Os Filhos da Lua escrita por Lua Chan


Capítulo 1
Olhos de gelo




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/742760/chapter/1

Tinha sido a quarta vez. A quarta e última vez da semana que eu recebia uma advertência da Stanford. Todos os alunos de lá sabiam que a expulsão era o próximo passo depois do quarto aviso e lá estava eu com o meu quarto "bilhetinho". Meu pai precisou organizar a papelada de transferência para outra escola de imediato, após me dar uma lição de moral nem tão eloquente. Meu futuro, agora, estava nas mãos de um gordo semi-calvo e sem pescoço, o vice-diretor Stanley, que me permitiria estudar na Monoghan High.

 — Bem, senhorita Grant, acho que deve saber que a conduta da Monoghan é contra qualquer tipo de desrespeito.— o gorducho falou, trocando olhares entre meu pai e eu. Izak estava decepcionado, eu sabia disso pela rigidez dos seus ombros — O que você fez de tão horrível que lhe causou sua expulsão da Stanford?

Dei de ombros e cruzei os braços, deixando um leve sorriso se esboçar em meu rosto, eu era a única que estava sorrindo dali.

 — Pus uma bombinha perto da cadeira do professor de história. — declarei — Foi divertido.

Izak me reprovou. Meu pai normalmente faz isso com um leve peteleco no nariz, mas dessa vez, ele deu uma rápida batida no meu pé, sussurrando por fim um "comporte-se". Sr. Stanley anotava coisas aleatórias em seu caderno e em seguida, tossia. Aquilo estava me dando nos nervos.

 — Receio que seu comportamento tenha que mudar, srta. Grant. De qualquer forma, não estou aqui para lhe julgar. Agora vou precisar da confirmação de alguns dados. Nome completo e idade, por favor.

 — Summer Nowaks Grant, 18 anos. — replico friamente.

 — Repetiu de ano alguma vez ou é somente atrasada? — pede ele, como se o fato de eu repetir fosse uma desonra.

 — Só estou atrasada, senhor.

 — Menos mal. riu baixinho — Local de nascimento?

 — Varsóvia, Polônia. — o diretor curvou as sobrancelhas, surpreso.

Diferentemente do meu pai, eu não tinha sotaque notável, já que só vivi lá por 6 anos. Poderia, muito bem, fingir que eu era uma garota americana comum e ninguém jamais suspeitaria, afinal, eu tinha algumas características deles. Allan Stanley continuou com as anotações até empilhar os papéis num montinho. Ele me fez assinar 5 páginas e prosseguiu com a falatória.

 — Você tem 7 horários de aulas todos os dias. Vai ter que ficar à tarde por pelo menos 2 vezes na semana. Como já são 12:57, você assistirá apenas a última aula.

 — No caso, a de Biologia? — meu pai questiona, olhando para o papel dos horários. O sr. Stanley assente.

 — Exato.

Murmurei um "que saco", meu pai bateu em meu pé novamente. Allan me passou um folheto com informativos das minhas primeiras aulas e outro com matérias diversas.

 — O que é isso? — pergunto sem desviar os olhos dele. Tenho quase certeza que ele notou um tom de irritação na minha voz. Izak respondeu por ele.

 — Essas são matérias extracurriculares. Pedi para o sr. Stanley mostrar algumas pra você.

 — Espera, não está querendo dizer que vou ter que escolher uma, né? — meu pai ficou calado. Xinguei algo num polonês bem desastroso, propositalmente, para irritar Izak.

 — Se quiser se enturmar nessa instituição, srta. Grant, vai ter que escolher algo. — Allan começou a folhear um caderno — Temos dança, artes cênica e plástica, canto, música... é só escolher um. Não deve ser tão difícil assim.

 — Claro que não. — bufei. Meus pés já estavam formigando por ficar tanto tempo sentada.

Se pudesse, atirava uma pedra na janela e fugia daqui, mas seria uma péssima ideia pra alguém que já foi expulsa de uma escola. Olhei com calma para cada matéria, nenhuma parecia chamar minha atenção. Optei, então, por escolher a menos pior.

 — Acho que vou ficar com música. Devo saber tocar algo no violão.

 — Ora, não seja modesta, srta. Grant. Seu pai me contou que aprendeu a tocar violino com 3 anos.

 — Ele disse, é? — olhei discretamente para ele e sorri, pela primeira vez.

A verdade é que eu tinha orgulho de saber tocar violino, afinal, minha mãe havia me ensinado a tocar alguns instrumentos quando morávamos na Polônia. Bem... quando ela ainda se comunicava conosco. Ela, agora, deveria estar numa viagem pela Índia, à trabalho. Enquanto isso, eu, meu pai e meu irmão morávamos por aqui, na Flórida. Pelo menos, agora moramos. Há duas semanas estávamos no Havaí.

