BTS's Doctor Crush escrita por Cellis


Capítulo 26
O desgastante cheiro de tinta


Notas iniciais do capítulo

OLÁ, QUERIDOS! ~opa, desvia das pedras~ OLHA SÓ QUEM RESOLVEU APARECER POR AQUI DEPOIS DE DUAS SEMANAS DESAPARECIDA!
Perdoem a demora da autora e não desistam de mim. Só nesse meio tempo, eu viajei, tive uma crise alérgica e quase quebrei o cotovelo... só o amor de vocês mesmo pra me manter viva e levemente sã das ideias ♥
Esse capítulo é consideravelmente menor do que o último, mas, na minha humilde opinião, é muito mais pesado/profundo e deve ser lido com um pouco mais de calma. Anymay, espero que gostem mesmo assim!
Desculpe pela pequena Bíblia inicial.

Boa leitura!



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— Como assim "qualquer coisa fica boa em mim"? — indagou Jung Soo, levando as mãos à cintura numa forma de expressar sua revolta. — Você já foi mais prestativa com sua melhor amiga, Kim Sun Hee.

Eu a encarei, erguendo uma sobrancelha e me perguntando mentalmente se ela estava fazendo algum tipo de teste psicológico comigo. Há mais ou menos seis horas (isso mesmo, seis), Jung Soo havia arrancado-me da minha linda e confortável cama com a desculpa de que precisava da minha ajuda para comprar um vestido. Mesmo indignada, eu me dei por vencida e aceitei ir ao shopping com ela — afinal, ela parecia realmente nervosa por causa do encontro que teria naquela noite, com alguém que ela mesma descreveu como "um atleta olímpico importante e lindo de morrer" — e esse foi o meu maior erro. Seis longas horas depois, com dezenas de lojas caríssimas já visitadas e nenhum vestido que realmente lhe agradasse, eu já estava enterrada em uma montanha de tédio e fome.

Eu podia ouvir meu estômago berrar, implorando por um almoço quentinho e delicioso.

— Você sabe que isso foi um elogio, certo? — retruquei, fitando-a. Eu estava sentada em um puff rosa e ela, parada na porta do provador para mostrar-me em seu corpo o vestido preto e justo que acabara de experimentar, encarou-me um tanto confusa. — Eu quis dizer que todos os vestidos ficam bons em você porque você é linda, Jung Soo.

Então, com suas longas madeixas atualmente loiras e sua pele levemente bronzeada, Jung Soo sorriu feito uma criança para mim.

A maldita parecia uma pintura de tão bonita.  

Aigoo... se era isso que você queria dizer, por que não disse logo? — disse, dando uma voltinha sem nenhum motivo aparente e como se a culpa pelo mal entendido fosse realmente minha. — Vamos, me ajude a escolher um vestido dentre esses que estão aqui e depois podemos almoçar.

Ela disse almoçar? Não demorou nem mesmo dois segundos para que eu escolhesse uma peça em meio à pilha de vestidos acumulada no puff ao meu lado, um vinho mais curto de alças largas que, assim como todos os outros, tinha servido perfeitamente em Jung Soo. Finalmente satisfeita, ela deixou que eu escolhesse o restaurante e, de bônus, prometeu que pagaria por toda a comida.

E, por fim, eu estava preenchendo o vazio em meu estômago, mesmo que quase às quatro horas da tarde. Escolhi comida tailandesa, uma das minhas preferidas. Os sabores, as texturas e os temperos exóticos eram tão...

— Há quanto tempo você não vê o Yoongi? — Jung Soo indagou repentinamente, interrompendo de um modo grosseiro os meus delírios culinários.

Eu a fitei, ainda um pouco revoltada e fazendo alguns cálculos mentalmente.

— Alguns dias... quase uma semana, eu acho. — respondi, ocupada demais com meu almoço para fazer contas exatas. — Por quê?

