Família De Marttino - Unidos Pelo Amor(Degustação) escrita por moni


Capítulo 2
Capitulo 2


Notas iniciais do capítulo

Oiieeeee



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 Hannah

   Depois de jantar um gelato no fim do trabalho eu sigo para meu quarto. A hospedaria é muito limpa e bem localizada. Mesmo quando ficamos limpando a gelatteria até tarde tem uma boa iluminação e alguém de plantão na recepção.

   Normalmente eu sinto um pouco de medo de caminhar a noite, por mais que Maria jure que é seguro, acho que meu tio acabou conseguindo me colocar medo sobre o mundo.

   Tom garantiu que ele não está mais me caçando. Disse que ficou louco de raiva quando não me encontrou e bateu logo na cada de Jane, mas depois desistiu. Acho que entendeu que fui embora e talvez esteja até feliz. No fundo sempre fui um problema que ele não queria ter.

   Jane e Tom vão se casar em dois anos. Acho bonito como eles se amam desde adolescentes. Me deito com um livro nas mãos, quem sabe ler um pouco antes de adormecer?

   Penso em Sandro, ele é muito bonito e não sei bem por que ele quis saber meu nome e idade, talvez para rir de mim com mais propriedade. Encaro meu uniforme pendurado num cabide na porta do guarda-roupa. Aquele chapéu é mesmo pavoroso.

  Não tenho que pensar nele. O melhor é ouvir Maria. Ele não é para mim. Está sempre cercado de amigos, garotas e dinheiro. Eu não me encaixo no mundo dele e isso não é um filme. Caras como ele não olham para garotas como eu.

   Além disso, sou só um uniforme, duvido que ele saiba diferenciar Maria e eu. Já aconteceu muitas vezes. Maria está atendendo e alguém fala comigo como se eu tivesse atendido. O uniforme mata nossa personalidade.

   Me dá um aperto no coração a hora de dormir. Uma saudade dos meus pais, da minha casa, da certeza de poder correr para eles depois de um pesadelo.

   Dói não ter ninguém. Nem mesmo um vizinho próximo, alguém para um momento difícil. Sou eu e nada mais. Meu nome devia ser solidão.

   Dobro o uniforme pela manhã. Visto jeans, tênis e sigo para o trabalho. Tenho mais é que agradecer ter um emprego. Não sobra dinheiro, nunca conseguirei chegar a Bolonha nem mesmo para tentar descobrir se sobrou algum vizinho. Nunca vou conseguir uma casa para mim, ou qualquer coisa com o salário que ganho. É a conta certa para a hospedaria e meus gastos com alimentação.

   Maria jura que em uns meses vou ganhar um pouco mais. Que estou em experiencia, mas não sei. Acho que o senhor Giacomo não pensa como ela.

   Pela manhã quase não tem trabalho, uns poucos turistas passam pela gelateria para experimentar nossa marca. Na hora do almoço tem um pouco de movimento e depois, no fim da tarde, quando os jovens estudantes deixam a universidade. Aos sábados o movimento é bom e aos domingos é cheio de turistas e família que vem a região passear.

   Tenho uma folga por semana, agora que vou usar a primeira. Na próxima segunda-feira, Maria quis trocar comigo e no fim, acabei preferindo trabalhar.

   Quando completar um mês, ela disse que vou poder folgar num domingo, para mim não faz diferença, todos os dias são iguais, talvez eu deixe que ela folgue sempre aos domingos, assim ela fica com a família. Ela precisa disso. Eu não.

   Maria está ajeitando as cadeiras quando chego. Ela é sempre a primeira a chegar e sempre tem um sorriso amigável. Gosto dela. Ainda não posso dizer que é uma amiga, quando o expediente acaba, seguimos cada uma para sua própria vida. Ela não fala muito dela e eu não tenho nada para contar.

   ─Animada? – Ela pergunta quando deixo a salinha onde visto o uniforme, não olho muito no espelho, se ficar prestando atenção em meu reflexo acho que não tenho coragem de enfrentar todo mundo com essa roupa e especialmente o chapéu. - Sexta-feira é sempre uma agitação.

