Coragem escrita por Arisusagi


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Tô perdida com as datas disso aqui, risos. Falaram que adiaram pra sexta, mas aí vi gente falando que era pra sábado e eu não sei de mais nada. Postei agora porque acho que amanhã não vai dar tempo.
Bem, pra esse delipa, eu queria escrever ou um AU pai solteiro, ou um AU pós apocalíptico. Aí me falaram "por que não os dois ao mesmo tempo?" e aqui estamos nós.
Essa história é um universo alternativo, mas os personagens ainda têm suas individualidades. O auê todo de "apocalipse" rolou enquanto o Aizawa ainda tava no ensino médio, então ele não chegou a virar um herói profissional.
Ah, e Yamada Hizashi é o nome de verdade do Present Mic, pra quem não sabe. Essa fanfic é EraserMic.
Enfim, boa leitura.



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Acordar deitado no chão duro já havia virado parte da rotina de Aizawa nesses últimos cinco anos. Ele rolou para o lado e se espreguiçou, sentindo sua coluna estalar. Ao seu lado, Yamada se mexeu, ainda sem acordar. Aizawa saiu de seu saco de dormir amarelo, levantou-se e foi até a janela.

Eles passaram a noite em um apartamento que ficava no terceiro andar de um antigo prédio residencial. O lugar estava completamente destruído, tomado pelos ratos e pela poeira, e sem um móvel sequer. Os andares superiores pareciam estar ocupados, e nenhum dos dois se atreveu a ver que tipo de gente estava lá. Era assim que eles viviam desde que as guerras destruíram o mundo: esgueirando-se pelos cantos, tentando se envolver o mínimo possível com grupos muito grandes.

Pela janela, Aizawa conseguiu ver cerca de cinco ou seis pessoas se distanciando cada vez mais do prédio em que eles estavam, coisa que o deixou um pouco mais aliviado. Quanto menos gente dividindo o teto com eles, melhor. Sua barriga roncou, e ele resolveu que já era hora de comer.

Como não era fácil encontrar comida, os dois faziam suas refeições com muita parcimônia, às vezes limitando-as a duas por dia. No dia anterior, Yamada havia achado, por acaso, uma caixa enorme cheia de enlatados, carne seca e várias outras coisas, escondida sob um piso falso em uma sala naquele mesmo prédio. Alguém provavelmente havia preparado aquele estoque com muito cuidado e o guardado ali para alguma ocasião especial. Já que seria complicado carregar tanto peso, eles decidiram deixar um terço da comida ali, caso eles ou a pessoa que escondeu aquilo ali precisassem futuramente.

Aizawa tirou um pacote de frutas secas de sua mochila e o abriu com cuidado para não fazer muito barulho. Ainda era cedo, e Yamada precisava descansar um pouco mais. Enquanto mastigava aquelas frutas borrachentas e sem gosto algum, Aizawa olhava o céu perder o tom alaranjado aos poucos, conforme o sol subia. Ele comeu cerca de metade do pacote, e guardou o resto para mais tarde.

Yamada acordou logo depois de ele acabar de comer, espreguiçando-se e reclamando que estava com dor nos ombros. Aizawa o olhou de lado, pensando em como sua aparência estava horrível. Yamada estava terrivelmente magro, com olheiras escuras sob os olhos e a barba por fazer. Seus cabelos, loiros e imundos, já estavam na altura dos ombros, e ele os mantinha presos em um coque desajeitado. Apesar de não se olhar no espelho há muito tempo, Aizawa sabia que seu estado não devia ser muito melhor que o dele.

“Bom dia, Shou.” Yamada disse, indo até Aizawa e beijando sua bochecha. “Já está quase sarando, né?”

Ele tocou com o polegar o quelóide rosado que havia na maçã do rosto de Aizawa, logo abaixo de seu olho direito. Cerca de três semanas atrás, os dois se envolveram em uma briga com um homem que tentou roubar a pouca comida que tinham. Depois de perceber que Aizawa conseguia apagar sua individualidade com os olhos, o homem o atacou com um canivete, o que causou aquela cicatriz. Yamada conseguiu tirar a arma de sua mão e imobilizá-lo, e os dois fugiram praticamente ilesos, exceto por aquele corte. Yamada ficou muito preocupado, e estava cuidando daquele ferimento mais do que o próprio Aizawa.

