GROVER

Nossa! Minha vez de narrar? Sério? Estava tão acostumado com o Percy fazendo isso. Inclusive, sinto falta dele. Claro, ele está todo ocupado em Nova Roma estudando com Annabeth e resolvendo um problema ou outro. Nada de novidade né? Quanto à mim, depois de minha pequena grande aventura com Apolo e Meg, resolvi voltar para o Acampamento Meio-Sangue. Quem sabe também, aproveitar para passar um tempo com Juniper, minha namorada. Juniper é uma dríade e eu, um sátiro. Sempre trabalhei em ajudar os outros semi-deuses gregos à chegar até o Acampamento Meio-sangue só que tanta coisa aconteceu ultimamente que eu acabei parando por um tempo com isso. Claro que ser o escolhido de Pã era uma honra enorme, mas eu não tive dúvidas quando decidi ajudar pelo menos mais um semideus à chegar até o Acampamento. Algum fácil e rápido, se é que eu poderia pedir algo assim. Eu fiquei os meses entre minha aventura com Apolo até o Natal com Juniper no Acampamento até que fiquei com saudade de um pouco de aventura porque tinham semideuses precisando de ajuda em todo lugar. Com a costa oeste e a costa leste sempre pipocando de problemas, achei que talvez algo mais para o meio dos Estados Unidos fosse mais tranquilo. E foi assim que eu cheguei em Chicago.

— Vem, vem, vem. - eu disse apressando o semideus que eu havia encontrado na cidade de Chicago. Claro que tínhamos que encontrar algum problema.

O semideus que encontrei chama-se, ironicamente, Peter Johnson. Só imagino a cara de todo mundo no Acampamento quando souberem que tem um garoto com o mesmo nome pelo qual o Sr. D. sempre chama o Percy. O garoto, de cabelos castanhos encaracolados presos num rabo de cavalo baixo, era meio gordinho e um tanto tímido. Tinha 12 anos e era filho de  Harmonia, deusa da harmonia.

— Tem certeza disso? Não me parece uma boa ideia. - disse ele.

— Anda! É só um Karpos filhote! - reclamei pegando no pulso dele com força e saindo correndo puxando-o antes que ele desistisse novamente.

Eu corria puxando-o pelos gramados do Grant Park. O Karpos, raivoso, nos seguia sem desistir da esperança de arrancar um pedaço do semi-deus que eu ajudava. A grama ainda estava com pedaços de neve e semi-congelada, o que complicou e muito a nossa fuga. Eu realmente preferia fazer esse tipo de coisas em outras estações do ano. Deveria ter algum tipo de acordo entre deuses, semideuses, monstros e demais criaturas quanto à época do ano na qual criar problemas. Eu não sabia bem o que achar dos Karpoi. Meg, a amiga de Apolo, tinha um até razoavelmente simpático e até útil. Para minha tristeza, Pêssego era exceção à regra. Mas eles eram também seres da natureza. Eu não sabia o que fazer!

Para minha felicidade, eu não precisei pensar muito sobre o que fazer quanto ao Karpos que nos seguia, pois, quando nos aproximamos do Museu de História Natural de Chicago, vi que de dentro dele saía correndo um babuíno vestindo uma camiseta de um time de basquete, os Lakers de Los Angeles.

— Um macaco!! - exclamou Peter.

— Na verdade é um babuíno. - eu disse olhando rapidamente para trás.

Acho que você vai me entender quando eu digo que a aparição do babuíno não me pegou tão de surpresa quanto tinha pegado Peter. Afinal, coisas do tipo já tinham se tornado comuns.

— Cuidado! Vou ajudá-lo, sátiro - gritou o babuíno embora Peter deva só ter ouvido algo como “Agh!” saindo da boca do babuíno.

O babuíno jogou algo estranho em nossa direção. Era um pequeno objeto, branco, provavelmente feito de barro ou cerâmica. Observei a trajetória que o objeto fez e, antes que chegasse ao chão, esse objeto se transformou em um crocodilo branco como osso.

— AAAH! - Peter gritou me puxando para o outro lado - AGORA PIOROU TUDO!

— UM CROCODILO! - gritei quase tão assustado quanto ele.

O crocodilo, enorme, podia facilmente carregar duas pessoas em suas costas. Uma parte de mim perguntou-se, com assombro, quantas ele poderia abocanhar. Como se ouvisse a minha pergunta, ele rapidamente diminuiu a distância que havia entre ele e o Karpos. O monstro fez um estranho ruído quando o crocodilo o abocanhou de uma vez completando sua dieta do dia (ou ao menos, eu esperava que estivesse completado).

Ofegante, olhei para a criatura albina que não parecia interessada em nos devorar embora Peter estivesse morrendo de medo se escondendo atrás de mim enquanto o babuíno se aproximava.

— Obrigado pela ajuda - eu disse para o babuíno e para o crocodilo.

— Aqui não é Nova Iorque, né? - perguntou o babuíno.

— Não. Chicago. - respondi.

— Com quem está falando? Com o macaco? - perguntou Peter.