   ─Sim, totalmente.

   ─Ótimo. O senhor Giacomo vai passar amanhã para deixar o envelope com o salário da semana. Domingo vou fazer um almoço especial para meus filhos.

   ─Que bom. – O assunto acaba com a chegada de um jovem casal e duas crianças. Uma ainda no colo e outra com uns cinco anos. Tão bonito ver uma família assim. Sirvo a mesa sorrindo para o garotinho no colo do pai. Ele parece orgulhoso do filho.

   Sonho em um dia ter uma família assim, alguém para dividir a vida e filhos. Dois pelo menos. Só não sei se um dia encontro uma pessoa para me amar.

   Sandro chega com seu grupo as três da tarde. Tarde de sexta-feira e eles estão animados. Não sei bem por que parecem sempre gritar uns com os outros, se provocar, rir em demasia e tenho sempre a impressão que sou o centro das conversas.

   A presença do grupo sempre me deixa atrapalhada e zonza. Fico ainda mais tímida e sempre faço ou digo alguma tolice. Maria sempre parece mais atenta ao meu trabalho quando eles estão aqui e isso também me deixa nervosa.

   Depois da confusão de atender os pedidos que Maria faz questão de entregar eu fico atrás do balcão atendendo quem prefere tomar seu gelatto ali mesmo sem usar as mesas.

   ─Uma água, por favor! – Uma das amigas inseparáveis de Sandro se encosta no balcão, em seguida a outra se junta a ela. As duas me sorriem. Sirvo a garrafa de água.

   ─ Oi. Sou Perla. – A moça diz sorrindo. – Você é Hannah, não é mesmo? – Afirmo. – Essa é Giani.

   ─Boa tarde. – Digo sem saber direito o que dizer. – Eu... querem mais alguma coisa?

   ─Não. Mora onde?

   ─Uns quarteirões daqui, numa hospedaria. Cheguei a pouco na cidade.

   ─Americana? Fala bem nossa língua.

   ─Sou italiana, minha mãe era americana, ela faleceu tem um tempo.

   ─Uhm. – Perla troca um olhar com a amiga. – Vamos contar?

   ─Acha? – Giani pergunta e fico olhando de uma para outra, elas balançam a cabeça afirmando uma para outra e depois me olham. – Sandro está interessado em você.

   ─Em mim? Ele disse isso?

   ─Disse. Ontem quis saber seu nome, idade. Está todo encantado. – Meu coração até descompassa um pouco, mas logo eu o acalmo, elas devem estar enganadas.

   ─Acho que se confundiram. Não deve ser eu.

   ─Você sim. Ele vai dar uma festa hoje e quer que você vá. Na casa dele. O que acha?

   ─Se ele quer que seja o par dele numa festa, não devia vir me convidar? – Elas riem, uma delas parece mesmo fazer uma careta que logo desaparece.

   ─Sandro é tímido, ele tem medo de levar um não.

   ─Tímido? Medo de um não? Acho que estão erradas. – Ele é tudo, menos essa pessoa que elas estão descrevendo.

   ─Conhecemos ele a vida toda. Pode acreditar. Que acha de ir a festa? Lá ele se aproxima e conversam. É o ambiente perfeito.

   ─Perla. Eu não sei. Nem tenho roupa de festa e não conheço ninguém.

   ─Conhece a gente. – Giani insiste. – Pode ir se vestir na minha casa. Eu te empresto um vestido e vai ficar linda. Vamos nos arrumar juntas.

   ─Isso Giani. Adorei a ideia. Que horas termina aqui? – Perla me pergunta.

   ─Oito da noite, é tarde.

   ─Ótimo. Apanhamos você aqui. Vamos nos vestir juntas e ir a festa. Vai gostar.

   ─É que depois eu nem tenho como voltar para casa.

   ─Aposto que o Sandro vai fazer questão de te levar em casa, mas se não der certo, então eu te levo. – Giani promete. – Sem discussão. Oito da noite.

