Efeito Borboleta escrita por deboradb


Capítulo 23
Sala Escura.


Notas iniciais do capítulo

Volteiiiiii



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/743262/chapter/23

Silêncio. Inquietante e tortuoso silêncio. Mas este, porém, perdurou apenas poucos segundos e logo fora preenchido pelo tique-taque continuo de um relógio. Pelo barulho do ar se movendo pela tubulação. Pelo estalar de insetos se chocando contra alguma lâmpada. Pelo som entrecortado que emanava de alguma estação de rádio... Todo aquele conjunto de pequenos barulhos mais parecia sussurros irritantes sendo despejados em meus ouvidos. Eu queria poder falar, gritar, até mesmo abrir os olhos, no entanto, minhas pálpebras pareciam pesadas demais e o estado em que eu me encontrava era de uma sonolência absurda. Era como se eu estivesse preso a uma incansável montanha-russa de sentimentos instáveis e inoportunos. Eu não conseguia descrever aquela sensação, era algum tipo de vazio, mas que ocasionalmente se tornava barulhento demais em minha consciência recém recobrada, misturando-se aos meus pensamentos confusos e incertos. Minha mente parecia fervilhar com aspirações profundas de questões dolorosas e situações difíceis que eu havia acabado de enfrentar, como flashes, sendo disparados em formas de imagens torturantes do que havia acontecido.

Katniss...

O nome da morena veio como um sopro desesperado em meus tímpanos, e como resposta, meus olhos se abriram de modo súbito. Era como se meu corpo inteiro houvesse levado um choque, ou como se minha alma houvesse retornado ao corpo após algum evento atordoante. Senti vibrações de energia percorrerem cada centímetro de meus músculos e minhas retinas fervilharam devido à claridade excessiva. Tudo girou diante os meus olhos naquele momento. Quando consegui novamente me situar, me vi ainda mais perdido do que antes, só que agora estava em uma sala toda em tons de cinza equipada por câmeras e instrumentos de produção. Foi então que, como um insight perfeito, o reconhecimento surgiu em minha mente. Eu estava na maldita Sala Escura.

Uma fisgada um tanto incomoda acabou atingindo a lateral esquerda de meu pescoço quando tentei mover minha cabeça, o que não foi uma boa ideia, já que a mesma pareceu pesar uma tonelada. Entretanto, ainda incomodado com a dorzinha na lateral de meu pescoço, tentei erguer minha mão até o local para verificar, foi então que veio a surpresa. Eu estava firmemente amarrado em uma cadeira sem qualquer chance de fuga. O desespero então começou a tomar posse de todo o meu ser e, juntamente com todas as sensações inoportunas, me vi sufocado, agonizando em meus próprios sentimentos oscilantes.

— Tem alguém aí? Por favor, socorro! — peço em um quase grito, obtendo como resposta apenas um gemido baixinho.

Em um movimento um tanto brusco, giro meu pescoço em direção ao som, e meu olhos prontamente se arregalam ao capturar a imagem desacordada de Glimmer jogada no chão, apenas alguns paços de distância a minha esquerda.

— Glimmer... Hey, acorde. Vamos, acorde! — minha voz sai embargada e rapidamente tenho minha visão embaçada por contas das lágrimas ao ver que ela não reage — Mas que droga! — praguejo. Seneca provavelmente havia nos dopado com a mesma droga utilizada em Madge.

Deixando que um suspiro cansado e impotente me escapasse pelos lábios, acabei avistando um carrinho com objetos como: álcool, luvas de látex, pequenos sacos de algodão e uma caixa com seringas ainda intactas. Aquilo acabou me arrancando uma breve careta juntamente com uma embrulhação no estômago. Mas o objeto responsável por prender completamente a minha atenção, foi uma fotografia que ali em cima repousava. Uma fotografia minha, onde eu me encontrava desacordado no chão daquela sala, em uma posição quase igual à de Glimmer. Após analisar a fotografia por alguns segundos, percebi que a mesma parecia ter sido tirada a pouco menos de uma hora. E nas condições em que me encontrava, voltar no tempo seria a única maneira de encontrar uma saída, mesmo que eu tenha prometido a mim mesmo nunca mais fazer aquilo.

