Solta o som - Rota Lysandre escrita por xHamiko


Capítulo 3
Desafiar a Gravidade




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A semana se passou.

Infelizmente, meus pais não tinham me deixado viajar para acompanhar Lysandre no funeral do pai, e eu me sentia mal por isso. Pra completar, desde que ele voltou do campo anda mais aéreo e mais fechado que de costume. Por mais que eu tentasse chamá-lo para uma pequena conversa, ele encerrava o assunto com palavras polidas e gestos brandos que funcionavam como um verdadeiro muro entre nós.

Isso me fazia lembrar do seu estado de espírito antes do acidente.

Na contramão de todo esse drama, os alunos estavam mais do que animados com a fase eliminatória do concurso de bandas, que era esta noite. Ninguém conseguia prestar a atenção na aula de educação física e as partidas de vôlei estavam tão aleatórias que maioria ignorava as regras e levava pro lado pessoal. Rosalya estava no ápice do seu mal humor.

Eu consigo entender porque minha amiga odeia tanto esse esporte. Eu não tinha jeito pra sacar, não tinha altura pra bloquear, nem reflexos pra rebater. Um prato cheio para Ambre e Li, que faziam questão de rir em voz alta e zombar em alto e em bom som do meu desempenho. Isso quando eu não levava uma bolada na cara por causa de uma delas.

Quando tudo acabou, eu tomei um banho longo no vestiário.

— Ainda bem que Lysandre não viu isso. – Eu desabafava com a Rosa enquanto me vestia. 

— Tudo bem, amiga. Se esse tipo de humilhação pública fizesse os rapazes desistirem das namoradas, Leigh e eu não chegaríamos nem ao primeiro mês de namoro. 

Eu terminei de me vestir e me sentei no banco, totalmente desgastada com aquela aula. Rosalya se sentou ao meu lado, com ar compreensivo.

— Você está preocupada com ele, né?

— Sinto como se eu tivesse abandonado-o. Toda vez que vou falar com Lysandre ele parece tão distante... Não sei mais o que fazer.

— O Lysandre é assim mesmo. Você precisa insistir mais. 

— Eu não sei, ele não gosta de insistência.

— Ele também não gosta de curiosos e você é a curiosidade em pessoa.

Comecei a rir sem querer. Realmente não sei como Lysandre nunca se aborreceu com isso.

— Talvez seja porque eu respeito o espaço dele.

— Você se escondeu no vestiário para ver a tatuagem!

— I-isso já faz tempo! E eu não sabia que ele me mostraria a tatuagem por vontade própria.

— Opa. Como é que é? O namoro de vocês já chegou na fase de tirar a camisa?

— N-não! Ele me mostrou a tatuagem no mesmo dia em que me escondi no armário!

Os olhos dela só faltaram saltar da face:

— Você nunca me contou isso!

— Por que eu contaria?!

— Ta brincando? Não sei como você nunca desconfiou que o Lys-fofo sentia algo por você. Ele tirou a roupa na sua frente! Estamos falando de alguém que usa camisa na praia!

Começamos a rir sem saber ao certo o motivo, mesmo que meu rosto estivesse queimando de vergonha.

— Vamos, vamos voltar pro ginásio ensaiar. – Rosalya ficou de pé.

— Ginásio? Não era a sala de música?

— Você está fora de órbita ou o que? A partir de hoje ensaiaremos no ginásio. Tem muito mais espaço pra atuação, esqueceu?

— É... Devo estar com a cabeça nas nuvens.

Quando voltamos pro ginásio, todos os alunos que participariam do musical já estavam lá. Além disso foi montado o material de áudio.

Alexy se aproximou de nós e estava usando uma travessa com chifres de bode e um jaleco qualquer.

— Oi, gente. To estiloso, né?

— Você fica atraente de qualquer jeito, Alexy. - Eu pisquei pra ele.

— Ah, pára, vai? Se você fosse um rapaz me ganharia facinho com essa.

— Sério? Eu não precisaria usar uma peça de roupa militar pra ficar mais sexy?

— Claro que isso facilitaria mais o trabalho.

Começamos a rir, mas fomos interrompidos pela professora Clarice, que pediu que nos preparássemos para nossa cena já que "parecíamos nos dar tão bem". 