   Elas me dão as costas e fico sem saber o que fazer. Ir a uma festa. Nunca estive em uma festa assim. Nunca tive um momento como esse com pessoas da minha idade.

   ─O senhor Giacomo não vai gostar nada disso. – Maria surge ao meu lado. – Ele não quer esse tipo de envolvimento com os clientes e essas duas garotas não são nada confiáveis.

   ─Maria, é só uma festa. O que pode dar errado?

   ─Tudo. Além disso, não acha estranho elas te convidarem para uma festa assim, do nada?

   ─Talvez queiram uma nova amiga. – Olho para mesa, Perla está conversando com Sandro. Ele tem um sorriso no rosto enquanto a escuta e fico pensando se ela está dizendo que meu contou sobre seu interesse.

   ─Cuidado, Hannah. – Maria me deixa trabalhando no balcão, nenhuma vez me permite ir a mesa deles. Por volta das seis eles vão embora. Perla e Giani me acenam sorrindo.

   Fico entre a vontade de ir e o medo até as oito quando vou para os fundos da loja tirar o uniforme e colocar na mochila. Ajudo maria a trancar as portas e limpar as mesas. Tudo fica pronto e ela me olha um momento quando toco a maçaneta para sair pela porta lateral.

   ─Você vai?

   ─Elas nem devem estar se lembrando, Maria. Acho que foi só uma bobagem. Até amanhã. Boa noite.

   ─Melhor assim. Boa noite. Vou fechar o caixa e partir também. Pode ir.

   Atravesso a porta e quando chego a calçada as duas estão de pé ao lado de um carro esporte. Me sorriem. Vieram, acho que são legais.

   ─Vamos?

   ─Eu...

   ─Vem, Hannah. Sandro está muito animado com a ideia de que vai até a casa dele. Os pais dele viajaram. Sempre que viajam damos belas festas. Vai gostar. Sei que sim.

   Não sei bem o que pensar, mas elas me puxam para dentro do carro e logo estamos chegando a um apartamento luxuoso, Giane e Perla falam sem para e nem consigo acompanhar, mas gosto de estar com elas e me sentir jovem.

   O quarto dela é maior que a gelateria. Ela me faz sentar no sofá ao lado da janela panorâmica.

   ─Vamos ver. O que acha Perla? O preto ou o azul? – Elas estão no closet discutindo roupas enquanto me sinto bem desconfortável.

   ─Azul! – A amiga responde, as duas surgem de volta com um vestido de vestido de tecido leve e muito curto, balanço a cabeça negando.

   ─O que?

   ─Muito curto. Decotado. – Elas trocam um novo olhar.

   ─O preto? – Giani pergunta a amiga e a outra volta para o closet. Volta com um vestido preto. É mais fechado, mais ainda bem curto. Suspiro, não vou me sentir bem naquele pedacinho de tecido. – Nem vamos discutir. Sandro vai ficar tonto quanto vir você. Vem. Vamos arrumar o cabelo e caprichar na maquiagem.

   São quase dez da noite quando encaro o espelho e não me vejo. Essa moça diante de mim é um exagero. Muita maquiagem, pouca roupa e saltos altos demais, mas quando as duas me cercam encarando o espelho eu descubro que as três se parecem muito. Tem o mesmo estilo e o mesmo perfume.

   - Vamos. Já chegou todo mundo. – Fico com tanta vontade de dizer que não vou. Morrendo de vergonha delas e pensando que vou passar vergonha, mas elas gastaram tempo me arrumando e emprestando roupa. Melhor eu ir. Não quero chatear ninguém.

   Levo minha mochila na mão. Minhas coisas todas estão lá, uniforme para trabalhar amanhã, documentos. Chegamos a uma mansão de tirar o folego e ele não está mesmo interessado em mim. As moças são todas lindas. Usam roupas como as que estou vestindo, mesma maquiagem e sapatos, mas elas são reais e eu estou fantasiada, é como estar com o uniforme do trabalho.

