BTS's Doctor Crush escrita por Cellis


Capítulo 23
Pelo olhar


Notas iniciais do capítulo

Gente, vocês me fizeram parar minha maratona de Age of Youth só para escrever esse capítulo para vocês. Vocês possuem ciência do tanto de carinho que vocês demonstraram para que isso acontecesse?
Espero que sim.

Boa leitura ♥



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Sentado na pequena escadaria que dava acesso à entrada do prédio, Yong Joon encarava-me como se não me visse há décadas, com direito a olhos arregalados e olheiras profundas. Assim que o táxi atrás de mim partiu, ele se levantou e caminhou receoso até a minha direção, trazendo nas costas uma mochila preta que parecia pesada.

—Podemos conversar? — indagou meu ex namorado ladrão.

Não. Nós, definitivamente, não podíamos conversar. Mas prazer, Kim Sun Hee, nutricionista formada e que se recusa a ouvir a voz da própria consciência na grande maioria as vezes.

— O que você quer? — foi a minha primeira opção de resposta que, diga-se de passagem, não soou nada simpática ao deixar minhas cordas vocais. Ótimo, porque aquela era a minha intenção. — Melhor, o que estava fazendo aqui?

— Esperando para falar com você. — respondeu, neutro. — Depois que você disse que teve de devolver o apartamento, eu imaginei que estaria morando com a Jung Soo. Acho que ainda lhe conheço um pouco, afinal. — completou, desviando os olhos para os próprios sapatos.

— Pelo menos um de nós dois conhece o outro. — sem a mínima piedade na voz eu retruquei, atraindo seu olhar de volta para mim. Eu não queria dar corda para Yong Joon, mas algo dentro de mim simplesmente berrava para que eu demonstrasse a raiva que sentia dele. Dei alguns passos para frente, arrastando minha mala pelo chão cimentado. — Se você quer tanto conversar, deveria tentar ir até a delegacia. Tenho certeza de que os policiais vão lhe ouvir.

E então, eu simplesmente contornei sua figura alta e nitidamente cansada, o ignorando. Quando comecei a subir os poucos degraus da entrada do prédio, fui interrompida por seu alto suspiro.

— Eu estou aqui tentando consertar a burrada que fiz, Sun Hee. — ele disse, me fazendo parar com o pé direito suspenso entre um degrau e outro. Apesar de estar de costas para ele, eu sabia que ele não havia saído do lugar que estava. — Por favor, me escute.

Respirei fundo, ainda de costas. Eu não deveria, mas algo dentro de mim agora me dizia que eu poderia.

Aish, por que eu sempre tinha que seguir minha maldita intuição?

— Venha comigo. — disse, sem me virar. Voltei a caminhar sem realmente me importar se ele estava me seguindo, mas, de repente, parei novamente. Virei para trás, constatando que ele não estava muitos passos atrás de mim. — Se você desperdiçar meu tempo, eu juro que ligarei para a polícia.

Em silêncio, ele concordou com um breve aceno de cabeça. Parecia chateado, na verdade, mas eu não o conhecia bem o suficiente para poder afirmar. Afinal, nunca se conhece realmente alguém que trai sua confiança tão descaradamente quanto ele. Yong Joon fez todo o trajeto até o elevador e depois até o apartamento de Jung Soo olhando para o chão, e eu não o fitei sequer uma vez.

Eu não tinha e menor vontade de olhar para a cara dele.

A porta do apartamento estava trancada, o que significava que minha amiga não estava em casa — o que era bom, porque eu não tinha ideia do que Jung Soo seria capaz se encontrasse Yong Joon, ainda mais dentro de sua própria casa. Adentrei e deixei a porta atrás de mim aberta, escutando a mesma sendo fechada logo em seguida. Tirei meus sapatos e, enquanto ele o fazia, não pude evitar de dizer algo que estava coçando em minha garganta para ser dito.

— Tente não roubar nada, por favor. — disse, séria, e não obtive resposta.

Deixei minha mala em um canto da sala e, de escanteio, vi Yong Joon fitar o objeto.

— Você estava viajando? — perguntou, mas eu simplesmente me recusei a respondê-lo. Afinal, eu já estava fazendo muito em deixar que ele subisse. Ele parecia já esperar a minha reação, por isso, continuou mesmo sem resposta. — Eu estive aqui todos os dias da última semana, esperando de longe que você aparecesse. Cheguei a pensar que meu palpite de que você estaria aqui estava errado.

