Take me To Church escrita por Charles Gabriel


Capítulo 3
Capítulo Três


Notas iniciais do capítulo

Boa Leitura ♥



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Na manhã seguinte estava sentindo uma dor terrível nas costas.

Eu não deveria ter ficado na mesma posição por tanto tempo.

Na noite passada, me permiti chorar por tudo.

Pela morte de minha mãe, pela indiferença de Ruzgar e pelo fato de eu nunca poder ficar com ele.

Passei a noite em claro chorando, eu deveria estar horrível.

Mas eu não me importo.

Ninguém realmente se importa.

— Sevilin? – Ouvi a voz de meu pai do lado de fora da porta de madeira de meu quarto – Está acordado?

— Estou sim, pai! – Respondi. Minha voz estava rouca. Talvez pelo fato de eu ter chorado a noite toda.

— Poderia levar algumas peças de roupa na casa de Ruzgar? – Papai perguntou com a voz esperançosa – O pai dele passou no comércio ontem e me pediu para que eu levasse umas roupas hoje para ele, mas não poderei ir. Você pode fazer esse favor?

Eu não queria ir.

Eu só queria ficar em casa e chorar até não me aguentar mais.

Mas eu não poderia desapontar meu pai, eu tinha que fazer isso. Por ele.

— Claro, papai! – Respondi, fingindo um entusiasmo que eu não havia no momento.

— Muito obrigado, Sevilin! – Ele parecia aliviado – As roupas estarão em cima da mesa, por favor, leve com cuidado! Você sabe o quanto Candan não gosta que as roupas estejam amassadas.

Isso realmente era verdade.

O pai de Ruzgar era sempre muito rígido e muito perfeccionista. 

— Certo, papai! – Respondi de maneira vaga, até que ouvi os passos de meu pai saindo.

Talvez ele fosse para o trabalho.

Levantei do chão e coloquei uma roupa qualquer, saindo do quarto logo em seguida.

As roupas de seda estavam devidamente dobradas em cima da mesa, coloquei-as com cuidado sobre meu antebraço e saí, fechando a porta de madeira. Não precisava trancar, minha casa era a mais longe do vilarejo, muito raramente alguém viria por ali.

Andando pelo pequeno vilarejo, percebi o quanto as pessoas estavam ocupadas com seus trabalhos.

E me perguntei se algumas delas já haviam sofrido por um amor como eu estou sofrendo.

Talvez sim.

Talvez não.

Cada um tem uma dor que carrega no coração.

Alguns minutos depois eu me encontrava na frente da casa de Ruzgar, era de madeira e com variadas flores em frente da casa.

— Sevilin? O que você está fazendo aqui? – Ouvi a voz bondosa da mãe de Ruzgar, Sevda. Sempre gostei de Sevda, desde criança me trata muito bem.

— Papai me pediu para entregar essas roupas para o Senhor Candan. – Respondi sem graça.

— Ah, querido! – Os olhos escuros iguais aos de Ruzgar brilharam de alegria – Muito obrigada!

— Onde está Ruzgar? – A pergunta saiu antes mesmo de eu pensar.

— Ah, Ruzgar está com visita! – Ela respondeu pegando as roupas de seda com cuidado.

— Visita? – Franzi o cenho.

— Sim, querido! Nuray está aqui em casa – Nuray era a filha do comerciante que vendia variados peixes no mercado.  Lembro que quando eu era criança, Nuray era apaixonada por Ruzgar. Talvez ainda fosse – Preparei alguns Keftedes, vou dar-lhe alguns.

— Não precisa... – Tentei dizer.

— Eu insisto, querido! – Sorriu de modo gentil – Você poderá levar ao seu pai também.

— Tudo bem, eu aceito – Decidi ceder.

Eu sabia que se dissesse não para Sevda ela iria insistir.

Segui Sevda até a cozinha, e me sentei na cadeira de madeira.

— Já volto, querido! Levarei as roupas até o quarto, fique a vontade. – Me lançou um sorriso gentil, saindo logo em seguida.

A casa de Ruzgar era aconchegante.

Eu gostava de ficar ali.

Ouvi risadas ecoando pelo corredor próximo ao da cozinha.

Meu coração se apertou.

Eram as risadas de Ruzgar e Nuray.

Senti vontade de chorar, mas não faria isso.

— Sevilin! – Nuray entrou na cozinha de maneira animada. Nuray continuava a mesma garota da qual eu me lembrava.

Seus cabelos loiros e compridos faziam contraste com seus olhos castanhos. Havia algumas sardas em seu rosto.

Nuray era o tipo de menina que fazia qualquer homem delirar com sua beleza e seu corpo.

Talvez Nuray fosse a garota que habita os sonhos de Ruzgar, assim como ele habita os meus.

Será que esse é o ciclo do amor?  Você ama alguém e essa pessoa vai amando outra.

Eu espero que não.

A vida é dolorosa demais.

E o amor também.

Ou talvez o amor não seja tão doloroso quanto eu estou pensando que seja.

Talvez amar alguém e não ser correspondido que é doloroso.

Nuray fazia jus ao significado de seu nome, Lua brilhante. Ela era uma garota que emanava energias boas.

Talvez ela fosse a Lua que iluminaria o céu de Ruzgar em suas noites mais escuras.

Eu não passo de apenas uma estrela insignificante no céu de Ruzgar.

— Ei, Sevilin! – Ruzgar me cumprimentou, sentando-se ao meu lado.

— Ei! – Sussurrei tentando não olhar em seu rosto.

— Você está bem, Sevilin? – Ruzgar perguntou. Olhei em seu rosto, sua testa estava franzida, sinal de que ele estava preocupado.

Meu coração adormecido pareceu ter vida novamente.

