Efeito Borboleta escrita por deboradb


Capítulo 25
Inferno Caótico.


Notas iniciais do capítulo

Volteiiii
Capítulo está beeem tenso, se preparem



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Eu já podia sentir a leveza tomar posse do meu corpo e aos poucos fui abrindo minhas pálpebras, não conseguindo enxergar muito do ambiente por minha visão estar um tanto embaçada. A dor em minha cabeça ainda se fazia presente, tornando-se mais forte a cada segundo, como se o meu crânio estivesse sendo esmagado por uma sequência de marteladas. Mas nenhum daqueles aspectos me intrigou tanto quanto o fato de eu sentir algo quente molhar minha camisa, deixando-a pegajosa em meu corpo. Foi então que eu abaixei o olhar, deparando-me com boa parte da minha camisa coberta pelo sangue que escorria em um fluxo relativamente intenso de meu nariz, deixando-me apavorado. Mas aquilo ainda não era o ápice das consequências, longe disso. Quando minha visão se tornou clara o bastante para que eu pudesse examinar o cômodo onde estava, me vi ainda mais apavorado. Eu havia voltado para o meu quarto na Blackwell, no entanto, o intrigante naquilo tudo era o fato de ele não parecer mais o mesmo. As paredes, a mobília, os livros descansando nas prateleiras, estava tudo sendo consumido por uma espécie de onda vibratória que deturpava o ambiente e fazia dele algum tipo de caixa cósmica. Em outras palavras, era como se o tempo e o espaço estivessem sendo distorcidos, como se a realidade estivesse se partindo ao meio, bem ali, diante os meus olhos.

Em uma tentativa frustrada de concertar as coisas, eu havia criado somente o caos. Apenas o caos dentro do caos. Consequências catastróficas e possivelmente irreversíveis. E como se algo estalasse em meu interior, rapidamente girei meu corpo, deparando-me com a fotografia responsável pela minha estadia naquele momento de um passado próximo. Eu precisava destruí-la, precisava alterar o curso dos fatos para evitar minha ida a São Francisco quando o tornado chegasse à cidade. Foi então que, com as mãos tremulas e os pensamentos se tornando parcialmente nublados, segurei a fotografia por entre meus dedos, rasgando-a ao meio em uma tentativa de expressar minha dor física e mental. Eu já podia sentir a moleza tomar posse de meu corpo, e por mais que eu tentasse permanecer consciente, meus olhos haviam se tornando pesados demais para que eu permanecesse com os mesmos abertos. Eu estava cansado, esgotado, na verdade, sem forças nem mesmo para respirar. Então meus pés simplesmente perderam o equilíbrio e eu me vi indo de encontro ao chão, sentindo tantas coisas que nem conseguia nomear corretamente enquanto era calorosamente abraçado pela escuridão.

[...]

Sussurros abafados, desconexos, misturando-se ao zumbido irritante que incomodava meus ouvidos. Aos poucos minha consciência ia sendo recobrada e juntamente com ela as dores em meu corpo. Era como se eu tivesse sido atropelado por um caminhão, como se meu corpo estivesse sendo rasgado ao meio. Era uma dor excruciante, mas que com o passar dos minutos fora sendo amenizada, tornando-se mais suportável. Por sorte, as pontadas em minha cabeça já não eram mais sentidas, o que de certo modo me causava alivio, mas ainda sim, não deixava de ser preocupante. Aquelas manipulações no tempo estavam me destruindo física e psicologicamente.

Depois de algumas tentativas falhas, finalmente consegui abrir minhas pálpebras, piscando algumas vezes até que minhas retinas houvessem se acostumado com a claridade. E quando este feito foi alcançado, senti toda a força se esvair de meu corpo ao me dar conta de onde estava.

— O quê...? Puta merda! — praguejo, sentindo um calafrio tétrico percorrer minha musculatura.

Eu não sabia bem como descrever o que estava sentindo naquele momento, mas era uma mistura de raiva e pavor, juntamente com algumas doses de desespero. Se por algum momento cheguei a pensar que havia consertado tudo, aquele pensamento fora terrivelmente esmagado pela dura realidade diante os meus olhos. Eu havia retornado a Sala Escura.

— O que você disse, Peeta? — acabo me sobressaltando quando Seneca praticamente se materializa a minha frente. Mas que porra! Aquilo só poderia ser algum tipo de pegadinha de muito mau gosto pregada pelo o universo — Quer saber? Esquece. Só responda a minha pergunta, por favor.