Eu não pude deixar de soltar uma risada descrente, um tanto amarga.

— Acho que poderia denunciá-lo por coação também. — respondi.

Eu simplesmente detestava agir dessa forma, como se fosse a pessoa mais infeliz e rude do universo. Não gostava quando as pessoas eram grosseiras comigo, por isso, sempre evitei fazê-lo também. Mas a simples presença de Yong Joon provocava aquela reação perversa em mim.

— Não é como se eu pudesse reclamar por causa do modo como você me trata. — disse, praticamente sussurrando, como se estivesse lendo a minha mente. Parecia estar falando consigo mesmo. — Mas espero que eu não tenha a feito perder sua essência doce e espirituosa que sempre teve.

Dessa vez, eu me mantive quieta por não saber o que responder. Apesar dos pesares, Yong Joon sempre fora uma boa pessoa para mim. Não creio que nós chegamos a amar um ao outro, mas éramos felizes juntos. Ele me fazia rir, cuidava de mim e me protegia com um abraço. Claro, houveram também as vezes que ele simplesmente sumia durante um dia inteiro sem dizer nada, mas eu sempre achei que era por causa do trabalho e nunca me importei muito com isso. Parando para refletir com mais atenção, nós éramos mais amigos coloridos do que namorados de verdade.

Mas até mesmo amigos não fazem com o outro o que ele fez.

Fitei-o, com sua calça jeans surrada, o moletom azul escuro e o cabelo preto por cortar quase cobrindo seus olhos. Sentado no sofá de frente para o qual eu estava e fitando-me com um olhar levemente perdido, ele realmente parecia cansado. A figura abatida fez baixar um pouco da minha guarda, mas isso não significava que eu estava disposta a dar as mãos para ele e sair cantarolando pelas ruas.

— Então, o que você queria me dizer? — perguntei, mais calma.

Endireitou-se no sofá e, em seguida, iniciou.

— Eu tenho problemas com jogo. Na verdade, sou um jogador compulsivo. — disse, pegando-me de surpresa. — Eu sempre fui sortudo e, quando comecei a jogar e a ganhar, entrei por um caminho sem volta. Mas acontece que a sorte de ninguém dura para sempre. — pausou, desviando o olhar para o tapete e dando uma risada amargurada. Em silêncio, eu esperei que ele continuasse. — Eu comecei a me afundar em dívidas logo depois que nós nos conhecemos.

Eu estava, literalmente, sem reação, ainda mais porque ele com certeza estava sendo sincero naquele momento. É claro que a culpa de nada daquilo era minha, mas pensar que eu fiquei tanto tempo ao lado de Yong Joon sem notar pelo o que ele estava passando mexeu comigo sim, seria hipócrita se negasse.

— Por que você nunca me disse nada? — indaguei.

— Bem, não é exatamente algo que me encha de orgulho. — respondeu, dando de ombros e com um sorriso sem graça no rosto. — Eu não podia dizer para a mulher que eu gostava que estava simplesmente fracassando na vida.

— Então, você achou melhor simplesmente roubar tudo que tinha dentro do meu apartamento?

Eu havia soado rude novamente, mas não me importava. Eu precisava entender aquela história, que era um capítulo confuso e mal acabado do meu livro da vida.

— Eu perdi a cabeça. — respondeu. — Eu já tinha vendido as minhas coisas e estava prestes a ser despejado, então não sabia mais de onde tirar dinheiro. Tudo piorou quando eles ameaçaram machucar as pessoas com quem eu me importava... — franzi o cenho. Yong Joon não tinha família, pelo menos até onde eu sabia. — Eles ameaçaram machucar você, Sun Hee.

Gelei. Vendo a minha reação, Yong Joon colocou-se de joelhos no chão e se curvou, provavelmente evitando meu olhar assustado.

— Perdão, Sun Hee. Eu jamais tive a intenção de colocá-la em perigo. — disse, praticamente implorando e com a voz um tanto pesada. Ergueu a cabeça e, não muito distante de mim, fitou-me com seus olhos exaustos. — Mas ninguém irá incomodá-la, eu prometo. Eu paguei o que devia.

Eu o encarei, em silêncio. Eram muitas as informações para que processasse em tão pouco tempo. Eu me sentia confusa, sem saber muito bem como reagir. Foi quando, de repente, uma dúvida surgiu na minha mente.

— Como você... — pausei, sem realmente saber o motivo. — Pagou?

