A verdade sobre Eles escrita por Jhulliaty


Capítulo 3
Capítulo 2 - Chuva de vento


Notas iniciais do capítulo

Quem era ele então?



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 — Ubirat’sya — Aquela palavra, que voou pelo céu, proferida pelo Anjo, criou um silêncio desconfortante junto do barulho dos passos vindos das pessoas.

Erdia não havia entendido tal palavra, outra língua, outra cultura, tanto que supôs que era Russo, já que todos se moviam, abrindo o caminho.

A voz que havia saído... grossa, alta, como se fosse capaz de destruir mundos com apenas uma ordem, saía da Anjo.

Era uma ordem de “seu Deus”, e os humanos haviam obedecido, abriram caminho, se movendo cada um para um lado, uma linha reta para fora da multidão.

Kalaziel, o Anjo que Protegia os demônios da doença, o ser sagrado que descera para salvar a todos, para retirar nossos pecados, para limpar nossos corpos.

Todos se abaixavam em reverência, enquanto os passos daquela Anjo ecoavam, juntamente com o som de pano da roupa da garota que agora estava em seu colo, pega sem permissão.

— Saiam — a Anjo havia se pronunciado, calmamente e meio baixo, mas havia. Erdia olhou para o que seria o rosto daquele ser e inclinou a cabeça sem entender — Foi o que falei, Erdia, mandei saírem da frente.

— Podia ao menos ter pedido “por favor” para eles — ela deu uma pausa e virou o rosto— E ter pedido antes de me carregar — parecia bem emburrada com aquilo, mas acima de tudo, estava vermelha. — E antes de me beijar também...

— Perdão, mas não havia forças para eu sequer me movimentar mais — quando acabou a linha das pessoas, a Anjo parou, perdida, olhando para ambos os lados — Onde deixou suas coisas?

— Como sabe das minhas coisas? Aliás, pensei que soubesse de tudo, do jeito que tem falado... — Kalaziel olhou para aquela nos seus braços, seus olhos eram cruéis— Ok ok, — Erdia suspirou, se rendendo e apontando para o local —, atrás da árvore.

A Anjo se moveu pesadamente até o local, os passos firmes faziam parecer que o chão ia afundar, por um segundo, Erdia ficou com medo, mas...

— Hey, Anjo — Erdia esperava uma multidão ao redor delas, esperava humanos gritando em pânico, esperava muita coisa, menos.... Quando a garota virou a cabeça para as pessoas, nenhuma delas havia se movido um centímetro —, você por acaso usou algo neles para não se moverem?

Assim que Kalaziel segurou a alça da bolsa, ela soltou um sorriso.

Filha de uma mãe.

— Eles vão nos atrapalhar.

— Eles estão com medo de você! Vão atrapalhar como? Tirando fotos suas, só se for.

A Anjo se endireitou, e novamente aquele olhar de superioridade com crueldade atingiu a garota, que encheu as bochechas e ficou brava.

— Certo — espera, aquele ser havia se rendido mesmo? — Perdão, somente não quero que isso nos atrase, meu tempo é curto, e possuo muita coisa que pretendo fazer em minha estadia aqui.

Era mesmo um Anjo então, ou algum ser de outro planeta que estava ali para um passeio.

Ou só uma louca.

Entretanto, mesmo com todos esses pensamentos não conseguiu deixar de sorrir enquanto era carregada, depois de tanto frio que habitava o corpo daquele ser, a mão que a segurava, como se fosse um bebê, estava quente e acolhedora, mas parecia mais a mão de um Pai, do que a de uma Mãe.

— Anjo — sua fala fora cortada.

— Kalaziel — a Anjo se virou, colocou a bolsa no ombro esquerdo e voltou a andar no mesmo instante que todos os humanos relaxaram, alguns caíram, outros somente se endireitaram, a visão limitada não permitia Erdia checar por completo — Existem muitos Anjos por aí, acima, porém, nunca vi outro Alado chamado “ Kalaziel”, prefiro que me chame assim.

— Então... — Não havia muito que Erdia pudesse fazer nos braços de um Anjo — Você vai me soltar? Eu posso andar.

— Algo como o que vocês chamam de... — A Anjo parou de falar um segundo, pensando, os humanos que passavam pelas ruas naquele dia cinza a olhavam  — pressentimento, acredito eu, me diz que assim que lhe colocar no chão, você irá fugir.

— Isso não!... — A garota se encolheu — Certo, eu iria mesmo, mas não sou a culpada disso, não é todo dia que um Anjo desce do céu, te beija e te pega no colo... — Suas palavras saíram quase sussurradas — Não é todo dia que me tocam...

A An- Kalaziel somente continuava a andar, como se soubesse exatamente para onde iria, como se estivesse lá por muito tempo.

Mas a própria Erdia não fazia ideia de onde estavam.

— Para onde vamos? — a garota queria andar, odiava ficar dependendo dos outros, e não estava acostumada com alguém a tocando.

