moça de longos cabelos castanhos claros. “Fala Inglês?”

“Sim.” Respondo, rouco. “Onde estou?”

“Hasetsu, no Japão. Você está em uma pousada com fontes termais.” Ela responde, cruzando os braços. “Meu nome é Minako Okukawa.”

“Victor Nikiforov. Eu sou russo.” Respondo, respirando fundo. “Como vim parar aqui?”

“Agradeça a esse garoto aí. Ele e o pai dele estavam andando na rua quando ele viu algo você desacordado na praia. Você quase que morre afogado. O pai dele foi quem te trouxe para cá e a mãe dele quem cuidou de você durante uma semana.” Ela explica e eu arregalo os olhos.

Eu estou uma semana abusando da hospitalidade dessas pessoas? Essa não.

“Você se lembra do que aconteceu antes de ser encontrado?” Ela pergunta e eu fecho os olhos, tentando me lembrar.

“Um pouco. Eu acho que estava em um navio e o mar começou a ficar agitado.” Respondo, sentindo o menino se mexer ao meu lado e se levantar, esfregando os olhos inchados.

“Quantos anos você tem?” Ela pergunta, se sentando na cama e pegando o menino nos braços.

“10.” Respondo, vendo-a se levantar.

“Hmm. E o que você gosta de fazer?” Ela pergunta, me fazendo respirar fundo.

“Cozinhar.” Respondo, mordendo o lábio. “Dançar e patinar no gelo.”

“Isso é bom!” Ela exclama, me assustando. “Eu ensino balé para todas as idades e temos um ringue de gelo não muito longe daqui. Sinta-se livre para aparecer um dia desses no meu estúdio. Eu quero ver você dançar.”

Quando ela se vira de costas, vejo que o menino fala algo para a mulher, que responde falando o meu nome e então me olha, abrindo um largo sorriso.

“Vi...Vi?” Ele olha para Minako, que repete meu nome para ele. “Vicchan?”

“Você se importa se ele te chamar assim? Yuuri aqui tem 6 anos.” Ela responde, abrindo a porta do quarto.

“Não. Está tudo bem.” O menino russo responde.

Ela fala mais algo para o menino em seus braços, que dá risada e olha para mim.

“Vicchan!” Ele diz, apontando para mim e depois aponta para si. “Yuri.”

“Yuri.” Dou uma risada, mas ele nega com a cabeça, fazendo bico.

”Yu-u-ri.” Ele fala, e eu repito, o vendo erguer os braços, dando gargalhadas.

Ele está feliz. E isso me deixa feliz.

Minako Okukawa me mostra a pousada, e me apresenta ao casal que me ajudou, que são os donos do local e país do menino. Eles se chamam Hiroko e Toshiya Katsuki. Tem também Mari Katsuki, que está estudando para fazer provas na escola. Minako fala algo para Yuuri, que afirma com a cabeça.

Minha barriga ronca, e eu fico embaraçado. Hiroko Katsuki me estende uma tigela enorme com comida dentro.

“Ka-tsu-don!” Yuuri fala, sentado no chão  com uma tigela do prato à sua frente, na mesa.

O observo pegar palitos com desenhos azuis e pegar um pedaço de algo empanado, e dar uma mordida, falando coisas sem sentido com uma expressão de pura alegria. Olho para o prato à minha frente e mordo o lábio, comendo um pouco do que me foi servido. E como era de se esperar, eu não sinto gosto de nada.

“É delicioso.” Minto, tentando parecer convincente.

“Não é? Hiroko prepara o melhor Katsudon existente!” Minako exclama, e fala algo para o casal, que sorri. “Ela agradece.”

Mas meus olhos param no menino, que me olha firmemente. Como se pudesse ver dentro de mim. Ele termina de comer, se levanta da mesa e se senta ao meu lado, para a minha surpresa.

“Yuuri?” Minako pergunta, mas o menino apenas balança a cabeça, negando.

Quando termino de comer, me sinto muito bem, pela primeira vez em um bom tempo. Sinto que o que comi me aquece por dentro, e me dá uma sensação de ternura que nunca senti antes em uma refeição. Quando sinto duas mãos me tocar nas minhas bochechas, eu noto que estou chorando e que Yuuri está tentando enxugar minhas lágrimas, apesar dele mesmo estar chorando.

“Por que você está chorando?” Minako pergunta, e provavelmente pergunta pro menino, que com o que ele responde, ela arregala os olhos.

“Eu estou chorando… porque este lugar é incrível.” Victor responde.

“Não. Você está chorando porque você estava sofrendo por dentro e agora está botando tudo para fora.” Minako fala, me assustando. “Foi o que eu entendi de Yuuri.”

O menino então me abraça, e eu retribuo o gesto, chorando muito.

“Yuuri.” Chamo, mas o menino não se move.

“Oh, ele provavelmente adormeceu. Pode por ele na cama que você está deitado e voltar para cá? Ainda quero conversar muito com você.” Eu afirmo com a cabeça, me levantando e o levando até o quarto.

