Made of Stone escrita por littlefatpanda


Capítulo 7
VI. De todas as festas do mundo


Notas iniciais do capítulo

GENTE DIVA, me desculpem pela demora! Please!

Eu exliquei melhor em MOF, mas pra quem não a acompanha: basicamente, eu tive umas semanas meio lixo e meio trágicas e tô cheia de problemas, então dei uma sumidinha básica. E como eu empaquei em MOF, acabei empacando aqui também, então...
ENFIM.
I'm back! E vou tentar continuar estando, mas preciso que me dêem um descontinho, por favor ♥

"De todas as festas do mundo, logo esta pra eu entender."



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— Isto é uma péssima ideia! — Mason verbalizou meus pensamentos.

A festa na casa de Ben, para a qual Bruno nos convidou na segunda-feira, foi adiada para uma sexta. A ideia genial de Alex para nos levar sem que ninguém soubesse era a seguinte: eu diria para minha mãe que dormiria no Ian, Ian diria que dormiria no Mason e Mason diria que dormiria na minha casa, quando, na realidade, todos dormiríamos na casa do Alex, já que seus pais estavam fora. Uma ideia bem pensada, mas que tinha absolutamente tudo para dar errado, principalmente porque a ideia veio do próprio Alex. 

— Que nada! Venham, é aqui — indicou, apontando para a casa barulhenta.

Claro que é ali, pensei, revirando os olhos.

Estávamos com as mochilas nas costas, mas Alex garantiu que guardaria em um lugar seguro na residência do novo amigo. Usava uma roupa preta e uma bota de couro que parecia custar todo o salário mensal da minha mãe. Havia um pingente em torno de seu pescoço, que brilhava mesmo no escuro, e um sorriso arteiro no rosto, que brilhava na mesma intensidade.

Mason estava bem ajeitadinho porque Ian ajudou no processo, arrepiando os fios louros e pegando uma roupa minha emprestada - as de Ian com certeza boiariam no corpo dele - para mudar um pouco o aspecto costumeiro dele. E Ian também não estava nada mal, com uma camisa azul xadrez, uma calça nova e um tênis que também custava um fígado meu.

Eu, por outro lado, usava os mesmos all star surrados, uma calça jeans velha e a minha melhor camisa, que ainda assim não era grande coisa, que eu roubei do meu irmão quando já não servia nele. 

— Não me diga, Alex — disse Ian, irônico. — Dava pra ver que é aqui lá da esquina!

Alex apenas riu, para nada se afetando com as palavras do primo.

A casa era imensa, de uma cor branca fosca, e tinha pelo menos umas dez janelas. O pátio era aberto e a grama já estava lotada de lixo, como era de se imaginar, como latinhas, bitucas de cigarro, copos plásticos e mais. Haviam, no mínimo, uma centena de pessoas espalhadas dentro e fora da casa, o chão tremendo com o volume da música eletrônica. O que era curioso, porque não haviam uma centena de pessoas no ensino médio daquele colégio de bairro. 

— E aí, Alex? — cumprimentou Bruno, bem-humorado, ao enxergá-lo adentrando no pátio.

— E aí, cara? — gritou Alex de volta, sorrindo. Então, virou-se para nós. — Se misturem e vai ficar tudo bem, vocês vão ver. Vai ser demais! — garantiu, esfregando uma mão na outra com empolgação ao passar os olhos para analisar os adolescentes dali. Então, advertiu, com um riso de canto: — Só não bebam muito álcool!

— Qual a definição de "se misturar"? — perguntou Mason, ajeitando os óculos. De novo, agradeci mentalmente. Alex o olhou com uma careta. — Eu sou antissocial, não faço ideia do que você tá falando!

Ian gargalhou, e Alex se juntou a ele, balançando a cabeça.

— Do que você tá rindo? — perguntei ao Ian, sério. — Você é o mais socialmente desajeitado de nós três — resmunguei, já de mau humor.

Ian fechou a cara.

— Crianças, não briguem — advertiu Alex, em um tom de pai. Então riu da própria performance, indicando o caminho em frente. — Vão! Vão logo.

