Eles decidiram partir na manhã seguinte.

Passaram o restante do dia anterior transferindo a gasolina do carro de Sara para o que estava na garagem da casa ao lado. Em seguida, fecharam a residência e colocaram nas mochilas todos os mantimentos que tinham e poderiam precisar durante aquela viagem.

 – Na melhor das hipóteses, conseguimos chegar até a metrópole enquanto o sol ainda está a pino. – Sara tomou a fala para si – Depois, de acordo com Iara, um barco estará na costa e levará nós quatro até esse laboratório escondido.

 Num primeiro momento, Sara havia sido contra a ideia de abandonar a casa por um tempo e viajar rumo a esse lugar desconhecido.

— E se for tudo uma mentira? – ela indagou, realmente acreditando nisso.

— Se for, nós voltamos para casa. – Tom respondeu – São poucas horas de viagem, se não houver zumbis ou problemas no caminho. Se algo der errado, podemos voltar no mesmo instante.

— Sara... – Iara virou-se para a amiga. Naquele momento, a mulher já havia revelado a todos que estava grávida – Você está esperando um bebê, um bebê que muito provavelmente nascerá imune. Não podemos deixar essa chance passar. Se o sangue de Mike puder ser usado para fazer a vacina e ninguém mais se tornar um morto-vivo nesse mundo, imagine que futuro lindo você e Mike estarão construindo para essa criança. Vai ser um futuro de esperança e coisas boas, exatamente o que você tanto procura.

Sara olhou para Iara. A companheira realmente sabia ponderar as palavras a seu favor. No entanto, era verdade que Iara não tinha dito uma mentira sequer – aquele mundo esperançoso realmente poderia acontecer. Só dependia deles.

Sim, aquelas palavras pesaram para Sara e foram justamente elas que fizeram a mulher concordar em partirem já na manhã seguinte. Mike também estava em cima do muro, com medo de novos indivíduos virem a invadir a casa e eles perderem aquele local para sempre.

— Vamos conseguir. Vai dar tudo certo. – Sara disse, apertando forte a mão de Mike e olhando fundo nos olhos dele. Ela repetiu as palavras do companheiro: – Vai dar tudo certo, eu acredito em nós dois.

Com isso, Mike sorriu e tudo parecia estar resolvido.

Empacotaram roupas, cobertores e alimentos. As armas eles levariam com eles mesmos, fixadas no cinto ou escondidas dentro das roupas. Afinal, nunca se sabe quais perigos poderiam ser encontrados na estrada.

Ao anoitecer, tudo já estava arrumado.

Tom acendeu uma fogueira e o grupo se amontoou em frente ao fogo, jantando num silêncio que misturava ansiedade, medo, mas, acima de tudo, esperança.

— Esse é nosso último jantar nessa casa por um tempo... – Mike disse, olhando com o canto dos olhos para Sara. Aquela, afinal, era a casa dela.

— Sim... – Sara murmurou baixinho, percorrendo os olhos pela construção ao seu redor. – Quem diria que tudo isso iria acontecer, hein?

E então, para a surpresa de Mike, Sara acariciou ligeiramente seu ventre e sorriu contente. Ela olhou para o companheiro e o homem notou o quanto os olhos de Sara ganharam um brilho novo, único, e extremamente confiante. Também, ela agora sorria para ele, um sorriso tão genuíno e acolhedor que Mike se sentiu abraçado por completo.

Ambos sabiam que eles fariam de tudo para transformar aquele mundo. Transformar aquele apocalipse num mundo melhor, principalmente para o filho deles que nasceria dali uns meses.

Após a janta, todos dormiram tranquilamente naquela noite.

Iara e Tom dormiram de conchinha, trocando sussurros esperançosos até caírem no sono. Sara ficou aconchegada no peito de Mike, compartilhando de seu calor. Conversaram sobre o passado, o presente e principalmente o futuro.

A luz da pequena vela em cima do criado mudo criava sombras que pareciam dançar em cima dos dois. Sara segurava a mão mordida de Mike, analisando-a de perto, ainda surpresa. Eles haviam cuidado do ferimento e agora a marca da mordida estava igual a de um ferimento normal. Em breve, a casca do machucado estaria curada e a única lembrança que eles teriam de tudo aquilo seria uma singela cicatriz. Sara e Mike pegaram no sono ainda abraçados um ao outro.

**

O grande dia finalmente tinha chegado.

Acordaram juntamente com o nascer do sol.

Como qualquer dia, foram ao banheiro, lavaram o rosto, e comeram um café da manhã dessa vez caprichado antes de pegarem a estrada. Decidiram que quem seria o primeiro a dirigir era Tom. Caso precisassem, outra pessoa assumiria o volante no decorrer da viagem e assim por diante.

O dia estava com a temperatura amena e algumas poucas nuvens cobriam o céu. Não parecia que seria uma manhã de chuva, apenas um dia um pouco mais fechado, mas um tanto quanto comum na cidade em que eles viveram por longos e longos anos.

Seguiram até a casa ao lado e entraram no carro.

O silêncio reinava na rua quando o automóvel seguiu em direção à avenida.

Sara deu uma última olhada para a sua casa, sua tão amada e preciosa moradia.

Lembrou-se por um instante de Alex e Scott e a saudade a dominou por um momento. Também, fora a paixão louca dos dois por zumbis que a mantiveram protegida durante o apocalipse – sem eles, ela sabia que sequer teria conseguido sobreviver durante todo esse tempo. Em silêncio, agradeceu aos dois.

Quando passaram pela casa, Sara voltou seu olhar a Mike, sentado a seu lado, e Tom e Iara no banco da frente. Seus preciosos amigos, sobreviventes e guerreiros como ela nunca vira igual. Agora, eles avançavam pela estrada abandonada, cheia de destroços e entulhos de um outro tempo, um outro mundo. Agora, eles seguiam um caminho distinto, rumo ao desconhecido.

Ou melhor... eles seguiam agora um caminho rumo à esperança.