Sombra de Lobo escrita por Sarah


Capítulo 1
Capítulo 01


Notas iniciais do capítulo

Várias criaturas sobrenaturais são citadas nessa histórias, todas tiradas de uma lista da wikipédia, mas vou deixar aqui o conceito daquelas que foram mencionadas ao longo dos capítulos.

Hob: espírito da casa.
Naga: fogo espectral.
Kapre: espírito malévolo da árvore.
Ankou: observador esquelético de sepulturas com uma lanterna e uma foice.
Jinn: criaturas espirituais.
Ortro: cão de duas cabeças
Wraith: espírito aquático ou aparição fantasmagórica.
Jumbee: espírito malévolo.
Atshen: espírito antropófago.
Cabeiri: espírito do vinho.
Danava: demônio aquático.
Bies: espécie de demônio.

Espero que apreciem a leitura, essa história deu um trabalho do cão. ^^



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Uma música do Pink Floyd estava tocando no bar, levemente acima da balburdia geral de uma sexta-feira. Sua cerveja estava gelada e James parecia um homem feliz, sentado à sua frente. Sirius nunca conseguira se impedir de ser um pouco feliz também quando estava diante da felicidade de James. Em média a cada minuto e meio ele levava a mão até o bolso da calça, onde Sirius sabia que ele havia guardado as alianças de casamento.

— Você ainda não tomou álcool suficiente para perder esses anéis, James — disse, tomando mais um gole da própria cerveja, na sétima vez que viu o outro repetir o movimento. — Espere até a uma hora da manhã para se preocupar com isso.

— Lily iria me matar se eu perdesse as alianças.

Sirius fez uma careta e revirou os olhos.

— Você sabe que não, ela se casaria com você mesmo sem os anéis. Mas eu pretendo ter você bêbado o bastante essa noite para correr o risco de perder a hora do casamento amanhã, então, sim, talvez Lily mate você.

James riu ao mesmo tempo em que mostrou o dedo do meio para ele. Sirius sabia que um palavrão estava prestes a vir, mas então o olhar de James se concentrou em um ponto às suas costas, e o riso dele se converteu em um sorriso acolhedor enquanto ele acenava.

Diante do gesto, Sirius assobiou baixinho. 

— Então o seu garoto veio mesmo? — questionou, mas James o ignorou deliberadamente, lançando-lhe um único olhar de alerta, como o que alguém daria a um cão que estava obviamente tentado a destruir seu melhor sapato.

No momento seguinte James estava de pé, abraçando Remus Lupin com um suspiro de satisfação. Para além do casamento iminente, James tinha passado o dia inteiro agoniado sem saber se Remus apareceria ou não.

— É bom que você possa ter vindo! — James sussurrou contra a orelha de James, os braços apertados em suas costas.

Remus sorriu quando James deslizou as mãos para bagunçar seus cabelos, num caminho amigável. Ao mesmo tempo, James pegou seu olhar por cima dos ombros de Remus, sorrindo como alguém que finalmente tinha todas suas peças unidas, parecendo terrivelmente feliz por ter os dois amigos ao alcance das mãos.

Sirius gostava de Remus, apesar de os dois só terem se encontrado algumas poucas vezes durante a vida, sempre por intermédio de James, mas não podia reprimir por completo a sensação de que ter outra pessoa ao redor roubava seu território, e, ohh, ele já havia cedido tanto espaço para Lilian.

— Se eu não ver você se casando nunca vou acreditar que é verdade! — Lupin respondeu, e Sirius podia entender a sensação. — Black — ele disse assim que James o soltou, voltando-se para Sirius e estendendo a mão.

Sirius retribuiu o cumprimento, mas também rolou os olhos, o que fez James dar a ele um novo olhar exasperado.

— Até o final da noite Sirius vai estar bêbado, e é provável que você o veja de cuecas, então acho que pode dispensar o sobrenome.

Remus riu, fitando Sirius de cima a baixo.

— Não deve ser uma visão ruim.

Sirius sentiu o sangue fluir para suas bochechas, mas o fato também poderia ser consequência do leve engasgo que veio com a provocação inesperada. Um pouco de cerveja subiu para seu nariz, fazendo-o pinicar enquanto Sirius tentava rir e tossir ao mesmo tempo.

— Tudo bem, eu pago as próximas bebidas em homenagem ao seu bom gosto. 