— Vá. Se. Foder. — digo pausadamente, expressando-lhe toda a minha fúria, mas o desgraçado apenas ri da minha cara.

— Boa resposta... — o sorriso presunçoso que há em seus lábios rapidamente se desfaz e sua expressão se torna séria, preocupada, até — Ei, o seu nariz está sangrando. — ele se agacha, segurando firmemente em meu rosto para poder analisar o sangramento, mesmo contra a minha vontade — Eu provavelmente dei a você uma dose muito grande. Sinto muito, Peeta. Mas, considerando que está prestes a morrer, um sangramento no nariz é o menor dos problemas.

Ele afasta-se de modo tão brusco, que minha cabeça acaba sendo jogada para o lado com o seu movimento repentino. E por mais que eu já tivesse uma lista bem extensa com todos os xingamentos mais sórdidos preparados para ele, tive que mantê-los entalados em minha garganta ao notar que o local ao meu lado encontrava-se inteiramente vazio.

— Ah, eu tive que deixar a Glimmer ir. — responde com simplicidade e rapidamente volto minha atenção para ele, encarando-o horrorizado — Não seja idiota, beleza? Ela está exatamente onde merecia estar.

— Não... — murmuro meio cabisbaixo. Aquilo não podia estar acontecendo.

— Ah, como se você se importasse. — ele faz descaso e sinto todo meu corpo vibrar em consequência ao ódio que eu sentia crescer cada vez mais em meu interior — Oh! As suas íris... Essa dilatação, igual a um obturador. — ele deixa o rosto a centímetros do meu, analisando meus olhos com admiração — As fotografias que você está tirando de mim agora enquanto pisca... Isso é fascinante! Ah, Peeta... — suspira audivelmente — Você poderia ter vencido a competição tão facilmente, mas resolveu destruir sua bela fotografia. Que desperdício... Bom, de qualquer modo, isso já foi. E sinto muito por ter queimado suas coisas. — sorri de lado ao ajeitar a postura, apontando logo em seguida para um recipiente que ainda continha algumas pequenas chamas.

As coisas finalmente começavam a fazer sentido em ralação ao fato de eu ainda estar preso ali. O desgraçado havia simplesmente queimado minha agenda com todas as minhas fotografias, impedindo qualquer chance de fuga que eu pudesse ter através da linha do espaço-tempo.

— Acabei indo longe demais. Especialmente por você ter se desenvolvido de nerd a herói em apenas uma semana. — prossegue, com um olhar analisador — Sabe, Peeta? Tem alguma coisa estranha acontecendo com você, e isso é mui... — seu dialogo é interrompido por um estrondo assustador, juntamente com um tremor que faz as luzes do bunker piscarem freneticamente. O tornado! Aquela constatação fez todas as células de meu corpo vibrarem em consequência ao pavor — Uou! Você viu que loucura está lá fora? — ele volta seu olhar sombrio para mim, após tê-lo desviado por porcos segundos, e então abre um sorriso de escárnio — E aí está o medo... Ah, Peeta, foi uma honra trabalhar com você nessas últimas sessões. Espero que essas imagens sejam apreciadas pelo que elas realmente capturaram. A perda da juventude. Pelo menos essa é a última lição que terá que ouvir de mim, e eu prometo que não terá mais sangramento de nariz. — lança-me uma piscadela debochada.

— Sr. Crane, por favor, não faça isso. — meu apelo sai embargado após uma falha tentativa de me soltar — Você não sabe o que está acontecendo...

— Shh... Silêncio, Peeta. — interrompe-me, enquanto se afasta a passos leves para preparar uma dose generosa do líquido branco de aparência inofensiva, porém de efeitos mortais.

Eu não podia acreditar que o universo seria tão filho da puta ao ponto de deixar tudo terminar ali. Aquilo não fazia sentindo. Eu não havia enfrentando todo um mar em fúria para simplesmente morrer na praia, tinha que haver outro jeito.

— Por favor, não faça isso. — suplico em um fio de voz, sentindo o embalo do medo e do desespero me consumir ao vê-lo aproximar-se portando uma seringa.

— Eu prometo que essa última dose não doerá. — fala com tranquilidade, segurando firmemente nas laterais de minha cabeça para ter livre acesso ao meu pescoço.

No auge daquela situação, minha visão já se encontrava completamente embaçada por conta das lágrimas que insistiam em forçar o caminha por meu rosto. Por mais que eu quisesse, não havia nada mais a ser feito a não ser aceitar a minha triste realidade. Depois de tantos esforços, de tanta luta, aquele seria o meu fim. Triste, inesperado, e inapto fim. Então, com a melancolia e a dor apertando o peito por ter falhado, engoli forçadamente o bolo que havia se formado em minha garganta e fechei os meus olhos, querendo ter como última lembrança as orbes tempestuosas e o sorriso genuíno de Katniss.