Ele me encarou, provavelmente surpreso com a pergunta — afinal, eu poderia ter gritado, chorado com medo ou avançado para cima dele, mas não escolhi nenhuma das alternativas. Voltou a sentar-se no sofá.

— Quando nos encontramos da última vez, eu tinha acabado de dar o meu carro como pagamento. Algo que deveria ter feito há muito tempo, mas fui idiota e teimoso demais para fazê-lo. — mais uma risada pesada. — Tive que ralar depois para cobrir o prejuízo que eles levaram quando você o quebrou quase todo, mas consegui quitar a dívida. Está tudo bem agora.

Levantei-me de supetão, assustando a ele e até mesmo a mim. A realidade estava começando a me atingir.

— Está tudo bem agora, Yong Joon. — disse, começando a caminhar sem rumo pela sala. — Mas e quando você voltar a jogar? E quando perder? Você não pensou no que eles pode fazer?!

— É por isso que estou indo embora. — interrompendo a minha pequena crise nervosa, ele disse, sem se levantar.

O fitei, ainda mais confusa.

— O que?

— Eu tenho um amigo que está prestes a abrir um negócio na China, e ele disse que está disposto a me ajudar com um emprego. — respondeu, calmamente. — Eu vou fazer de tudo para fazer valer a pena a chance que estou tendo, mas, se mesmo assim eu tiver uma recaída e voltar a jogar, será a milhares de quilômetros de distância de você. Por isso, não precisa se preocupar. Você está segura.

Naquele momento, eu não pude evitar de me sentir um pouco mais aliviada e, ao mesmo tempo, com pena. Ele estava sentado na ponta do sofá e, na outra, eu me sentei. Havia a distância de uma almofada nos separando e ambos fitávamos o chão.

— Você acha que vai conseguir resolver seu problema assim? — indaguei, quase murmurando.

— Não sei, na verdade. Mas pelo menos estou tentando. — respondeu. — E é por isso que eu vim procurá-la, Sun Hee. Tenho certeza que pelo menos uma parte do problema eu posso resolver.

Sem entender, eu me virei na sua direção em um reflexo. Yong Joon pegava do chão a mochila preta que trouxera consigo, sem dizer nada. A colocou em seu colo, suspirou e, em seguida, pôs o objeto no espaço vazio entre nós, empurrando-o na minha direção.

— O que é isso? — indaguei, inquieta.

Ele me encarou, fixamente.

— Tudo que eu lhe roubei. — disse, me surpreendendo. — A quantia em dinheiro e mais o que valiam os seus móveis. Inclusive o fogão industrial que você tanto gostava.

Lentamente, eu desviei o olhar para a mochila ao meu lado. Puxei-a para um pouco mais perto, procurando pelo zíper. Quando o encontrei, seu barulho sendo aberto tornou-se o único ruído presente naquela sala, ao passo que Yong Joon mantinha os olhos atentos às minhas ações.

Estava tudo ali. Ou, pelo menos, a enorme quantidade de maços de dinheiro dava a impressão de que estivesse.

— De onde você tirou esse dinheiro? — a pergunta fora automática. Ainda boquiaberta, eu não podia deixar de duvidar por quais meios Yong Joon tinha conseguido tal quantia.

— O amigo do qual eu falei me emprestou. Um dos motivos para eu estar indo trabalhar para ele é para poder pagá-lo de volta. — respondeu. — Não se preocupe, é dinheiro limpo.

Mesmo que ele não tivesse o direito para tal coisa, não parecia ofendido pela minha pergunta. Pelo contrário, eu pude sentir em sua voz um necessidade de se explicar.

— Eu sinto muito por tudo que lhe fiz, Sun Hee. — disse, repentinamente. — Espero que tenha uma boa vida.

Quando me dei conta, Yong Joon já estava de pé e caminhando na direção da porta, sem me dar muita opção do que dizer. De repente, parou, de costas para mim.

— Mesmo que eu não tenha esse direito, posso lhe fazer uma pergunta? — perguntou, virando-se para mim. Com um aceno de cabeça, eu lhe dei permissão. — Naquele dia em que nos encontramos e você... bem, naquele dia. — tudo bem, eu também não tinha muito orgulho de ter quebrado seu carro praticamente todo. — Você estava acompanhada. Aquele cara de cabelos azuis... ele é uma boa pessoa?

A pergunta sobre Yoongi me pegou de surpresa. Estava tão envolta pelo momento que nem percebi que já estava abrindo a boca para lhe responder.

Ye. Ele é uma boa pessoa.

