Anais de Tëmallön; Os Livros Sagrados escrita por P B Souza


Capítulo 9
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo em tempo recorde!!!
Espero que gostem :)



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A dor no molar cariado voltou, foi o que o fez despertar.

— Ele tá vivo?

— Claro que sim, se não porque o trariam de volta aqui?

— Não, eu quis dizer; ele se mexeu!

Ouviu as vozes de Orfeu e Kaedra, era como berros em suas orelhas. Expressou dor enquanto se encolhia, mas se encolher apenas causou mais dor. Grunhiu de agonia, incapaz de gritar, pois os dentes estavam cerrados um contra o outro enquanto a dor percorria seus músculos.

— Não se mexe. — Então uma mão encostou nele, o fez parar. Kaedra. Tentou obedecer. A visão retornava aos poucos. A língua foi até o dente. Cadê?

Sentiu o vazio, não de apenas um, mas dois dentes. Seu molar esquerdo e o dentro atrás do molar haviam desaparecido e havia uma sutura no local, a qual soltou um pouco de sangue quando, sem cuidado, Alek passou a língua por cima.

Demorou a conseguir se sentar, e quando o fez, levou a mão aonde sentia mais dor, o estômago. Olhou para Kaedra e Orfeu, ambos não haviam mudado nada, pareciam até mesmo ocuparem os mesmo lados da cela. Porém notou que os desenhos de Orfeu no chão haviam recebidos novas formas e marcas.

— O que é isso?

Puxou sua camiseta para cima, era uma camiseta de botões, nova de cor vinho, sua calça também era nova, de um material macio parecido com algodão, bege, seus sapatos de alfaiataria fina, não vinham de uma manufatura, mas sim de uma produção individual.

Quando olhou sua barriga, encontrou um corte da bacia até as costelas, suturado de forma elegante, mas havia um cano para fora do corte, e tornando a entrar mais acima, como se uma parte dele estivesse vazando da costura, ou não tivesse cabido dentro do corpo na hora de fechar.

Ao ver a cena, desesperou-se, levou as mãos à cabeça, e encontrou apenas pele, pois seus cabelos haviam sido raspados e então começou a engasgar enquanto lhe faltava palavras, o pavor do que lhe acontecera antes... Não me lembro, não consigo me lembrar de nada. Se levantou, zonzo, segurando-se na grade. Olhou para Kaedra.

— Eles fizeram experimentos em você. Mentir é feio, Alek. Você é sim um mago!

— Eu...

— Se não fosse eles o teriam deixado aqui para apodrecer, tal como nós. — Orfeu garantiu. — Só fazem essas coisas com magos. Eles querem entender como vocês usam magia, querem aprender a usar também, eu acho. Você devia se matar!

Alek olhou para o chão, lembrou do céu e da cidade que imaginava existir lá em cima, lembrou das histórias de um Deus benevolente que habitava no céu, em uma cidade flutuante, lembrou do véu para onde todos iam, lembrou de Onires e seu sacrifício. Pelo bem maior, para que não usem meu poder como arma contra meu povo.

— Ou pode se juntar a mim.

— Quê? — Kaedra perguntou olhando para Orfeu.

— Ele é um mago, eu preciso de um mago!

— Está delirando se acha que Alek se juntaria a seu tipo...

— Eu ofereço mais dinheiro que qualquer trabalho que você tenha tido, ofereço o dobro disso! — Orfeu sorriu para Alek, então foi até ele. — Quando eu escapar você pode vir comigo...

— Não. — Alek disse, resoluto. — Não sei o que você é. Não me importa, eu tenho uma casa, uma família...

— Que vai morrer! Eu estou te oferecendo...

— Não! — Alek repetiu.

— Tudo bem. O enterro é da sua família mesmo.

— Baixo até para você! — Kaedra disse em uma careta para Orfeu, que deu de ombros retornando para seu canto na cela.

Então sentaram-se todos.

Alek procurou pelo seu corpo mais lesões e ferimentos e suturas e experimentos. Não encontrou nada além dos dentes, do tubo inserido em seu corpo o qual não entendia a função, e o cabelo raspado. Conversou com Kaedra sobre suas roupas novas, o motivo delas. Ninguém parecia saber por que lhe deram roupas novas.

— O que ele veio fazer aqui, afinal? — Perguntou então, olhando para Orfeu.

— Um plano estúpido que deu errado eu acho.

— Isso também é como eu vim parar aqui, ideias estúpidas que dão errado. Mas que ideia estúpida? Ele não parece ser o tipo que está aqui por acaso, essa fuga, as marcas...

— São dias. — Orfeu respondeu. — Dias que se passaram desde quando o plano começou, desde quando o julgamento aconteceu, desde quando fui preso, e até a minha soltura.

— Não vão te soltar. — Kaedra disse.

— Vocês dois se conhecem...

— Sabe ler, mago? Certo? — Alek anuiu, sem entender. — Sabe interpretar, suponho. Olhe os desenhos. Ache um padrão...