— Por nada. — respondeu, dando de ombros e escolhendo com qual espetinho de carne de porco se atracaria em seguida. — É que eu achei que vocês tivessem se encontrado depois do episódio com os seus pais.

Com a observação de Jung Soo, eu voltei a tornar-me pensativa. Ela estava certa, no fim das contas — nos últimos dias, toda a minha comunicação com Yoongi se restringira a mensagens de texto e curtos telefonemas. Eu não o via desde o jantar com meus pais.

Será que... ele havia se assustado?

Não, Yoongi não era esse tipo de homem. Ele havia sobrevivido àquela noite e, de quebra, ainda se declarado da maneira mais intensa e fofa logo em seguida. Ele me amava e eu já tinha mais do que certeza disso, então não havia motivos para alimentar minhas paranóias viajantes e minhas inseguranças. Respirando fundo, eu resolvi que o melhor que tinha a fazer naquele momento era alimentar apenas o meu estômago e suspirar pesadamente por ter arrumado um namorado tão ocupado e, bem, mundialmente famoso.

Coisas da vida.

Por fim, Jung Soo não me enrolou e realmente pagou toda a conta sem nem pestanejar. Ela parecia verdadeiramente animada com o encontro que teria à noite e, se um dia eu chegasse a conhecer o tal atleta olímpico, o agradeceria apenas por existir. Assim que entramos no carro para voltar para casa, senti meu celular vibrar em meu bolso traseiro.

— Aposto que é o boy. — brincou Jung Soo, enquanto eu alcançava o aparelho e ela travava seu cinto de segurança.

Além de linda, ela também parecia estar se tornando vidente. O nome de Yoongi surgira na tela há poucos segundos (com um coração ao lado, que eu havia salvo junto ao seu contato por ter me tornado uma pessoa extremamente brega depois que começamos a namorar) e havia uma mensagem sua.

Sun Hee-ah, a escritura ficou pronta, mas eu estou preso em um ensaio agora... você pode encontrar a corretora no restaurante?

Bem, aquela não era exatamente a mensagem que eu estava esperando (até porque eu não estava esperando nada, na verdade), mas meu coração quase explodiu ao lê-la. A escritura, o pedaço de papel que continha meu nome e me tornava oficialmente a dona daquele lugar, estava pronta. Não pensei duas vezes ao responder para Yoongi que já estava a caminho e que ele não precisaria se preocupar com nada. Com um sorriso de orelha à orelha, fitei minha melhor amiga, que me encarava sem entender minha felicidade repentina.

— Você pode me dar uma carona até o restaurante? — indaguei.

— Até o seu restaurante? — rebateu, entendendo a minha alegria e sendo contagiada pela mesma. Quando acenei positivamente com a cabeça, ela abriu um sorriso tão bobo quanto o meu. — Mas é claro. Aigoo... finalmente vou conhecer esse lugar!

Assim, tão animada quanto eu, Jung Soo dirigiu por todo o caminho me fazendo diversas perguntas sobre o nosso destino. Estava curiosa para saber onde era, o quão grande era, que reformas eu planejava fazer... enfim, basicamente sobre tudo. Como eu já disse antes, mesmo que não expressasse verbalmente tanto quanto deveria, eu tinha muita sorte em ter Jung Soo em minha vida. Apesar de suas loucuras e de seus conselhos um tanto ruins, ela era uma ótima melhor amiga.

Quando finalmente chegamos ao nosso destino, saltamos do carro como se estivéssemos competindo para ver quem era a mais rápida. Eu acabei por alcançar a entrada primeiro, arrancando-lhe um resmungo ao abrir a porta, e ri da nossa situação. Nós parecíamos duas crianças.