— O único motivo de você não sofrer bullying físico é porque é alto demais — resmungava Mason, indo na frente, emburrado.

— O quê? — perguntou o outro, mais indignado ainda. Revirei os olhos. — Eu sei conversar, pelo menos...

— Você sabe rir das piadas que não entende, é diferente — rebatia o loiro, causando mais uma enxurrada de picuinhas. 

— Caleb?

Antes que eu pudesse me virar, Alex pegou meu braço, fazendo com que eu parasse. Tinha as sobrancelhas arqueadas e um sorriso jocoso ao me olhar de cima a baixo. — Esta é sua melhor roupa?

— Sim — resmunguei, irritado com toda a pose de rico dele. — Algum problema?

Ele riu, erguendo as mãos. — Nenhum, nenhum.

Franzi o cenho, observando quando ele levava ambas as mãos para a nuca e uma careta concentrada tomou conta de seu rosto por um instante. Logo depois, como se ele se decidisse, sorriu ao retirar o pingente do pescoço e dirigi-lo ao meu. Afastei-me na hora, mas ele me manteve parado.

— É só para completar esse seu visual — explicou, sério, ao tentar fechá-lo sem enxergá-lo, na minha nuca. 

Os dedos frios em minha pele arrepiaram até o último fio dos meus cabelos, mas eu me mantive sério. O hálito de menta, das balas que houvera dividido entre nós quatro, chegou ao meu rosto, já que o dele estava próximo o suficiente para tal. Ignorei também.

Assim que ele terminou, eu puxei o pingente para ver do que se tratava. Era uma bala de revólver - falsa, obviamente -, mas parecia ser prata de verdade, pela maneira como chamava atenção mesmo na escassez de luz. Arqueei as sobrancelhas, vendo que ele sorria, satisfeito.

Optei por ficar calado, sabendo que era a melhor opção.

— Quando é seu aniversário? — perguntou ele, voltando a caminhar em direção à casa. Percebi que os outros dois já haviam sumido de vista. 

— Mês que vem — murmurei, ainda observando o pingente em meu pescoço.

— Ótimo! — exclamou, satisfeito. — Depois disto, você irá tão arrumado para as festas que nem eu vou chamar atenção. — Riu, me olhando de canto. — A sua, talvez.

Franzi o cenho, confuso.

Alex parecia trocar umas ideias consigo mesmo, por vezes, que eu não era capaz de entender, e eu nunca sabia se era por eu ser burro ou porque só o Alex é capaz de entender o Alex.

Adentrei, por fim, na casa que vibrava. 

Mal havia posto os pés lá dentro e já sabia que ia sair dali com muita dor de cabeça. Haviam adolescentes por toda parte, nenhum adulto, e provavelmente nós três éramos os mais novos de toda a galera. Alex já ia cumprimentando um pessoal que eu nunca tinha visto na vida, e puxando conversa com vários, enquanto eu tentava localizar os outros dois patetas do nosso quarteto.

Alex pegou minha mochila e, antes que eu pudesse ver, se desfez dela junto da dele ao entregar para um garoto e dizer-lhe alguma coisa.

Uma garota loira de cabelos curtos mal disse alguma coisa para o Alex e já saiu deixando marca de seu batom vermelho no rosto dele, dando as costas logo após. Uni as sobrancelhas, pensando se era realmente assim que funcionava o mundo do romance hoje em dia: "hoje te sujo de batom em uma festa, amanhã você pergunta meu nome e daqui há uns anos temos um par de filhos."

Alex pegou a minha mão rapidamente, sequer dirigindo-me um olhar, fazendo caminho por entre as pessoas no centro da sala de estar, mais parecida com uma boate naquele instante. 

Pobres pais.

Alguém respingou uma espécie de ponche vermelho sobre o ombro da minha camisa e, com uma careta, grudei-me ainda mais em Alex para não me perder no meio da selva, envolvendo seus dedos com os meus. Mesmo envergonhado até a próxima vida, achei melhor esta opção do que me perder no meio de adolescentes bêbados.

— Aí estão vocês!