Limpando minha mente de qualquer pensamente torturante que insistia em me atormentar, foquei toda a minha atenção somente naquela fotografia. Milésimos de segundos, este fora o tempo que levou até que as luzes se tornassem fortes demais para meus olhos suportarem e então, gradativamente e de repente, me vi sendo sugado para dentro daquela imagem.

— Esse ângulo destaca a sua pureza, está vendo? — a voz grave e um tanto abafada chega aos meus ouvidos na companhia do click de uma câmera — Apenas a pura expressão... Nossa! Olhe esse rosto perfeito...

A voz prosseguiu com seu monólogo e forcei minhas pálpebras a se abrirem, deparando-me primeiramente com a claridade, que veio tão forte que quase queimou minhas retinas. Mas ao me acostumar com a mesma, pude enxergar a silhueta de Seneca agachado a minha frente com uma câmera apontada em minha direção. Com um pouco de esforço tentei mover meu corpo, mas esta fora uma péssima ideia, já que Seneca acabou se exaltando e desferiu um chute na base de meu abdômen. Estava tão entorpecido por conta da droga injetada em minhas veias que nem a dor eu senti, o que acabei agradecendo mentalmente.

— Mantenha-se quieto! — ordena com acidez, voltando a direcionar a câmera para mim, dando início a mais uma sequência de fotografias.

No entanto, acabei remexendo-me novamente, incomodado com os flashes contínuos que emanavam da câmera. Minha visão ainda encontrava-se levemente embaçada em consequência aos efeitos da droga, mas nítida o suficiente para permitir-me enxergar a expressão raivosa que dominava a face de Seneca.

— Que merda, Peeta! Você fodeu com a minha fotografia! — rosna, pondo-se de pé em um sobressalto, quase fazendo os óculos caírem de seu rosto — Mas não se preocupe, temos todo o tempo do mundo. Por enquanto. — abre um sorriso perturbador e doentio — Eu sabia que você era especial assim que vi sua primeira selfie... Sim, eu ainda odeio essa palavra. — ele solta uma risada debochada antes de voltar a me fotografar — Mas eu amo a pureza da sua própria imagem. Não como a Johanna, que sempre olhava para os lugares errados. Pobre Johanna. — estala a língua e balança a cabeça em um falso lamento — Queria que o Gale pudesse ver esse cenário. Ele se esforçou tanto, mas você não pode só usar alguns sujeitos aleatórios e esperar um estilo ou tema coerente. Mas ele tinha um bom olho para sombras. E um bom olho para várias outras coisas, como sua família de elite descobrirá junto com Arcadia Bay... — ele envolve uma de suas mãos revertida pela luva de látex em meu ombro, movendo minimamente meu corpo para capturar um novo ângulo — Ótimo... Excelente... Ah, esses olhos... É uma pena você ser tão xereta, Peeta. Mas essa sala é vigiada 24 horas por dia, então só precisei mandar uma mensagem do telefone do Gale para você cair direitinho em minhas mãos. Você deveria ter se concentrado nos deveres de casa ao invés de bancar o detetive pessoal com sua namoradinha.

— Katniss... — o nome da morena não passa de um sussurro ao sair de meus lábios, porém a voz nem de longe parecia ser a minha.

Katniss, isso. É, desculpe-me por ter matado... por o Gale a ter matado em legítima defesa. Mas ela tinha um histórico problemático como a maioria das pessoas que vivem em Arcadia Bay. Ninguém achará isso surpreendente. Nem mesmo se importarão. — sinto meu peito inflar tamanha raiva que sinto ao ouvir suas palavras, mas infelizmente não havia nada que eu pudesse fazer, pelo menos não naquele momento onde meu corpo e minha mente encontravam-se entorpecidos demais para qualquer ação — Mas eu prometo que as pessoas se importarão com a sua morte hoje, Peeta. Não menti quando disse que você tinha um “dom”. — seus olhos encaram os meus de forma perturbadora — Agora deixe-me prosseguir com minha sessão fotográfica... Sim, agora está legal... Talvez mais um close ou outro... — flashes e mais flashes são disparados diante os meus olhos, deixando-me ainda mais desnorteado.