Yong Joon desviou o olhar e um pequeno sorriso apareceu em seus lábios. Parecia triste, porém sincero.

— Isso é bom. — disse, balançando a cabeça. — Você merece alguém assim.

O encarei, intrigada.

— Como você sabia que...

— Pelo olhar. — interrompeu-me, já adivinhando qual seria a minha pergunta. — Quando se aproximou de você, ele lhe fitava de um jeito que eu conheço bem. Já tive aquele olhar, por isso sei o que significa.

E então, deixando-me com aquelas palavras, Yong Joon voltou a caminhar na direção da porta.

— Yong Joon. — chamei-o, me levantando. Ele me fitou por cima do próprio ombro, e eu não dei nenhum passo para frente. Respirei fundo, sentindo a necessidade de dizer aquilo. — Boa sorte.

Por fim, existiam os mocinhos, os vilões e a grande maioria que perambulava entre as duas categorias. Yong Joon havia se perdido entre os três caminhos, mas, mesmo assim, eu ainda esperava que ele se reencontrasse.

— Para você também, Sun Hee.

E assim, finalmente, eu pude finalizar aquele capítulo da minha vida.

 

***

 

Alguns poucos dias haviam se passado desde o dia em que voltei do Japão, recebi a visita inesperada e cheia de surpresas de Yong Joon e, de bônus, passei a ter mais dinheiro do que esperava juntar pelos próximos dois anos. Não preciso dizer que foram muitas informações para Jung Soo processar. Depois de surtar por esses motivos (além dos acontecimentos no Japão, sobre os quais eu também contara), ela praticamente me arrastou até o banco. Mesmo que levemente revoltada por eu ter aceitado conversar com Yong Joon e ainda ter sentido pena dele, ela me obrigou a depositar todo o dinheiro em minha conta.

"Mesmo que tenha vindo daquele idiota, esse dinheiro ainda é seu." foi o que ela disse, com seu tom de voz autoritário.

Nesse momento, eu me encontrava sentada em minha cama, encarando a mochila vazia de Yong Joon deixada por mim no centro do meu quarto. Eu deveria jogá-la fora, certo?

Quando finalmente me levantei para fazê-lo, fui interrompida pelo toque do meu celular. Sobre a cama, o nome de Yoongi piscava na tela do mesmo, o que produziu um largo sorriso em meu rosto. Apressando-me mais do que o necessário, eu atendi no segundo toque.

Ye, oppa.

Sim, eu estava sendo melosa. Algum problema?

Aigoo... nunca pare de atender as minhas chamadas assim. — foi a primeira coisa que disse, arrancando-me uma risada. — Você está ocupada?

Aniyo. Estou em casa. — respondi. — Por que?

Eu queria lhe mostrar um lugar. Mas não me pergunte o que é, porque pretendo fazer suspense.

Aish... — bufei, perguntando-me porque ele gostava tanto de me torturar fazendo-me esperar para descobrir as coisas. Mas droga, eu tinha que ser tão curiosa? — Tudo bem, me mande o endereço.

Ye. — disse, claramente animado. — Vejo você lá.

Nos despedimos e, em seguida, não demorou muito para que a mensagem de Yoongi chegasse. Estranhei o endereço quando o vi. O que diabos Yoongi pretendia me mostrar na mesma rua que o dormitório deles?  Curiosa, eu decidi que tomaria um banho antes de trocar de roupa e, enquanto o fazia, tentaria pensar no modo mais sutil de como contar para Yoongi sobre Yong Joon.

Cheguei à conclusão de que não havia um jeito mais delicado, afinal, e também estava fora de cogitação não dizer nada. Eu contaria, e a partir daí seria problema do destino. Fitei meu macacão jeans no espelho, que cobria minhas pernas até mais ou menos um palmo abaixo dos meus joelhos, e o tênis tão branco quanto a blusa que eu usava por debaixo da peça jeans. Se Yoongi me desse dicas sobre o que planejava fazer, eu poderia ao menos ter certeza de que estava vestida adequadamente para a ocasião — mas ele não dava, então, passaria vergonha ao meu lado se eu não estivesse, o que me deixaria um tanto feliz também.

O táxi não demorou para chegar. Agora eu tinha dinheiro para andar tranquilamente de táxi. Pelos céus, eu me sentia a mais nova milionária de Seul.

Tudo bem, alerta de exagero.