A voz de Mason me causou certo alívio, quando chegamos em um dos cantos menos movimentados daquela sala, onde os dois se encontravam ao lado de Bruno e Annelise. Ambos estavam sem as mochilas também. Ao mesmo tempo, Alex soltou minha mão ao vê-los, me direcionando um sorriso de canto e uma piscadela de olho.

Franzi o cenho, mas ele logo puxou papo com os dois colegas.

Inclinei o rosto, com os olhos focados no pescoço de Ian, onde uma marca de batom se encontrava. Olhei para Mason, um tanto chocado, e ele apenas assentiu, em uma comunicação silenciosa que apenas nós dois entendíamos.

— Ian? — chamei, puxando sua camisa para que descesse o olhar para mim. Ele sorria feito um pateta e se remexia no lugar, perpassando os olhos por toda a casa, procurando por algo. — Ian, você pegou alguém? — perguntei, não impedindo o riso, sem conseguir desviar o olhar do pescoço meio brilhante com a cor rosa espalhada nele. 

Ian assentiu, rindo com empolgação.

— Ela é uma gata! — contou, extasiado. — Espera só até eu encontrá-la outra vez, eu juro pra você, Caleb! Não é, Mason? — cutucou o menor, que apenas revirou os olhos, enquanto eu ria. — Caramba! Ela é loira, Caleb, loira! 

— E mais velha — acrescentou Mason, concordando com o outro. — Tenho certeza que ela é amiga de Faye, mas não estuda com a gente. 

Assenti, balançando a cabeça com incredulidade. Nosso Ian, que orgulho. 

Quando girei o rosto, encontrei os olhos escuros de Annelise sobre mim, que me encarava com um interesse estranho. Franzi o cenho, desviando o olhar para Alex, que também me olhava junto de Bruno, e logo percebi que falavam ao meu respeito.

Estreitei os olhos para o Alex, que apenas riu, me puxando para perto. 

— Caleb, Annelise — apresentou, simplesmente, indicando a garota do nosso colégio. — Annelise, Caleb. 

Arqueei as sobrancelhas, esticando a mão para cumprimentá-la de forma automática. — Prazer — murmurei, um tanto confuso, e distraído com as mãos de Alex nos meus ombros. 

Annelise tinha a pele escura, os olhos escuros e delineados com a cor azul, os cabelos crespos soltos em cascata.

Bruno parecia divertido ao desviar os olhos admirados dela para mim e vice-versa, enquanto eu me sentia perdido. O sorriso de Annelise aumentou pouco a pouco, até que seu rosto se contorceu em uma careta fofa. 

— Que bonitinho! — exclamou, e eu arregalei os olhos, vendo que ela me puxava para perto, me abraçando como se fôssemos amigos de longa data.  

Ainda esmagado por ela, Bruno apareceu no meu campo de visão, gargalhando após o momento inicial de surpresa pela atitude da garota. Não tão surpreso quanto eu. Assim que ela me soltou, pegou meu rosto com ambas as mãos e continuou fazendo a cara fofa, como se eu é que fosse. 

— Ok, ok — interrompeu Alex, quando me puxou contra seu peito, para longe dela. — Eu sei que ele é um neném, mas vamos parar de esmagá-lo, sim? 

Alex deu um riso, mas sua voz soou um tanto impaciente, grudando-me em seu peito. 

No mesmo instante, assim que processava o comportamento dele, girei o rosto a tempo de encontrar os olhos claros de Mason por sobre nós, e engoli em seco.  

A maneira como Alex agia, por vezes, me fazia reviver alguns momentos aleatórios da minha vida. A maneira como eu podia sentir sua mão no meu peito ao passo que meu melhor amigo nos analisava me trouxe uma sensação específica: de quando eu jogava a bola para o pátio do vizinho mal-humorado, mesmo quando minha mãe havia me advertido para que isto não se repetisse, e eu tinha que pular o muro escondido para buscá-la, cuidando para não ser pego no flagra por ninguém. 

Alex fazia com que eu me sentisse assim, boa parte das vezes. E com o Alex, era como se eu tivesse fazendo algo errado, algo diferente da situação relembrada, porque eu não a desempenhava, só estava sendo arrastado para tal por outro alguém. 