“Eu te amo, Marrentinha.”

A declaração percorreu por minha mente nebulosa, afogando-me em um mar de sentimentos distorcidos quando a ponta gélida da agulha entrou em contato com minha pele. É o fim... Então o inesperado aconteceu. Um estrondo foi-se ouvido e logo em seguida passos apreçados chocaram-se contra o piso, fazendo Seneca entrar em alerta. Os acontecimentos que vieram logo em seguida se desenvolveram em câmera lenta diante os meus olhos. Haymitch surgiu afoito por entre a porta da sala, com sua arma em riste e pronto para enfrentar qualquer que fosse a ameaça. No entanto, Seneca não se deixou abalar pela afronta do policial e partiu para cima do mesmo com um dos tripés que por ali estavam. Um disparo foi feito, porém a bala ricocheteou em uma das paredes e o revolver foi parar bruscamente do outro lado da sala, assim como o tripé que residia nas mãos do meu ex-professor psicopata. Sem suas devidas armas, os dois então deram início a um combate mano a mano, onde Haymitch saíra como vencedor devido aos seus anos de experiência como combatente do exército.

— Ah, meu Deus! Peeta, você está bem? Consegue se mexer? — Haymitch pergunta aflito, enquanto desamarra apressadamente meus braços e pernas. Entretanto, tudo o que consegui fazer naquele momento foi ficar encarando-o com os olhos semicerrados e o cenho franzido. Os recentes acontecimentos haviam sido tão inesperados que minha mente viu-se atordoada demais para acreditar — Peeta, você está me ouvindo?

— S-Sim... Sim, estou... — finalmente consigo responder, piscando diversas vezes para clarear meus pensamentos — Obrigado, Haymitch... Eu... Obrigado...

— Não me agradeça. Você me trouxe até aqui. — seus olhos encaram os meus com preocupação, e só então noto o avantajado corte em seu supercílio — Mas, primeiramente, vamos prender esse filho da puta! — aponta para Seneca, que se encontrava jogado sobre o chão a alguns metros de distância, com vários hematomas e cortes espalhados pelo rosto — Ele não irá a lugar algum quando acordar, a não ser para a prisão... ou pior. — avisa, enquanto gira o corpo do meu ex-professor, deixando-o de bruços, para logo em seguida amarrá-lo com precisão.

Fico observando-os por alguns segundos, deixando que um suspiro longo e exasperado me escape pelos lábios. Estava sendo difícil digerir tudo aquilo, acreditar que Haymitch havia nocauteado Seneca e posteriormente me salvado, mas o universo não se mostrou tão filho da puta, afinal de contas.

Com a mente fraca e o corpo parecendo pesar mais do que realmente pesava, levantei-me da cadeira, apoiando minhas mãos na mesa mais próxima, enquanto sentia cada músculo presente em meu corpo ser tensionado devido à exaustão. Eu estava completamente acabado, tanto no físico quanto no psicológico. Era um imenso e complexo amontoado de coisas sobre coisas, de problemas, de barulhos, de insanidades. Mas todas aquelas coisas eram somente consequências das minhas ações. Ações egoístas, talvez. Aquilo me fez pensar detalhadamente em como pode ser o sentimento de estar trancado do lado de fora de casa, longe de todas as particularidades, mas pensei novamente em como deve ser terrivelmente pior estar preso do lado de dentro. Eu recordava-me de quando acordei em uma manhã ensolarada e havia uma sensação de possibilidade. E eu lembrava-me de ter pensado: “Esse é o início da felicidade. É aqui onde ela começa. E, é claro, haverá muito mais”. Nunca me ocorreu que não era o começo. Era a felicidade. Era o momento. Aquele exato momento, a manhã em que havia dito a Katniss que a amava. A manhã em que ela zelou por nós. E era recordando-me daquela manhã em questão, onde nos entregamos de corpo e alma, que deixei meus anseios, minhas dores, e minha exaustão de lado, para focar-me somente em como faria para trazê-la de volta. Infelizmente, em um momento de fúria, Seneca havia queimado todas as minhas fotografias, impossibilitando meu propósito de voltar no tempo. Mas, por sorte, ou até mesmo acaso, recordei-me da fotografia que Delly havia tirado na noite da festa no Clube Vortex, eu só torcia para que ela ainda a tivesse.