A coisa toda aconteceu logo em seguida. Assim que fechei a porta, ainda fitando minha amiga, eu assisti sua expressão carrancuda transformar-se em olhos arregalados e uma boca aberta em um perfeito O. Como ela parecia ter sido congelada pela Elsa, eu segui seus olhos com os meus para tentar entender o que estava acontecendo, deparando-me com uma cena que eu com certeza não esperava: em meio a latas de tinta espalhadas por todos os cantos e sobre o chão forrado por um enorme plástico azul, os sete integrantes do meu atual grupo favorito encaravam-me, cada um com seu respectivo sorriso.

— Surpresa! — exclamaram, todos ao mesmo tempo.

Se tinha uma coisa que eu estava, essa coisa era surpresa. O que eles todos estavam fazendo ali (incluindo Gae Mae, o qual eu não via há muito tempo e só havia notado a presença agora)? Por que havia tantas latas de tintas espalhadas? Mais importante: por que diabos Jung Soo ainda estava paralisada?

Ok, aquilo era muito para que eu absorvesse corretamente.

— Alguém pode me explicar... isso? — indaguei, olhando ao meu redor.

Eles riram, ao passo que eu me tornava tão paralisada quanto Jung Soo. Yoongi aproximou-se de mim com seu pequeno sorriso, trazendo um grande envelope pardo em mãos.

— Eu gostaria de começar dizendo que eu não menti, está bem? — iniciou, divertido. Ergueu o tal envelope na minha direção. — Aqui está a escritura, ficou pronta hoje. Kim Sun Hee, você é oficialmente a proprietária deste restaurante.

Eu não pude evitar de sorrir. Lentamente, apanhei o envelope de suas mãos e quase abracei o pedaço de papel — mas, ao invés de fazê-lo, voltei a encarar meu namorado.

— E o resto? — perguntei, nitidamente me referindo aos outros sete e à bagunça que os acompanhava.

— Bem, aí a culpa já não é minha. — respondeu, erguendo as mãos como se tivesse sendo rendido pela polícia.

Eu franzi o cenho sem entender e, quando estava prestes a pedir que ele me explicasse, um Taehyung animado e sorridente surgiu por trás de Yoongi, assustando-me.

— A ideia foi minha, noona! — pois bem, agora eu estava preocupada. — Nós vamos participar de um jogo para o V LIVE que envolve, entre outras coisas, pintar paredes. —pausou, apontando para as latas de tintas. — Como a noona já estava planejando reformar o lugar e nós não temos experiência com pintura, achei que seria uma ótima ideia unir o útil ao agradável. 

— E usar o meu restaurante como sala de prática? — emendei, apenas tentando ter certeza de que havia acompanhado seu estranho raciocínio. — Essa era a sua ideia?

Percebendo o meu tom de voz, Taehyung encolheu os ombros. Olhou para trás, buscando algum apoio, mas nada obteve em resposta.

— Bem, colocando desse jeito... — iniciou, mas não se atreveu a terminar a frase.

— Sun Hee. — Gae Mae interveio um pouco acanhado, aproximando-se. Como de costume, parecia nervoso e ansioso, mais ainda assim nitidamente mais calmo do que no dia em que nos conhecemos. —Se você não gostar ou não ficar bom, a empresa pagará profissionais para pintarem novamente.

Opa.

Aquilo era algo a ser considerado. Afinal, de um jeito ou de outro, a pintura do lugar sairia de graça para mim — e com isso eu poderia economizar parte do dinheiro que tinha guardado para a reforma, o que seria algo muito bem vindo naquele momento. Quando você acaba de passar por uma experiência de falência, qualquer economia é bem vinda.

Os meninos me encaravam com certa expectativa, o que tornava a cena meio cômica, na verdade. Respirei fundo e, levando as mãos à cintura, fitei-os de volta.

— O que vocês estão esperando para começar? — indaguei, surpreendendo-os.

A habitual onde de exclamações, palmas e bagunça veio logo a seguir. Ao modo Bangtan, os meninos começaram a escolher suas ferramentas (devo citar que houve um guerra entre os três mais novos para decidir quem ficaria com o maior rolo?) e a atracar-se com as grandes latas de tinta para abri-las.