Com um pouco de dificuldade, eu o coloco na cama e aproveito para olhar melhor o quarto em que estou. Diversos pôsteres de um patinador famoso e de bailarinos é o que mais se destaca. E então me pergunto se aquele quarto é dele.

“Vicchan.” Escuto, e me surpreendo.

Ele está sonhando comigo?

De volta, vejo Minako com um jornal, e arregalo os olhos quando vejo a foto do navio em que estava.

“Esse navio…” Ela começa e eu afirmo com a cabeça. “Sente-se.”

Obedeço, e ela aponta para um número na matéria.

“146 mortos.” Ela fala, e eu congelo. “Seu nome está aqui também. E os nomes Katerina e Seamus Nikiforov.”

“Meus pais.” Digo, mordendo o lábio.

“Não está triste pela morte deles?” Ela pergunta, mas eu nego com a cabeça.

“Sempre ausentes, por causa do trabalho.” Digo, e ela respira fundo.

“Victor, você ainda é uma criança. Você precisa de ajuda, mas não posso chegar e estender tudo de mão beijada.” Ela fala, seriamente. “Vamos fazer alguns planos. O mais importante agora é você aprender a falar japonês. Eu e Yuuri podemos te ajudar com isso. Então, temos que te colocar em uma escola, para que você tenha a educação suficiente para o seu futuro. E precisamos comprar roupas e vários objetos pessoais para você.”

“Eu não acho que tem uma escola que me aceite.” Digo, mordendo meu lábio.

“Ah tem sim. Uma escola muito especial.” Ela fala, sorrindo.

Confuso, apenas inclino o rosto.

~x~

Em 3 semanas, aprendo a falar em japonês. Não fluentemente, mas consigo destacar palavras-chave e pelo tom de voz, consigo entender o que estão falando.

“Vicchan, Gohan.” Vejo Yuuri surgir na porta do quarto, me olhando com curiosidade.

“Arigatô, Yuuri.” Digo, fechando o livro ilustrado que lia e me levantando da cama.

Sentado na mesa, ao lado de Yuuri, eu faço minha refeição e respiro fundo. Quando vejo Hiroko-san, eu me levanto e me aproximo dela.

“Hiroko-san. Oshiette yo. Gohan.” Eu peço, juntando as minhas mãos ao pedir.

Ela arregala os olhos e sorri, falando algo que eu não entendo muito bem. Sinto dois puxões na minha calça e vejo que Yuuri é o culpado.

“Vicchan.” Ele fala, erguendo um dedo. “Nihon”

E então, ele ergue dois.

“Gohan.”

Oh! Eu preciso melhorar meu japonês primeiro!

~x~

“Victor, eu falei com uma amiga que é diretora de uma escola especial que aceita estrangeiros. Quando expliquei sua situação para ela, ela concordou em te aceitar e se coloca à disposição para te ajudar com o seu país.” Ela explica, me assustando. “Akai Tsubasa Gakuen possui dormitórios e uma área comercial própria. Ela possui um projeto em que permite crianças estrangeiras estudem gratuitamente e permitam se desenvolver não só academicamente, como também profissionalmente.”

Eu ouvi falar da escola Akai Tsubasa, mas nunca pensei que teria a honra de aprender. E eu aceito, ansioso.

Mesmo que isso me faça se afastar de Yuuri.

Ou era o que achava que ia acontecer. Mas o menino também estuda na mesma escola, para a minha surpresa.

Nas férias, nós voltamos para Hasetsu. Como me prometeu, Hiroko-san começa a me ensinar a cozinhar pratos japoneses. E mesmo assim, não revelo meu segredo para eles.

~x~

Quando me graduo, aos 17 anos, eu decido voltar para Rússia. Eu não me arrependo, mas me vejo sentindo falta de Yuuri. Após toda a confusão com relação ao que aconteceu no passado e o fato de eu estar vivo, eu começo a trabalhar como assistente de cozinha de um grande restaurante graças ao diploma da Akai Tsubasa Gakuen. E o tempo passa e com isso, passo cada.vez menos pensando no menino fofo que me resgatou anos atrás e me deu uma nova vida.

~x~

10 anos depois

“Ei Viktor!” Um dos cozinheiros com quem trabalho me estende um trio de convites. “Minha irmã está competindo em Sochi e me deu alguns ingressos. Você quer?”

Quando vejo que são ingressos para a Copa Rostelecom de patinação de gelo, abro um largo sorriso.

“Claro! Muito obrigado!” Digo, pegando os ingressos.

“Esse ano parece ser interessante. Temos dois Yuris participando. Um russo, e um japonês.” Uma outra cozinheira fala, e algo em mim estrala.

Um japonês que se chama Yuri?

“O Yuri japonês é incrível! Ele vem garantindo ouro desde que era Junior e nem Giacometti e Leroy são capazes de ultrapassar ele.”

“Mas o Yuri russo acabou de estrear na categoria adulta e com vitória na Copa da América.”