— Peeta? — chama o ex-militar, utilizando do artifício físico para tomar o lugar a minha frente. Eu nunca havia reparado até aquele momento, mas, Haymitch era totalmente adepto a particularidades, ao modo desordenado que o acaso ditava coisas e pessoas, situações e momentos. Isso era bonito nele, eu tinha que admitir. Contemplava seu ser de um modo intenso, não funcionando igualmente para mim. Algumas coisas deixavam-me propenso a sair de cena, a esquecer da importância de tudo e voltar ao caos dentro da minha própria mente — Onde está a Katniss? — sua voz soou como um burburinho, inclinando-se em minha direção, para muito além de meus ouvidos, para dentro de mim, como um caminhão desgovernado destruindo as barreiras de autocontrole que eu havia criado.

— H-Haymitch... A Katniss... — engulo em seco, sentindo todo o ar ser drenado de meus pulmões enquanto minha visão era embaçada novamente pelas lágrimas — A Katniss... está morta... — falo por fim, de modo quase silencioso, sentindo um incomodo na garganta por minha voz ter soado tão cavernosa e desolada.

O choque por minhas palavras ficara nítido em sua face, já que o mesmo arregalou os olhos e logo tratou de embrenhar os dedos nos fios aloirados de seus cabelos, expondo quase que totalmente seu desespero. Então seus olhos marejaram, e através deles pude enxergar toda a sua fragilidade. Ele a amava. Amava como um pai ama uma filha.

— Isso não está acontecendo... Não pode ser... Não, Deus... — suas pernas pareceram perder as forças, pois o mesmo cambaleou algumas vezes enquanto seu peito subia e descia em um ritmo frenético — A Katniss não... Peeta, você tem certeza? — seus olhos encaram-me suplicantes, agoniados, até.

— Sim, e-eu vi... — minha voz embarga, mas eu a forço a sair mesmo assim — Eu vi o Seneca matá-la no ferro-velho... ontem à noite. — comprimo os lábios, tentando a todo custo conter o líquido salgado e transparente que escapava por meus olhos.

— Ontem à noite... Quando eu estava sentindo pena de mim mesmo no quarto do hotel. — murmura, sua entonação saindo tremula devido à emoção — Eu prometi a Clara que protegeria as garotas, como posso olhar para ela e explicar isso? — ele então desaba, deixando toda a sua dor e remorso serem extravasados através das grossas lágrimas que rolavam sem pudor algum por sua face — Eu nunca disse a Katniss que eu... eu... Que merda! — pragueja, socando fortemente um dos armários que estava a sua esquerda.

Eu nunca o tinha visto naquele estado de desolamento profundo, mas compreendia sua dor, pois era a mesma que a minha. Desorientada, insaciável, sufocante, torturante. E fora exatamente aquela dor, aquele amontoado de sentimentos destrutivos, os responsáveis por eu não ter assimilado a tempo a aproximação repentina de Haymitch para com Seneca.

— Você matou a filha da minha esposa, seu escroto fodido! Você tirou a minha enteada de mim!

Uma arma em riste, e o tom sôfrego e raivoso fora substituído pelo estalar ensurdecedor de um tiro, desencadeando um instável, desordenado, e nocivo inferno caótico. A vida era irônica, cômica, e por vezes trágica, mas não nos permitia vivenciar nada além da realidade.

— Peeta, eu... eu sinto muito... sinto muito por você ter que ver isso. — desculpa-se Haymitch, quebrando o silêncio que havia perdurado por incontáveis minutos após o ocorrido, enquanto mantínhamos nossa atenção em um Seneca de lábios mudos e olhos mortos — Que merda! O que eu fiz? Todo aquele tempo que desperdicei com vigilância... Eu falhei com a Blackwell, falhei com você, com a Katniss... Falhei com a minha família. — o corpo do ex-militar vai de encontro ao chão, enquanto o mesmo desaba em um choro descontrolado, como um bebê que anseia o colo da mãe.

— Você não falhou, deu o seu melhor. — falo com sinceridade, agachando-me ao seu lado para afagar seu ombro. Um gesto simples, mas que eu tinha consciência de que lhe passaria conforto.

— É melhor você sair daqui... — se pronuncia após alguns minutos, limpando as lágrimas e recobrando a postura — Você já passou por traumas o suficiente nesta sala. — completa, encarando-me com polidez, e apenas assinto em concordância.