— Babuíno - corrigi - Sim, posso falar com animais.

— Agh! - disse o babuíno se eu for representar o que Peter ouviu, o babuíno, na verdade, reclamou por não ter chegado à Nova Iorque.

— Como errou de caminho tão exageradamente assim? - perguntei - Ah, e como se chama? Me chamo Grover e esse é o Peter.

— Não teve muito tempo de escolher. - disse o babuíno - Me chamo Khufu e esse é Filipe. Tivemos que vir na pressa passar um recado para C… para os nossos amigos em Nova Iorque. Queríamos ter ido parar no Central Park, mas acabamos aparecendo na exposição egípcia desse museu.

— Egípcia? hum.. - eu disse. acho que uma vez Percy mencionou ter enfrentando um deus que era, de certa forma, metade grego e metade egípcio.

— Ei ei ei. Traduza pra mim - pediu Peter.

— Ele queria ter ido para Nova Iorque - eu disse olhando para Peter e então cruzando os braços - Podemos tentar arranjar um jeito de te ajudar à chegar lá. É muito urgente?

— Sim! Extremamente urgente! Tenho que entregar um recado de grande importância. - explicava Khufu que logo parou por uns segundos e me observou como se estivesse tendo uma ideia - Você… estava indo levar ele para o Acampamento Meio-sangue?

— Como sabe do Acampamento? - perguntei desconfiado.

— Meu recado envolve o acampamento - disse Khufu - Tenho que avisar Carter e Sadie, para que eles avisem no acampamento. Urgente! Urgente! Urgente! Urgente! Urgente! Urgente! Urgente! Urgente!

— Certo, certo. Entendi. Vamos dar um jeito de fazer você chegar lá rapidinho. - eu disse.

Depois de explicar rapidamente a situação para Peter, fomos todos para onde deixei o carro que estava usando. Carro esse que peguei… ahm… emprestado. Khufu explicou que Filipe não era exatamente um crocodilo de verdade, era uma shabti. Algo como um boneco ou amuleto egípcio controlado por magia que um homem chamado Amós havia criado. Esse homem, também era quem havia enviado os dois naquela missão desesperadora. Só a conversa deles estava me deixando tão preocupado que eu comecei a mastigar um colar de correntes que havia encontrado e achado legal.

Com o carro, decidi que o jeito mais sensato e rápido de enviar os dois até Nova Iorque estava à quase 3 horas de viagem de carro de nós na cidade de Indianápolis. Peter ficou quietinho no cantinho dele. Eu sentia que ele não estava muito bem, o que fazia total sentido considerando o que ele passou, coisas que todo semideus passava (Embora eu tenha certeza que Percy deve estar no topo do ranking dos mais problemáticos). Para com que todos coubessem no carro, Filipe voltou à sua forma de bonequinho (ou shabti, como Khufu me corrigiu ao perguntar como ele fazia para transformar Filipe em “boneco”). Seguimos viagem com o rádio tocando New Rules da Dua Lipa e eu estava até gostando até que Khufu trocou para a narração de um jogo de basquete.

Foi difícil, mas conseguimos nos comunicar com Leo. Para nossa alegria depois de uma longa jornada até Indianápolis, Leo marcou de se encontrar em um Starbucks. O filho de Hefesto de pele bronzeada, cabelos encaracolados castanhos e agora 16 anos acenou quando nos viu nos aproximando. Ao seu lado, Calipso. A ex-titã que agora estava tão mortal quanto Apolo, simplesmente observava do lado do namorado o nosso grupo estacionando o carro. Embora tivesse alguns milhares de anos, Calipso parecia ter 16 anos, assim como Leo.

— Cara.. você não tava brincando quando disse que encontrou um babuíno - disse Leo quando saímos do carro.

— Pois é… esse é Khufu - eu disse. Embora Khufu tenha se apresentado, duvidava que Leo tinha entendido mais do que “Agh!”

— E você… você é o Peter Johnson? - perguntou Leo para o meu tímido companheiro - Caaara… vai ser tão legal ter você no Acampamento! Eu adoraria ver isso! - disse ele rindo.

— Não vai voltar mesmo para lá? - perguntei.

— Aqui tá tão legal cara - justificou Leo - Tem muito que posso fazer e aprender na Estação Intermediária. Mas Emmie e Josephine querem que eu vá pra escola também. Acredita nessa? ESCOLA!

— Podia ser pior… - disse Calipso.

— Podemos falar disso lá dentro? Estamos todos morrendo de fome.

— Justo, justo - disse Leo.

Todos entramos no Starbucks e pedimos um verdadeiro batalhão de comida. Eu, eu fiquei só no café e no restinho da lata de refrigerante que Peter tinha bebido quase num gole só. É, sei que acham estranho. Eu comi a latinha. Será que os humanos achavam que eu estava comendo um cookie e que Khufu era alguma criança gordinha? Apesar de estarmos todos comendo, Khufu estava com dificuldade de achar coisa para comer. Aparentemente, só aceitaria se, por algum motivo estranho, essa coisa tivesse um nome que terminasse com a letra “O”. Depois de muito procurar, ele decidiu beber um "Frappuccino”.