Alexy e eu fomos para a área onde ficaria o palco para cantar Algo Mau, uma cena que se passa depois que o Dr. Dillamond entra na sala de aula e encontra no quadro a frase "animais devem ser vistos, não ouvidos". Ao nosso redor, estavam os outros alunos, inclusive Dake e Ambre.

A professora fez um sinal e Alexy começou sua atuação:

— Oh, senhorita Elphaba... As coisas que eu ouvi esses dias...

 Então ele começava a me cercar de uma forma desconfiada e misteriosa enquanto a música soava.

 (Alexy)

 Ouvi que um castor

Renomado doutor 

Não vai mais poder lecionar

Pois perdeu o dom de falar!

♪ 

E agora o cão pastor

Outrora grande orador

Não vai mais pregar

Pois só pode ladrar!

 ♪

São boatos talvez

Mas muitos de nós estão perdendo a voz

Algo mau se passa aqui em Oz

 (Eu)

Algo mau... Justo aqui em Oz!

 (Alexy)

Sempre às escuras

Por trás do véu

Algo bééééé

Dr. Dillamond começou a balir.

— Hehe. Perdão. Eu quis dizer "mau".

— Dr. Dillamond, o senhor está bem? 

— Não, não, relaxa. Foi só uma recaída. Tá tudo tranquilo.

— Se os animais estão desaprendendo a falar, temos que pedir socorro! O Mágico de Oz pode nos ajudar! Temos um mágico, né? É pra isso que ele serve!

 – Ah, é? Porque se esse é o papel dele, então ele vai ser um completo inútil nessa história!

Ouvimos os outros começarem a rir, e até eu tive dificuldades em permanecer no papel. Só Armin que não curtiu a piada, e a professora Clarice, claro. 

— Alexy! – Ela chamou a atenção – Eu aceito a improvisação, mas nada de desviar muito do texto!

Continuamos.

O ensaio seguiu com a chegada do príncipe Fiyero à Shitz, e Galinda se encantando por ele, enquanto desprezava o apaixonado Boq. Nessa cena, Fiyero, com todo o seu charme, e todos os alunos da universidade cantariam É Só Dançar, onde o príncipe convida todos a viverem uma vida mais divertida.

E era incrível como Dake encarnava o personagem, estilo aqueles galãs de filmes. Estava tão afinado e tão galante que mesmo Ambre parecia vidrada, como se fosse a própria Galinda.

 Tanto tempo de ensaio e ainda estou cho-ca-da. 

Dake e Ambre pareciam confortáveis com suas posições, diferente de Kentin, que parecia estar engolindo veneno na hora em que Boq mendingava a atenção de Galinda.

 – Senhorita Galinda, espero que você reserve uma dança pra mim no baile. Eu estarei lá. Esperando. A noite toda.

 – Oh, você é tão gentil. – Ambre se empolgou porque empinou o nariz e jogou os cabelos para trás, como uma verdadeira diva pop - Mas você sabe o que seria mais gentil ainda?

Então ela começava a cantar seu pedido para que o personagem de Kentin cortejasse Nessarose, que estava numa cadeira de rodas. Como Boq era apaixonado por Galinda, aceitava o pedido e, assim, Galinda podia ir ao baile com seu amado Fiyero.

Kentin realmente odiava essa cena.

Agora era a vez de Melody - como Nessarose - pedir para eu agradecer Galinda por ter achado um par.

(Melody) 

 ♪

Essa é a minha chance

De sonhar com um romance

Com um munchkin que Galinda achou pra mim

Tente ao menos entender

Que eu preciso agradecer

Esse gesto

Diga que sim

O meu par perfeito foi Galinda quem encontrou

O meu par perfeito é o Boq

— Por favor Elphaba, tente entender.

(Eu)

 ♪

Eu vou...

Devo admitir que Melody tinha uma voz canora muito bonita, mas acho que será impossível ela não levar essa história pro lado pessoal, afinal Nessarose se apaixonará perdidamente por Boq, que não a retribuirá. Então, no futuro, ele será vítima de uma relação abusiva e morrerá de parada cardíaca depois de Nessa errar o feitiço para fazê-lo se apaixonar por ela. Para salvá-lo, Elphaba o transformará no Boneco de Lata.

É só colocar o Nathaniel no lugar do Boq e tudo fará sentido.