   Giani deixa minha mochila num armário assim que passamos pela porta de entrada, tem muita gente, mais do que imaginei e quem sabe posso apenas achar um cantinho e me esconder até acabar e eu poder ir embora.

   Perla me entrega um drink. Eu balanço a cabeça negando.

   ─Meu Deus! Garota, isso é só para relaxar um pouco. É fraquinho. Olha em volta. Todo mundo está bebendo. Quer parecer uma boba?

   Tomo uns goles, é doce e muito gostoso. Caminho com elas entre as pessoas. Elas falam com todos e não me apresentam a ninguém e decido tomar mais uns goles da bebida para relaxar. Meus ombros doem de tanta tensão.

   Quando o garçom passa servindo mais bebidas meu copo está vazio. Perla já desapareceu e Giani pega dois copos novos, um para mim e outro para ela.

   ─Bebe e logo vai estar bem feliz! – Ela ri. Dou um gole da bebida que parece tão doce quanto a anterior, mas um pouco mais forte. Assisto a festa acontecer sem coragem de me mover do lugar até que ele aparece. Chega apertando mãos e beijando rostos da escada central até descer a sala de vários ambientes.

   ─Oi! – Ele diz quando chega até onde estou e nem sei como responder um simples cumprimento.

   ─Diga se não sou divina! – Giani pede a ele me apontando. – Fiz um ótimo trabalho, não acha?

   ─Está muito bonita, Hannah.

   ─Obrigada.

   ─Estava contando que viria. – Ele toca meus cabelos, sua mão desce por meu ombro como se o movimento fosse natural. Seus olhos recaem sobre mim de um jeito estranho, eu estremeço. Ele se curva e beija meu rosto. – Não saia daqui. Volto logo. – Afirmo sem saber bem o que fazer e logo ele desaparece entre as pessoas.

   ─Vamos virar o drink de uma vez? – Giani me convida e nego.

   ─Não consigo. É muito forte.

   ─Vai ser divertido. Hannah, precisa aprender a se divertir agora que somos amigas. – Amigas? Ela acha isso? É bom ter amigos. Giani segura minha mão. – Juntas? – Olho para o copo pela metade. Não vai ser nada demais. Concordo e ela sorri. Giani dá só uns goles, percebo quando baixo meu copo vazio e o dela está pela metade. – Ah! Venceu. Não consegui. Já venho. Espera o Sandro aqui. Vou pegar mais drinks para a gente.

   Não demora muito para me sentir meio zonza. Perla aparece com drinks, eu devia ter comido qualquer coisa. Olho em torno procurando por comida, mas só tem bebidas por todos os lados.

   ─Não Perla. Já bebi dois drinks. Estou meio tonta.

   ─Toma o copo, vamos tomar um ar lá fora enquanto bebemos e isso logo passa. – Caminho com ela me puxando pela mão e o ar da noite realmente me faz bem. Ela me faz rir com algo sobre o cara que está apaixonada e a convidou para uma viagem. Deixamos os copos vazios e voltamos para dentro.

   A música não parece mais tão alta, as pessoas não parecem mais tão agitadas e me sinto leve. Tudo me faz rir e danço com um grupo de pessoas no meio da sala.

   Sinto calor e prendo os cabelos num coque. Um rapaz me oferece uma cerveja e aceito. Desce gelada e me refresca. Ele diz algo em meu ouvido, mas não entendo. Sua mão toca minha cintura e então Sandro aparece e o empurra.

   ─Ei amigo. Ela não está sozinha. – Os dois apertam as mãos, riem de algo e Sandro me envolve a cintura. Me puxa para ele e dançamos, seus lábios descem por meu pescoço, sua mão sobe por minhas costas.

   ─Eu... – Não sei o que dizer. A língua enrola um pouco e acabo calada. Acho que devia pedir a ele para ir com calma, mas não consigo articular nada. Perla e Giani se juntam a nós e sinto mais segurança. Bebemos mais um drink. Não entendo mais o que eles dizem direito e quero me sentar. Talvez dormir. Toda hora tem um copo em minha mão e minha visão turva um pouco.