— Mas então… - continuou Leo - escola cara! Eu não quero ir para escola, eu não posso ir para a escola.

— Por causa disso tudo de ser semideus? - perguntei, alguns tinham problemas, verdade, mas Percy, apesar de ser filho de Poseidon, conseguiu terminar a escola e estava na universidade agora. Claro, fazer isso não foi nada fácil.

— Não não. É porque… olha essa gostosura toda. O novo gostoso pra dedéu atrairia atenção demais das garotas. - ele disse

— Aham… claro - disse Calipso meio descrente.

— Poxa! Fique do meu lado! - disse Leo.

— Não sei… a ideia de escola me parece bem divertida - disse Calipso levando seu copo de chocolate quente até a boca elegantemente.

— Escola, estou falando de escola, Raio de sol. - disse ele suspirando e olhando para a garota - Estamos falando de valentões, aulas chatas e professores chatos.

— Enfrenta não sei quantos perigos mortais por aí, e está com medo de valentões? - perguntou Calipso surpresa.

— Estou é com medo de aulas chatas. - disse Leo com a boca cheia de donut.

— Mas deixando isso de lado, qual era o favor que vocês queriam? Querem uma carona até o Acampamento Meio-Sangue? - indagou Calipso lançando um olhar para Peter.

— Ah, pode ser mas não, não era o foco. Mas se der, seria legal. Na verdade, teria como levar Khufu até Nova Iorque? Ele disse que era bem urgente. Achei que Festus poderia…

— Ser mais rápido? - perguntou Leo - Pode deixar com o tio Leo aqui! Vai querer vir também? Podemos deixar o carro de vocês na Estação Intermediária.

— Hum.. pode ser. - disse Calipso dando de ombros - Um pulinho rápido em Nova Iorque pode ser legal.

Quando terminamos de comer, saímos do Starbucks e fomos para um estacionamento vazio que tinha ali perto. O dia já estava perto de terminar quando Leo usou um apito e ficou em pose de super-herói quando se assobiar o apito fosse algo extremamente emocionante e importante. Peter notou a pose que ele fazia e ficou olhando para ele e então para mim com curiosidade se perguntando o que iria acontecer, se é que iria acontecer alguma coisa, e se eu sabia o que era.

Não precisei responder nada, pois logo Peter soltou um grito de medo ao ver um dragão metálico se aproximando de onde estávamos.

— Relaxa, relaxa carinha. Eu que o chamei até aqui. - disse Leo abrindo um sorriso radiante - Esse é Festus, meu dragão mecânico.

— Você tem um dragão mecânico? - perguntou Peter quando Festus pousou diante de nós.-

— Sim! Legal, né? - perguntou Leo para o menino e ele afirmou fascinando com os olhos saltando e a boca escancarada.

— Posso fazer carinho nele? - perguntou Peter.

— Fique à vontade - disse Leo.

— Pergunta… - disse Calipso enquanto Peter se divertia com o dragão - Você, eu, Grover, Khufu e Peter. Acho que pode ficar meio arriscado…

— Não.. que isso. Eu fiz uns ajustes no Festus depois que voltamos. Vai dar direitinho. - respondeu ele mas ela parou o encarando como se aquilo fosse uma novidade que ela não aprovava.

— Ah… então foi isso que você estava tão ocupado fazendo quando te chamei para ver Cartas para Julieta.

— Sim mas… mas, era um filme meloso de romance…Tem até “Julieta” no nome! Coisas com “Julieta” no nome dificilmente incluem qualquer ação - Leo tentou se justificar.

Não parece ter dado muito certo, pois ela continuou o encarando só que agora de braços cruzados. Foi nessa hora que eu agradeci silenciosamente pelos filmes e músicas que eu gosto serem quase os mesmos de Juniper.

— Só não fico totalmente com raiva de você porque ele era meloso mesmo - disse Calipso.

— Não fique com raiva de mim não. Eu assisto outro com você… um menos meloso. - sugeriu ele juntando as duas mãos na frente da mão implorando para ela que parecia pensar no caso dele.

— Aquele que estavam falando… que foi indicado para aquele… aquele prêmio lá… dourado e que tem o nome de um cara.

— Oscar? - tentei.

— É, o que está indicado para o Oscar. - disse Calipso - Que tem um monstro aquático.

— A Forma da Água? Me parece o tipo de filme que o Percy veria com a Annabeth - disse Leo.

— Pois eu quero ver. Feito? - perguntou Calipso.

— Feito - disse Leo segurando nos ombros dela e beijando o topo de sua testa.

Antes que ele pudesse se distanciar muito, ela deu um beijo nos lábios dele lentamente, os dois fecharam os olhos e eu tossi sem graça (e com inveja e saudade de Juniper).

— Então? Podemos ir? - eu perguntei evitando olhar para os dois.

— A-Ah, claro, sim! - disse Leo meio sem jeito - Todos à bordo das Linhas Aéreas Festus. Próxima parada, Nova Iorque!