Zohar escrita por AnneFanfic


Capítulo 26
Saudade




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/746692/chapter/26

Quando a saudade que eu sentia por minha mãe desapareceu com a chegada dela, a saudade que eu sentia por ele, e que até então estava adormecida, ressurgiu.  

 

 

 

Zohar não saberia dizer ao certo quanto tempo ela ficou ali abraçada à mãe. Sabia dizer apenas que finalmente o medo que sentiu durante todo aquele tempo tinha se dissipado. Sua mãe estava ali agora. Estava a salvo.

Depois que as devidas apresentações foram feitas, Suzan chamou todas para um café, onde puderam conversar um pouco. Aisha sentiu-se extremamente à vontade enquanto conversava com Suzan, como se já a conhecesse há muito tempo. E diante de tudo aquilo Zohar simplesmente não conseguiu parar de sorrir. Sarah, que estava ao seu lado, não parou de pegar no pé dela por isso. Mas também não pode deixar de se emocionar com tudo aquilo.

—E pensar que por minha causa vocês estão juntas novamente.- sussurrou ela para Zohar. —Eu sou demais mesmo, não sou? Pode dizer, pode dizer. Esse é o momento.

Zohar riu com aquilo e passou os braços em volta do pescoço dela, puxando-a para um abraço apertado e já sentindo seus olhos se encherem de lágrimas.

—Obrigada, Sah. Você é a amiga mais louca que eu já tive, mas ainda assim você é demais.

—A melhor?

—Tá’. Você é a melhor.

Sarah riu com aquilo, enquanto se separava de Zohar, e disfarçada e rapidamente passou a mão no rosto para secar uma lagrima que tinha escapado.

 

 

Mais tarde, quando Zohar abriu a porta do quarto após ter tomar banho, encontrou sua mãe deitada na cama que iriam dividir. Por já ser um pouco tarde achou que ia encontra-la dormindo, mas como esse não era o caso ela sorriu de felicidade por poderem conversar mais um pouco.

 —Hm... Que cheirosa...- Aisha abriu o sorriso ao ver a filha entrar, e só quando ela se virou para fechar a porta foi que reparou num detalhe. —Cortasse o cabelo?

O sorriso que Zohar tinha estampado no rosto congelou naquele mesmo momento ao lembrar as circunstâncias daquele episódio. Podia sentir suas bochechas queimarem, como se de repente sua mãe pudesse ler sua mente e estivesse prestes a ver toda a cena de Taehyung cortando seu cabelo. Ela correu até o guarda-roupa para disfarçar o nervosismo e começou a ajeitar as poucas coisas que tinha ali.

—Cortei...- respondeu dando de ombros, esperando que ela não fizesse mais perguntas. —Queria mudar um pouco...

—Ficou bonito.- e aquilo foi tudo.

Zohar suspirou aliviada e relaxou.

—E o tio Raed? Não reclamou por você ter vindo pra cá?- perguntou, e se jogou na cama deitando-se ao lado de Aisha.

Ela abraçou a filha e deu um beijo no topo da cabeça dela antes de responder. Estar com ela novamente parecia tão irreal que precisava tocá-la de tempos em tempos para ter certeza de que não estava sonhando, principalmente quando o nome do seu cunhado soou aos seus ouvidos.

—Não. Quero dizer, não sei...- Aisha riu, e Zohar olhou para ela sem entender. —Eu não avisei que estava vindo.

Zohar se apoiou nos cotovelos e arregalou os olhos.

—Como assim? Você não contou que estava vindo pra cá?!- ela não conseguia esconder a surpresa.

—Pois é, não.- Aisha fez uma careta. —Ele estava insuportável...

—Sempre foi, né?- Zohar complementou, olhando para as próprias unhas e pensando em pedir um esmalte emprestado com Sarah no dia seguinte.

—Sim...  Quero dizer, em partes. Mas depois que...- Aisha deixou a frase morrer e Zohar olhou para ela. Por algum motivo aquele parecia ser um assunto delicado demais, que jamais deveria ser tocado, mas depois de um suspiro Aisha pensou que uma hora ou outra teriam que conversar sobre aquilo. —Depois que você fugiu do casamento ele ficou ainda mais insuportável.

Zohar voltou a olhar para as unhas e balançou a cabeça, como se compreendesse exatamente o que sua mãe queria dizer, mesmo não conseguindo imaginar o que ela teve que aguentar durante todos aqueles dias.

—Eu imagino... Ele deve ter ficado com muita raiva.

—Muita raiva é pouco.- Aisha disse depois alguns segundos. —Ele não quer te ver nem pintada de ouro.

—A raiva já se transformou em ódio então?

—Acho que desde o primeiro momento.

Zohar refletiu sobre aquilo. Era engraçado saber que tinha alguém que a odiava a tal ponto, e saber que esse alguém era seu tio tornava as coisas um pouco mais desagradáveis. Sabia que o sentimento que tinha por ele podia ser tudo, menos ódio. Mas não podia negar que, se dependesse dela, com certeza nunca mais o veria novamente.