A raiva só crescia cada vez mais dentro de meu peito, fazendo-me puxar o ar com certa dificuldade para meus pulmões. Inclinei o rosto para o lado, com o intuito de esconder-me dos flashes enquanto tentava soltar minhas mãos das amarras, falhando miseravelmente na tentativa. Minha vontade naquele momento era de socar a cara de Seneca até que o mesmo ficasse completamente desfigurado, porém, o maldito efeito da droga que percorria cada centímetro de minhas veias impedia-me de cometer tal ato. Mas se ele achava que sairia daquela impune, estava redondamente enganado. Eu estava determinado a mandá-lo com uma passagem só de ida para o inferno.

— Peeta, não se mexa muito, por favor. Preciso que você pose e seja enquadrado do meu jeito! — ralha; como se estivesse falando com uma criança que cometera alguma travessura — Talvez uma nova dose o acalme... — lança-me um sorriso nefasto antes de se afastar, indo até a pequena mesa onde se encontravam as drogas.

— Não... Não... — murmuro em um estado agonizante, começando a me debater freneticamente com o intuito de livrar-me daquelas malditas amarras, mas fora tudo em vão.

Os sussurros desesperados estavam morrendo em minha garganta conforme minhas forças – que já eram mínimas – iam se esvaído aos poucos. Foi então que eu fechei os meus olhos, sentindo o meu peito arfar enquanto um turbilhão de imagens bombardeava minha mente. Eu sentia uma vontade imensa de chorar com tamanho desespero, medo, e, sobretudo, revolta. Mas eu não iria fraquejar, não diante aquele psicopata que um dia eu cheguei a chamar de professor.

— Agora não se mexa, ou isso doerá... muito. — ele sorri de forma cínica ao agachar-se a minha frente para fechar uma de suas mãos em torno de meu pescoço, enquanto a outra é utilizada para segurar a seringa com a droga.

— Seu infeliz, maldito! Largue-me agora! — grito enfurecido e como resposta, ele apenas solta um riso debochado, apertando ainda mais os dedos em torno de meu pescoço.

Acabei engasgando enquanto sentia o ar sumir de meus pulmões a cada segundo que passava nas mãos daquele ser doentio. Foi então que, com o restante de forças que ainda possuía, consegui erguer uma de minhas pernas para chutar o carrinho de equipamentos que estava posicionado a nossa esquerda, fazendo o mesmo se chocar contra um dos suportes de iluminação. O impacto fora tão forte que acabou levando alguns tripés e câmeras juntos, causando estrago suficiente para fazer Seneca se afastar abruptamente, completamente enfurecido por minha ação.

— Seu filho da puta! — um grito de dor rasga minha garganta quando ele acerta seu punho fechado em meu rosto, fazendo sangue jorrar por meus lábios. O efeito da droga já não estava mais tão presente em minhas veias, afinal de contas — Você não escuta, não é?! Na verdade, você nunca ouvia direito as minhas aulas... Se tivesse, saberia que isso tudo aconteceria. — ele aproxima-se de mim, ficando a apenas alguns centímetros de distância, mantendo seus olhos doentios fixos nos meus. Com tal proximidade era possível notar o quanto seu corpo tremia, totalmente descontrolado enquanto as gotículas de suor escorriam por sua testa — Sabe de uma coisa? Você é bem persistente, Peeta. Fiquei de olho em você e notei que andou agindo de forma destemida nessa semana, talvez mais do que agiu a vida inteira... — segura meu rosto com força, fazendo-me gemer de dor — Lembre-se da minha regra número um: nunca... perca... o momento. — fala pausadamente e antes mesmo que eu tenha a chance de absorver suas palavras, sinto a textura metálica da agulha atravessar a pele sensível de meu pescoço.

Minha visão, que já se encontrava embaçada por conta das lágrimas que em momento algum permiti serem derramadas, logo nada mais enxergava devido a forte claridade. Foi então que o meu corpo relaxou, amoleceu, para segundos depois ser sugado pela força altamente gravitacional da linha do tempo. Às imagens ao meu redor se tornaram apenas borrões incompreensíveis, obrigando-me assim a fechar os olhos de um modo súbito, e quando voltei a abri-los, lá estava eu novamente, amarrado naquela cadeira posicionada no centro da sala.

Aquele desgraçado!

