A chantagem

Kaline Bogard

Parte 01

 Poucas coisas nessa vida irritavam Inuzuka Kiba. Okay, não eram tão poucas coisas assim, afinal o garoto tinha um gênio intempestivo muito fácil de provocar. Mas poucas coisas nessa vida conseguiam deixá-lo tão irritado quanto ele se sentia nos últimos dias.

Uma de suas amigas, a quem conhecia desde o Jardim de Infância, estava numa enrascada.

Hinata era uma menina doce e tímida, de uma família tradicional em Konoha, uma família rigorosa em suas tradições e em costumes arcaicos sobre comportamento e imagem social.

Recentemente, com ousadia inesperada, criara uma conta numa rede social. E usava esse perfil para desabafar algumas coisas, postar algumas fotos usando um pseudônimo, de modo quase anônimo.  Os Hyuuga mantinham-se longe de vulgaridades como os aplicativos mais populares, por isso ela conseguia fazer suas postagens em paz, sem que os parentes desconfiassem.

Mas a Internet é um fenômeno que não se pode prever ou calcular as consequências da mais simples e inocente palavra digitada.

Pois uma menina tão bonita quanto Hinata, e com postagens tão despretensiosas, rapidamente angariou um número impressionante de seguidores! E entre os milhares de fãs que se aproximaram virtualmente dela, haviam pessoas maldosas.

Logo sua ascendência renomada foi descoberta. E um misterioso internauta começou a chantageá-la querendo que ela lhe enviasse nudes. E exigindo um encontro pessoalmente. Caso contrário, ele avisaria a família sobre a conduta que seria duramente reprovada.

E nesse ponto a história alcançava Inuzuka Kiba.

O garoto impulsivo e extravagante não era atento a detalhes. No entanto, logo deu-se conta de que tinha algo errado com a amiga. Cujo silêncio, antes tímido e recatado, tonou-se pesado de preocupação.  Sabia que se fosse descoberta, a família reagiria de um modo bem ruim.

Depois de alguma insistência, Hinata se abriu e contou tudo, fazendo Kiba tomar suas dores. Não podia aceitar que um criminoso virtual prejudicasse sua amiga!

A primeira providência foi falar com Shikamaru. O rapaz estava um ano a frente no colégio, era velho conhecido de Kiba dos clubes extra, tinham feito artes marciais no mesmo grupo.

Shikamaru era um nerd de classe maior. Dominava tecnologias e conhecia os recursos como ninguém. Boatos diziam que ele se aventurava no mais sombrio da Deep Weeb, fofoca que impressionava Kiba na medida certa. Ainda que ele não fizesse ideia do que seria essa tal de Deep Web.

O rapaz não foi capaz de ajudar. Shikamaru deparou-se com um hacker tão bom quanto ele próprio. Talvez melhor. E como não era fã de trabalhos problemáticos, abriu mão de rastrear o desconhecido.

— Então vamos aceitar a chantagem! — Kiba falou para Hinata, na hora do almoço de uma sexta-feira, quando a pressão sobre a menina se tornou grande demais. Ambos estavam no telhado do colégio, tentando pensar uma saída.

— Não entendi, Kiba kun — ela falou baixinho. Não podia mandar nudes para um completo estranho! E recebera um ultimato: ou cumpria as exigências ou sua vida virtual seria revelada, exposta aos Hyuuga.

— Marca um encontro com ele e a gente desvenda isso! — Kiba acertou um soquinho na palma da mão, meio impressionado com a própria esperteza.

— Um encontro? — Hinata encolheu-se. Pensar em encontrar com alguém tão maldoso a assustava.

— Sim. Mas eu que vou no seu lugar. E vou dar uma surra tão grande que ele nunca mais vai chantagear ninguém! E depois eu tiro umas fotos suspeitas e você usa como proteção. Se ele chantagear que vai contar pra sua família, você rebate que vai divulgar as fotos dele também! — terminou o plano sorrindo largo. Como era inteligente!!

Mas a menina balançou a cabeça, desanimada.

— Não, Kiba kun. Pode ser perigoso — ela falou — Prefiro que meus pais descubram tudo a colocar você em perigo. Mas agradeço que...

— Não! Não tem perigo nenhum. Marca em um lugar cheio de gente, o perigo vai ser só pra ele, quando eu amassar o nariz e arrancar uns dentes com o meu punho.

Hinata não pareceu muito convencida. Só depois de alguma insistência e vários argumentos perfeitamente lógicos na opinião de Kiba, que a menina acabou cedendo. Ela concordou com o plano, com algumas condições: iria marcar no shopping de Konoha, no sábado a tarde (horário em que o local estava super lotado) e que Kiba desistisse ao menor sinal de perigo. Também se ofereceu para acompanhá-lo, embora a oferta fosse rapidamente descartada.  A garota estar ou não no local do encontro não faria a menor diferença. E Kiba não queria que ela assistisse a surra que prendia dar no tarado virtual.

—--

O encontro foi marcado para a semana seguinte. O que deu tempo para a dupla se preparar.  Kiba pegou o celular de Hinata emprestado, um moderno que tirava ótimas fotos e fazia vídeos em alta qualidade. O aparelho de Kiba era antigo, com pouco espaço de armazenamento.

Conforme combinado, foi para o shopping no final da tarde. Comprou um grande milk-shake de morango num copo transparente e circulou pela praça de alimentação até que uma mesa em frente a sorveteria se esvaziasse e ele pudesse se sentar.

Uma mistura engraçada de sentimentos tornava Kiba inquieto. Ansiedade e empolgação. Ele se sentia um daqueles policiais corajosos que agiam infiltrados nas máfias e prendiam todos os vilões. Discretamente observava ao redor, em busca de algo suspeito, um degenerado virtual que circulasse entre as pessoas. Com toda certeza um pedófilo que ameaçava uma garota do colegial!

O tempo passou lento, tedioso, não devia ter chegado meia hora mais cedo! Embora viesse motivado pela preocupação em não conseguir uma mesa no lugar combinado.

Havia um zunzunzun típico, resultado das vozes de todas as pessoas reunidas no local, conversando com animação.  Sobre a mesa, o milk-shake começava a derreter e se misturar com a calda cor-de-rosa, graças a relutância de Kiba em beber aquilo. Tal sobremesa era o sinal que mostraria ao desconhecido quem era a pessoa que deveria encontrar.

Talvez o sujeito fosse um grande covardão. Ao ver Kiba no lugar de Hinata tremera nas bases e fugira sem querer enfrentar um garoto! Claro, a menina tinha toda uma aparência frágil e indefesa. A vítima perfeita!

A um passo de desistir do encontro, o instinto quase selvagem de Kiba o alertou.  Vinha um esquisitão na sua direção. E que esquisitão! Um homem alto, usando uma blusa engraçada, de gola alta a esconder-lhe o rosto, detalhe que somado aos óculos escuros dificultava uma visão completa do rosto de tez muito pálida.

Não hesitou um segundo sequer em puxar a cadeira e sentar-se a frente de Kiba.

— Blue Angel? — o estranho lançou a queima-roupa, referindo-se ao nick name que Hinata adotou.

— Sim! — Kiba respondeu num resmungo meio rosnado.

— Então, na verdade, você é um garoto se passando por mulher...?