“Acho que podemos ficar aqui por mais uns dias.” Aizawa murmurou. “Tudo depende do pessoal que está lá em cima.”

“É um bom lugar para ficar.” Yamada pegou o pacote de frutas secas que Aizawa havia deixado sobre a mochila. “Você vai querer isso aqui?”

“Não, pode comer.”

Aizawa continuou olhando pela janela, ouvindo uma reclamação ou outra de Yamada quanto ao gosto das frutas. Com a água e a comida que tinham, eles podiam ficar ali por mais ou menos uma semana. Isso se ninguém aparecesse para incomodá-los.

 

×××

 

Já era quase fim da tarde quando os dois ouviram um barulho vindo do lado de fora do apartamento em que estavam. Yamada se aproximou da porta, prestando mais atenção nos sons lá fora. Parecia que alguém estava revirando as pilhas de entulho que estavam no corredor.

“Acho que é uma pessoa só.” Ele sussurrou com a orelha colada no batente. “Melhor ver quem é.”

Aizawa concordou, e o seguiu até o corredor.

    Um garotinho, que não devia ter mais de oito ano de idade, revirava o entulho no corredor, completamente alheio aos dois. Ele tinha cabelos roxos muito bagunçados, quase chegando à altura de seus ombros, e vestia roupas largas e puídas. Aizawa e Yamada se entreolharam, sem saber o que fazer. O menino estava sozinho ali, mas eles não sabiam se havia alguém - algum adulto— junto com ele, em algum outro canto do prédio. Aizawa estava prestes a sugerir que voltassem para o apartamento e deixassem o garoto sozinho ali quando ele olhou por cima do ombro e os viu. Ele arregalou os olhos, agarrou o pedaço de madeira mais próximo e apontou para os dois adultos.

    “Epa, calma aí.” Yamada ergueu as mãos por reflexo.

    “O que vocês querem?” Apesar da expressão assustada, o garoto falou em um tom surpreendemente calmo, tão confiante que nem parecia uma criança.

    “A gente não vai fazer na-” Yamada se calou no meio da frase e abaixou as mãos lentamente.

    “Hizashi?” Aizawa perguntou, estranhando o comportamento do amigo.

    Yamada continuou parado onde estava, sem dizer uma palavra. De repente, ele se virou bruscamente e avançou em direção a Aizawa, agarrando seu pescoço com as duas mãos.

    “Hizashi! O que aconteceu?!” Ele segurou os pulsos de Yamada, tentando fazê-lo soltar.

    Atrás dos óculos escuros, Aizawa conseguiu ver que olhos de Yamada estavam turvos, quase como se não estivessem se focando nele. Ele estava, sem dúvida nenhuma, sendo controlado.

Aizawa olhou para o garotinho, que juntava objetos aleatórios em seus braços o mais rápido que podia, e ativou sua individualidade. Yamada o soltou no mesmo instante, e só não caiu no chão porque ele o segurou.

    Quando viu que Yamada não se mexia mais, o menino tentou fugir, mas Aizawa foi mais rápido e bloqueou o caminho para a escada.

    “O que você fez?” O garoto perguntou em um tom um pouco mais desesperado, olhando para os lados atrás de outra rota de fuga.

    “Você controla as pessoas com sua individualidade, não é?” Aizawa disse, ativando sua própria enquanto olhava fixamente para o menino. “Eu apaguei ela.”

    O garoto pareceu muito aflito, apertando os objetos que havia pegado contra o peito.

    “Deixa eu ir embora, moço.” Ele murmurou baixinho, sem todo aquele ar confiante de antes. “Por favor. Eu não vou atrapalhar vocês.”

    “Shouta, você está assustando ele.” Yamada pareceu ter finalmente se recuperado do que havia acontecido antes. Ele se agachou na frente do menino, apoiando as mãos nos joelhos.“O que vai fazer com essas coisas aí?”

    O tom amigável de Yamada pareceu ter deixado o garoto um pouco mais confortável. Ele olhou para os objetos que tinha nas mãos - um cabo de vassoura quebrado, duas tábuas e um pedaço de lona - e em seguida olhou para Yamada.