Melody é minha amiga, mas Nath também é, e eu realmente não desejo que um dia eles fiquem juntos. Nenhum dos dois merece isso.

Continuamos o número com Peggy, como Madame Morrible, avisando para Galinda que ela tinho sido admitida na classe de feitiços por pedido da Elphaba, fazendo Galinda se arrepender do modo como vinha tratando a bruxa verde. E assim começa uma linda amizade entre Galinda e Elphaba.

Mas o fato de Ambre me olhar como se eu fosse a criatura mais desprezível da peça estragou toda a poesia da cena.

Mesmo assim, quando terminou a professora Clarice bateu palmas.

Assim os ensaios acabaram e todos começaram a se dispersar, eu fui interceptada por Dake.

— Hei. Posso ter uma palavrinha com você?

E lá vamos nós.

— Estou ouvindo.

— Eu vim pedir desculpas. Não tenho sido um cara legal.

Ergui as sobrancelhas surpresa. Será que eu escutei direito?

— Eu reparei que você está muito evasiva nos ensaios. — Ele continuava — E temos que nos beijar durante a peça.

— Bom, não vamos nos beijar. Eu já falei com a professora que não quero fazer isso.

Pela cara dele, ele não esperava por essa:

— Ok, mas vamos nos abraçar, então não leve minha atuação como investida, ok? Eu sei que você está bastante desconfortável.

— Obrigada. Eu me sinto mais tranquila. 

— É meio difícil eu desistir de algo que eu quero, mas não vai se repetir. Eu não sei o que você viu no esquisito, mas... Hm... Ele é um cara de sorte.

Sorri com naturalidade:

— Eu também tenho muita sorte. Hm... Dake, tem uma coisa que eu quero dizer. Estou surpresa em lhe ver participando da peça.

— Eu sei. Meus dons artísticos lhe impressionaram, não?

— É verdade, mas não é só isso. Por que resolveu ajudar seu tio? Você vai ganhar algum ponto participando da nossa peça? Algo pro currículo ou coisa assim?

— Ah, não. Foi uma desculpa pra... – Ele passou a mão pelos cabelos e, pela primeira vez, ficou bastante desconsertado – Pra tentar dar minha última cartada com você.

Essa me pegou de surpresa.

— Mas acho que chegou a hora de jogar a toalha. Além disso, o Lord da heterocromia parece possessivo. Ele não pára de olhar pra cá e isso ta me dando medo.

Lysandre estava me observando? Eu olhei para trás bem na hora que ele desviava o olhar para Castiel, que parecia estar resmungando alguma coisa.

Voltei a mirar o surfista:

— Não se preocupe. Lysandre é muito tranquilo. Mas eu posso me cuidar sozinha.

— Bem, eu não quero colocar essas palavras à prova. A gente se vê.

Dake sorriu e deu meia volta, indo embora.

Bom, se até ele pode reconhecer que tem agido feito um idiota, então talvez a humanidade não esteja perdida.

Saí do meio dos alunos e aproveitei que Lysandre estava presente pra me juntar a ele e Castiel.

— Que surpresa boa. – Abracei o braço do meu namorado, que se moveu o suficiente para me dar um beijo sutil na testa – O que fazem aqui?

— Rosalya falou pra encontrarmos ela depois do ensaio. – Castiel revirava os olhos – Eu não acredito que vamos ter que vestir aquele tipo bizarro de roupas de novo.

— Pense nisso como um investimento. Afinal vocês ficam lindos nelas.

Eu podia jurar que Castiel estava prestes a fazer um comentário cínico, mas desistiu no meio do caminho. Verdade que desde que ele soube do meu namoro com Lysandre anda controlando algumas piadinhas.

— Eu vou logo ver o que a Rapunzel tem pra nós.

E foi embora, deixando-nos a sós. Lysandre aproveitou o momento e se virou para mim:

— Aquele rapaz estava lhe perturbando?

— Não, não. Dessa vez está tudo bem. E você? Como está?

— Bem. 

Era muito estranho. Eu não conseguia mais conversar direito com ele. Aquilo não podia continuar. Lysandre não queria falar e eu tinha que respeitar isso, mas não dava pra continuarmos daquele jeito.

Respirei fundo. Algo precisava ser feito:

— Eu realmente sinto pela sua perda, Lys. Queria poder lhe ajudar.

