Anais de Tëmallön; Os Livros Sagrados escrita por P B Souza


Capítulo 13
Capítulo 3




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Era um dia de sol e no céu as nuvens haviam se dissipado. De todos os reinos anexos, Alnia-saar parecia um dos melhores para se viver.

Não haviam tantas fábricas, o ar era leve e sempre tinha dias de sol. O crime era baixo e o povo era unido, os distritos eram autossuficientes e o governo era diferente de tudo. Um reino governado pela magia. Alek pensava. O último reino

A Ordem de Hasgyz detinha o controle financeiro e social de Alnia-saar, isto aconteceu depois dos Capas Negras, quando o Rei dos Reis exigiu uma reforma governamental, Alek sabia daquilo tudo, pois estudava tudo. Lá fora podia fazer um belo dia, mas ele preferia as noites para estudar as estrelas. Sendo assim, durante as tardes ensolaradas, se recolhia em seu quarto ou no escritório de seu pai, pegava os livros e os mapas, e dedicava-se aos estudos.

Lia sobre os Reis dos Reis da Sexta Geração, estes haviam sido os percursores do vapor, inventores das mais incríveis maquinas. Eram chamados, por muitos, de senhores do metal.

Lia sobre os doze reinos anexos, desde Konan-wegron até Nicacus, cada reino com sua cultura, cada reino com seu governo e suas Ordens.

Lia sobre a represa de Onmere, construída ao extremo-norte pela dinastia homônima da Quinta Geração dos Reis dos Reis.

Fazia tudo isto para não ter que sair e brincar com as outras crianças, para não ter que sair e olhar a própria irmã. Alek sentia-se frustrado na maioria das vezes, impelido a ser responsável mesmo quando não queria. Não era o mais velho, mas tinha que se comportar como tal. Na rua ou na praça quando se juntavam as crianças para brincar, Tessara sempre causava comoção com sua situação que Alek julgava impraticável. Compadecia-se pela irmã quando esta tinha suas crises, mas no decorrer dos dias sentia mais raiva do que admitia.

— Você não vai ir olhar sua irmã mesmo? — Saedra, sua mãe, veio lhe perguntar parando na porta do escritório de Talmer, que Alek ocupava no momento enquanto sue pai trabalhava.

Alek abaixou a cabeça antes de se virar. Na sua frente estava um exemplar de “Alumínio, o futuro do metal”. Suspirou e girando na banqueta que estava sentado olhou para sua mãe.

— Ela fica fazendo coisas erradas. E eu que tenho que ficar brigando com ela...

— Eu tenho muita coisa pra fazer, Alek...

— Mãe, eu não quero! — Alek disse por cima da voz de Saedra e a mulher fechou a cara para ele. Sua mãe tinha uma expressão sempre doce, serena, mas quando zangava-se, parecia outra pessoa, as linhas de expressão se tornavam visíveis e fortes, o olhar acalentador sumia dando espaço para olhos que te julgavam no completo silêncio, e então chegava o sentimento de culpa. — Eu estou estudando. — Disse como uma desculpa para tentar evitar uma discussão maior, seu pai sempre lhe disse que deveria estudar, então era isso que sempre fazia.

— Vou falar com o seu pai quando ele chegar!

Sem mais, antes que Alek corasse e repensasse, Saedra se retirou deixando o garoto e seus livros no cômodo poeirento.

Alek se levantou e olhou para as partículas de poeira flutuando, estáticas, no ar. Podia vê-las pelo feixe de luz do sol que entrava pela janela, a qual ele se dirigia.

Abriu o vidro e dependurou-se no parapeito, a madeira estava quente e ressecada, cheia de pedaços do óleo conservador lascado, pois fazia anos que a última aplicação fora feita. os olhos buscando Tessara na praça do outro lado da rua. Havia umas dez crianças lá, ele gostava de brincar, mas toda vez que Tessara estava junto, Alek não brincava, se preocupava com a irmã e ficava brigando com ela, com medo que qualquer coisa pudesse machuca-la ou, pior, ela machucar alguém. Lembrava-se que seu pai havia lhe dito; Tessara podia ter as mesmas habilidades que eles, mas sua condição a tornava perigosa, a tornava volátil demais para ser deixada sozinha. Até temos certeza, temos que ficar de olho. Alek pensou, virando de contragosto e indo para o corredor, indo à praça, indo cuidar de sua irmã.

Podia preferir os estudos, mas entendia qual era a função daquele escritório. Seu pai havia feito tudo aquilo por ela, não por ele. Tessara era o motivo de tudo, a cura para seu estado era o combustível do conhecimento de sua família, e Alek entendia isso. Todos os livros que ele usava como desculpa para evitar a irmã estavam ali justamente para ajudar ela.

Assim, desceu as escadas ouvindo os degraus rangerem com seus passos e então, antes de chegar no térreo, a porta da casa foi escancarada, Saedra lá em baixo deu um grito de pavor, e Alek correu para ver o que acontecia.

— Por Hasgyz, o que houve?