Um suspiro pesado escapou por meus lábios e naquele momento um único rosto surgiu em minha mente, o rosto de Katniss, fazendo com que meu peito arfasse pesado, dolorido. Aquele maníaco doentio havia a matada sem nem ao menos pensar duas vezes, como se a presença da morena não passasse de algo insignificante, como se ela não fosse nada. Arfei novamente, mas diferente de segundos atrás, desta vez fora de revolta, ódio e completa indignação. Eu faria aquele puto desgraçado pagar por todo o mal que havia causado.

— Hmmm... — um gemido um tanto rouco ecoa por toda a sala e quando direciono meus olhos para o mesmo, avisto Glimmer, remexendo-se sobre o chão enquanto desperta.

— Glimmer... Hey... É o Peeta... Consegue me ouvir? — pergunto, observando os olhos da loira serem abertos de forma lenta e preguiçosa.

Em primeiro momento ela parece um tanto atordoada, pisca diversas vezes e acaba franzindo o cenho ao observar com atenção o ambiente a sua volta, até que suas belas orbes esverdeadas se fixam nas minhas, arregaladas, amedrontadas.

— Peeta... Ah, Deus, onde... onde nós estamos? O que está acontecendo? — questiona, embaralhando-se um pouco nas palavras, tanto pelos efeitos da droga como pelo desespero.

—Nós fomos drogados Glimmer, assim como a Madge... — engulo em seco, tentando não transparecer todo o meu nervosismo através das palavras — Você se lembra de como chegou aqui?

— Não... Eu não... Eu não sei... — sua voz sai embargada devido ao choro iminente — Espere... Você me avisou. Avisou sobre o Gale... Foi quando fui pedir ajuda ao Seneca e ele começou a ficar estranho. Essa é a última coisa de que me lembro. — ela funga baixinho — Eu não consigo mexer minhas mãos... Socorro, Peeta... Por favor... — o choro vem tão intenso e desesperado que o corpo da loira se contrai em consequência aos soluços.

— Glimmer, eu preciso que você se acalme e me escute com atenção, está bem? — ela assente, e mesmo que com muito custo, consegue controlar o choro — Ótimo... Olha, o Seneca é o responsável por estarmos aqui, foi ele quem nos sequestrou e ainda por cima está usando o Gale. Esse cara que se diz nosso professor é um grande filho da puta muito perigoso, então temos que sair daqui antes que ele volte.

— Não acredito que isso está acontecendo... Eu não quero morrer assim, Peeta... — seus olhos se encontram com os meus, permitindo-me enxergar todo o medo e aflição que naquele momento transbordavam através de suas orbes esverdeadas.

— Ninguém aqui irá morrer, Glimmer. — asseguro, tentando trespassar-lhe calma e segurança, duas coisas que naquele instante nem eu mesmo possuía — Eu tenho um plano, ok?

— Peeta, estou com tanto medo... — uma nova onda de grossas lágrimas volta a banhar as bochechas da loira, cobrindo os rastros das que já haviam secado.

— Eu também estou, acredite. Mas não temos tempo para ficar com medo... Temos que contra-atacar agora. — enfatizo. Minha voz e expressões faciais até poderiam exalar calmaria, mas por dentro eu me encontrava como uma verdadeira tempestade.

— Peeta, não consigo nem mexer os braços... como vamos contra-atacar? — questiona, enquanto tenta inutilmente enxugar as lágrimas.

— Glimmer, eu não vou deixar esse psicopata se safar. Só preciso que você seja forte, não irei conseguir fazer isso sozinho. — argumento — Precisamos agir agora, enquanto ainda estamos lúcidos. Se ele nos drogar novamente, esqueceremos tudo.

— Não sou forte, Peeta. Olhe para mim... Olhe o que eu fiz com a Madge. — sua voz sai falha e ela balança a cabeça negativamente.

— Estamos juntos nessa, ok? Vai ficar tudo bem.

— Não acredito que isso está acontecendo... que o Seneca faria isso comigo... com a gente... — murmura um tanto perdida antes de fechar os olhos com força, e esse simples ato faz mais lágrimas lhe escaparem.

— Glimmer, nós iremos fugir de alguma forma. Eu prometo. — garanto, sentindo um leve aperto no peito ao ver a garota mais popular da Blackwell, a que eu jurava odiar até poucas horas atrás, tão frágil e indefesa sobre aquele chão frio.