— Não se preocupe, isso passa. Meu pai estava infeliz nos últimos tempos. Internado, debilitado, deixando-nos preocupados... Logo ele que sempre gostou de deixar as pessoas a sua volta bem.

— O que vai acontecer agora?

— Minha mãe quer continuar na fazenda. É onde estão os amigos dela e o resto dos nossos familiares. Mas por enquanto está na casa da minha tia até que algumas coisas do meu pai sejam retiradas. Leigh e eu cuidaremos disso amanhã.

— Sua mãe é tão radiante... Eu torço pra que ela fique bem. E Leigh também é tão gentil e... E tem você nessa história toda.

Ele passou a mão pelo meu rosto, numa carícia terna. 

— Você é um verdadeiro encanto. — Ele sorriu. E era aquele sorriso irritantemente fofo que me impedia de insistir em qualquer assunto ruim – Dou a minha palavra que minha família e eu vamos ficar bem.

Suspirei claramente vencida:

— Pode me prometer uma coisa?

— O que quiser.

— Se algum dia... Sei lá, por algum motivo, você se sentir cansado e precisar de colo, não hesite em me procurar. Nem precisa me dizer qual é o problema, ok?

— ...

Eu esperava que ele me desse uma resposta pronta, mas em vez disso ele ficou em silêncio, aparentemente surpreso. No instante seguinte, o semblante dele minguou e ele baixou a cabeça desolado.

Eu sabia... Lysandre estava muito triste.

— Você tem meia hora livre? – Ele me perguntou abatido.

E eu assenti imediatamente.

 

~ o ~

 

No clube de jardinagem, o único som que se ouvia era o canto de um ou dois passarinhos. 

Lysandre se encontrava deitado de lado no banco da praça, com a cabeça no meu colo e um dos braços cobrindo o rosto. Parecia emocionalmente exausto. Meus dedos deslizavam pelo seu couro cabeludo com suavidade e, em meio às várias carícias, eu podia sentir que seu corpo ficava cada vez mais relaxado. De vez enquanto seus dedos tocavam timidamente a minha mão, mas voltavam a ficar suspensos acima da cabeça.

A perda do pai foi mais dolorosa do que aparentava.

Mas algo dentro de mim dizia que agora ele ficaria bem.

 

~ o ~

 

A noite das eliminatórias havia chegado.

Na entrada, Peggy estava distribuindo vários adereços para tornar o clima divertido. Alexy pegou um óculos escuro grande de plástico, Armin um boné do Luigi e fizeram Kentin colocar orelhas de elfo mesmo este último relutando muito.

— Parem com isso! Eu to parecendo um boboca! — Kentin fazia um bico digno de uma criança de oito anos sendo obrigada a vestir o terninho.

— Você não tem senso de humor não? - Alexy provocava - Vamos aproveitar!

— Eu acho que vou escolher as orelhas de coelho — Falei colocando uma travessa sobre minha cabeça — Lysandre vai achar engraçado.

Alexy me lançou um olhar suspeito:

— Éééé... Não sei se “engraçado” é a palavra certa.

— Ah, vai, eu acho que fiquei fofinha com isso!

— Eu não disse o contrário.

O clima estava bem festivo, pelo menos até Ambre e Li passarem pelo nosso grupo e fazer cara de desdém.

— Que ridículo! Vão tirar pontos da nossa escola por excesso de idiotas!

— Ambre — Priya falava com sutileza — Por que não participa da brincadeira? Vai ser muito divertido.

— Como se eu quisesse fazer origami com esse papel de bobo. Isso é muito brega. — Ela olhou para mim, sabe-se lá por quê — Se bem que mal gosto é a sua cara. Namorar o idiota do Lysandre é bem prova disso.

Revirei os olhos. O que o meu namorado tinha a ver com essa conversa?

— Pois eu acho que o Lysandre ficaria feliz em saber que você pensa assim, Ambre. O coitado do Castiel já tem o azar de ser seu tipo.

Dessa vez toquei num nervo porque ela me lançou um olhar assassino:

— Você não sabe de nada sobre mim e o Castiel.

— Além de que você parece aquele chiclete que ele pisa em cima e não desgruda do sapato de jeito nenhum? É, não sei mais nada.