— Um hotel, já lhe disse antes, preciso de sua cooperação, e preciso lhe explicar as coisas.

Erdia olhou ao redor, seus olhos vagavam naqueles prédios cobertos por frio e embaçados pelo vapor, era a parte rica da cidade, afinal, não importava para onde ela fosse, sempre existiria isso: A parte rica e a pobre.

— Posso não saber como é a Rússia, An... Kalaziel, mas sei que aqui não é onde eu deveria me hospedar.

A Anjo abaixou a cabeça um pouco, algo como “ Por quê? ” podia ser traduzido pelo seu olhar.

Por que era tão fácil entende-la?

— Eu não sou rica, nem dinheiro tenho direito, eu... não tenho o que fazer aqui, Kalaziel, eu só vim para cá porque ganhei uma bolsa, minha viagem foi paga pela escola e...

Ela foi cortada.

— Entendo. Erdia, eu irei pagar esse hotel, você não tinha local para ficar, então iria direto para a escola, estou certa? Só prometa que irá me ouvir.

“Certa”? Anjos possuem sexo? Mesmo que parecesse uma mulher, ela não achou que fosse uma.

Erdia engoliu em seco e se encolheu um pouco, concordando com a cabeça, se um Ser Divino falava... quem era ela para dizer o contrário?

Após isso, as únicas coisas que ecoavam eram os passos das pessoas e os de Kalaziel mais alto que o do resto, ao menos para ela.

Bom, quando um homem passou do lado dela, a Anjo era mais alta do que ele.

Qual seria a altura dela?

Conforme andava, e Erdia se acostumava à ideia de que estava sendo carregada e que havia sido beijada por uma mulher... Uma Anjo — ao menos a voz dela era — ela notou como algumas pessoas olhavam para elas.

Kalaziel, apesar do manto, possuía um porte bem forte, mas era estranho ela não mostrar o rosto, mesmo tendo ficado dias na Terra, ela não parecia ter mesmo se mexido, já que estava mais gelada que pedra, porém...

Erdia corou enquanto lembrava-se do beijo, novamente.

A Anjo havia se reerguido como se nunca houvesse ficado parada, como se não parecesse uma pedra, como se...

— Chegamos — a voz altiva e celestial fez Erdia tomar um susto momentâneo — O que houve? — a voz da Anjo estava mais... normal? Séria, sim, mas não parecia a mesma.

— Não... — Ela balbuciou, mas logo se reagrupou — Não é nada — Teorias não a ajudariam agora.

Erdia olhou para a fachada que estava um pouco afrente delas: Era um hotel luxuoso, a fachada era vermelha e dourada.

Bem, lá no fundo, ela esperava por isso, na verdade, ela duvidava que aquela Anjo fosse ficar em algum canto de buraco com ela, mas...

— Você não vai pagar, mas preciso que fique no chão por um momento sem fugir de mim — Erdia já havia aberto a boca para contestar, mas Kalaziel a interrompeu — Não minta para mim, sei que ainda pensa em sair correndo para algum canto, se perder e acabar presa nesse lugar.

A garota estava surpresa, quanta arrogância.... Ela cruzou os braços e encheu as bochechas, estava nervosa quando foi colocada no chão junto da sua bolsa.

— Eu não ia realmente fugir... — Foi quando a outra respirou fundo e fechou os olhos — Kalaziel?

A Anjo havia feito um equilátero com suas duas mãos e cruzava os dedos conforme falava, também abaixando a cabeça.

— Deusa do Inverno — o vento gelado soprou, fazendo a garota tremer de frio, era intencional? Acidental? O que diabos ela estava fazendo?! — Já lhe prestei um favor, preciso de outro! — Erdia estava estupefata, o que estava acontecendo? — Faça nevar, o suficiente para acinzentar os olhos e esbranquiçar a pele.

Quando ela terminou de falar, sua mão formava uma gota de chuva.

E a neve começou, leve, mas com um vento gelado.

A garota segurou com força a alça de sua bolsa de viagem, que agora estava no chão e era bem leve. Onde havia se metido?

— Você que fez isso? — sua voz saiu forte. — Nevar.

— Não — Kalaziel estava mais séria do que o normal, ao menos parecia — Foi Sinjor, vamos entrar — Ela estendeu a mão para a menina.

— Eu sei andar.

— Você vai se molhar.

— Eu não me importo.

Kalaziel hesitou por um momento antes de ir até a bolsa de Erdia e a abrir, mas foi impedida com um empurrão e um resmungo mal-educado.

— Só quero pegar uma blusa para você colocar na cabeça. — A Anjo estava séria, Erdia, vermelha.

— Eu já estou quente o suficiente! — Erdia agarrou a bolsa com força e começou a andar.

Quase deu para ver a Anjo levantar os ombros enquanto seus passos alcançavam Erdia.