— Sun Hee-ah. — ouvi a voz de Yoongi me chamando, fazendo com que eu desviasse a atenção da cena que os meninos faziam. Ainda de frente para mim, ele apontou com a cabeça para algo ao meu lado com uma expressão desconfiada no rosto. — Sua amiga está bem?

Ah, de novo não.

Virando-me, me deparei com Jung Soo paralisada, mais uma vez por causa do Bangtan. Coitada, se ela havia congelado apenas com a presença de Yoongi na última vez, imagino como deva estar se sentindo de frente para o grupo todo. Era engraçado vê-la assim porque, por ser tão faladeira, eram raras as vezes nas quais minha amiga simplesmente não conseguia dizer nada. Entrelacei meu braço no seu, não conseguindo evitar uma risada.

— Vai passar. — respondi para Yoongi e, em seguida, comecei a puxar uma Jung Soo de olhos arregalados para fora do restaurante.

Quando fechei a porta atrás de mim, agradeci aos céus pelo fato dos meninos serem tão distraídos ao ponto de nem ao menos notarem a presença surpresa dela. Conhecendo-os como conheço, tenho certeza de que ficariam mudos e vermelhos de vergonha com a presença dela — afinal, nosso relacionamento à parte, eles eram extremamente tímidos quando precisavam lidar com mulheres.

— Eles... — iniciou ela, apontando para dentro do estabelecimento, porém não disse mais nada em seguida.

— Sim, Bangtan Boys. Idols mundialmente famosos e meus chefes também. — completei seu raciocínio, já empurrando-a para dentro do carro. — O dia em que você parar de se transformar em uma estátua de pedra diante deles, prometo que lhe apresento corretamente.

Ela bufou enquanto sentava-se e colocava o cinto de segurança.

Aish... eles são tão lindos. — disse, suspirando.

Não pude conter a risada.

— Dirija com cuidado, Jung Soo-ah. — falei e, antes que ela pudesse dizer mais alguma coisa, bati a porta e a incentivei a dar partida.

Minha melhor amiga com alguns miolos a menos à parte, voltei para dentro do restaurante, que agora mais parecia um ambiente de guerra (sério, se alguém jogasse uns sacos de areia pelo chão, seria uma trincheira perfeita). Os meninos faziam uma algazarra não só com suas próprias vozes, mas com as tintas também. O colorido já estava espalhado por todo lado, inclusive na blusa preta do meu namorado, que tinha uma carranca no rosto e reclamava de alguma coisa com Jungkook.

Eu riria, mas a cena era trágica demais para isso.

Aigoo... espero que a empresa realmente dê um jeito nisso depois. — falei sozinha, já arregaçando minhas mangas e me preparando psicologicamente para me enfiar naquela bagunça.

 

***

 

Alguma coisa — além do frango frito que nós havíamos pedido como lanche, que estava mais do que torrado — não me cheirava bem. Apesar da atmosfera agradável que os meninos sempre conseguiam criar no ambiente ao redor deles, ainda havia algo me incomodando, e a minha intuição raramente falhava. Talvez fosse pelas vezes que eu flagrei Yoongi e Namjoon aos cochichos um com o outro, ou pelo modo que o primeiro constantemente checava algo em seu celular, ou até o fato de que Taehyung e Jungkook surgiam ao meu lado a cada cinco minutos com uma pergunta menos lógica do que a outra... eu não tinha ideia do que era mas, naquele momento, todas as atitudes deles me pareciam suspeitas.

Tudo bem, talvez eu esteja sendo um pouco paranóica. Os meninos pareciam felizes e entretidos demais com as tintas de parede para notarem que estavam pintando até os próprios cabelos, e talvez eu estivesse internamente implicando com o fato de estarem pintando as minhas paredes.

Aigoo... eu nem ao menos podia culpar a TPM, pois a desse mês já havia passado.