    “Eu queria fazer uma cabana.”

    Os dois adultos se entreolharam um pouco confusos.

    “Uma cabana? Por quê?”

    “Para dormir.” Ele esfregou o nariz com as costas da mão.

    “Mas você não tem outro lugar melhor para dormir?”

    Ele ficou quieto por alguns instantes, e balançou a cabeça negativamente.

    “E seus pais?” Aizawa perguntou. “Onde estão?”

    O garoto arregalou os olhos, quase como se estivesse prestes a chorar, e Aizawa se arrependeu de ter perguntado aquilo. Ele provavelmente havia sido separado de sua família por algum motivo, assim como Aizawa e Yamada foram anos atrás. Eles sequer sabiam se seus parentes ainda estavam vivos.

    “Calma, calma.” Yamada tentou tocar a cabeça do menino, que deu um passo para trás, agarrando a lona e os pedaços de madeira com mais força. “Ei, qual o seu nome?”

    “Shinsou Hitoshi.” Ele disse depois de hesitar por alguns instantes.

    “Eu me chamo Yamada Hizashi. Prazer em conhecê-lo, Hitoshi-kun.” Yamada estendeu a mão para ele, e Shinsou apenas a olhou, um pouco receoso. Yamada deu uma cotovelada em Aizawa, pedindo para que ele se apresentasse também.

    “Aizawa Shouta.” Ele resmungou, revirando os olhos. Apesar de estar preocupado com o garoto, ele achava que Yamada estava tentando criar um vínculo mais forte do que o necessário.

    “Você está com fome?” O menino assentiu imediatamente. “Nós temos comida, quer um pouco?”

    “Ei, Hizashi…”

    “Não tem problema, né, Shouta?” Yamada perguntou, antecipando as reclamações que ele faria. “Nós temos bastante comida, não vai fazer falta.”

    Aizawa suspirou. Pelo visto, seria bem difícil fazer Yamada desistir de ajudar o garoto.

    “Tá bom.” Shinsou disse depois de pensar por uns instantes.

    Shinsou os seguiu até o apartamento, e ficou parado perto da porta, receoso, sem largar dos objetos que tinha nas mãos.

    “Hm, vamos ver o que temos aqui.” Yamada começou a revirar a caixa de papelão onde estavam os alimentos. “Você gosta de abacaxi?”

    “Gosto.”

    “Ótimo.” Ele pegou uma lata de abacaxi em calda e a abriu com um canivete, entregando-a para Hitoshi junto com um garfo. “Aqui, cuidado para não se machucar.”

    “Obrigado.” Shinshou colocou os objetos que segurava no chão, e se sentou com a lata nas mãos.

    Ele devorou as rodelas de abacaxi quase como um animal, coisa que deixou os dois adultos muito assustados. Aizawa se sentiu um pouco culpado por ter pensado que não era uma boa ideia dividir a comida com o menino. Pela forma como comia, Shinsou deveria estar sem se alimentar direito a bastante tempo.

    “Estava bom?” Yamada perguntou assim que Shinsou comeu o último pedaço.

    “Estava.” Ele esfregou o rosto com a manga da camisa. “Muito obrigado, Yamada-san.”

    “Não há de quê.”

    O céu já estava escuro a essa altura, e Aizawa precisou acender um lampião a álcool para iluminar o lugar. Shinsou se levantou e ficou parado perto da porta, amuado, olhando para o chão.

    “Acho melhor ele passar a noite aqui.” Aizawa disse, sua voz grave dando um leve susto no garoto. “É perigoso ficar lá fora.”

    Tanto Yamada quanto Shinsou ficaram um pouco surpresos com aquilo, considerando que Aizawa não parecia estar muito feliz com a presença do menino.

    “Então precisamos arrumar uma cama para ele. Aqui, pode ficar com o meu colchonete.”

    Shinsou parecia ter um certo brilho no olhar enquanto via Yamada desenrolar o colchonete, quase como se aquela fosse a melhor coisa que aconteceu a ele no dia. Isso fez Aizawa pensar em que tipo de situação aquele garoto dormia normalmente.

