A ideia de troca de corpos não era tão interessante como a ficção fazia parecer, Marinette logo descobriu.

A começar pelo simples ato de andar. Marinette tinha que confessar que passara um bom tempo de sua vida escolar observando Adrien (Adrien, não Chat Noir, a garota dizia a si mesma com irritação e bochechas queimando) e estava familiarizada com o jeito do garoto andar. Mas reproduzir isso... Já não era tão simples. Cada passo conscientemente dado para não deixar transparecer que algo estava errado, e isso exigia mais esforço do que a garota gostaria.

Não só isso, mas ela estava no corpo de Adrien. Adrien Agreste, conhecido como um modelo natural e filho do famoso Gabriel Agreste.

Agir assim era exaustivo.

Principalmente se ela estava em uma sessão de fotos! Francamente... Ela tinha sido Ladybug. Isso não queria dizer que ela devia ser mais sortuda do que a maioria das pessoas? Por que diabos a troca de corpos tinha acontecido naquele dia em particular? Marinette só queria encontrar Adrien, procurar o Mestre Fu, talvez rever Tikki e voltar ao normal. Prioridades.

Mas ao invés disso...

— Adrien, por favor, vire um pouco de lado. Abaixe a cabeça, não, não tanto... Isso — dezenas de instruções. Centenas de fotos. Como Adrien aguentava aquilo tudo? Marinette queria morrer. Ela era o tipo de pessoa que desenhava roupas, não o que posava com elas!

— O que há com essa expressão de quem está entediado? Nos seduza, Adrien. Nós conquiste!

Marinette teve que reprimir um suspiro. Como poderia replicar o sorriso encantador de Adrien Agreste? Um sorriso que, agora com a maior parte de suas memórias de volta, possuía tanto de Chat Noir que era incrível como ela nunca tinha feito a conexão. Um sorriso tão inigualável...

— Adrien, meu querido, essa é a expressão de quem chupou um limão. Quer fazer uma pausa?

Seja Ladybug, seja Ladybug, seja Ladybug.

— Eu só preciso de um pouco de água, perdão — não podia prejudicar Adrien. Marinette sabia o quão rígido Gabriel Agreste era, e colocar Adrien em risco era inaceitável. Seja como Ladybug, seja como Marinette.

O fotógrafo suspirou, parecendo derrotado, mas concordou mesmo assim. Marinette se ergueu, sentindo seus músculos— os músculos de Adrien — protestarem. Mesmo que o corpo dele fosse extremamente resistente, ficar fazendo poses e na mesma posição era infernal.

Ainda assim, sorriu para o fotógrafo e para duas assistentes que estavam ao lado dele.

— Obrigaaa-do...... Obrigado. Não vai levar muito tempo, prometo.

E, tentando não correr, Marinette se dirigiu ao canto onde estava a mochila de Adrien. A garota tinha apenas pego-a torcendo para que os materiais certos já estivessem lá dentro. Remexer a mochila parecia muito com invasão de privacidade... Pelo menos era evitável, ao contrário de suas necessidades biológicas.

Com as bochechas ardendo e tentando não pensar naquela manhã, pegou a garrafinha de água ao lado da mochila. A garrafinha tinha sido pega  no impulso, já que Marinette se lembrava de tê-la visto na mesa de Adrien em várias  aulas, embora não em todas.

Ok. Precisava se recompor.

Tirar Adrien — Chat Noir — de sua cabeça e terminar aquele ensaio. Certo. 

Ela definitivamente não precisava da imagem do ensaio de verão que Adrien tinha feito em-

— Adrien! — uma voz cortou seus pensamentos, para sua felicidade. Uma voz familiar, mas muito estranha. Marinette se virou na direção para se deparar... Consigo mesma balançando os braços entusiasticamente para chamar atenção.

Uau. Quantas pessoas tinham a chance de ver a si mesmas através dos olhos de outras pessoas? Certamente não muitas. Marinette percebeu que era menor do que imaginava ser, e seu rosto era um pouco mais redondo do que o espelho mostrava, e seu sorriso largo parecia quase maníaco-

— Que bom que consegui te encontrar! — sem contar sua voz, que parecia completamente diferente quando não ouvida por seus próprios ouvidos. Marinette- Adrien— praticamente correu em sua direção. — Desculpa, eu não conseguia ficar na aula e estava preocupado com o ensaio — murmurou.

Enquanto isso, Marinette analisava a si mesma, após passar o susto inicial. E quase implorou para que o chão a engolisse, porque é claro que, no meio de tantas roupas, Adrien... Chat tinha que  vestir aquilo. Sim, era inegável que crescer no meio da indústria da moda tinha dado a ele uma noção de estilo, e habilidades extraordinárias. Como a trança escama de peixe que tinha feito, ao invés das tradicionais maria-chiquinhas.

Mas isso não o isentava da culpa de ter vestido a saia preta e a bata verde-bebê com desenhos que claramente eram uma referência a Chat Noir.

— Está tudo bem — Marinette só esperava que não estivesse muito vermelha. — Só é desconfortável, mas estou bem.

Um sorriso malicioso surgiu no rosto de... Marinette. Uau. Era bizarro ver uma expressão tão Chat Noir em seu próprio rosto.

— Pelo menos você já está acostumada a ficar na frente das câmeras, não é... My Lady?

My Lady.

Uma parte de Marinette morreu ali. Aquelas palavras saindo de sua boca! Que absurdo! Claro, ela tinha ouvido antes no telefone, mas pessoalmente era... Bizarro.

Aquele dia estava sendo bizarro, e ainda não era nem hora do almoço!

Pelo menos ela sabia estar se tratando de Chat Noir. Com todos aqueles maneirismos, era Chat Noir. 

Marinette ainda estava se acostumando com a ideia de ter sido Ladybug. Depois de ter acordado com a realização, as memórias das trocas de corpos tinham se esvaído como um sonho que era esquecido no decorrer do dia. Mas Marinette estava bem. Tinha sido Ladybug. Ela e Chat tinham prometido se reencontrar, mas logo perderam as memórias, e se perderam um do outro.

E ao vê-lo ali, ela só conseguia pensar no buraco que tinha sentido por todo aquele tempo em seu peito, que era nada mais nada menos que falta de seu parceiro, de seu melhor amigo.

Imediatamente, o puxou para um abraço, pegando Adrien de surpresa. Era estranho: seu corpo era pequeno demais e parecia frágil entre os braços de Adrien. Mas isso era o de menos.

— Senti sua falta — sussurrou.

Braços passaram ao seu redor.

— Eu também.

Como Marinette pôde se esquecer?

Aquela pergunta estava sendo bastante recorrente. Mágica, talvez. Não importava. O que importava era que estavam juntos de novo, é assim permaneceriam.

— Adrien, a pausa acabou — a voz do fotógrafo foi uma interrupção nem um pouco bem vinda. Marinette se afastou de Adrien lentamente, quase como despertando de um sonho. — Peça para sua namorada lhe esperar, e vamos terminar o ensaio antes do almoço.

E, rápido assim, a magia tinha sido quebrada. Namorada. Marinette se desviou violentamente para o lado e baixou a cabeça, seu instinto forçando-a a evitar contato visual com seu parceiro. Em vão.

— Espera — sua mão ficava pequena na mão de Adrien, notou, o coração falhando uma batida. Ergueu os olhos para tirar a expressão determinada que não deixava de ser familiar. — Meu nome é Adrien Agreste. É um prazer te conhecer, my Lady 

Qual é seu nome?

Um sorriso lhe escapou dos lábios.

— Marinette. Meu nome é Marinette Dupain-Cheng.