Era ele quem fazia coisas estranhas, não eu. E ainda assim, eu me pegava olhando ao redor para ver se alguém estava me olhando cometer os deslizes que eu não estava cometendo. E francamente, nem ele.

O que ele estava fazendo, afinal? Sendo estranho? 

Isto não é argumento algum. E talvez por este motivo, Mason não havia se atrevido a falar mais nada até agora, desde segunda-feira, quando Alex ficou me abraçando na frente dos dois e Mason percebeu o quanto aquilo era esquisito. Eu tenho certeza que ele percebeu. Mason e eu éramos normais, ao contrário dos Cunningham, na minha humilde opinião, por isto ele também via o que eu via. 

E o que era isto, eu sequer sabia explicar. O que eu via? 

A verdade é que eu não queria saber. 

— ... porque se você não beber, não vai embora! — tagarelava Bruno, com o Alex, que ainda mantinha uma mão espalmada em meu peito. — Ei, Ben! Ben, vem cá, cara! 

Girei o rosto de um lado ao outro, tentando me localizar com tanta conversa e pessoas paralelas. Pisquei algumas vezes, acabando por focar os olhos em Annelise, que novamente me olhava. Desta vez, de forma normal. 

— Caleb, vamos! — convidou, subitamente, fazendo um gesto com a mão ao tentar deslocar-se para a cozinha. No entanto, ela desviou os olhos para trás de mim, em Alex. — O quê? — questionou, com uma careta, os olhos nele. — Eu não vou abusar do garoto, Alex, pelo amor... — resmungou, revirando os olhos. Senti o rosto queimar de vergonha, ouvindo Alex estalar a língua atrás de mim. — Vem, Caleb, traga seus amigos! Tem bebida com e sem álcool na cozinha, e uns aperitivos. 

— Não, não — intrometeu-se Jake, o rapaz que chegou junto do Ben, o dono da casa. Eram os siameses. — Aperitivos não tem mais — riu-se ele, enquanto o outro estalava a língua, desgostoso que houvesse acabado a comida. — Mas bebida tem sim, podem ir.

Jake vacilou um pouco ao nos relancear, provavelmente por nossa idade, mas deu de ombros. Que bom, porque não era como se eles também pudessem beber.  

— Alex — chamou Ben, passando os olhos pela forma como estava grudado em mim, mas optando por ignorar —, você sabe que já é da casa! 

— Claro — riu-se ele, modesto. — Valeu, Ben! 

Neste instante, apareceu a bendita da Mary Jane. Não que eu tivesse algo contra ela, mas eu tinha algo contra ela

— Alex! — chamou, colocando uma das mãos bem feitas no ombro dele, arrancando-lhe um riso sem graça. Relanceou-me em seus braços com certo estranhamento, mas relevou ao focar nele de novo. — Estava pensando que não viria. 

— Alex! — repreendeu Annelise, antes que ele respondesse, tirando a mão dele do meu peito e me puxando em sua direção. — Deixa o garoto aproveitar a festa, não foi pra isto que o trouxe?

Alex hesitou mas deu de ombros, sorrindo de um jeito forçado antes de começar uma conversa com Mary Jane, que já aproveitava a deixa para passar um dos braços magricelas pela cintura dele.

— Venham — chamou Annelise, acenando para que Mason e Ian também a seguissem.  

Dei uma última olhada em Alex, vendo que ele alternava o olhar entre mim e a menina dos olhos puxados, optando por finalizar a atenção nela, mexendo-lhe nos cabelos negros e compridos de maneira carinhosa.

Dei as costas, seguindo meus amigos e engolindo um longo suspiro exaustivo. 

Bruno e Ben tinham características semelhantes: cabelos castanhos, olhos castanhos e pele parda. Bruno era mexicano, bem-humorado, usava roupas um tanto acima de seu tamanho, era um tanto encorpado para alguém de quinze ou dezesseis anos, e tinha a mesma altura do Alex. Ben era mais ajeitado - e a julgar pela casa imensa, provavelmente, riquíssimo -, e bem mais alto, até mesmo do que Ian. Eu lembrava que ele já estava no último ano do ensino médio, sendo mais velho, então não era colega do Alex, ao contrário do Bruno e, bom, também do Jake. 