Ok, eu acho que ela só não me agrediu porque Priya, Kim e os meninos estavam por perto. Ambre respirou fundo e saiu à passos duros, mas antes de ir embora soltou seu último veneno:

— Você é tão insignificante que um dia Lysandre vai acabar esquecendo que namora você.

Meu coração falseou.

Talvez nem mesmo ela saiba que tocou na ferida, pois poucos sabem com detalhes o que realmente aconteceu com o meu namorado, mas... Essa doeu.

Priya me deu um meio abraço e me puxou para perto dos outros:

— Não liga pra ela. Vamos nos divertir.

— Tem razão.

Sentamos juntos na área reservada para os alunos da Sweetie Amoris no auditório e ficamos vendo as apresentações. A torcida de todas as escolas tinham vindo em peso. No entanto - talvez pelo grupo de Lysandre já ter feito um show para o público antes - quando a nossa banda subiu no palco os gritos da plateia se tornaram mais intensos.

— Solta o som, Sweetie Rock! — Kim gritava.

Ouvíamos gritos da plateia e não eram só dos alunos da Sweetie Amoris. Até Viollete estava se empolgando. Claro que eu também não estava quieta. A voz do Lysandre combinada com os arranjos dos instrumentos fazia meus ossos vibrarem de tanta adrenalina.

 Entre um refrão e a próxima estrofe, Lysandre recuou e deu vista para Castiel e Íris. Então começou a batalha de guitarras. Castiel era o primeiro e tocava com a mesma energia que Nathaniel batia nos pratos. As vibrações na plateia aumentavam. Quando ele terminou, foi a vez da Iris tocar e para a minha surpresa ela executou a sequência com habilidade. Os acordes eram mais agudos e melódicos, um pouco mais suaves que os de Castiel. Por fim os dois tocaram guitarras juntos num arranjo simplesmente perfeito enquanto Lysandre voltava a cantar.

— Vamos ganhar!! — Alexy só faltava me esmagar. — Eu tenho certeza que a escola vai usar o prêmio pra fazer uma viagem em grupo!

— Eu achei que o dinheiro seria usado pra financiar nossa formatura - Rosalya também falhava em se desvencilhar do nosso amigo.

— Que vai ser num iate!!

Meu Deus, a imaginação do Alexy é mesmo muito fértil.

O resultado só seria anunciado na semana seguinte em cada escola, mas não era nenhuma novidade que iríamos para as finais.

Quando todo o espetáculo acabou, esperei o auditório esvaziar pra poder sair. Meus pais ficaram de me buscar assim que eu ligasse pra eles, mas eu queria falar com Lysandre antes.

Desviando do verdadeiro desafio que era não colidir com todas as pessoas que caminhavam em sentido contrário ao meu, eu me dirigi aos camarins para ver se encontravam os membros da Sweetie Rock.

— Com licença... Licença... Desculpe... Com licença...

De repente senti alguém segurar meu pulso e quando me virei percebi que era meu namorado.

— Lys! Eu tava lhe procurando.

Ele não respondeu. Estava me olhando com a face rosada e a boca semi aberta.

— Lysandre?

— ...

— Oi? Tem alguém aí? — Eu sacudia a mão na frente dos olhos dele.

— Ah. Perdão. Sinto-me... Estranhamente vulnerável. Você está mais linda do que de costume.

Eu deixei escapar uma risada incrédula:

— É por causa das orelhas de coelho, não é?

— Oh. - Não era brincadeira. Ele realmente não tinha ligado uma coisa a outra — É verdade. Você está irresistível com elas. — Ele então lançou aquele sorriso doce e encantador — Eu gosto de coelhos.

— Por isso as escolhi. Achei que seria engraçado.

— Só acho que corro risco de sair de órbita constantemente se você continuar usando isso.

Ele me puxou levemente para perto, até trocamos um longo beijo.

Talvez as palavras de Ambre tivessem me deixado um pouco paranoica, pois sem pensar duas vezes, acabei abraçando-o receosa, como se eu soubesse que ele escaparia dos meus braços a qualquer momento. No entanto, ao sentir Lysandre me envolver e acariciar minha nuca, acabei me deixando levar. Ele tinha uma áurea branda que conseguia me deixar cada vez mais submersa num mundo onde só existia nós dois.

— Vocês estavam em continentes separados ou o que?