—Era a felicidade dele ou a minha, mãe.- ela disse simplesmente, depois de um tempo em silêncio. —Khalil podia ser o que fosse. Podia ser legal, um bom homem...- e nessa parte ela revirou os olhos, pois não entendia o que de bom as pessoas viam nele. —...podia até ter uma vida razoavelmente boa, mas casar com ele não era uma escolha minha

Ambas ficaram em silêncio por um tempo. E então, pegando Zohar totalmente de surpresa, Aisha começou a chorar. Zohar estava tão concentra em seus pensamentos que ao dar-se conta do que estava acontecendo não soube o que fazer.

—O que foi mãe?- Zohar esfregou as costas de Aisha com a mão, na tentativa de acalmá-la. —Eu falei alguma coisa?

Aisha balançou a cabeça negativamente e ao passo que enxugava as lágrimas.

—Só Allah sabe o quanto eu me arrepende por ter forçado você a casar com ele...- e voltou a chorar, deixando Zohar com o coração partido. —Você me pediu tantas vezes para não casar... Eu fui muito estúpida em ter dado ouvidos ao seu tio.

Zohar olhou para ela, que chorava de arrependimento, e colocou os braços em volta dela da melhor forma que conseguiu, já que estavam deitadas na cama. Nem mesmo durante aquela época ela não sentiu raiva da mãe pela insistência em casar. Sabia que ela estava ainda muito debilitada psicologicamente, assim como todos, e realmente achava que casar seria uma espécie de salvação para ela e todos.

—Já passou mãe. Isso não importa mais.

Aisha se sentou na cama e amarrou os cabelos em um coque. Em seguida abraçou a filha e pediu desculpas mais outras vezes.

—Prometo que, aconteça o que acontecer, vou sempre ficar do seu lado.- Aisha deu um beijo na bochecha de Zohar e a abraçou novamente, afagando os cabelos dela.

Minutos mais tarde, quando tudo já estava mais calmo, Zohar deitou a cabeça no colo da mãe e ela começou a brincar com os cabelos da filha. Fazia tanto tempo que não ficavam daquela forma que tinha até esquecido como os cabelos da filha eram macios.

Zohar estava falando sobre o que tinha feito durante aquelas semanas na ONG, as atividades e as colegas, e por um motivo que Aisha não prestou atenção Sarah foi mencionada. Ela não tinha gostado muito do jeito dela, mas sabia que se não fosse por ela não estaria ali. Foi obrigada a dizer à filha o que pensava sobre ela, porém tudo o que ouviu de Zohar foi uma risada.

—Ela é meio estabanada assim mesmo, mas é legal.

—Sim, claro.- Aisha não deu muito crédito. —Mas não confie muito nela. Ela não tem cara de ser confiável.

—Eu também achava isso, mas o tempo faz qualquer pessoa que conheça ela mudar de ideia. Sério, mãe. Ela pode ter todos os defeitos do mundo, mas é uma ótima amiga.

Aisha ponderou sobre aquilo. Amiga. Fazia muito tempo que não ouvia Zohar chamar alguém daquela forma e logo uma mistura de sentimentos e pensamentos confusos começou a tomar conta de si. Zohar tinha sobrevivido às bombas e tiroteios. Tinha escapado de um casamento não consentido e participado de uma fuga não planejada, mas apesar de toda essa vivencia ela era só uma garota de dezessete anos que queria e precisava ter amigas.

—Foi ela que trouxe você pra cá, não foi?- perguntou, sentindo o coração doer por não ter conseguido dar outro rumo à vida da filha desde o inicio, mas antes que Zohar respondesse lembrou-se de outra coisa. —Afinal, Zohar, como foi que toda essa história aconteceu?

Zohar sentiu de repente um frio percorrer todo o corpo, se sentou na cama e olhou para a mãe. Ela estava perguntando, é claro, sobre como tudo tinha acontecido para ter ido parar ali. Sabia que uma hora teria que explicar, mas não pensou que sentiria seu coração quase pular pela boca quando o momento chegasse.

—Ah... Bem...- Zohar desviou os olhos para o lençol. —Na verdade foi tudo muito rápido. Eu estava sentada lá ao lado de Khalil e de repente aquele rapaz apareceu na nossa frente.- ela falou, quase atropelando as palavras.

—Sim, eu lembro disso.- Aisha disse. —Mas eu não conhecia ele. Ele era convidado?- ela fez uma careta engraçada que fez Zohar sorrir. Talvez porque ele e o amigo eram os únicos asiáticos do salão.

—Não sei. Só sei que eu não entendia nada do que ele estava falando. Ele é coreano.- e nesse momento Zohar viu sua mãe arquear as sobrancelhas, estarrecida. —E ele parecia...- ela ponderou as palavras. —Parecia incomodado. Irritado ou com raiva.- deu de ombros. —E naquela hora que você e eu fomos até o corredor...- Zohar fez uma pausa para ver se sua mãe se lembrava da cena. —Quando você voltou para o salão pra pegar não sei o que que você tinha esquecido, ele apareceu na minha frente e perguntou se eu queria... fugir.