O siamês de Ben tinha a mesma idade do Cunningham mais velho. Jake tinha os cabelos castanhos em um tom mais claro, a pele branca e os olhos em um tom claro - se verde ou azul, eu não fazia ideia.

Um era mais sério que o outro, entre Ben e Jake - Mason havia me dito que eram amigos de infância ou algo assim -, sendo Jake um pouco mais descontraído. E Bruno, perto dos dois, era um palhaço. Obviamente, era o mexicano que melhor se dava com Alex. 

Ri com o pensamento, adentrando na cozinha com meus dois amigos, e deixando os mais velhos para trás. E deixando Alex com a Mary - perfeita - Jane. 

Na cozinha, se encontravam todas as garotas do grupinho e uma quantidade absurda de garotos também enfiados ali, apenas por causa delas.

Assim que adentramos, uma menina loira pegou Ian pela nuca - que quase se engasgou pela surpresa - e beijou-lhe os lábios, encostando-o na parede. Arregalei os olhos pela surpresa, vendo que Mason fazia o mesmo, antes de nos olharmos e cairmos na risada. 

Pelo menos um de nós estava se divertindo à beça. 

— O que é isto? — perguntou Mason, pegando um copo com uma bebida esverdeada. — Isto não é cerveja. — Cheirou, fazendo uma careta. — E muito menos suco. 

Fiz uma cara de nojo, afastando o copo dele. — Então nem interessa o que é. 

No entanto, Mason puxou o copo de volta, relanceando rapidamente Ian e a garota que ainda não o havia largado. Trancou a respiração e virou o copo todo de uma vez, enquanto eu o encarava de boca aberta. 

— O que tá fazendo? Mason! — Cutuquei-o, vendo-o largar o copo na mesa outra vez, vazio.

— Ian se misturou da maneira dele — contemplou, indicando nosso amigo desajeitado. — Eu vou me misturar da minha, e você devia se misturar da sua. 

— Ficando bêbado? — sussurrei alto, me aproximando de Mason, com uma careta. 

— Não. Digo, sim. — Ajeitou os óculos, ainda com uma careta pela bebida. — Sei lá, Caleb! Já estamos aqui mesmo. — Deu de ombros, usando os olhos para fazer uma varredura ao redor, e eu sabia que eram os olhos de detetive. — Talvez eu encontre um dos meus amigos virtuais por aqui. 

— Espera! — chamei, quando ele me deu as costas. — Maze! — gritei, mas o som da música não ajudava. 

Com um suspiro, observei o beijão de novela de Ian e da loira e logo os desviei para as colegas do Alex, que conversavam animadamente, rejeitando os rapazes que se aproximavam. Era incrível quantas pessoas cabiam naquela cozinha, sendo que nem na minha casa inteira caberia aquela quantidade de adolescente embriagado. 

Eu acabei sozinho, cercado de pessoas que mal conheço, em um local no qual pus os pés pela primeira vez. Eu devia, pelo menos, fingir que faço parte para "me misturar", como foi instruído por Alex. 

Observei a jarra com a mistura verde de álcool e sabe-se lá o que mais. Dei de ombros, pegando um copo e virando-o de uma vez também. 

O líquido desceu rasgando em minha garganta, e apesar de já ter bebido álcool escondido para provar, era completamente diferente daquele ali. Tossi, só depois de haver engolido, sentindo o gosto de limão, o gosto de álcool e o gosto de algo mais que eu não gostaria de descobrir nunca do que se tratava. 

Olhei ao redor, percebendo que tudo permanecia igual. A música, as pessoas, a velocidade de tudo. Nada de esfeitos especiais, do mundo girando, das luzes piscando, da língua enrolando. 

Estalei a língua.

Então realmente era mentira quando a pessoa toma um copo de álcool nos filmes e já fica embriagada. Que desserviço. 

Decidi dar uma olhada ao redor, saindo da cozinha e esbarrando em alguns corpos. 