Os três sentaram na mesa, Sirius e James frente à frente, Remus à esquerda de Sirius. Por um instante Remus pareceu um tanto deslocado, mas então as cervejas chegaram. Seu tio Alphard costumava dizer que todo homem era um amigo quando se compartilhava uma bebida com ele. Às vezes, a amizade perdurava quando acabava o efeito do álcool.

Era isso que tinha acontecido com ele e James quando os dois tinham doze anos. James subira até o sótão do internato em que estudavam porque escutara boatos de que havia uma assombração no lugar, e ele queria mandar uma carta para casa que impressionasse seu pai. Sirius tinha ido até lá porque sabiaque era apenas um Hob inofensivo habitando o local, e aquele era um bom lugar para beber sem que ninguém descobrisse. Tinha sido uma surpresa encontrar com James lá e perceber que ele havia subido até o sótão não exatamente por causa dos boatos, como alguém faria em um teste de coragem, mas porque o garoto sabia que os boatos podiam ser reais e ele desejava livrar o sótão da assombração — era o que a família dele fazia. Esse último fato James só tinha contado depois de ambos terem terminado a garrafa de vinho que Sirius roubara, e então Sirius contara sobre sua própria família.

Eles tinham dormido no sótão aquela noite, e depois da ressaca nenhum dos dois havia se afastado muito do outro. Como consequência, Sirius tinha sempre ouvido falar muito de Remus. James era amigo dele desde antes de ir para o internato: ambos trocavam cartas, e James voltava das férias repleto de histórias de tudo o que tinha feito com Remus Lupin, e de como ele era inteligente e incrível.

Céus, Sirius tinha passado a maior parte da vida morrendo de ciúmes de Remus, até que Lily chegara e ele percebera que sentir ciúmes de Remus não era a pior coisa do mundo, pois ali ainda existia esperança.

As conversas na mesa giraram em torno desse tempo de infância e sobre o casamento — a irmã de Lilian se recusara a comparecer na cerimônia, e como Sirius tinha ajudado Lily a escolher as flores para o buquê —, cada assunto pontuado com piadas sujas, até que, em algum momento, a cerveja foi substituída por uísque.

A bebida logo pintou as bochechas de James de vermelho, soltou sua língua e deixou suas risadas mais altas. Sirius chegou a achar que eles passariam pela noite sem mencionar nada relativo ao trabalho — era o casamento de James, e tanto ele quanto Remus pareciam ter se ajustado num acordo tácito de que não falariam sobre isso se James não fizesse o primeiro movimento. Afinal, James tinha decidido se retirar, deixar aquela vida para trás. Sirius sabia o quão difícil essa decisão tinha sido, como sabia que a mera menção das coisas com as quais eles estavam acostumados a lidar podia atrair a má sorte.

No entanto, depois do terceiro copo de uísque, James pareceu reunir coragem para levantar o assunto.

— A sua caçada terminou bem, Remus? Quando falei com você, achei que pudesse não terminar o trabalho a tempo de chegar aqui para o final de semana. — A pergunta foi dita em um tom baixo, muito mais cuidadoso do que quando eles estavam discorrendo sobre o pau de James ser ou não grande o suficiente para manter Lily em um casamento feliz.

Remus deu de ombros em um movimento delicado.

— Eram Nagas. Foi mais difícil descobrir o que eram do que acabar com elas. Enchi a casa com vapor de água benta, e elas finalmente apagaram — ele contou com naturalidade, mas Sirius reparou que Remus levou a mão até o torso e podia jurar que havia uma queimadura na região. Em seguida, ele respirou fundo. — Você vai mesmo se retirar, James? — Havia incredulidade e admiração na pergunta.

James assentiu. Sirius viu seu pomo de adão subir e descer quando ele tomou um longo gole de uísque, reprimindo uma careta. Em seguida, James pegou um guardanapo da mesa e começou a picá-lo em pedacinhos em vez de encará-los. 

— Não posso arriscar levar Lily para a vida que nós tínhamos. — Falar do que eles faziam era agourento e dizer o nome de Lily naquele contexto obviamente doeu em James. 

— É claro que não —Remus falou, a voz cheia de conforto. — Sirius? — ele questionou, mas não havia dúvida real na sua voz. Era como se Remus tivesse certeza que Sirius iria dizer o mesmo que James, que estava se retirando também, porque, ohh, era simplesmente o curso natural das coisas que Sirius Black seguisse James Potter, embora os dois não caçassem juntos há quatro anos.

Sirius sacudiu a cabeça em negativa.