   Puxo Sandro pela camisa. Ele ri me segurando quando perco um pouco o equilíbrio.

   ─Preciso descansar! – Consigo dizer a ele.

   ─Vem gata, eu sei o que quer. – Ele me leva pela mão. No caminho para não sei onde quase caio uma vez. Alguém me ampara. Depois estamos subindo as escadas. – Vai conhecer meu quarto. O recanto do amor.

   Ele é legal, vou descansar no quarto dele e quando estiver bem, peço que me leve em casa.

   Assim que a porta fecha em me abraça, sua boca cobre a minha e não consigo sentir nada. Meu corpo está amortecido, eu não sei bem o que está acontecendo e sei que devia estar reagindo. Meu primeiro beijo, ele vai caminhando comigo em seus braços, dou umas passadas para trás a cabeça voando longe enquanto sua boca não se separa da minha e não tenho forças para afasta-lo. Não consigo dizer que não quero e na verdade eu nem sei se não quero.

   ─Não pensei que fosse ficar tão bonita. Não sabia que tinha uma gostosa por baixo daquela roupa ridícula. – Ele diz quando caímos na cama, sinto seu corpo de encontro ao meu, sua boca descer por meu pescoço e o vestido vai sumindo por suas mãos e minha mente vai e vem e não sei o que ele está dizendo ou eu. Nem mesmo tenho certeza se estou dizendo alguma coisa. São só imagens confusas e minha mente tenta lutar com a fraqueza e me alertar e tudo fica agitado, ele está nu e eu também.

   ─Sandro isso...

   ─Quero você, gata. Vamos ficar juntos, vou cuidar de tudo. – Ele diz no meu ouvido. Eu balanço a cabeça numa negação e lá está sua boca devorando a minha e é só meu corpo amortecido sem que eu saiba o que realmente está acontecendo e então ele está ao meu lado. Meus olhos fecham um momento. Preciso organizar os pensamentos e reagir.

   A luz do dia me desperta. Leva um longo segundo para minha cabeça começar a funcionar. Abro os olhos me vejo sobre a cama grande. Sozinha, um lençol sobre mim. Minha mochila no chão do quarto. Minha cabeça dói e sinto enjoo. Sandro. Nós dois estivemos aqui juntos e aconteceu. Ele e eu... corro para o banheiro. Vomito, lavo o rosto e encaro minhas coisas no chão. O vestido que usei não está mais lá. Nem meu jeans. É só o uniforme e não entendo. Me visto, que escolha eu tenho?

   Encaro o espelho que pega toda uma parede, estou péssima. Ele não está comigo. Achei que acordaria com ele. Sandro disse algo sobre cuidar de tudo. Ele está gostando de mim?

   Pego a mochila e deixo o quarto. A casa está silenciosa. Na sala um casal dorme no chão espalhados. Ando pelos ambientes e quando escuto vozes vindas dos fundos e barulho de água e sigo até a piscina.

   Sandro está na água. Giani em seus braços e os dois se beijam longamente. Fico parada olhando a cena. Outros estão em torno. Rindo e conversando. Quando se separam e me veem eles trocam um sorriso.

   ─Já joguei o vestido no lixo. – Ela me diz envolvendo mais o pescoço dele. – Fica melhor no uniforme. É mais a sua cara.

   ─Por que? – Pergunto com a voz embargada. Meus olhos estão nele.

   ─Foi divertido. Queria saber como você era. Na verdade, você é meio sem graça. Não sabe se mexer se é que me entende. Pode ir.

   Eu não consigo nem mesmo responder. Só corro para longe, corro sem parar até a rua e depois eu continuo a correr até meu corpo não corresponder mais e paro juntando folego. As lágrimas correm por meu rosto. Meu coração está partido. Quebrado, dolorido.

  Quando me dou conta uma senhora está me levando para a calçada. Me oferece ajuda, diz coisas boas, mas eu não escuto. Eu só consigo chorar. Até que me lembro que preciso sobreviver, que tenho que trabalhar e respiro fundo.