— Opa, pequeno!

Deparei-me com o dono da festa, as sobrancelhas arqueadas, quando me deu uma cotovelada sem querer, no meio da multidão. Eu estava acostumado com pessoas altas, por causa do Ian, mas o Ben era outra história. Ergui o olhar, esfregando a testa com uma careta desgostosa.

Ele fez uma cara de culpa. — Caleb, não? — perguntou, me analisando. — Alex está lá, se você tá procurando por ele. 

Assim que ele apontou para o Alex, segui seu olhar, encontrando-o aos beijos com Mary Jane. Bufei, dando as costas para o Ben, tentando encontrar Mason, mas de alguma forma meus olhos retornaram para ele.

Alex parecia completamente desconfortável. Retribuía alguns beijos insistentes da menina de traços asiáticos, mas tentava continuar a conversa com os amigos ao lado, rindo com nervosismo e desviando um tanto dela. 

Se ele não queria ficar com ela, por que o fazia? 

Decidi que eu o observaria desta vez, e não o contrário. 

Alex fixou o olhar escuro em algum ponto que não pude distinguir entre aquela cambada de gente, e pareceu concentrado demais nele, rindo sem graça para MJ e seus amigos e logo voltando a atenção para o ponto específico. Segui seu olhar para perto das escadas para o andar de cima, mas não vi nada. Franzi o cenho, tentando compreender, mas tudo o que havia perto das escadas eram mais adolescentes embriagados. 

O garoto desvencilhou-se de MJ, tirando o braço do entorno dela e dizendo algo rápido em seu ouvido, logo o repetindo para os amigos, antes de marchar para longe deles. Os cinco colegas continuaram em uma conversa descontraída, e Alex pareceu checar para ver que a atenção não estava mais nele antes de apurar os passos em direção às escadas.

Eu estava tão concentrado nele que não vi quando alguém subiu as escadas antes do Alex. 

Seguia ou não seguia? 

Puxei o copo de um garoto que estava distribuindo e o virei mais uma vez, desta vez, ignorando a ardência na garganta. 

Sim, eu o seguiria! 

Se eu parasse para pensar nos motivos para as minhas ações, eles estariam tão claros quanto cristais. Não era um enigma grande, nem um mistério, nem nada do tipo. Era óbvio, tão óbvio que eu não parei para pensar, porque eu descobriria no mesmo instante. 

Então eu entendi a expressão "mentir para si mesmo". Não era algo literal, porque é impossível literalmente mentir para si mesmo. Era não pensar a respeito, até que explodisse em sua cara. Era a mesma coisa que ignorar os problemas com o intuito de que desaparecessem por conta própria, como em um passe de mágica. 

Assim que subi as escadas, vi que o local não estava vazio como eu pensava. Haviam menos pessoas, todo o andar estava um tanto escuro, e a maioria dos adolescentes ali estavam grudados uns nos outros, e grudados contra as paredes. Passei por um banheiro fechado do qual se podia ouvir gemidos e batidas de porta, e então por uma sala onde haviam ao menos uns três casais, fora os que haviam nos corredores. A única exceção era um grupo de garotas que ria e tirava foto de outro casal. 

Assim que cheguei no fim do corredor, onde haviam menos pessoas e menos barulho, quase desisti, voltando por onde vinha. Mas a última porta - era o quarto do Ben, já que havia uma plaquinha com o nome dele - estava entreaberta, de forma tentadora demais para que eu desse as costas. 

Eu a abri devagar, agradecendo que a madeira não estivesse barulhenta, e não demorei para distinguir duas pessoas contra uma mesa de estudos. 

Arregalei os olhos. 

Alex era estranho e sempre seria estranho, na minha concepção. Mas naquele instante, pelo menos um terço de sua estranheza foi explicado. E com muita nitidez. 

Alex prensava um garoto loiro e magricela contra a mesa, beijando-lhe como se o mundo fosse acabar, enquanto o outro tinha as mãos dentro da camiseta dele.