Copa de Rostelecom - Programa Curto

1° Yuri K. - Japão - 103.90 - On Love: Eros

2° Yuri P.  - Rússia - 101.38 - On Love: Ágape

3° Christophe G. - Suíça - 98.58 - Intoxicated

4° Leo de la Iglesia - USA - 98.2 - Still Alive

5° Phichit C. - Tailândia - 97.92 - Shall we skate

6° Jean-Jacques L. - Canadá - 94.21 - King JJ

Me surpreendo com as apresentações. Principalmente com as dos dois Yuris, que usam coreografias diferentes para diferentes versões de uma música. Com o fim das apresentações, deixo a arquibancada e me dirijo à saída, ainda mais ansioso para o dia de amanhã.

~x~

Copa de Rostelecom - Programa Livre

1° Yuri K. - Japão - 353.4 (Novo recorde) - Yuri on Ice!

2° Yuri P. - Rússia - 351.2 - Piano Concerto in B-minor: Allegro Appasionato

3° Phichit C. - Tailândia - 299.45 - Terra Incognita

Eu e todo o público russo aplaudimos os medalhistas de pé.

~x~

Copa de Rostelecon - Exibição

Yuri K. - Japão - Stammi Vicino (Stay Close to Me)

Yuri P. - Rússia - Welcome to the Madness

Phichit C. - Tailândia - The King and The Skater

~x~

“Ei, Viktor. Estamos com problemas.”

“O que foi?” Pergunto, lavando minhas mãos.

“O cliente que pediu Katsudon. Ele quer falar com o cozinheiro.” Um garçom, Georgi, fala e eu olho do vidro da cozinha para as mesas do restaurante, parando em uma onde um rapaz de cabelos negros está com o rosto voltado para a janela. Engulo em seco e decido eu mesmo ir.

“Eu falo com ele.” Digo, retirando o meu avental.

Lentamente, me aproximo dele e pigarreio.

“Com licença.” Digo em Inglês, e o vejo virar o rosto, o reconhecendo logo como o medalhista de ouro de patinação de gelo.

“Boa noite.” Ele fala, abrindo um sorriso com um estranho brilho no olhar. “Você é o cozinheiro que preparou este prato?”

“Sim.” Digo, e noto que o sorriso dele se desfaz.

“Entendo.” Ele fala, abaixando o rosto. “Está muito bom. Ela vai ficar orgulhosa em saber disso. Me desculpe por atrapalhar seu trabalho.”

Eu volto para a cozinha, confuso. O que ele quis dizer com aquilo?

“Ei, Viktor. O cliente de antes me pediu para lhe entregar isso.” Georgi me estende um guardanapo, onde eu leio:

Que bom que você está feliz, Vicchan.

Vicchan? Quem me chamava assim era…

Saio em direção das mesas, procurando por ele desesperadamente. Yuuri. Yuuri, cadê você? Caio no chão, cobrindo o rosto com as mãos. Como pude ter me esquecido dele? Por isso que ele deixou de sorrir.

“Qual é o problema?” Escuto e ergo o rosto, surpreso.

Yuuri Katsuki está ali, na minha frente. Me olhando com aqueles enormes e brilhantes olhos. Sem pensar duas vezes, me jogo nos braços dele, chorando muito. Eu o assusto com isso, mas mesmo assim, ele fica massageando minhas costas e pedindo desculpas para as outras pessoas que estão ali.

~x~

“Você é incrivel! Tri-campeão mundial de patinação de gelo em seu quarto campeonato adulto.” Digo, andando com ele pelas ruas de São Petersburgo.

“Você que é incrível, fazendo pratos deliciosos sem poder saborear eles.” Yuuri diz, me fazendo arregalar os olhos.

“Desde quando…”

“Desde o início, quando você comeu o Katsudon de minha mãe pela primeira vez e agiu como se já estivesse comido ele antes.” Yuuri responde. “Claro que quando era pequeno, não entendia. E quando cresci, eu conversei com Kunogi-sensei, e ela me ensinou sobre ageusia.”

Kunogi-sensei, a enfermeira e conselheira da Akai Tsubasa Gakuen?

“Entendo. Minha mãe foi diagnosticada com câncer de mama quando estava grávida de mim e não sabia. No meio de uma sessão de quimioterapia, uma das enfermeiras perguntou à ela se ela estava grávida. Quando a confirmação veio através de exames, tiveram que interromper tudo. Graças a isso, eu não nasci com algo grave. Apenas não poder sentir o gosto e ter cabelos assim, acinzentados.”

“Não é acinzentado. É prateado. Ele fica bem em você e era muito bonito quando era longo.” Yuuri diz, e eu noto que ele está embaraçado.

Quando chegamos no hotel, nós nos despedimos.

“Yuuri, quando você vai embora?” Pergunto, o abraçando.

“Amanhã de manhã.” Ele responde, retribuindo o abraço.

Nos afastamos, e ele acena, sorrindo.

“Até, Victor.”

E o vejo entrar no hotel. E então me lembro que não peguei o número dele. Solto um gemido, me curvando em agonia. Quando coloco as mãos nos bolsos, toco em algo estranho. Quando ergo minha mão direita, vejo um papel com número de telefone, e-mail, instagram e Facebook. Dele.

~ Continua? ~


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Notas finais do capítulo

Ageusia: Perda ou diminuição do paladar.



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