Soltando um suspiro sôfrego e profundo diante aquela nossa situação, intensifico o aperto de meus dedos em torno do braço da cadeira, em uma tentativa de expressar a dor física e mental enquanto estudo minuciosamente tudo ao meu redor, até ter meus olhos fixados em uma nova fotografia repousada sobre o carrinho de objetos a minha direita. Acabo franzindo o cenho ao encará-la, notando que diferente da outra, onde eu me encontrava jogado sobre o chão em um estado critico entre o lúcido e o inconsciente, nesta eu me situava exatamente ali, sentando naquela cadeira enquanto mantinha os olhos abertos, mesmo que um tanto perdidos.

Isso pode funcionar... Por favor, que funcione...

Faço uma suplica mental antes de concentrar-me naquela imagem, sendo direcionado para aquele exato momento em questão de segundos. E lá estava Seneca novamente, agora posicionado atrás de uma câmera apoiada em um tripé, tirando incontáveis fotografias de uma versão “grogue” da minha pessoa.

— Estou conseguindo algumas imagens espetaculares aqui, Peeta. — comenta com um sorriso sínico — Sim, a Glimmer mataria para tomar o seu lugar, mas ela não entende a nossa... ligação. — seu olhar sobre mim é igual ao de um predador — Você é o vencedor, Peeta. Eu escolho você, o seu retrato.

— Vá se foder! — cuspo as palavras, e como resposta ele apenas balança a cabeça, divertindo-se com a situação.

— Você está agitado demais, meu caro aluno. Sei que está com medo... Todos vocês possuem um olhar inocente quando acordam aqui, que é rapidamente substituído pelo medo ao descobrirem o que está prestes a acontecer. — seu tom de voz, por mais contraditório que seja devido às circunstancias, sai de um modo ameno.

— Por que você está fazendo isso, Seneca? — questiono, sentindo uma leve embrulhação em meu estômago.

— Ah, Peeta, fico contente por você ter feito essa pergunta. — ele ajeita os óculos em sua face antes de prosseguir — Basicamente, sou obsecado com a ideia de capturar a inocência no momento em que ela se corrompe, essa troca do preto e branco para o cinza, e além. — se agacha a minha frente, seus olhos sombrios brilhando em êxtase ao andar da explicação — A maioria das modelos são cínicas, por isso perdem a ingenuidade. No entanto, algumas alunas da Blackwell carregam a esperança e o otimismo como uma aura. E essas sortudas se tornam minhas modelos, meus temas. Mas o louco de tudo isso é que você é o meu primeiro modelo masculino... Não costumo trabalhar com garotos, pois seus traços não possuem a leveza, a delicadeza feminina, entende? — ele inclina a cabeça levemente para o lado, analisando cada traço de meu rosto — Mas você, Peeta. Você possui algo que não sei explicar, algo que me deixa intrigado... fascinado.

— Você é um psicopata! — esbravejo, despejando toda a minha raiva e repudia sobre ele.

— Ao contrario, Peeta. Eu sou tão são que ninguém sabe o que está acontecendo com você agora. — ele se põe de pé, lançando-me um sorriso vitorioso — Como pode ver, a Bela Adormecida aqui está muito acabada para as minhas lentes gentis... — aponta para uma Glimmer desacordada a minha esquerda — E nem vamos falar sobre a sua falecida parceira. Já estou de saco cheio dessas putas punks desde a minha época em Seattle.

— Seu desgraçado, filho da puta! Não ouse tocar no nome da Katniss! Você não tem esse direito! — grito enfurecido, sentindo meu peito arfar tamanha dor e angústia — Eu vou fazer você pagar caro por tudo o que fez, Seneca! Muito caro!

— Ela estava com uma arma carregada. Foi em legitima defesa. — ergue as mãos em um falso e debochado sinal de rendição, abrindo um sorriso tenebroso logo em seguida — Mas é isso que acontece quando você brinca com armas... ou tenta me foder.

— Você fala demais, cara. — resmungo irritado — Tudo que eu consigo pensar agora é no quanto eu odeio a sua voz... e você.

— É melhor você saboreá-la bem, Peeta, já que é a última coisa que ouvirá. — ri maldosamente, fazendo um arrepio macabro percorrer toda a extensão de minha coluna — Ah! Isso foi de arrepiar. Seu rosto até mudou de cor... Maravilha!