— Sun Hee. — eu estava tão perdida em meus próprios pensamentos que nem notei Yoongi sentando-se ao meu lado, até ele chamar meu nome. — Eu preciso falar com você.

Aquela frase causou um pequeno arrepio em minha espinha, não pelas palavras, mas sim pelo tom sério e baixo que ele usava. Um pouco afastados de nós e parecendo completamente alheios a nossa presença, os meninos descansavam jogados pelo chão e conversando entre si. Encarei Yoongi, que me fitava com certa urgência em seus olhos.

— Pode falar. — eu disse, porém não obtive resposta. Yoongi se manteve em silêncio, parecendo estar escolhendo mentalmente as palavras para me contar algo complicado. — Aconteceu alguma coisa?

Aniyo. — emendou, apressadamente. — Não há nada errado, mas é que eu preciso lhe contar sobre...

Não conseguiu completar sua frase, sendo interrompido pelo toque desnecessariamente alto do meu celular. Ele pulou de susto, uma cena um tanto engraçada, e eu fitei o nome na tela do aparelho para decidir se atenderia a chamada ou não.

Kim Sun Young.

Surpresa e curiosa, eu pedi licença a Yoongi e me levantei para atendê-la. O que quer que ele fosse me contar, provavelmente não seria tão impactante quanto um telefonema surpresa da minha irmã. Já um pouco afastada de Yoongi, atendi a chamada no quarto toque.

— Alô. — eu disse, um pouco desconfiada. — Sun Young?

Aniyo, unnie. Sou eu, Yu Jin!

Ela nem precisava dizer seu nome. A voz infantil e animada era inconfundível aos meus ouvidos.

— Sobrinha! — exclamei, feliz por ouvir sua voz. Apesar do meu relacionamento um tanto delicado com minha irmã, Yu Jin era uma criança adorável e uma das minhas maiores paixões. — Como você está, minha querida?

Estou bem, titia. Apesar de estar sofrendo nesse momento...

— Sofrendo? — perguntei, preocupada com sua voz cabisbaixa. — Aconteceu alguma coisa?

Ye, unnie! — exclamou e, naquele momento e por conhecer tão bem aquela pré-adolescente de dez anos, eu não tive um pingo de dúvidas de que ela estava fazendo drama sobre algo banal. — O meu grupo favorito acabou de anunciar que fará uma turnê mundial, unnie. Mundial, sabe? O primeiro e o último shows serão em Seul, mas todos os outros vão ser fora do país. Serão meses, unnie! — pausou, fungando. Eu havia acertado na mosca, por outro lado. — É uma oportunidade de ouro... mas a mamãe não quer me levar!

E era para isso que serviam as tias, no fim das contas. Eu podia visualizar a cena que antecedera aquela ligação: Yu Jin e minha irmã haviam discutido e, por ainda não ter um celular, a mais nova surrupiou o da mãe para poder ligar para a tia legal que faz todas as suas vontades. Aigoo... aquela menina já era tão esperta!

— E eu posso saber onde eu entro nessa história? — indaguei, fingindo-me de desentendida.

Oras, unnie, você mora em Seul... e é a melhor tia desse mundo, claro!

Como eu disse, esperta. Eu não pude evitar de rir.

— Posso saber, ao menos, o nome do grupo que está deixando o coraçãozinho da minha sobrinha tão aflito? — perguntei, já me preparando mentalmente para ter que passar futuras horas e horas da minha noite pesquisando sobre um bando de rapazes da minha idade/mais novos apenas para agradá-la.

Bangtan Boys. — respondeu animada, e eu senti meu enorme sorriso fechar-se lentamente. — Você conhece, unnie?

Mesmo com todo amor que sentia pela minha sobrinha, eu não a respondi. Eu não conseguia responde-la, mesmo com seus insistentes chamados do outro lado da linha. Involuntariamente, meus olhos pousaram em Yoongi, sentado no chão um pouco mais à minha frente, encarando-me com certa preocupação nos olhos, e logo depois no restante dos rapazes.