O local o qual Yoongi me mandara a localização era, na verdade, uma fachada de vidro coberta por algum adesivo preto, que não me permitia enxergar lá dentro nem mesmo se eu colasse o rosto contra o vidro. Criando coragem e me perguntando mentalmente o que diabos ele estava aprontando, eu segurei firme na maçaneta redonda de madeira e empurrei a porta, deparando-me com um espaço enorme, porém, vazio.

Ah, você chegou! — a voz de Yoongi ecoou alta e animada pelo salão. Fechando uma porta de alumínio atrás de si do lado oposto ao que eu estava, ele caminhou pelo lugar vazio até me alcançar.

Ele usava jeans rasgados e uma camisa preta de manga curta, e até mesmo a roupa simples conseguia deixá-lo ainda mais lindo. Mas eu estava determinada a manter o meu foco para descobrir o que ele havia preparado, por isso, prestar atenção em sua beleza estava fora de cogitação naquele momento.

Mas ele tinha mesmo que me cumprimentar com um abraço? Aish... o perfume dele era tão bom.

— O que é isso? — perguntei desconfiada, quando nos separamos.

— No dia em que nós chegamos do Japão, eu vi de dentro da van uma placa de vende-se ali fora. Aqui costumava ser um restaurante, muito bom por sinal. — respondeu, concordando com sua própria opinião ao balançar a cabeça. — Quando liguei para pedir informações sobre o lugar, a corretora disse que o proprietário está passando o ponto porque pretende voltar para Busan.

Eu o encarei, sorrindo ao finalmente entender o que estava acontecendo.

— Você marcou um horário para que eu visse o lugar? — perguntei, apenas para confirmar minha teoria.

Ye. Eu achei que você fosse gostar daqui e, de bônus, hoje é meu dia de folga. — respondeu, falsamente dando de ombros.

Eu sabia que ele estava tentando fingir que nada daquilo era um grande feito, quando, na verdade, provavelmente havia planejado cada detalhe há uns dois dias atrás. Sorri, chegando à conclusão de que seria perda de tempo dizer em voz alta tais palavras apenas para provar que eu estava certa.

Ao invés disso, eu resolvi aproveitar a maravilhosa surpresa.

— Você não existe, Min Yoongi. — murmurei, fitando-o diretamente nos olhos.

Ele abriu seu pequeno sorriso.

Aigoo... se não existisse, quem estaria lhe mostrando esse lugar agora? — indagou, brincando. Enlaçou meu braço no dele logo em seguida, pronto para me conduzir. — Vamos, ainda tem muita coisa para você ver.

E tinha mesmo. Na cozinha, a corretora nos esperava pronta para nos mostrar cada detalhe daquele lugar. Uma moça alta, loira e simpática, que me mostrou vantagens as quais eu simplesmente adorei. A cozinha era enorme, quase maior do que o próprio salão para os clientes, assim como a dispensa e a aconchegante área para os funcionários nos fundos. Havia também uma sala para o gerente e uma vinícola, ambos com paredes bem decoradas e bem iluminados. Ou seja, o lugar era perfeito. Bem, talvez não fosse exatamente perfeito, considerando as pequenas reformas que precisariam ser feitas, mas com certeza era o lugar que eu sonhava em ter e gerir desde que era criança.

Quando a corretora nos disse que nos daria um pouco de privacidade e nos deixou sozinhos na cozinha, Yoongi me olhou feito uma criança. De frente para mim, seus olhos estavam inquietos e animados ao mesmo tempo.

Aquilo, senhoras e senhores, era um bebê de vinte e quatro anos.

— E então? —  indagou, a poucos passos de onde eu estava. — Gostou?

O fitei, encostando minha cintura na pia para me apoiar.

— Se gostei? — devolvi, fazendo com que ele enrugasse a testa. — Eu amei. É o lugar que eu sempre quis ter.

E então, ele abriu um sorriso duas vezes mais largo do que o normal e , em seguida, respirou fundo. Na verdade, Yoongi estava começando a me parecer mais ansioso e animado do que deveria.

Mais um vez, ele estava aprontando alguma coisa.

Eu fiquei um bom tempo o encarando e tentando decifrá-lo, até que algo surgisse em minha mente. E, depois de muito pensar, algo realmente surgiu.

Oppa. — chamei-o. O mesmo estava olhando algo sobre o balcão e, quando ouviu minha voz, levou seu olhar na minha direção no mesmo momento. — Você disse que viu uma placa de vende-se lá fora, não foi? — indaguei, e ele concordou com a cabeça. — Mas não tem placa nenhuma lá fora.