— Estou sim, Ruzgar e você? – Respondi fingindo um sorriso.

Ruzgar me conhecia muito bem, e ele sabia quando eu estava mentindo.

Isso era péssimo.

— Estou bem! – Ele respondeu, levantando as sobrancelhas.

Nuray começou a tagarelar coisas sobre sua família que nem Ruzgar ou eu respondíamos.

Ruzgar parecia perdido em seus pensamentos, e eu ainda mais.

— Poderíamos sair qualquer dia desses, Ruz – Nuray murmurou com sua voz aveludada, olhando Ruzgar com carinho.

Senti vontade de vomitar.

— Não poderei, Nuray! – Ele pigarreou – Tenho que ficar em casa cuidando de minhas irmãs para minha mãe.

— Ah... – Nuray fez um biquinho.

Que nojo.

— Que bom que ainda está por aqui, Sevilin! – Sevda apareceu na pequena cozinha, animada.

Ela me serviu um pouco de Keftedes, mas não conseguia comer.

Não enquanto Nuray estava paquerando Ruzgar na minha frente.

Ruzgar tentava fugir de suas paqueras, eu percebia isso.

Não sou bobo.

Talvez ele estivesse fazendo isso porque eu estava por perto e sentia pena.

Que ódio!

Quando consegui terminar de comer os Keftedes, pedi alguns para Sevda, para levar ao meu pai.

Sevda deu uma quantia bem generosa, daria para meu pai e eu almoçarmos tranquilamente hoje, fiquei feliz.

Saí de lá o mais rápido possível, sem me despedir de Nuray ou Ruzgar.

Ruzgar iria ter uma linda vida ao lado de Nuray e eu não iria atrapalhar isso.

*|||*

 

Horas mais tarde, fui colher cevada.

E depois de receber meu pagamento fui para as margens do rio.

Aquele lugar definitivamente não era bom, pois eu me lembrava de Ruzgar.

Meu coração parecia estar em mil pedaços dentro do peito.

Talvez Ruzgar nascesse para encontrar o grande amor de sua vida, que com certeza nunca seria eu.

Lágrimas saíam de meus olhos.

Inferno!

Eu não deveria chorar.

— Sevilin? – Eu reconheceria a voz de Ruzgar em qualquer lugar. Que droga, ele me veria chorando – Aconteceu alguma coisa?

Limpei as lágrimas com as costas da mão, e me permiti segurar o choro.

— Não, não aconteceu nada – Respondi olhando para o chão de terra.

Ele me puxou para seus braços fortes e meu coração retumbou dentro de meu peito.

Por que isso, Deus?

Uma vez eu ouvira meu pai dizer, que as pessoas que mais amamos são as que mais nos destroem, na época eu achava aquilo muito errado.

Hoje em dia, eu começo a acreditar que isso é verdade.

— Vai ficar tudo bem, Sevilin! – Ele sussurrou – Eu vou ficar de seu lado.

— Não, você não vai! – Respondi também sussurrando.

Ele me afastou, para poder olhar em meu rosto. Seus olhos castanhos estavam tristes.

— Por que você está dizendo isso? – Ele sussurrou.

— Porque sim! – Me soltei de suas mãos fortes.

— Sevilin, eu amo você! – Ele sussurrou – Mas não podemos nos assumir para todo mundo, não quando a igreja pode nos esquartejar.

— Você não quer por conta da igreja ou pela Nuray? – Perguntei de forma ríspida.

Suas sobrancelhas franziram, e depois seus olhos começaram a brilhar.

— Você está com ciúmes de Nuray? – Ele respondeu de maneira divertida. Senti-me com vergonha, meu rosto estava queimando. – Nuray gosta de mim, não vou mentir, mas eu não gosto dela. Eu gosto de você, Sevilin!

Meu coração batia tão forte que eu poderia escutá-lo.

Fiquei em silêncio.

Mas e se ele estivesse mentindo?

Senti como se mil facas estivessem em meu coração.

— Você está mentindo, Ruzgar!

Ruzgar me olhou boquiaberto.

— O que você quer que eu faça pra te provar que é você quem eu amo? – Ruzgar passou a mão por seus cabelos escuros desgrenhados – Eu engoliria pedras apenas para te ver bem, mas ainda sim, não parece ser o suficiente!

Aquilo me pegou de surpresa.

Ruzgar me puxou de maneira brusca para seus braços e me beijou de maneira carinhosa.

O beijo não demorou muito, mas foi o suficiente pro meu coração bater de maneira descompassada.

Eu não sabia o que dizer.

— Eu queria que ficássemos juntos – Sussurrei.

— Acho que podemos ficar juntos – Ruzgar passou a mão por meu rosto, me olhando com carinho. Aquilo me surpreendeu.

— Como? – Mordi o lábio, esperançoso.

— Já que não podemos nos assumir publicamente, vamos namorar escondido – Seus olhos estavam com um brilho. Aquilo aqueceu meu coração.

Engoli em seco. 

— É perigoso, Ruzgar! – Sussurrei – Alguém pode nos pegar!

— Por você eu sou capaz de correr riscos! – Ele me deu um sorriso – Vai aceitar minha proposta ou não?

— Eu aceito – Respondi sem pensar duas vezes.

Ruzgar me abraçou forte.

E depois de muito tempo, senti meu coração e minha alma ficarem leves.

Talvez essa leveza eu só encontrasse com Ruzgar e com mais ninguém.


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Notas finais do capítulo

Para quem não sabe, Keftedes são almôndegas de carne e ervas, que eram muito servidas na época da Era Bizantina.
Era uma comida típica apenas para as pessoas de classe média e baixa.
Espero que tenham gostado, até breve.



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