Inabalável SARA escrita por tsubasataty


Capítulo 16
14.


Notas iniciais do capítulo

Preparem o coração...



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Algo está vindo.

Da mesma direção em que tudo começou.

Algo grande.

 

Iara não retornou.

Dias se tornaram semanas e semanas se transformaram em meses. Sara ainda acreditava que a amiga voltaria para lhe trazer informações acerca do mundo, porém, quanto mais o tempo passava, mais suas esperanças foram desaparecendo de vez.

Quando faltavam duas semanas para acabar o inverno, Sara se viu completamente sem mantimentos. O frio e a neve não davam trégua por um dia sequer e a mulher se via cada vez mais sem opções.

Desistiu de esperar por Iara.

Precisava, agora, era encontrar o que comer.

Com os muros cada vez mais congelados e escorregadios, Sara estava tendo dificuldade para acessar as outras casas. Decidiu, portanto, que era hora de adentrar as casas do outro lado da rua. Começaria, então, por aquela casa que ficava bem em frente a sua.

Seguiu até a residência da família Monteiro, pegou as chaves e abriu o portão. Estava preparada e devidamente vestida como sempre fazia ao explorar algum território novo. Com a mochila nas costas e uma faca nas mãos, olhou para os dois lados da rua antes de atravessar às pressas.

A casa a sua frente era uma construção bem trabalhada, um dia lar de amorosas pessoas, porém agora estava corroída e esquecida pelo tempo. A fechadura enferrujada não foi problema para Sara. Com a ajuda de uma chave de fenda e seu canivete, não demorou até ela conseguir abrir o portão a sua frente.

Adentrou a casa e foi recebida por uma onda de fedor. Tapou a boca rapidamente com a mão e retirou do bolso um lenço. Amarrou-o ao redor do rosto e seguiu para o interior da casa. A porta da sala também não estava trancada ali e, com cuidado, Sara adentrou aquele território desconhecido.

O lugar gritava a abandono. Paredes rachadas, mofo por todos os lugares, poeira e terra em cada canto do chão. Enquanto seguia até a cozinha, ficou imaginando o que havia acontecido com a família que morava ali. Eles não eram próximos de Sara e viviam em seu próprio mundo particular, mas Sara, tentando pensar positivo, imaginou que eles estavam bem – só assim conseguiu seguir adiante, sem sentir um peso maior nas costas.

A cozinha, mais uma vez, era o cômodo mais mal cheiroso da casa. Sara sentiu vontade de vomitar. Prendendo a respiração, correu até os armários e foi abrindo um por um, faminta em busca de algo que pudesse comer. A maioria das coisas já havia mofado e estragado, mas no fundo do armário a mulher teve um vislumbre de esperança: haviam ali alguns enlatados e pacotes fechados intactos de comida.

Retirou tudo rapidamente e deu uma olhada no que encontrou: milho, salmão e ervilha enlatados e 3 pacotes em perfeito estado de macarrão instantâneo. A boca de Sara se encheu de água quando viu aquele macarrão – havia se passado muito tempo desde que ela comera algo assim pela última vez.

Agradecendo mentalmente, colocou tudo na mochila e seguiu para o restante da casa. Tudo o que ela precisava era de comida, nada mais importava para Sara naquele momento. Vasculhou gavetas de quartos, armários no meio do corredor e nem sequer uma última barrinha de cereal ela encontrou. Sabia que era hora de desistir.

Voltou para a sala e mexeu em algumas coisas. Foi então que se deparou com um pequeno bar escondido entre a poeira. Havia 3 garrafas ali. Sara limpou a sujeira com as mãos para ler os rótulos: um vinho suave e 2 garrafas de uísque. A bebida não era algo que fazia parte do cotidiano de Sara, porém naquele momento, sem pensar duas vezes, enfiou tudo na mochila e se dirigiu para a saída da casa.

Ela já estava do outro lado da rua, trancando o portão quando ouviu ao longe uma saraivada de tiros. Uma veia de preocupação brotou em sua testa; era a terceira vez que acontecia isso essa semana. Será que o barulho estava vindo da Ressurreição?

A intuição de Sara dizia claramente que sim. Porém, alguma coisa no fundo de seu ser sabia que lá não era o seu lugar. Ela sabia que não deveria pisar em território desconhecido sem pelo menos ter um grupo de aliados ao seu lado e algumas armas de fogo em suas mãos. Iara tinha uma espingarda, e sabe-se lá quais eram as outras armas do seu grupo.

Ela não iria arriscar tudo o que possuía porque sua amiga estava lá. Afinal, Iara sabia se defender – tinha recebido treinamento para isso. Sara, por outro lado, não tinha nada disso e sua única arma era composta por um simples estilingue de metal.

Desviou os olhos do lugar de onde saía os tiros e apressou-se em seguir para dentro de casa.

**

Os tiros continuaram por dias, e a cada hora que passava Sara ficava mais preocupada, porque aquilo não era normal. Na sua pequena cidade, anteriormente com cerca de 25 mil habitantes, não havia motivos para tamanho caos.

Alguma coisa muito errada estava acontecendo, afinal.