Allan pigarreou e se levantou da cadeira para apertar a mão do meu pai. Eles ficaram conversando por um tempo, enquanto eu escutava uma música no celular. Por fim, ele agradeceu pela minha "colaboração" e me guiou até a porta de seu escritório. Agora éramos apenas eu, meu pai e alguns alunos que vagavam pelos corredores infinitos daquele lugar.

 — O que foi, ojciec? — perguntei, ao notar que ele estava me encarando por um longo tempo — Algum problema?

 — Aparentemente não, meu bem. — replicou com um sorriso forçado — Só quero garantir que você e Yakob sintam-se em casa.

 — O senhor se sente em casa aqui? — a pergunta o pega de surpresa e ele apenas sorri.

 — Estou me adaptando tanto quanto você e seu irmão. — ele ajeitou o terno e beijou minha testa — Agora vá para sua primeira aula. E por favor, se comporte.

Balanço a cabeça positivamente e me viro para ir à sala. Até sinto um vazio no peito por ter sido expulsa da outra escola, mas a verdade é que não consegui me adaptar lá. As pessoas eram rudes e os professores não ligavam para os alunos.

Chegando na sala 05, dou um breve suspiro e abro a porta, pronta para encarar mais de uma dúzia de alunos e uma professora sorridente. Dou um passo para trás, e prendo a respiração, como se eu fosse me acalmar daquela forma. Bem... não adiantou. Todos olhavam para mim como se eu fosse um pisca-pisca ambulante.

 — Bom dia. — fingi uma postura confiante - Sou a aluna nova, Summer Grant. — retiro o "Nowaks" e toda sua essência polonesa do meu nome, porque sempre o achei estranho.

A professora abre um sorriso mais largo e se aproxima de mim.

 — Você chegou na hora certa, Summer. Sou Amelia Lowell, professora de Biologia. Pode me chamar de sra. Lowell. — eu a cumprimentei — Estava prestes a apresentar um trabalho à turma. Bem, seja bem-vinda.

Agradeci e me adiantei em procurar por uma cadeira vazia. Encontrei uma na frente de um garoto de olhos azul-escuro e cansados. Dei um sorriso pra ele, mas ele me devolveu uma expressão sisuda e sombria. Uma sensação esquisita se apoderou de mim, seguido de um calafrio.  Fingi que nada havia acontecido e me concentrei nas palavras da minha nova professora e no ambiente da minha nova turma.

 — Como eu ia dizendo, pessoal, faremos um trabalho que valerá como uma Avaliação Parcial. Vou disponibilizar os temas de cada grupo no e-mail da turma. — sra. Lowell afirmou — Vocês formarão duplas-

 — Não pode quarteto? — uma garota morena gritou do fundão da sala. O resto da turma riu.

 — Dupla, Amber. — Amelia insistiu — E eu vou dividi-los.

Houve um alvoroço imediato. Uns protestavam, outros suspiravam de alívio. Outros, como eu e o garoto dos olhos escuros, apenas aceitaram.

 — Pois é. É assim que faremos, agora silêncio e prestem atenção. Só vou dizer uma vez. — ordenou, pegando um lápis e uma caderneta — Paul e Seth. Ion e Millan. Amber e Rudy. Holland e Caitlin. Danielle e Thomas. Summer e Amur. Jordan e David. Nick e Kara. Organizem-se e tirem suas dúvidas enquanto puderem.

Todos correram para seus grupos. Pelos suspiros, palavrões e murmúrios, a experiência não agradara muita gente. Fiquei intacta, sem saber o que fazer ou pra onde ir. Contei, mentalmente, 12 segundos até alguém se aproximar de mim. Era o garoto dos olhos escuros, o que me causava calafrios. Ele suspira. Seu aroma era estupidamente agradável, tinha cheiro de floresta.

 — Você é Summer, não é? — ele pergunta, o timbre de sua voz me deixava assustada e indefesa. Dou uns passos para trás e ele cruza os braços — Eu fiz uma pergunta.

 — S-Sim. — preguejei mentalmente por ter gaguejado, mas era impossível olhar pra ele e não sentir alguma coisa.

— Sou Amur Gauthier.

— Uhm... prazer te conhecer. Eu... eu vou perguntar nosso tema à professora. — me afastei do garoto, engolindo em seco.

Algo nele me intrigava e eu não tinha certeza se isso era bom.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Ojciec: "pai" em Polonês



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Os Filhos da Lua" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.