Aigoo... você não deve conhecer. Façamos assim: eu vou lhe enviar o vídeo que eles postaram agora há pouco, anunciando a turnê, e a unnie promete pensar com carinho no meu pedido, certo? Com bastante carinho. — pausou para que eu respondesse, mas eu não o fiz. — Certo, unnie?

Ye. — murmurei, por fim.

Yu Jin despediu-se animadamente. Eu ouvi algumas vezes o barulho da ligação encerrada, antes do meu cérebro acordar o suficiente para afastar o celular do meu rosto. Uma mensagem fez o aparelho vibrar nas minhas mãos, ao passo que eu sentia que todas as minhas ações estavam sendo realizadas numa velocidade dez vezes mais lenta do que a normal.

Um link de um vídeo, o qual eu precisei de alguns segundos de coragem para acessar, seguido de um "Não esqueça de pensar com carinho, unnie.". Os sete rapazes que estavam ali, tão próximos de mim fisicamente, surgiram sorridentes e bem arrumados na tela de tamanho mediano do meu celular. Sem me importar, eu coloquei o volume beirando ao máximo, e a algazarra que eles faziam ao meu redor foi gradativamente sendo substituída pela a que faziam dentro do aparelho. Pelo silêncio, eu sabia que todos os olhares já estavam em mim, mas eu não me importei e mantive o foco no vídeo que seguia em minhas mãos.

Quando o Namjoon do celular começou a falar, o Yoongi à minha frente levantou-se num pulo.

— Sun Hee, não veja isso. Vamos conversar primeiro e...

Eu não estava ouvindo-o, apenas as vozes em minhas mãos conseguiam penetrar meus ouvidos. Conforme cada um se pronunciava, anunciando países e datas animadamente, os meus pensamentos começaram a se organizar.

Agora tudo fazia sentido. Infelizmente, minhas suspeitas não eram apenas paranóias da minha cabeça: os cochichos, as checadas desesperadas nos celulares e o modo como eles passaram o dia todo tentando me manter ocupada, tudo com o nítido propósito de prender minha atenção e não permitir que eu recebesse aquela notícia.

— Por que? — a pergunta escapou por entre os meus lábios, sem que eu percebesse.

A proximidade com Yoongi me fez desviar a atenção do vídeo, que ainda estava na metade. Eu o fitei e, naqueles olhos que eu jurava serem incapazes de esconder algo de mim, eu finalmente vi a aflição por ter conseguido fazê-lo.

— Sun Hee, me ouça com atenção, está bem? — indagou, num tom de voz que mesclava doçura e desespero. Segurou delicadamente em meus braços, prendendo minha atenção. — Eu estava planejando lhe contar sobre a turnê, mas ainda estava procurando o momento certo. Primeiro você estava tão feliz, depois tão frágil e eu...

— Desde quando vocês já sabiam sobre a turnê? — perguntei um tanto esperançosa, o interrompendo.

Talvez, se ele tivesse descoberto ontem ou...

— Há algumas semanas. — respondeu, jogando um balde de água fria nas minhas esperanças. — Eu queria lhe contar antes, mas eu sabia que ficaria chateada.

Durante alguns segundos, eu pausei aquela cena mentalmente. Yoongi me fitava com olhos tristes e envergonhados, o que tornava tudo mais pesado.

— Chateada? — indaguei, por fim. — Yoongi, você achou que eu ficaria chateada em saber sobre a turnê?

Ele me encarou, confuso. Parecia estar, finalmente, se dando conta de que todo o esforço que ele fizera durante aquelas últimas semanas para me esconder aquela notícia fora inútil e sem sentido.

— Mas você parece chateada. — disse, encolhendo os ombros.

Ele não estava entendendo. Logo Yoongi, quem sempre fora do tipo de pessoa que pegava as coisas rapidamente e raramente precisava que alguém lhe explicasse algo, estava ali, com dificuldade em entender uma situação tão cristalina diante dele.