— Passei dias olhando seus desenhos, não há padrão...

— Errado! — Orfeu olhou para Kaedra. — Quer contar para ele?

— Eu te disse...

— O que vocês são... — Alek começou, mas foi interrompido.

— Eu conto então! — Orfeu pulou na frente de Alek e apontou aos desenhos no chão. — É como Kaedra disse, ideias estúpidas. Deu errado, mas valeu a pena? Talvez não, mas eu disse, vou escapar. Você pode se juntar comigo ainda, ou ficar aqui e ser cobaia dos médicos malucos! Eu posso proteger a sua família, Alek. Eu preciso de você comigo, mas você precisa de mim, eu sei que precisa...

— Eu não sei o que você é, ou o que você quer, mas eu não estou interessado. Não vou fugir daqui, vou sair daqui como um homem livre, limpo!

Então até mesmo Kaedra riu, pouco, mas riu. Orfeu gargalhou.

— Aquela marca. É a única com três bolinhas dentro do círculo, eu risquei ela no meio hoje cedo quando os guardas trocaram de turno. Sei que era manhã porque acompanho todo dia a movimentação dos guardas e quando eles trazem comida é possível ver grãos de pães nas roupas de Silas e Amon. Agora, por exemplo, é madrugada, Olivar deve estar dormindo na cadeira lá na sala e sabe no fundo do corredor, aonde sequer tem luz? É onde estão os presos mais brutos, um dos guardas me disse que eles não são alimentados, eles comem uns aos outros. Sabe o que significa certo? São mais monstros que homens! A escada leva para outro nível interno no Pilar, provavelmente você sabe para onde, e o elevador sobe até o topo, até a cidade do pilar, aonde fica o Rei dos Reis. Eu aprendi tudo isso durante muito tempo, e ainda assim acabei aqui, mas agora olha aquela marca, a única marca. Ela é um evento. E eu risquei esse evento há pouco, você ainda estava inconsciente. Sabe por que eu risquei?

Kaedra olhou para Orfeu com apreensão. Ele sorriu para Alek.

— Você vai descobrir! — Os dentes de Orfeu estavam amarelos, imundos. Mas ele parecia excepcionalmente contente, seus olhos eram de um velho que não dormia, sua pele estava ressecada e ele mesmo estava magro, mesmo mantendo certa forma muscular. — Todos vão descobrir.

Recuando, ele se deitou em cima de suas marcações, os dedos ensanguentados e as unhas rachadas sequer o incomodavam.

Alek assistiu imóvel, até que o sono voltasse para ele também.

Na cela eles pouco tinham o que fazer. Então, uma vez que sabia que gritar pelos guardas e pedir explicações sobre seu estado era inútil, e que nada podia fazer para mudar aquele paradigma, foi se deitando também.

— Se eu fosse você não dormiria.

— O que você quer de mim?

Kaedra então olhou para Alek e colocou a mão no ombro dele.

— É sério, não dorme. — Alek olhou para ela, agora tinha certeza, ela e Orfeu se conheciam, se conheciam bem demais.

— Mais algumas horas. Só mais algumas horas! — Orfeu então começou a falar sozinho.

— De onde você conhece ele?

— É uma longa história, Alek. Eu pensei que tinha acabado, inclusive.

— Vocês dois... — Alek olhou para Orfeu que cantarolava sobre esperar algumas horas. — É isso?

— Oh, não. Orfeu... Eu... Quando eu era pequena meu pai morreu resistindo a um assalto, minha mãe não tinha como me criar, eu tinha três ciclos e ela tinha mais dois filhos. Ela me deu, eu cresci em um orfanato, e vez ou outra as crianças fugiam para brincar na rua, haviam castigos, claro, as fábricas sempre precisavam de mais funcionários, e a Senhora do Orfanato sempre queria mais algumas moedas, conforme fui crescendo as coisas foram se complicando...

— Kaedra...

— E um dia eu fiz besteira. Ai tive que correr, fugir de verdade. — Kaedra continuou, ignorando Orfeu. — Morei na rua alguns dias, mas eu tinha aprendido coisas no orfanato. Orfeu precisa de um mago agora, mas antes ele precisava de um cérebro, porque como pode ver ele é bem burro!

— Kaedra ele não...

— Que diferença faz...

— Eu não quero...

Alek olhou os dois começando a berrar um com o outro. Então, pondo fim aos berros deles, o chão, o teto e as paredes tremeram. As luzes se apagaram, piscaram, tornaram a ascender, oscilando. O som da explosão repercutiu por todo o Pilar e Alek abriu um olhar de desespero, Kaedra mostrava indiferença e Orfeu era só felicidade.

— Está na hora! — Ele disse eufórico.

E então começou.


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Notas finais do capítulo

Aquele momento em que notamos; o mundo não gira em torno de Alek. Tem muita coisa acontecendo lá fora, coisas que não tem nada a ver com Alek... ainda!



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