— Muito cedo para aposentadoria. Peguei alguns trabalhos ao redor daqui depois de ter ajudado James a se fixar. Não faria sentido ir para muito longe quando teria que voltar para o casamento, e eu queria me assegurar de que nada tinha seguido ele até aqui. — James fez um grunhido diante da frase, que Sirius aprendera a identificar como apreço pela atenção e uma declaração de que aquilo não era necessário. Remus deu um sorriso de canto que dizia que ele também entendia o sentido por trás do som.

— De certa forma, é bom saber que você não está farto de monstros.

James revirou os olhos, voltando a falar antes que Sirius pudesse responder qualquer coisa.

— Sirius está indo para o norte depois do casamento, você devia pegar uma carona com ele, Remus. Você disse que queria verificar a notícia de que algumas pessoas têm visto aparições em um parque em Lira, e isso seria caminho, já que Sirius pretende seguir para um lugar mais frio. — A sugestão de James parecia displicente à primeira vista, mas Sirius pôde notar leve suspiro de alívio quando ela escapou.

De repente, percebeu que James estivera planejando juntá-los o tempo inteiro. Sentiu-se de volta às férias de verão do colégio, quando passava algum tempo na casa de James e ele se desdobrava para unir os dois e fazer com que se dessem bem. Sirius sentiu a mesma relutância infantil voltar a subir por sua garganta.

Estava prestes a abrir a boca para negar a carona quando seu olhar encontrou o de Remus. Ele o mirava com cuidado, avaliando-o. Uma cicatriz fina subia por seu pescoço até sua bochecha esquerda e a mão que segurava o copo de bebida tinha calos no lugar onde o dedo encaixava no gatilho de uma arma. Remus parecia cansado, mas também parecia um bom caçador — e, ohh, agradavelmente bonito.

A avaliação dele também devia ter sido positiva em algum sentido, pois quando Remus voltou a falar foi para concordar.

— Uma carona facilitaria as coisas.

Sirius ainda levou mais um segundo ponderando, engolindo um bocado de uísque que ardeu em sua garganta, porém, por fim, decidiu que não valia a pena estragar o casamento de James com preocupações. Daria uma carona para Remus até Lira, e, então, seguiria em frente.

— Espero que você goste dos Beatles, porque é tudo que eu tenho no rádio do meu carro — falou, e o sorriso de James quase valeu a mentira sobre sua boa disposição.

.

.

.

— O quê? — Sirius perguntou enquanto Remus rodeava seu carro, estacionado na garagem de James.

Remus sorriu um sorriso torto e deu de ombros. Ele tinha os cabelos amassados e seus olhos estavam um pouco vermelhos. Sirius sabia que não devia estar muito melhor, ambos ainda de ressaca depois da despedida de solteiro no bar e da festa de casamento de James.

— Acho que esperava algo com mais estilo — Remus falou, parecendo mais divertido do que decepcionado.

O automóvel era um Jeep com uns quinze anos de uso, grande e abrutalhado, do tipo que, na sua época áurea, uma mãe de classe média enfiaria seus três filhos para levar no colégio junto com todas as compras do mercado. Agora a pintura verde musgo estava meio opaca e havia um ligeiro amassado na porta do carona, onde James tinha sido arremessado por um poltergeist numa caçada que tinham feito juntos, mas o motor continuava forte como sempre.

— Se você quer estilo, deveria ver minha Harley-Davidson. Ela poderia voar! Infelizmente não é muito prática para viagens, o kit de exorcismo mal cabe no bagageiro. Deixo ela guardada em uma garagem alugada em Saint Laurence — Sirius falou e considerou sobre isso. — Talvez eu traga ela para cá, agora que James se estabeleceu.

— Você vai acabar com todo o espaço que ele tem aqui.

— Ele me deve por casar e se retirar tão cedo. Quando estávamos na escola a gente dizia que ia caçar durante a vida inteira, mas olha só. Acho que um espaço na garagem é uma compensação justa. — Não era sua intenção, mas um pouco de amargor devia ter escapado através da sua voz, pois Remus o encarou como se estivesse prestes a dizer alguma coisa consoladora. Sirius voltou a falar antes que o outro tivesse alguma chance: — Vamos, acho que nenhum de nós vai querer estar aqui quando James voltar da lua-de-mel.

As duas bolsas que Remus carregava consigo — uma de roupas, uma de instrumentos de trabalho —, não ocupavam muito espaço e foi fácil acomodar tudo no porta-malas.

Quinze minutos depois, os dois estavam indo em direção ao norte, Black Bird soando pelos auto-falantes do carro.


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