— Você não entende, não é? — eu perguntei, me amaldiçoando mentalmente por não conseguir controlar minha voz trêmula. — Eu jamais ficaria triste por vocês estarem saindo em turnê, Yoongi. Mesmo que a gente acabe passando alguns meses longe um do outro, eu continuaria feliz por vocês... uma coisa tão grande assim é reflexo do seu sucesso.

Yoongi levou alguns segundos processando minhas palavras, provavelmente já começando a entender onde eu queria chegar. Ele desviou o olhar, respirando fundo.

— Yoongi, você me escondeu isso. — minha voz saiu sem a minha permissão, e continuou. — Durante essas semanas, durante todos esses dias, você teve diversas chances de me contar. Mas, em todas essas chances, você se calou e esperou que eu descobrisse através de outras pessoas.

Aniyo! Eu queria que você soubesse por mim, Sun Hee.

Seu tom de voz transparecia a necessidade que ele sentia que eu entendesse aquilo, que entendesse o seu ponto de vista. E eu entendia, na verdade, mas o problema era que ele ainda não estava entendendo o meu.  

— Você sabe que essa não é a primeira vez que alguém esconde algo de mim. — a afirmação deixou minha boca num fio de voz, como se eu implorasse para que ele entendesse o que eu realmente queria dizer.

Quando sua expressão endureceu e seu corpo enrijeceu, eu soube que ele havia entendido.

— Eu não sou o Yong Joon. — disse, um pouco mais firme.

Aish... aquilo tinha ido longe demais. Eu estava magoada com Yoongi e tinha todo o direito, porque ele havia sim tirado conclusões precipitadas (e erradas) sobre mim e, por isso, me escondido algo tão importante. Por outro lado, eu sabia que as minhas mágoas passadas tinham sua parcela de presença na presente, como se eu estivesse me deixando ser assombrada por fantasmas. Por conta do que acontecera com Yong Joon, eu tinha dito algo um tanto ríspido a Yoongi e agora ele tinha o direito de se chatear naquela situação. Eu sabia que ele jamais seria a sombra que Yong Joon fora na minha vida mas, mesmo assim, eu não conseguia expressar aquilo verbalmente. Havia um bolo denso e angustiante na minha garganta, o que começava a me deixar extremamente nervosa.

 — Não fique com raiva deles, por favor. — a voz neutra de Yoongi puxou-me de volta para a realidade, e eu demorei alguns segundos para entender sobre o que ele estava falando. — Eu prometi que eu mesmo contaria para você, por isso eles não lhe disseram nada.

Só então eu reparei que, sem nenhum motivo, eu encarava os meninos enquanto me perdia em meus pensamentos. Atrás de Yoongi, quase do outro lado do salão, eles silenciosamente mantinham suas cabeças baixas, ao passo que eu sabia que tentavam não prestar atenção na tensa conversa que eu mantinha com Yoongi — mas essa era uma tarefa um pouco difícil. Durante um momento, eu me senti mal por estar os fazendo passar por aquilo.

— Não estou com raiva de ninguém. — eu disse, sincera.

A verdade era que eu estava confusa. Ao mesmo tempo em que me sentia muitíssimo feliz pelos meninos e pelo sucesso deles, eu estava extremamente sensível e insegura naquele momento. Eu não fazia ideia se teria de ir junto com eles ou se ficaria para trás, por quantos meses poderia ficar longe de Yoongi e... eram pensamentos demais para serem organizados no calor do momento. Eu me praguejava mentalmente por não estar parabenizando os rapazes como deveria, ao invés de simplesmente tentava atravessar uma crise interior perante eles, e, fitando as paredes coloridas e extremamente mal pintadas ao meu redor, eu me sentia uma péssima pessoa. Eu queria correr e enfiar minhas próprias mãos dentro de mim, na tentativa de tentar arrancar a inquietude que ali crescia. Aish... se Yoongi tivesse me contado tudo antes...