— Haymitch... obrigado por me salvar. — lanço-lhe um olhar de gratidão antes de sair a passos rápidos do bunker, mas não sem antes pegar as chaves do carro de Seneca. Ele não precisaria mais dele, afinal de contas.

— Delly? Consegue me ouvir? — pergunto no instante em que a loira atente ao telefone. Eu já me encontrava do lado de fora do celeiro, parado ao lado do Maserati na cor preta, enquanto tinha o meu corpo banhado pelas gotículas d’água da desenfreada tempestade.

Peeta?! Caramba, onde você está? — apesar de a ligação estar péssima, era perceptível o tom de preocupação na voz da loira. 

— Não importa... Escute só, você está com aquela foto que tirou ontem à noite no estacionamento? — pergunto de modo aflito. Aquela tempestade estava deixando meus nervos à flor da pele.

Ahn... sim, mas por quê? Não foi uma boa foto...

— Sim, foi sim e eu a quero! Onde você está? — interrompo-a sem rodeios.

No restaurante Winchester. Estou presa aqui com a Clara graças ao clima apocalíptico.

— Estou a caminho.

O quê?! Isso é loucura! Aqui está um completo caos, não dá para você andar pela rua sozinho. Sério, Peeta, fique onde está. Não acho que essa tempestade esteja diminuindo. — aconselha — Estou apavorada aqui.

— Eu também estou, Delly. Mas não acabou ainda, ok? Chegarei aí o mais rápido possível. — aviso, e antes que ela tenha a chance de protestar, encerro à ligação. Talvez eu tenha sido um pouco groso com a loira, mas meu interior encontrava-se tão desordenado que não parei para medir minhas ações ou palavras, estava apenas agindo de modo quase que automático.

Uma vez que o celular já se encontrava devidamente guardado em meu bolso, ajeitei o casaco cinza em meu corpo, com o intuito de proteger-me do frio e caminhei apressadamente para o outro lado do carro, entrando no mesmo e não perdendo tempo em dar partida em direção à cidade. Conforme o veículo ia se aproximando das ruas que levavam ao centro de Arcadia Bay, era possível notar os efeitos caóticos que a tempestade – mesmo ainda estando longe – já havia causado. Casas e comércios em sua maioria destruídos pela força do vendo, assim como inúmeros postes caídos sobre as calçadas e até mesmo sobre as ruas, dificultando minha passagem em certos pontos. Era triste ver toda aquela devastação, e pensar que tudo aquilo poderia ser somente mais uma das tantas consequências causadas pelas minhas ações egoístas de voltar no tempo, deixava meu coração comprimido dentro do peito. Não havia nada mais amargo e corrosivo do que o peso da culpa.

Enquanto mantinha meus olhos atentos na estrada, senti meu celular vibrar no bolso, e ao retirá-lo, notei que era uma ligação da minha caixa postal. Mesmo que meus pensamentos estivessem enevoados devido aos recentes acontecimentos, resolvi atender, e ao fazê-lo, logo a voz eletrônica soou indicando que havia uma nova mensagem, tendo esta sido enviada às 21h de ontem.

Peeta... é o Gale. — meus olhos prontamente se arregalam ao ouvir a voz um tanto chorosa do Hawthorne, e por muito pouco não perdi o controle do carro devido ao choque momentâneo — Eu apenas queria dizer... me desculpa. Eu não queria machucar a Madge, ou a Johanna, ou... Na verdade, eu não queria machucar ninguém. — um soluço rompe em meio à ligação e sinto minha pulsação acelerar. Ele parecia tão quebrado — Eu fui um completo idiota todo esse tempo, principalmente por deixar que as pessoas me manipulassem. Todos me usaram. E o Sr. Crane... ele está vindo me pegar, então toda essa merda acabará logo. Mas antes que isso aconteça, eu preciso te avisar para ficar esperto, Peeta... Assim que ele acabar comigo, você será o próximo. — a linha fica silenciosa por alguns segundos — Desculpa... por tudo. — então a chamada se encerra, deixando-me com a boca seca e os olhos marejados.

Eu sentia sim raiva do Gale, muita raiva, por tudo o que ele havia feito. Mas no fundo ele não passava de um garotinho assustado, que ansiava um pouco de cuidado, de carinho, de amor. Ele poderia ter tido um futuro muito promissor, pois, apesar de nunca ter admitido em voz alta, ele possuía sim um dom incrível para a fotografia. Mas infelizmente havia crescido em uma família instável demais, onde o dinheiro falava mais alto do que os princípios básicos de uma relação familiar. E, apenas imaginar conviver diariamente com pessoas fúteis que carregavam tanta negatividade consigo, deixou-me nauseado. Tal realidade era algo bastante comum, porém rejeitar isso com o intuito de não atormentar-se não fazia o sofrimento por ele vivido deixar de existir, muito pelo contrário, só faziam as coisas se tornarem ainda mais insuportáveis. Gale poderia ter sido tudo, mas em consequência as suas más influências e aos caminhos tortuosos, ele acabou não sendo nada.