Zohar percebeu que sua mãe a estava encarando muito nos olhos, como se tentasse ler seus pensamentos.

—Filha, você fugiu com um estranho!

—Mãe, eu ia casar com um estranho!- Zohar rebateu sem nem mesmo esperar para ponderar o que a mãe tinha dito. —Dava no mesmo.- deu de ombros mais uma vez, voltando a olhar para o lençol.

—Mas e depois?

—Como assim “depois”?- Zohar sentiu o coração dar mais um pulo dentro do peito e não arriscou olhar para ela e deixar transparecer o nervosismo.

Queria deixar de fora a parte que Taehyung veio até a ONG com ela segurando sua mão enquanto dormia, que ele dormiu no sofá do andar de baixo e no dia seguinte cortou seu cabelo e que, como agradecimento, ela deu seu véu preferido para ele e recebeu de volta um abraço apertado. Nesse momento esperou que sua mãe não se lembrasse e nem perguntasse pelo véu que tinha dado de presente e acabou se lembrando também que teria que falar para Suzan não comentar nada sobre Taehyung ter passado tempo demais com ela. Por algum motivo temia o que sua mãe poderia pensar por ter permitido tudo aquilo acontecer. Ela tinha dito minutos antes que acontecesse o que acontecesse estaria do lado dela, mas aquilo provavelmente se referia àquele momento em diante, certo? Não tinha como ela não ficar decepcionada se soubesse de tudo aquilo.

“Céus! Ele passou a mão no meu cabelo! Onde eu estava com a cabeça...?!”¸ Zohar pensou, relembrando tudo aquilo.

—Ora, Zohar!- Aisha chamou a atenção da filha. —Você fugiu com um estranho! Quem era ele? Era algum conhecido de alguém do casamento? Ele não pediu nada em troca por te ajudar?- e o tom de incredulidade na voz de Aisha por achar que seria impossível alguém fazer alguma coisa daquele porte de graça fez Zohar esboçar um sorriso.

E enquanto sua mente relembrava tudo o que tinha acontecido para responder a pergunta da mãe, ela percebeu um aperto no peito que não sentia há semanas. A saudade que sentiu dele nos primeiros dias e que foi se amenizado com o passar do tempo estava ali novamente, à porta do seu coração.

—Tudo que eu sei é que ele fez mais por mim do que qualquer pessoa jamais pensou em fazer.- ela respondeu, e sabia que aquelas palavras iriam cutucar uma ferida no coração de sua mãe. Sabia, tinha certeza daquilo e até se lamentava por provocar aquilo, mas não podia deixar de dizer aquilo. —Eu sei que ele arrumou uma confusão enorme por causa do que fez e até teve que adiar o voo de volta pra Coréia.- e calou-se subitamente ao lembrar que aquilo só tinha acontecido porque ele tinha decidido dormir ali.

Aisha observou cada detalhe do rosto da filha enquanto respondia a sua pergunta.

—Vocês mantém contato?

Zohar olhou dentro dos olhos da mãe por um momento, tentando entender a intenção por trás daquela pergunta.

—Não.- respondeu, esboçando um sorriso enquanto suspirava e tentava controlar a vontade de chorar que subitamente apareceu. Insistentemente as lágrimas começaram a se acumular no canto dos olhos e ela se pegou olhando para os lados ao passo que piscava repetidas vezes, querendo que as lágrimas voltasse para o lugar de onde tinham saído.

Zohar esperou que sua mãe dissesse alguma coisa, qualquer coisa, que a fizesse parar de pensar nele, mas ela ficou em silêncio. Ela então olhou para a mãe e viu que ela a estava observando. Não com um olhar inquisidor ou suspeito, mas com um olhar terno, esperando que Zohar desabafasse. Até porque estava nítido que ela estava incomodada com alguma coisa. Como sua mãe não perceberia isso?

—Dona Suzan deu o número aqui da casa pra ele manter contato, mas ele... nunca ligou.- ela deu de ombros. E ter que ouvir sua própria voz admitindo aquilo fez ela dar um último suspiro antes de deixar que as lágrimas caíssem.

Seria possível que ele não tinha tido nem mesmo a curiosidade de ligar só para saber o que tinha acontecido com ela?

Por mais que ela tentasse não pensar nisso, parecia impossível. Ele tinha sido tão atencioso ao fazer aquilo tudo, por que não tinha ligado nem uma vez sequer? Sabia que não tinha acontecido nada com o avião porque tinha ficado a maior parte dos primeiro dias ali na casa de Suzan assistindo à TV e nada tinha sido noticiado. Sentia-se um tanto chateada ao pensar que ele não ligava porque não queria, e ao pensar nisso sentia muita raiva de si mesma por ficar se importando. Ele tinha salvado sua vida, tinha sido gentil e amável, mas como sua mãe tinha dito ele era apenas um estranho. E ela se sentia uma idiota por ter que admitir que às vezes seu coração ainda sentisse saudade.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Onnn... Calma ZohZoh.. Você não é idiota não. Quem não sentiria saudades? T_T
♥_♥



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Zohar" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.