    “Prontinho. Você dorme aqui.” Yamada bateu no colchonete com as duas mãos. “Ah, estou com fome. Quer comer mais um pouco, Hitoshi-kun?”

    “Não…” Ele respondeu depois de hesitar por uns instantes. “Não quero, obrigado.”

    “Tem certeza? Pode comer, não tem problema.” Yamada insistiu.

    “Não quero mesmo, obrigado.”

    Yamada pegou uma lata de fiambre e um garfo e se sentou junto da parede. Aizawa se sentou bem ao seu lado, tão perto que seus ombros se tocaram, com uma lata de sardinhas em mãos. Eles comeram em silêncio, enquanto Shinsou os observava, sentado sobre o colchonete.

    “Nossa, já estou cheio.” Yamada estendeu sua lata para Shinsou. “Quer ficar o que sobrou, Hitoshi-kun?”

    Shinsou pegou a lata no mesmo instante, murmurando um “obrigado” antes de começar a comer garfadas da carne com o mesmo desespero de antes.

Aizawa riu baixinho. Ele sabia que Yamada poderia muito bem ter comido aquela lata inteira, mas fingiu estar satisfeito só para que o garoto comesse mais um pouco.

    “Obrigado…” Shinsou murmurou mais uma vez quando terminou de comer.

    “Quando foi a última vez que você comeu?” Yamada pegou a lata vazia e jogou em um saco de lixo. “Antes de chegar aqui.”

    “Acho que foi ontem de manhã… Ou antes de ontem.” Hitoshi coçou a cabeça, pensativo. “Não me lembro bem.”

    Yamada e Aizawa se entreolharam, muito preocupados. Não havia mesmo nenhum adulto cuidando aquele garoto?

    “Depois que a mamãe…” Shinsou abraçou os joelhos junto ao peito, sem terminar a frase. “Ficou mais difícil achar comida sozinho.”

    “Pode comer o quanto quiser aqui.” Surpreendentemente, quem disse isso foi Aizawa. “Não tenha vergonha de pedir.”

    “Obrigado…” Shinsou fungou, escondendo o rosto atrás dos joelhos. “Muito obrigado.”

    Os soluços de Hitoshi encheram o lugar. Yamada sentou-se ao lado dele, passando a mão pelas suas costas trêmulas, tentando confortá-lo. Ele agarrou a jaqueta de couro de Hizashi e escondeu o rosto em seu peito, chorando ainda mais.

    Enquanto observava a cena, Aizawa imaginou como foi a vida de Shinsou nesses últimos anos. Ele não deveria nem ser nascido quando as guerras começaram, há mais de nove anos. Quando se separou de sua família, Aizawa tinha dezessete anos, e sobreviver naquele mundo destruído por conta própria era absurdamente difícil. Não dava para acreditar que uma criança estava passando por situações ainda piores.

    Depois de chorar por um bom tempo, Shinsou se acalmou e soltou a jaqueta de Yamada. Ele esfregou o rosto com as mangas da camisa, ainda fungando e soluçando.

    “Eu quero dormir agora.” Ele murmurou.

    “Tudo bem, pode deitar.” Yamada se levantou, deixando o colchonete inteiro para ele.

    Shinsou se deitou encolhido e adormeceu no mesmo instante.

    “Caramba, nem imagino o que esse menino passou.” Yamada sussurrou.

    “Ele tem muita coragem…” Aizawa se levantou e pegou seu saco de dormir. “Mais coragem do que nós dois juntos.”

    “É verdade… Acho que vamos ter que cuidar dele daqui pra frente.”

    “Isso a gente resolve amanhã.” Ele entrou no saco de dormir e se deitou no chão. “Boa noite.”

    “Boa noite.”

   


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Notas finais do capítulo

Finalzinho cagado né. Escrevi ele agora, logo depois de fazer uma prova de custos e ficar com a mão e a cabeça moídas. Me poupem.
Eu não entendi bem o esquema de fanfic adicional que esse delipa teve, mas escrevi uma adicional de Starmyu antes dessa aqui. Se chama Moon Holic, depois coloco o link aqui.
Muito obrigada a todos que leram ♥