Com um suspiro sôfrego e atormentado escapando por meus lábios, estacionei o carro em meio aos destroços espalhados pela rua e fechei os meus olhos com certa força, pressionando minhas têmporas ao sentir uma intensa dor de cabeça despontando. Tentei limpar minha mente, e as lágrimas que trajavam caminhos por minhas bochechas tinham esse mesmo efeito, eliminando consigo as impurezas internas. No entanto, ao sair do carro e me deparar com toda a destruição catastrófica que o tronado estava causando a cidade que um dia representou minha maior alegria, fez-me sentir como se o chão estivesse desmoronando abaixo de meus pés. Eu me sentia sobrecarregado, com medo, inseguro. Minha vontade naquele momento era a de desistir, mas eu não podia, não estava no meu sangue, então apenas segui a passos pesados em direção ao restaurante Winchester, ansiando por algo que pudesse aliviar minha mente aos poucos.

— Peeta! — exclama Clara ao ver-me adentrar o restaurante que, por incrível que pareça, é o único estabelecimento que se encontra inteiro em meio aquele caos — Oh, Deus! Estou tão feliz em vê-lo, querido! Você está bem? — pergunta um tanto agitada após dar-me um caloroso abraço.

— Sim, estou bem. — permito-me sorrir, mesmo que minimamente — E quanto a você e o pessoal? — questiono, intercalando meu olhar entre ela e as poucas pessoas que ali estavam, incluindo Delly, que se aproximou rapidamente para embalar-me em seus braços.

— Estamos bem, na medida do possível. O Winchester quase não está aguentando. Não sei se sobreviverá ao tornado... Enfim, fique aqui com a Delly e aqueça-se. Tenho que voltar para ajudar àquele cavalheiro no chão. — aponta para o homem ferido próximo a algumas mesas — Por sorte, Delly está juntando todo o material de primeiros socorros.

— Não é nada demais, Sra. Everdeen. Mas é tudo o que temos. — Clara sorri para a loira e afaga seu ombro com carinho, afastando-se logo em seguida para cuidar do pobre homem.

— Está tudo bem, Delly? — pergunto preocupado ao ver que o olhar da loira se tornou distante de repente.

— Como diabos eu ignorei todos esses avisos, Peeta? — franzo o cenho, não compreendendo sobre o quê exatamente ela estava falando — A neve... O eclipse...

— Não há nada que você poderia ter feito, Delly. — interrompo-a ao assimilar suas palavras.

— Não, eu sou uma completa idiota! Eu deveria ter previsto isso. — ela prende o lábio inferior por entre os dentes, parecendo segurar-se para não chorar. Então a envolvo em um abraço apertado, tentando confortá-la mesmo com todos os acasos a nossa volta.

— Shh... Vai ficar tudo bem. Eu prometo. — deposito um beijo carinhoso no topo de sua cabeça e ela ergue os grandes olhos azuis – agora um tanto avermelhados pelo choro reprimido – para poder encarar-me.

— Odeio dizer que estou feliz em vê-lo, mas eu estou.

— Tudo bem, o importante é que você está em segurança. — sorrio, enxugando uma lágrima solitária que acabou lhe escapando.

— Eu ainda não acredito que você veio até aqui, em meio a um tornado E6, somente por uma fotografia... Quer dizer, eu sei que você não veio por mim...

— Delly, eu vim por todos vocês. — interrompo-a novamente, expressando-lhe minha sinceridade — Agora, apenas diga-me que está com a fotografia.

— Sim... Aqui está. — a loira entrega-me seu celular, com nossa fotografia estampando a tela — Peeta? — ergo meus olhos ao ouvir seu chamado — Eu não faço ideia do que está acontecendo, mas acredito que você fará a coisa certa quando o momento chegar. — não consigo evitar a surpresa ao ouvir suas palavras, mas sorriu-lhe em agradecimento antes de voltar toda a minha atenção para a fotografia.

Desta vez, eu faria as escolhas certas.