Nos afastamos bruscamente após ouvirmos o comentário corta-clima da Peggy, que estava se divertindo com nossa reação.

— Foi mal.  Ela continuava rindo  Mas essa cena tava muito dramática! Parece até que alguém quase morreu!

— Peggy...  Eu estava vermelha feito um tomate.

Olha só, Rose, agora que o Jack sobreviveu ao Titanic, será que eu posso entrevistá-lo?

— Eu gostaria de poder ir logo pra casa.  Lysandre falava com naturalidade. Preciso viajar amanhã cedo.

— Não se preocupe, não vou demorar. São só umas perguntas bobas. 

Lysandre suspirou e beijou minha mão antes de me deixar para o mar de perguntas da Peggy.

Era hora de ligar para os meus pais.

 

~ o ~

 

 No sábado a tarde, todos os integrantes do musical estavam na escola para um ensaio com um palco montado e toda uma pequena produção. Luzes, máquina de fumaça, cabo de suspensão...

— Acho que só eu tenho um final feliz nessa obra. — Armin comentou.

— O Mágico de Oz termina exilado. — Eu rebati.

— Mas pelo menos ele fica vivo e livre, né? Peggy termina presa, Melody morre esmagada, Kentin vira um zumbi de lata, Alexy fica mudo, o surfista-força-barra vira um espantalho, você tem que se fingir de morta... Peraí, só a Ambre se dá bem nessa história!

— Você só percebeu isso agora?

— E eu saí sábado a tarde da minha casa pra ver a Ambre se dar bem?

— Não é o fim do mundo. Já estamos acabando. Logo você vai poder ir pra casa passar o resto da tarde jogando LoL.

"Muito bem, vamos terminar o primeiro ato." A voz da professora Clarice soava do megafone.

— Dessa vez vamos usar o cabo de suspensão. — Ambre falou perto de mim, num tom provocador — Será que consegue cantar Desafiando a Gravidade la de cima? Não vá tremer a voz, heim?

Eu a ignorei. Nem sei por que ainda me dou ao trabalho de falar com essa criatura. 

—  Em suas posições. —  Ordenou a professora.

Nessa cena, Elphaba encanta a vassoura pela primeira vez e propõe fugir com Galinda - agora chamada de Glinda. É uma bonita cena entre as duas amigas, mas que representava um verdadeiro desafio pra Ambre e pra mim.

E dessa vez eu seria erguida para simular o vôo na vassoura.

Eu estava com um mau pressentimento.

(Eu)

 ♪

Sinto algo novo em mim

Nada será igual

Não vão me sujeitar

À regras que me fazem mal

É tarde pra ter medo

É hora de despertar

O meu instinto chama

E me faz tentar

Desafiar a gravidade

Tentar domar a gravidade

Não vão me alcançar

 

(Ambre)

 ♪

Não percebe o que fez

A sua ilusão de grandeza?

(Eu)

 ♪

Não quero mais limites

Cansei de obedecer

Não sei no que vai dar

Mas hoje eu vou pagar pra ver

Quis tanto ser aceita

Foi tão caro esse amor

Se isso é amor

Não pago mais o seu valor

Vou superar a gravidade

Desafiar a gravidade

Não vão me alcançar

O silêncio da plateia mostrava que todos estavam bastante concentrados. Nesse momento eu abria o meu grimório e fingia usar meus poderes. Então aparecia a vassoura voadora. Eu convidava Glinda para ir comigo, mas ela se recusava e me dava uma capa preta pra me proteger do frio.

Os guardas de Oz invadiram o cenário, e a produção começou a colocar o cabo de suspensão em mim para eu poder "voar".

Meus pés começaram a sair do chão e mesmo nervosa eu conseguia continuar cantando.

Sou eu!

Olhem pro céu do oeste

Lá vão me encontrar

Pois como alguém me disse

Todos tem direito de voar

Eu posso estar sozinha

Mas hoje o céu é meu

Quem duvidava veja

Agora quem venceu

Já sei voar sobre a gravidade

Desafiar a gravidade

E todos vão me respeitar

— E ouçam bem a minha voz, o mágico e toda Oz

Agora vão me ver

Voaaaaar 

Foi a situação mais irônica do mundo. Enquanto o coral cantava em plenos pulmões, contagiados pela emoção da cena…

… O cabo se partiu la do alto.


Continua

 


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