— Você não irá se safar dessa. Espero que saiba disso. — ameaço, tentando a todo custo camuflar o medo para que este não seja visível em minha voz.

— Sabe, quando você contou ao diretor que fiz a Madge chorar, por um momento achei que tivesse me pegado. Ainda bem que o nosso honrado diretor Snow é como a maioria dos administradores: um alcoólatra no armário. — ri de modo desdenhoso — Eu sei que os Hawthorne passarão por um enorme escândalo quando a cidade descobrir que deveres de casa o filho de elite deles andou fazendo.

— Eu achei que o Gale fosse uma grande ameaça... e ele realmente é, mas tudo porque foi usado por você!

— Prefiro o termo manipular. Como uma imagem... foi fácil lidar com o Gale. Um pobre garoto perturbado que só queria atenção, então eu lhe dei, e acabei me tornando um tipo de “imagem paterna” para ele. — revela sem nenhum tipo de remorso — Acontece bastante entre alunos e professores. Foi até um pouco tocante no começo.

— Você contou a ele tudo sobre os seus planos na Blackwell? — questiono, ajeitando-me melhor no encosto da cadeira.

— Não seja idiota, Peeta. Eu disse apenas o que ele queria ouvir e em troca, tive acesso à fortuna da família Hawthorne. Quem você acha que pagou por todo esse equipamento e essa Sala Escura gloriosa? — ele ergue as sobrancelhas em obviedade ao apontar para o ambiente ao nosso redor — De que forma você acha que eu conseguiria todas essas drogas novas para os meus temas?

— A Johanna foi sua vitima, não o seu tema. — rebato, completamente desacreditado com o cinismo e frieza daquele ser a minha frente. Em pensar que eu o tinha como maior exemplo e inspiração. O quão tolo eu fui? Mas era como dizia o ditado. Quem vê cara, não vê coração.

— Ah, Johanna Mason... Essa sim foi uma verdadeira tragédia. — ele solta um suspiro frustrado e um tanto pesaroso — O Gale achou que conseguiria ser um artista como eu, mas em vez disso, o idiota exagerou na dosagem da droga e acabou a matando de uma overdose acidental. — revela, fazendo o ar se esvair por completo de meus pulmões. Mesmo não a conhecendo pessoalmente, era doloroso saber a forma tão infeliz e ocasional que a morena de olhos caramelados havia morrido.

— Porque a Johanna? — a pergunta sai de meus lábios em um sussurro angustiado.

— Não tenho tempo para contar tudo, mas ela era... especial. Um cameleão humano. Tantas possibilidades visuais... Tínhamos uma verdadeira ligação. — ele desvia os olhos dos meus por poucos segundos, mas o suficiente para me fazer notar que o ocorrido trágico com a morena de mechas avermelhadas havia o afetado mais do que ele se permitia demonstrar.

— Ela deixou... — pigarreio para limpar a garganta — Ela deixou você tirar fotografias dela?

— Sim... Johanna estava apaixonada por mim, Peeta. — revela e sem perceber, acabo fazendo uma careta — Não estou sendo egocêntrico, ok? Basta apenas olhar todas as nossas sessões fotográficas. Não que eu vá deixar, é claro. Mas acredite; ninguém amou tirar as fotos tanto quanto ela. — ele abre um sorriso gentil, mas ao se dar conta disso, rapidamente endurece a expressão — Enfim, Johanna está morta. Mas sem lágrimas, Los Angeles a mataria de qualquer forma. Então veja isso como um favor.

— Você é um doente...

— Não, Peeta. Eu sou um artista. — interrompe-me — E não se faça de bonzinho quando, na verdade, deu uma baita de uma surra no Gale.

— Eu sei que o que fiz não foi certo, mas eu me importei mais com o Gale do que você! — retruco, olhando-o diretamente nos olhos, somente para ver suas orbes sombrias brilharem enraivecidas.

— Não mesmo! — eleva o tom de voz, mas rapidamente se recompõe — Só é uma pena ele ter caído na tentação da Johanna. Ele realmente achou que poderia imitar o que faço com uma câmera e um tema... Tal pai, mas não tal filho.

— Onde o Gale está agora? — arrisco perguntar.