Uma vez que minha atenção encontrava-se totalmente diante a imagem a minha frente, não demorou muito para que os efeitos corriqueiros da viagem no tempo tomassem posse de meu corpo, levando-me para o momento exato em que aquela fotografia havia sido tirada.

— Não temos tempo para essa merda. Vamos logo, Peeta! — pisco um tanto atordoado quando Katniss puxa-me pela mão de modo meio brusco, fazendo o corpo de Delly afastar-se rapidamente do meu. Mas quando o atordoamento passa e meus olhos focam-se nos tempestuosos da morena, apenas envolvo sua cintura com meus braços, enterrando meu rosto em seu pescoço. Era indescritível a sensação de sentir seu cheiro, seu calor, seu coração batendo aceleradamente contra o meu. Eu a amava tão intensamente que, ficar sem ela, era o mesmo que ficar sem respirar.

— Hey... O que diabos está acontecendo? — pergunta visivelmente confusa, afastando-se minimamente do abraço para poder encarar-me de um ângulo melhor.

— Nada. Eu só... precisava muito, muito mesmo te abraçar. — confidencio, sorrindo-lhe com emoção. Os olhos da morena encontravam-se tão acinzentados quanto uma forte tempestade, daquelas que acompanhavam os ventos e que levavam embora o brilho do sol.

— Hmm... Suponho que vocês precisem conversar. — a voz acanhada de Delly surge ao nosso lado, atraindo a nossa atenção. Por um segundo havia até esquecido-me da presença da loira ali — Não se preocupem, está tudo bem. — ela sorri um tanto constrangida antes de dar-nos as costas, seguindo a passos cambaleantes em direção ao dormitório.

— Garota insuportável. — Katniss resmunga a minha frente — Vamos, Peeta. Temos que encontrar o Gale agora. Ele precisa pagar pelo que fez a Johanna. — sem esperar por qualquer reação minha, a morena começa a direcionar-se para a entrada do ginásio.

— Katniss, espere! Eu tenho algo importante para lhe contar. — dou uma pequena corrida para acompanhar os passos apreçados da mesma.

— Eu posso andar e ouvir ao mesmo tempo, ok? — rebate com certa indiferença, fazendo-me bufar diante sua teimosia.

— Pare e me escute pelo menos uma vez! — ralho ao puxá-la pelo braço, fazendo-a parar bruscamente a minha frente.

— Tudo bem, Conquistador. Estou ouvindo. — resmunga, cruzando os braços de forma impaciente.

— Katniss... — começo, soltando um suspiro sôfrego — Você não pode ir a essa festa. Você irá... morrer ser for.

— O quê? Droga, Peeta! Você usou seus poderes de novo, não foi? — seus lábios se contorcem em uma careta desgostosa.

— Eu tive que usar, Katniss! O Seneca matou você e outras pessoas! — revelo, vendo suas orbes acinzentadas se tornarem maiores devido a surpresa.

— Seneca? O professor de fotografia? — assinto — Mas como? O Gale que é o maldito do assassino em série! Nós vimos às provas! — seu tom de voz sai esganiçado, enquanto sua expressão demonstra incredulidade. Eu não podia culpá-la, era difícil acreditar que um cara tão gentil e carismático como Seneca Crane pudesse ser capaz de cometer tais atrocidades. Mas ele era a definição perfeita de lobo em pele de cordeiro — Peeta, onde está o Gale? — questiona, encarando-me com profundidade, como se já houvesse matado a charada, o que acabou me arrancando um suspiro pesaroso.

— Morto. — murmuro meio cabisbaixo — Seneca o matou.

— Morto? Aquele filho da puta já está morto? — questiona a si mesma, enquanto leva as mãos aos cabelos nervosamente — Peeta, você pode me dizer exatamente o que aconteceu? Por favor?

E foi exatamente o que eu fiz, contei-lhe tudo, absolutamente tudo o que havia acontecido até aquele momento presente, tendo que fazer leves pausas em um ou outro momento, já que minha garganta encontrava-se rudemente dolorida em consequência as palavras, que mais pareciam espinhos cada vez que saiam por meus lábios. E a cada relato exposto, as expressões de Katniss revezavam entre as mais remotas emoções, sendo a mais fiel delas a raiva, que foi a que prevaleceu quando a morena sugeriu irmos atrás de Seneca.

— Katniss, eu passei por muita coisa para voltar até aqui. Mas eu não podia deixar você morrer. — minha voz acabou embargando diante todas as emoções que eu vinha segurando, mas que naquele momento estavam simplesmente transbordando em forma de lágrimas — Você me trouxe de volta, não posso perdê-la de novo... E não vou. — asseguro, aproximando-me dela para tomar suas mãos nas minhas.