Nesse momento, ele engoliu uma quantidade exagerada de ar, o que significava que eu estava no caminho certo. Quando coçou a nuca e olhou para baixo, eu tive a certeza de que estava.

— Bem, isso... — iniciou, pausando. Em seguida, voltou a me fitar, parecendo estar escolhendo as palavras mais delicadas para me dizer algo. — A placa foi retirada porque o lugar foi vendido.

Aquilo era o mais delicado que ele conseguia? Naquele momento, eu murchei como um alface que fora temperado há horas atrás.

Péssima analogia, mas pelo menos traduz como eu me senti depois de descobrir que o lugar dos meus sonhos não poderia ser meu, mesmo que eu pudesse finalmente pagar pelo mesmo.

— Vendido? — indaguei, confusa. — Mas então, por que a corretora nos mostrou o lugar?

Yoongi pigarreou, se aproximando. Disse alguma coisa, mas foi baixo demais para que eu ouvisse e tive que pedir para que ele repetisse.

— Porque... foi eu que comprei. — sussurrou.

Eu o encarei, nitidamente boquiaberta. Do jeito que a minha vida estava caminhando, eu provavelmente precisaria buscar alguns sinônimos da palavra surpresa na internet.

— O que? — perguntei, depois de algum tempo em silêncio, vulgo em choque.

Aish... eu sei que não deveria ter feito isso. — respondeu, num tom culpado. — Tinha uma pessoa muito interessada em fechar negócio, mas eu realmente achei que você gostaria desse lugar... por isso, eu corri na frente e comprei primeiro. Sei que foi uma decisão precipitada, mas eu realmente queria que você visse primeiro, sabe?

Eu, francamente, gostaria que meu cérebro fosse mais rápido em decidir qual seria a reação apropriada para aquela situação. Mas a única vontade que eu tinha era de ter uma crise de risos e sair pulando pelo salão vazio.

— Yoongi. — ele me fitou, nitidamente preocupado com o que eu estava pensando. — Mas o que você faria se eu não gostasse?

Tudo bem, não era exatamente o que eu deveria dizer naquele momento, mas a curiosidade era maior do que eu.

— Não sei. — respondeu. Ele nitidamente não tinha pensado muito naquilo. — Colocaria para vender de novo?

E então, eu simplesmente não resisti. Rindo, eu quebrei a pouca distância entre nós e o abracei, envolvendo seu pescoço com ambos os meus braços e precisando me esticar um pouco para fazê-lo. Ele se assustou um pouco com a minha reação, mas logo em seguida devolveu o abraço ao envolver minha cintura com seus braços num aperto daqueles que você deseja que nunca termine.

— Isso quer dizer que você não está chateada pelo o que eu fiz? — perguntou, ao pé do meu ouvido.

— Yoongi. — eu disse seu nome, apenas pelo prazer de dizê-lo. — Eu te amo.

E assim, nós éramos o casal que fazia e dizia as coisas primeiro, para depois pensar.

Até eu mesma me assustei com o que havia acabado de dizer, então, quando senti seu coração acelerar num nível extraordinário contra o meu peito, eu não me espantei. A verdade era que, mesmo que eu ainda não tivesse plena consciência disso até aquele momento, eu realmente o amava, e o que disse havia saído do meu coração — mesmo que isso fosse extremamente clichê.

E então, ele lentamente nos separou. Segurou meu rosto com ambas as suas mãos, fitando-me intensamente.

— Isso é sério? — indagou, nitidamente em choque. — Você não está sendo influenciada pelas emoções do momento ou...

— Eu amo você. — o interrompi, sorrindo largamente. —  E a única influência sobre os meus sentimentos, é você.

Ele ficou alguns segundos fitando cada pequena parte do meu rosto, em silêncio. Foi quando, de repente, as palavras de Yong Joon ressoaram em minha mente.

Pelo olhar.

O olhar de Yoongi dizia tudo o que eu precisava saber, mesmo que ele ainda estivesse procurando as palavras ideais para expressar-se em voz alta.

E então, ele aproximou seu rosto do meu e colou nossos lábios delicadamente. Fora apenas um selinho, mas sem dúvidas o melhor de todos. Quando se afastou, ele parou a poucos centímetros do meu rosto e, em seguida, fitando-me com um intensidade que eu jamais havia visto, abriu seu pequeno sorriso.

— Eu te amo, Sun Hee.

E então, no seu olhar, eu vi sinceridade.


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Estou ansiosa pelas opiniões de vocês!

Até ♥