Não, a culpa não era apenas dele.

— Rapazes, o Sejin ligou e... — Gae Mae iniciou, pausadamente e tomando o cuidado de quem pisava em uma dúzia de ovos ao pronunciar cada palavra. — Nós precisamos ir.

Eu ainda fitava as paredes recém pintadas, e o cheiro forte de tinta começava a me enjoar. Yoongi pigarreou, fitando-me diretamente nos olhos.

— Vá para casa e descanse um pouco. — disse e, mesmo parecendo preocupado comigo por conta da minha reação e aparência deploráveis, ele ainda soava um pouco ressentido. — Nós conversaremos depois.

Eu não o respondi. Não porque não queria, estava me fazendo de difícil ou de raiva, mas por causa da massa agonizante presa em minha garganta que me impedia de dizer qualquer coisa. Os meninos, aos poucos, foram se despedindo com tímidos acenos de cabeça e deixando o local, passando silenciosamente ao meu lado um por um. Na vez de Gae Mae, ele fez uma pequena pausa em seu caminhar e me fitou receoso.

— Nós mandaremos uma equipe para cuidar da pintura. — afirmou, referindo-se à bagunça nas paredes do restaurante, e voltou a percorrer seu caminho.

Por fim, sobramos apenas eu e Yoongi. Eu, que já havia rido tanto por causa dele, que me apaixonava cada dia mais por sua personalidade um tanto peculiar e que já havia molhado suas mãos com minhas lágrimas. Ele, que havia feito de um tudo por mim, que me ajudara a realizar meu maior sonho e que, por conta de um deslize seu, havia sido rigidamente julgado por mim.

Eu que, como um maldito ser humano falho que sou, sentia que estava cometendo um erro enorme ou deixá-lo sair por aquela porta, mas que ao mesmo tempo não conseguia mover sequer um músculo para impedi-lo.

Foram longos os segundos os quais ele passou ao meu lado, nossos ombros quase se tocando. Ele respirou fundo, como se quisesse dizer algo mais mas estivesse muito esgotado para fazê-lo e, por fim, acabou por deixar-me sozinha naquela imensidão colorida — que agora parecia ainda mais escura e sem graça do que antes.

Olhei ao meu redor, silenciosamente, e meus olhos pousaram em uma bancada não muito longe de mim, que era uma espécie de passagem para a cozinha. Sobre a mesma, o envelope que Yoongi me entregara mais cedo. Eu fiquei tão eufórica quando ele o fez, que nem ao menos havia aberto o objeto para espiar lá dentro. Sozinha, quase esmagada pela repentina nuvem de solidão ao meu redor, eu finalmente o abri. A escritura. Folhas e mais folhas que eu havia sonhado minha vida inteira em ler, mas que naquele momento pesavam culposamente em minhas mãos.

Ele havia feito aquilo por mim. Do seu jeito um tanto diferente e único, Yoongi me dera uma das maiores provas de amor que eu poderia receber em toda a minha vida — e, segurando-a em minhas mãos naquele momento, eu molhava sua capa plastificada com as pequenas gotículas de água que saltavam dos meus olhos.

Pelos céus, por que a vida não poderia ser mais como aqueles livros refrescantes e leves de romances? Por que, justo quando estávamos indo tão bem, nós mesmos tínhamos que nos boicotar?

Acompanhada de meus questionamentos inúteis, eu me sentei ali mesmo, no chão coberto por plástico onde estava pisando, e me encostei na bancada. Respirei fundo, e o cheiro forte da tinta invadiu minhas narinas, queimando-as. Era um odor tão incômodo e irritante que poderia facilmente esgotar minhas forças.

Se eu mesma já não estivesse o fazendo.  


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam?
"Mas, Cellis, depois de todo esse tempo você resolveu aparecer só para desgraçar com os nossos psicológicos?"... sim, sinto muito. Amo vocês ♥

Até!



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