O garoto loiro também era do nosso colégio, e embora parecesse mais novo, estava no segundo ano também. Ele era gay assumido, e muita gente mexia com ele por isto, já que sempre havia sido muito óbvia a sua sexualidade devido aos seus trejeitos. Eu tinha certa simpatia por ele, principalmente depois de ver pelo o que Will passou, mas ao vê-lo gemer quando as mãos do Alex lhe agarraram o traseiro, tudo que senti foi desgosto. 

O gosto amargo em minha boca nada tinha a ver com o álcool, e nem tampouco as minhas mãos trêmulas e a respiração pesada. Eram consequências do coração apertado. 

Bem feito, Caleb, informei a mim mesmo. Curiosidade matou um gato, não foi?  

Alex vivia de brincadeiras para o meu lado, brincadeiras que garotos fazem com garotas quando querem que elas retribuam o sentimento. Ou garotos fazem com garotos, neste caso, quando querem chamar atenção para eles. Brincadeiras que não tinham por que ele fazer, já que ninguém fazia isto se realmente não quisesse uma reação, principalmente quando se trata de garotos. Bom, ninguém hétero, ao menos. Mas talvez Alex só estivesse me testando, porque ele claramente — claramente! — gosta de garotos. 

Pisquei algumas vezes, nem conseguindo raciocinar o suficiente para sair dali. 

Nem sei por que eu estou chateado, resmunguei para mim mesmo. Porque o Alex estava brincando comigo? Mas quem disse que eu corresponderia? 

Minha presença se tornou notável quando a camisa do loiro voou para longe, quase me acertando na cara, e um som surpreso saiu da minha boca. 

Os dois congelaram, girando os rostos para a porta em menos de um segundo, Alex se afastando do loiro no mesmo instante. Ele franziu o cenho, o corpo estático, antes de estreitar os olhos na minha direção, provavelmente para enxergar de quem se tratava naquela penumbra.

— Caleb? 

— Perdão — murmurei, baixo demais para o meu gosto. Pigarreei. — Eu já tô indo. 

Dei as costas antes de ouvir alguma resposta, apressando os passos para longe e descendo as escadas como um vulto, os olhos ardendo pela luz da qual eles haviam se desacostumado no bréu de cima. Engoli em seco, percebendo que, desta vez, era eu quem esbarrava nas pessoas, porque a linha reta na qual eu queria caminhar não parecia tão reta assim. 

Franzi o cenho, parando na porta da cozinha. Tentei de novo, vendo que meu corpo ia para o outro lado e não para o qual eu gostaria que fosse. 

Oh, isto não é bom. 

— Maze? — Vi o vislumbre do loiro, rindo de alguma coisa que uma garota ruiva dizia. — Mason! 

Ele virou em minha direção, as bochechas avermelhadas, assim como os lábios, e os olhos brilhando. 

— Caleb, onde você tava? — perguntou ele, enrolando a língua. — Eu encontrei a cat89 — contou, fazendo com que eu me aproximasse, me perguntando se havia ouvido direito. — Dos jogos! Ela é uma das minhas informantes, e o nome dela é Cristina. 

Assenti, ainda me sentindo desnorteado, percebendo que Mason estava mil vezes pior do que eu. Meu equilíbrio podia ter sido afetado, mas ele estava completamente bêbado! 

Demoramos um tempo até encontrar Ian e mais ainda até que eu os convencesse a sair para fora. Procurei por nossas mochilas e descobri, por Annelise, que estavam escondidas nos armários da cozinha, junto de várias outras. Nos encaminhamos para o lado de fora para sentarmos na grama, bebendo um pouco de água para melhorarmos, enquanto esperávamos por Alex.

Afinal, era para a casa dele que iríamos. 

O vento frio da madrugada começou a me dar uma tremedeira - ou teria sido a bebida? - e me encolhi, percebendo que Ian dormia na grama e Mason digitava com velocidade no próprio celular, feito um louco. Segurei o pingente de bala entre os dedos, mais frio que o ventinho de fora, e me perguntei qual diabos era a do Alex. 

Queria desistir de ir até a sua casa, porque a simples ideia de olhar na cara dele depois do que eu presenciara já me dava náuseas, mas eu não tinha nenhuma desculpa para dar à minha mãe. Suspirei, apenas vendo quando a forma de Alex se materializou, de frente para mim. 