— Ah, Peeta... Sinto muito... Eu... — seus olhos estavam baixos e tristes, mas ainda sim, se mantinham presos aos meus — Fui eu quem arrastou você para toda essa merda. Ninguém, muito menos você, deveria passar por isso... Mas temos que deter o Seneca. Temos que matá-lo.

— Não! Não dessa forma, Katniss! — afasto-me dela em um movimento brusco, negando veementemente — Não posso continuar concertando as coisas se só o que faço é continuar estragando tudo! Eu sei como isso acabará e temo estar fodendo todas essas realidades alternativas. — acabo soltando sem perceber, mas quando tomo consciência de minhas palavras, comprimo os lábios e fecho os olhos com força, sentindo mais lágrimas tomarem o caminho de minhas bochechas. Droga!

— Realidades alternativas? Do que você está falando, Peeta? — a sonoridade de suas palavras exala confusão, e acabo xingando-me mentalmente — O que você fez?

— Eu fodi tudo, Katniss... — abro minhas pálpebras somente para encontrar as orbes tempestuosas da morena sobre mim — Eu queria ajeitar as coisas, mas acabou dando tudo errado.

— Peeta, do que diabos você está falando? — de cenho franzindo e olhos apertados, ela deu um passo à frente, exigindo de forma silenciosa uma explicação.

— Fui capaz de voltar no tempo para o último dia em que o Thomas estava vivo. — começo de forma cautelosa — Eu o impedi de sair, mas... mas você acabou em um acidente de carro. Você ficou completamente paralisada. E estava sofrendo, morrendo lentamente. Então você pediu para que eu... acabasse com a sua vida. Mas, Katniss, não tinha como eu fazer aquilo. Eu tive que voltar para essa linha temporal para vê-la novamente. Eu tive... — minhas palavras se rompem em meio ao choro e rapidamente sou amparado pelo abraço reconfortante da morena.

— Isso deve ter sido tão difícil para você... Sinto muito, meu amor. Sinto muito por ter pedido isso a você. — seu tom de voz sai falho e ela acaba intensificando o aperto de seus braços em tordo de meus ombros.

— Foi pior para você, mas eu não fazia ideia do que aconteceria. E, como sempre, estraguei tudo. Mas eu nunca quis machucá-la, nunca. Você tem que acreditar em mim. — afasto minimamente nossos corpos, e só então noto o rastro de lágrimas em suas bochechas. Ela havia chorado silenciosamente em meu ombro, assim como fiz no dela.

— É claro que eu acredito, seu bobo. — sorri, mesmo que tristemente, antes de repousar sua testa na minha — Você acha que eu conseguiria lidar com essa situação? Porque eu certamente não conseguiria. Ninguém conseguiria. Mas o importante é que estamos juntos novamente.

— Você tem razão. — suspiro, acariciando seu nariz com o meu após roubar-lhe um selinho — É por isso que você deve vir comigo, para que possamos ficar juntos e vivos.

— Mas e o Seneca? Você acha que deveríamos deixá-lo se safar com as torturas e os assassinatos?

— É claro que não! E é por isso que contaremos tudo ao Haymitch, incluindo o fato de a Glimmer estar em perigo. Ele irá detê-lo, sei disso. — asseguro.

— Certo. — suas orbes intensas analisam-me cuidadosamente por alguns segundos — Céus! Você passou por tanta coisa.

— Muita coisa. — solto uma risada sem humor, enquanto sinto meu corpo torna-se mais leve — Escute só, Marrentinha. Em alguns minutos, não saberei o que aconteceu. Absolutamente nada. Então você terá que me contar tudo o que acabei de falar e fazer, está bem?

— Você acreditaria em mim? — vejo um lampejo de insegurança cruzar sua imensidão acinzentada.

— Eu sempre acreditarei em você, Katniss. — sorrio ternamente, recebendo seus lábios macios sobre os meus em um beijo repleto de carinho e paixão, para segundos depois ter minha consciência levada pela escuridão. 


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Notas finais do capítulo

Estamos definitivamente na reta final pessoal, falta MUITO pouco mesmo para o encerramento da história. Por isso se preparem, porque as tensões no enredo só ficarão ainda mais complexas. Agora é tudo ou nada kkkkk

Bom, espero que tenham gostado do reviravolta que houve em relação aos acontecimentos. Haymitch não era uma pessoa ruim, afinal de contas, apenas estressado demais kkk

Beijos, até o próximo ♥



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