   Maria me olha firme quando chego. Não preciso dizer nada. Estou descabelada. Cheirando a bebida, amassada e com os olhos inchados.

   ─Vá para casa. Digo que não estava se sentindo bem. Amanhã você vai se sentir melhor.

   ─Maria...

   ─Só vá para casa. É melhor assim.

   Obedeço, tomo banho, ele disse, Tio Oliver disse que o mundo iria me devorar e ele estava certo. Disse que eu era fraca e acertou mais uma vez. Por isso ele me trancava. Por que sou burra, sou idiota e qualquer um que se aproxima só quer mesmo me machucar.

   Sandro não volta a gelateria até quarta-feira, ele chega com suas amigas e sinto vontade de sumir. Nenhum deles se dá ao trabalho de fingir. Eles me ignoram ou riem. Eu calo e sirvo as mesas como se não existissem.

   Maria sempre de olho. O senhor Giacomo vem todos os dias ao anoitecer e procuro me comportar sem reclamações. Mesmo que me sinta sempre humilhada. Mesmo que eles sempre façam questão de me humilhar eu calo.

    Três semanas do ocorrido e ainda choro todas as noites até adormecer. Pela manhã meu corpo está dolorido e me sinto cansada. O enjoo vem logo cedo. Sinto tonturas e a menstruação está duas semanas atrasada e simplesmente sei.

   Não me lembro de detalhes daquela noite. Se doeu, se demorou, se foi rápido e nem mesmo se eu pedi que parasse. A culpa é minha. Só minha. Ele me levou para o quarto, mas eu não me recusei a ir.

   Toco a barriga quando a certeza me invade. Preciso contar a ele. Preciso saber se ele vai ficar ao meu lado. Acho que ter um bebê pode mudar as coisas. Muda para mim. Ainda sinto aversão e nojo dele. Quase tanto quanto sinto de mim mesma ou daquelas garotas e o que fizeram comigo por pura diversão. Como se eu não fosse gente. Como se não passasse de um brinquedo para riquinhos entediados.

   No domingo é minha folga. Decido que não posso abrir mão dela. Preciso tomar coragem e procura-lo. Compro um teste de farmácia. Não que eu precise. Sei o que está acontecendo. Sinto meu corpo mudar, minha cabeça. Tem os enjoos e quedas de pressão. Um reboliço no meu corpo, na minha alma. Na minha vida.

   Coloco o exame com os dois risquinhos na bolsa. Ele vai querer uma prova. Uma empregada me recebe com uma ruga na testa.

   ─O Sandro, por favor, diga que é a Hannah, diga que é uma emergência. Que não posso ir embora sem falar com ele.

   Ela desaparece e demora um tempo até ele surgir com cara de sono. Me olha como se nem se lembrasse de mim.

   ─Você?

   ─Eu... eu... eu não sei como dizer.

   ─Então não diz e eu volto a dormir.

   ─Grávida. Estou... gravida.

   ─E o que eu tenho com isso?

   ─De você! – Me explico e ele continua a parecer indiferente. Nem uma leve mudança no comportamento.

   ─Acha que é a primeira a me jogar essa conversa? Quanto quer para ir embora? O dinheiro do taxi?

   ─ Eu não tenho ninguém, você... é o pai do bebê.

   ─ Maluca você. Foi para cama comigo, como deve ir com todos e vem com essa história? Fica longe de mim. Foi uma brincadeira e aposto que gostou muito. Agora vá embora. Não quero filho nenhum, mesmo que fosse meu. Olha para mim, para minha casa. Acha mesmo que não tenho como tirar você do meu caminho?

   ─Sandro... – Eu fico pensando se isso é verdade. Se está mesmo acontecendo. Ele não pode estar dizendo a verdade. Encontro seus olhos claros. Ele é um monstro. Me usou de todos os modos, eu deixei, mas ele... ele não estava bêbado.

   Fico tonta. Meu estômago embrulha e quando me dou conta estou vomitando em seus pés. Ele salta para trás. Grita eu acho, não sei. Só consigo colocar tudo para fora e quando ergo a cabeça o nojo dele por mim não é maior do que o meu por ele.