O Hotel, extremamente alto, crescia em espiral em direção ao céu, três prédios que se ligava por pequenas plataformas de um para o outro. Ele possuía cores que variavam do transparente vidro, dando para ver do lado de dentro, quanto para um branco acinzentado que podia ser confundido com neve, mas a fachada possuía uma porta automática do que parecia ser madeira, contornada com prata e um “H” em vermelho bem no centro, que ela deduziu ser de “Hotel”.

A garota olhou para tudo aquilo com certo receio, preferia sua casa simples.

Um braço foi estendido acima de sua cabeça e Erdia quase se encolheu com aquilo, em autodefesa e quase susto, de novo. Kalaziel estava lhe cobrindo com a capa, e antes que pudesse falar algo, a Anjo se prontificou.

— Não vou deixar que você fique doente, sei o resultado disso em humanos.

— Você não fica doente?

Elas estavam quase na porta quando Erdia viu um aceno positivo, aquilo era para a pergunta ou para ela ficar focada?

Quando estavam perto o suficiente da porta, ela se abriu automaticamente, e ambas entraram.

O homem avaliou as duas de cima a baixo, e fez uma cara de desgosto. Erdia não podia culpar o homem, não estava de um jeito bom para o local, mas em comparação, Kalaziel só havia levantado ainda mais a cabeça.

— As senhoritas possuem aposentos? — ele falava em inglês. Na voz dele, carregava o respeito por obrigação, e o nojo misturado com humilhação por sadismo.

— Gostaria de solicitar uma suíte por três dias e duas noites para duas pessoas.

O homem estava nitidamente segurando a risada.

— Se não sair daqui imediatamente, irei chamar a segurança.

 Um maço de dinheiro foi colocado em cima da mesa pela Anjo, o homem olhou receoso.

— Gostaria de solicitar uma suíte por três dias e duas noites para duas pessoas. — ela tirou o capuz deixando seu rosto e um pouco da franja, com uma presilha de Lua, aparecer, seu olhar de outono era intimidador — Por favor.

O atendente, receoso, olhou de modo desafiador para a Kalaziel, e com um leve pedido de “ licença”, ele pegou o dinheiro e contou. Mais do que surpresa estava estampada em seu rosto, era quase como medo.

Ele engoliu em seco e chamou por alguém chamado “ Jordan”, que compareceu de imediato, quase correndo. Era um homem de porte grande demais para uma pessoa, vestido de preto, mas parecia mais um atendente que um segurança.

— Jordan, leve essas senhoritas para seus aposentos, na nossa Suíte do prédio Três, por favor.

Jordan estendeu as mãos apontando para o elevador e começou a se movimentar. Kalaziel foi em direção a ele, mas Erdia olhou para o balconista e fez uma leve reverência, pediria desculpas se não achasse que ele que devia pedir, e então, seguiu a Anjo.

Dentro do Elevador, luxuoso o suficiente para ser um mini ambiente próprio, o clima parecia pesado por conta das inúmeras insistências do homem para Erdia largar sua bolsa de viagem praticamente vazia, coisa que ela não fez, depois de um tempo o homem acabou por ficar emburrado.

Kalaziel só ficou parada enquanto os dois, um de cada lado dela, criava um pequeno cabo de guerra vocal.

A porta do elevador se abriu, já revelando o quarto que nem mesmo porta possuía.

A Anjo entrou nele e avaliou o local, olhando para a maioria dos lados, e depois se dirigiu para a enorme janela.

— Uma bela vista — Kalaziel olhava fixamente para ela enquanto Erdia entrou em passos cuidadosos e com um pedido de “ com licença” bem baixo. O Atendente, foi em seguida, com toda a sua pose fina e observou Kalaziel — A janela abre?

— Abrir?! Estamos no Octogésimo nono andar! Seria loucura abrir! — nervosismo estava presente em tudo no corpo do homem, como se estivesse ouvido a maior loucura do mundo.

Kalaziel tirou todo o capuz e mostrou o resto do rosto.

Ela possuía um cabelo curto marrom que parava na altura do queixo, o prendedor em formato de lua ficava acima de uma mini trança que parecia impedir do cabelo ir para frente dos olhos, enquanto sua franja, virada para a direita, cobriria o olho se ela caísse. A pele clara da Anjo não era algo realmente angelical, como se não fosse intocada, e sim uma cor de pele que já havia sido um pouco banhado pelo sol, uma cor de pele humana, sua boca parecia possuir brilho labial, por conta do reflexo da luz.

Mesmo com toda aquela beleza, o que parecia ser um chifre era, aparentemente, só cabelo, um cabelo deslocado que estava acima de tudo tão perfeitamente alinhado, entretanto, o destaque eram seus olhos, agora, mais brilhantes, um marrom com brilhos que pareciam folhas.

Realmente uma tempestade de folhas caindo no chão.

Ao responder o homem nervoso, a voz de Kalaziel era pura e calma, controle e perfeição:

— A Janela abre?

— Ah?... Sim... — O homem parecia emburrado, já Erdia havia mordido o lábio na parte de dentro, se impedindo de rir.

— Perfeito então.


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Notas finais do capítulo

Ser amaldiçoado apaixonado.



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