Ergui os olhos, vendo que ele parecia um tanto desnorteado e sério - o que era bem incomum, tratando-se dele -, relanceando os dois, que nem viram sua presença, para depois voltar os olhos enegrecidos para mim.

Eu sabia o que ia acontecer agora, então decidi evitar que acontecesse. 

— Caleb... 

No mesmo instante, dei um soco no Ian ao meu lado. — Acorda, Ian! — chamei, vendo que Mason erguia os olhos do celular, e Ian resmungava. — Alex vai nos levar embora. 

Alex pareceu desconfortável, mas forçou um sorriso, e assentiu quando o primo perguntou se era verdade. 

Sequer pude prestar atenção nos detalhes da casa do Alex, ainda maior que a de Ian, porque meu estômago fazia barulhos estranhos e minha mente estava à mil por hora, o que era desagradável quando se está tonto. A residência estava em construção na parte dos fundos, mas pudemos ver os materiais e as tintas atrás da parede de vidro que dava visão para os fundos, onde se encontrava uma piscina vazia. 

Tudo era muito branco, e quieto, já que os pais do Alex não se encontravam, e um tanto vazio. Subimos as escadas e Alex nos indicou seu quarto, primeira parte da casa inteira que parecia um pouco normal.

Tudo era preto e branco, como o enorme tapete preto que tomava conta de metade do quarto. Haviam pôsteres de bandas e uma coleção de CD's em uma estante só para isto e equipamentos relacionados à música. Arqueei as sobrancelhas, fixando os olhos na figura de Axl Rose na época da juventude, sem camisa e com a famosa bandana nos cabelos lisos. 

Alex pareceu desconfortável com meu olhar estudioso por sobre suas coisas. Talvez ele realmente soubesse o que eu estava pensando a seu respeito agora. 

Dormir em seu quarto, em dois colchões, com Mason entre eu e ele, foi provavelmente o momento mais crítico da minha vida até ali. Mason não demorou um segundo para dormir depois de deitar a cabeça no travesseiro, e Ian também não levou muito tempo para capotar, na cama do Alex - não cabíamos os três em dois colchões se Ian fosse um dos três -, que começou a roncar em menos de cinco minutos. 

Alex tentou conversar novamente, mas eu apenas desviei o assunto, sabendo que nenhum dos outros dois iriam acordar nem se gritássemos. 

— Caleb, por favor — pediu ele, uma última vez, erguendo o rosto para me encarar por sobre a cabeleira loira de Mason. — Eu só queria te pedir... 

— Ninguém vai saber. 

Alex fechou a boca, os olhos brilhando com a luz que provinha da varanda, já que todas as outras estavam apagadas. Engoliu em seco, abrindo a boca uma segunda vez, mas eu o interrompi. 

— Não é meu segredo pra contar — finalizei, pondo um fim na conversa. — E eu não tenho nada a ver com isto. 

Alex afundou a cabeça no travesseiro, com um suspiro, de forma que eu já não o podia ver, com Mason no meio. E, quando eu estava quase relaxando para dormir, ele pronunciou-se mais uma vez.

— Você não se importa? — perguntou, em um sussurro, parecendo curioso. 

Inspirei fundo, virando de barriga para cima, para encarar o teto. Agora podia ver que era cercado de estrelas, da mesma forma que o meu. Sorri por isto, mas logo reprimi o sorriso. Idiota, resmunguei pra mim mesmo. 

Eu me importava mais do que podia pôr em palavras que ele estivesse agarrado com um garoto, ainda mais porque não parecia ser a primeira vez. E nem a última. Mas eu sabia o motivo dele estar perguntando, e o receio por detrás da pergunta. Lembrando de Will, fui o mais sincero do que admitiria a mim mesmo ao responder:

— Nem um pouco. 


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Notas finais do capítulo

Sempre quis fazer isto e consegui: atualizei todas as quatro histórias ao mesmo tempo, em cascata, hihi.

Amem, odeiem, mas me digam o que acharam! *O*
Att: 05/2021.



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