   ─Se quiser tirar eu pago.

   ─Assassino. – É tudo que consigo dizer e então eu me afasto. Estou enjoada. Assustada e só sei correr para longe mais uma vez. A última vez.

   As coisas que tio Oliver disse de mim ficam martelando minha mente e ele tinha razão. Sempre teve razão e eu devia ter me contentado com a prisão de sua casa.

   É o que mereço por ser tão tola. Chorar é parte da minha existência agora e é o que faço o resto do dia. Abraçada a minha barriga com a certeza que nada no mundo vai me afastar desse serzinho que cresce em mim e não tem culpa de nada. Eu o amo. Não importa como chegou até mim. É meu e amo com todas as minhas forçar.

   Não vou contar a ninguém. Vai ser meu segredo até estar pronta para falar sobre isso.

   Me forço a sair da cama mesmo enjoada. Quando chego a gelateria dou de cara com Sandro saindo de mãos dadas com Giani. Ele sorri de modo cínico quando passa por mim.

   O senhor Giacomo está sério quando entro.

   ─Bom dia, vou me vestir e...

   ─Não. Desculpe Hannah, mas preciso demitir você. O rapaz que saiu, sabe bem quem ele é. Veio aqui dizer que anda perseguindo ele. Disse que ele e os amigos vão parar de frequentar o lugar e por mais que ache que ele está mentindo eu sustento minha família com esse lugar e não posso perder os alunos da universidade.

   Fico ouvindo tudo calada. Quando vou parar de afundar? Até onde posso ir?

   ─Não devia ter se envolvido com eles. – Maria me recrimina. Como se não soubesse disso.

   ─Hannah, você é boa moça. Sinto muito. Vou te dar uma indenização. Três semanas de salário.

  Ele conta notas, coloca em um envelope e me estende, não quero pegar. Quero implorar por uma chance.

   ─Senhor, prometo ficar quieta, eu...

   ─Não posso, ele vai me causar problemas. É menino rico, cheio de amigos. Eu realmente não posso. Você é jovem. Vai conseguir logo outro emprego.

   ─Onde? Foi sorte conseguir essa vaga. Não tenho experiencia.

   ─Por que não tenta a vindima? Toda vinícola contrata essa época do ano, é trabalho duro, mas dá um bom dinheiro e você consegue mais um folego até achar um emprego.

   Tinha me esquecido da vindima. É sempre assunto nos telejornais e eu me lembro de como tudo ficava mais alegre nessa época do ano.

   ─Vá, querida. Pegue um ônibus e procure uma vinícola grande. Vai conseguir. – Maria me incentiva. Sei por que ele veio aqui. Por que estou gravida. Por que não quis abrir mão do meu filho e ele com certeza tem medo de me ver desfilar minha gravidez. Eu não tenho escolha. Não é só por mim. Agora é pelo meu bebê também.

   Não sei se me despeço deles. Ando tão atordoada que nem realizei ainda tudo que está acontecendo comigo. Parece que ando numa espécie de pesadelo. Como se não tivesse controle sobre nada. Como se a qualquer momento fosse despertar, mas não. A angustia fica me atordoando a mente o tempo todo.

   Um garçom fuma um cigarro nos fundos de um restaurante. Me aproximo.

   ─Senhor, qual o melhor vinho da toscana?

   ─De Martino moça, mas é muito caro. – Ele diz dando uma longa tragada no cigarro, quando solta a fumaça sinto enjoo e dou dois passos para trás.

   ─A vinícola fica muito longe?

   ─Ele é feito na vinícola De Martino. A Vila De Martino é bem conhecida. Se chegar a San Gimignano vão te indicar o caminho. Umas horas de ônibus.

   ─Obrigada. – É isso. Uma vinícola grande. Essa deve ser grande o bastante e devem precisar de gente. Eu posso tentar isso antes de mergulhar na escuridão total. – Vila De Martino. – Repito para não esquecer.

                        


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Notas finais do capítulo

Beijossssssssssssssssssss



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