— Morto e enterrado. — sua resposta vem fria e cortante, fazendo-me arregalar os olhos tamanha surpresa — Depois do que ele fez a Johanna, eu sabia que não poderia mantê-lo como protegido por muito tempo. Agora a polícia nunca encontrará o corpo dele... Você finalmente entende agora, Peeta? Não posso comprometer a minha visão com amadores qu...

— Você é um amador! — interrompo-o de modo exasperado — Olhe para o rastro de morte que deixou para trás! Não pode colocar toda a culpa no Gale. E quer saber? Eu não me importo com o que faça comigo, mas uma coisa eu te garanto, Sr. Crane... — sorrio-lhe com desprezo e repulsa, inclinando meu corpo para frente para ter certeza de que ele veria o ódio fervilhar em meus olhos — Você irá morrer, seu grande filho da puta! Pela Katniss.... Pela Johanna...  Por todo mundo!

— Ah, como eu amo o seu espírito, Peeta. Mas você veio parar aqui por conta própria, com suas próprias escolhas... — ri debochadamente e acabo revirando os olhos, aborrecido com o fato de minhas palavras não terem surtido nenhum efeito sobre ele — Enfim, gosto que os meus temas sejam vistos, não ouvidos. Então preciso garantir que não aja nada seu deixado para trás. — ele me dá as costas, ameaçando seguir até uma mesa de escritório onde minha mochila se encontrava.

— Não mexa nas minhas coisas! — rosno, debatendo-me na cadeira de modo enfurecido.

— Shh... Fique quieto! — ordena, lançando-me um olhar repreensor antes de sua atenção ser totalmente direciona para minha mochila, onde ele começa a analisar os pertences que ali residiam — Hmm... Veja só todas essas belas fotografias. Agora entendo porque sua câmera instantânea é tão atraente, você não precisa de um computador para imprimir o seu trabalho. — suas orbes sombrias brilham através das lentes dos óculos, admiradas, ao observarem cada uma de minhas polaroids.

Ele parecia realmente gostar do meu trabalho, no entanto, o mais louco daquilo tudo era o fato de que, se aquilo tivesse acontecido há alguns dias, eu provavelmente estaria eufórico com seu elogio. Mas agora? Bem, agora tudo o que eu conseguia sentir era asco por aquele homem tão desprezível que um dia considerei ser o mestre da fotografia.

— Essa foi uma bela selfie, Peeta, porém um completo desperdício de talento... Mas enfim, isso já não importa mais, não é mesmo? — ele ajeita os óculos sobre o rosto antes de jogar a fotografia próxima aos meus pés — Bom, eu adoraria continuar com a nossa conversa, mas preciso muito dar continuidade ao meu trabalho. E se eu fosse você, Peeta, aproveitaria ao máximo esses poucos minutos, pois eles serão os seus últimos. — lance-me uma piscadela acompanhada de um sorriso hipócrita, dando-me as costas logo em seguida para caminhar até os equipamentos de alta tecnologia do outro lado da sala.

Eu estava com muito medo, apavorado, para falar a verdade. Mas o único pensamento que vinha a minha mente naquele momento era o de encontrar uma saída, algum um modo de escapar. E foi então que, como se uma lâmpada houvesse se acendido acima de minha cabeça, rapidamente desviei meu olhar da figura de Seneca para encarar a fotografia jogada aos meus pés, reconhecendo a mesma como a selfie que havia tirado em sua aula no início daquela semana, pouco tempo depois de ter aquele estranho sonho com a tempestade.

Uma vez meu pai havia me dito que, em todo beco sem saída, sempre havia uma passagem secreta. E ele não poderia estar mais do que certo. Exalando todo o ar que havia em meus pulmões e buscando no mais profundo de meu ser a calmaria necessária para aquele momento, depositei toda a minha atenção naquela fotografia um tanto amassada, sentindo as costumeiras sensações ao emergir de volta no tempo. E tão rápido quanto um piscar de olhos, lá estava eu novamente, sentado cara a cara com Seneca Crane em sua aula de fotografia.

É... Parece que estamos de volta ao começo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado =D
E só um aviso aqui rapidinho, a fic acaba de entrar em sua reta final, só mais alguns capítulos e estaremos dizendo adeus :'(
Mas vida que segue, né? kkkk
Beijos, até o próximo!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Efeito Borboleta" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.