Ouviu sua mãe falar quando pulou o último degrau direto ao piso do corredor, saiu em disparada ao hall e encontrou seu pai, uma mão suja de sangue, um corte na bochecha esquerda e a camisa que usava além de imunda estava rasgada.

— Pai...

— Esta tudo bem! — Talmer disse, e então Tessara já chegava até eles.

Alek olhou para a cima quando ouviu o choro. Era Inara, a sua irmã mais nova. Foi atacado por duvidas, se subia para pegar a irmã que provavelmente despertara com o barulho, ou se ficava e acudia seu pai.

— Inara chora, acalmem ela. Eu vou me trocar! — Talmer disse entrando, puxando Tessara pelo braço, com carinho, e lhe dando um beijo na testa. — Não foi nada, minha querida, uns Carza perdidos por Alnia-Saar, somente.

E com isso Talmer subiu as escadas junto de Saedra.

Alek ficou ali em baixo, ao lado de Tessara, que olhou para ele e riu, aparentemente sem motivo, então foi correndo para a cozinha. Ele foi atrás de imediato, sua mãe estava na cozinha, e foi só pensar na velocidade que tudo aconteceu para imaginar que nada fora guardado. Assim, chegou à cozinha junto de Tessara e já tirou as facas do alcance dela.

— Vai brincar, vamos, lá pra fora. — Alek inferiu ao ver que Tessara perdera o foco e não tinha ido fazer nada na cozinha. A menina apenas parou e ficou olhando ao redor.

— Eu não quero mais brincar lá fora. — Tessara disse com sua voz arrastada. — Eles são maus.

— Você que é burra. — Alek disse empurrando a irmã pelas costas rumo à sala.

Enquanto o fazia, ouvia a mãe e o pai discutindo no andar de cima, mas Inara já havia parado de chorar.

— Eu não sou burra. — Tessara retorquiu com irritação, a voz mais aguda.

Alek só anuiu, e os dois se sentaram em um sofá ao lado do Hall.

Tessara não suportou ficar ali por muito tempo, então se jogou no chão e de joelhos foi até o outro lado do cômodo, aonde havia duas pilhas de tronquinhos para o forno e lareira. Ela pegou um deles e com cuidado foi girando até tirar de baixo de todos os outros, de forma que quando o fez, toda a pilha se ajustou a ausência de um tronco, e Tessara recuou em um susto ao ouvir os troncos descendo alguns centímetros.

Alek sorriu, mas ela não viu, estava de costas para ele.

— O que vai fazer com isso?

Tessara o ignorou. Era normal que quando se concentrava em algo, deixava de ouvir o mundo ao seu redor. Então Alek a deixou, o que um pedaço de madeira poderia fazer de ruim?

Seu pai já descia a escada então.

Sua mãe vindo atrás, preocupada. Talmer se trocou e preparou uma mala de mão às pressas.

— Alek, venha aqui. — Ele chamou e o menino obedeceu.

Quando viu o pai, encontrou um semblante triste, mas sua mãe tinha um semblante desolado, ela chorava copiosamente, mas tentando conter qualquer som, evitava, inclusive, de olhar para Alek.

— Pai...

— Escute, com atenção! — Talmer se agachou encarando o filho, ambos estavam na mesma altura agora. Ele era um homem já vivido, tinha seus cinquenta e dois ciclos, mas o rosto estava livre de rugas ou seu corpo do cansaço que vinha com a idade. Alek olhou os olhos castanhos do pai sabendo que aqueles olhos se refletiam em seus próprios. — Sua mãe vai cuidar de vocês por um tempo, mas você é um homem já, precisará cuidar dela também, e de sua irmã. Eu tenho que viajar, mas vou voltar, quando você menos esperar, eu já vou ter voltado! — Sorriu, mas não convenceu.

— Pai, eu não quero...

— Escute, Alek. Cuide de sua família, cuide de sua irmã. E proteja o dorrem, esconda-o e sempre que puder estude-o, para proteger e cuidar, nunca para ferir!

— Mas você disse que às vezes para parar a maldade, temos que...

— Eu sei o que eu disse, mas eu estava errado. — Talmer então deixou que uma gorda gota caísse de seu olho ao chão, ele não limpou o rosto ou desviou o olhar. — Eu estava tão imensamente errado... Proteja o Dorrem assim como sua irmã, cresça, Alek, e se torne o homem que eu lhe ensinei a ser! E se um dia chegar alguém que deseje o livro, que tente tomar ele de ti... Destrua-o!

Sem mais, se levantou.

Alek abriu a boca, mas não conseguiu falar nada. Talmer abraçou Saedra longamente, cochichou algo em seu ouvido e então a largou, olhos nos olhos, era um adeus. Repetiu com Alek e com Tessara, e quando chegou na porta, o homem que havia ensinado tudo que Alek sabia chorava.

Naquele momento o menino soube que seu pai não voltaria, mas negou para si mesmo.

— Até logo, pai! — Foi o que disse.

E com um sorriso tristonho de Talmer, a porta foi se fechando, a casa mergulhando na penumbra das paredes contendo a luz de um dia ensolarado.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado, e quem puder deixar um comentário; fará toda a diferença! :)



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