 

Demorou alguns dias para os tiros cessarem de vez.

Enquanto isso, a primavera mostrava seus primeiros sinais.

Toda a neve havia derretido e a temperatura durante o dia começou a subir, chegando a 20º. Sara enfim se viu livre do excesso de roupas e dos grossos cobertores que precisara usar toda noite para suportar o frio que encobria o seu redor. A grama voltou a crescer e as folhas das árvores se tornavam verdes outra vez.

Quando todo o gelo derreteu dos muros, Sara estava sem comida outra vez e decidiu que finalmente poderia adentrar a casa atrás da sua. Aproveitou que toda a cidade estava em silêncio novamente e começou a botar em prática a sua ideia.

Pegou a escada e apoiou-a no telhado, subindo rapidamente até chegar ali em cima. As telhas ainda estavam escorregadias, mas com cuidado Sara continuou em frente, rumo ao telhado da casa vizinha, que era unido ao telhado de sua casa. Atravessou sem problemas, e para descer até o chão escalou uma pequena plantação suspensa feita de madeira e metal que ficava no muro rente ao telhado. Não havia mais vasos ou plantas ali, então foi relativamente fácil chegar até o chão.

Sara não sabia o motivo, entretanto seu coração estivera acelerado o dia todo, e um leve tremor percorria seu corpo. Ela não sabia a razão, só sentia que precisava ser rápida e voltar logo para casa.

Com um empurrão, a porta para dentro de casa se abriu. Como todas as demais, aquela residência também havia sido destruída pelo mofo e podridão. Um ar desolado e de abandono caminhava lado a lado de Sara enquanto ela seguia para dentro de casa.

Logo de cara, deu de frente com a cozinha. Com o lenço já amarrado ao rosto, foi rápida ao abrir gavetas e armários. Na despensa encontrou diversos sucos de latinha, leite em pó, bolacha de água e sal, um potinho de creme de avelã e um tubo cilíndrico, uma comprida latinha redonda, recheada de batatas chips. Havia apenas isto, todo o resto já tinha estragado. Sem perder tempo, colocou tudo na mochila e seguiu até os quartos.

Mexeu dentro de guarda-roupas, armários e gavetas e tudo o que encontrou foram 2 únicas barrinhas de cereal. Decidiu que era hora de desistir; aquela havia sido a pior das buscas de Sara. Mesmo com a mochila ainda leve, decidiu que devia voltar para casa.

Sara estava escalando a horta suspensa quando o chão aos seus pés começou a tremer de repente e o ar acima da sua cabeça foi coberto por um barulho alto, ensurdecedor e surreal. Era como se um monstro estivesse habitando os céus. Subiu apressada o restante do caminho e, quando alcançou o telhado de sua casa, não acreditou no que viu.

Nada na vida a havia preparado para aquilo.

Toda a sua coragem se esvaiu, todo o restante de sua esperança foi pisoteada ali, bem na frente de Sara. Descobriu o que era aquilo que estava causando o tremor no chão e tudo que passou pela sua cabeça foi que havia chegado o fim. Diante daquilo que estava a sua frente, ela só conseguiu pensar que os zumbis enfim haviam vencido a humanidade.

Horrorizada e incapaz de acreditar, Sara via algumas ruas abaixo um exército enorme de zumbis seguindo para leste, exatamente onde se encontrava a sua casa. Não eram dezenas ou centenas, havia milhares de zumbis ali, prontos para devorar qualquer humano que aparecesse a sua frente.

Era um Zunami.

Para Sara, aquele era o fim.

Os joelhos de Sara quase cederam, mas antes que houvesse tempo para desistir, ela ouviu não muito longe dali alguém gritando desesperado seu nome. Prestou mais atenção e o barulho foi ficando cada vez mais próximo. Percebeu que era uma voz feminina, a voz de Iara.

Sara percebeu na hora: a amiga precisava de sua ajuda.

Forçou seu corpo a seguir em frente, mas tão distraída como estava olhando para a horda de zumbis, não se deu conta de que havia algo também percorrendo os céus. Tarde demais Sara viu o helicóptero. Tarde demais ela viu a bomba que aquela máquina mortífera em forma de libélula jogou na direção dos zumbis.

O impacto da explosão, juntamente com o vento que o helicóptero emitia, fizeram Sara perder o equilíbrio o rolar pelo telhado. Sem chance nenhuma de se proteger, Sara rolou até cair com força no chão de sua casa. Todo o seu corpo sentiu o impacto na hora e um estalo doído saiu de algum lugar de seu corpo.

A mulher tinha lágrimas nos olhos e não conseguia se mexer. Seu pulmão doía, sua garganta extremamente seca parecia que havia se fechado para sempre. Um gosto forte de sangue encheu a sua boca até fazê-la tossir. Gotas vermelhas mancharam toda a sua camisa. Sara sentiu um líquido quente escorrendo pela cabeça e forçou uma de suas mãos machucadas a irem até ali. Não demorou a perceber que estava sangrando na cabeça também.

Tentou com todas as suas forças, mas foi tudo em vão. Nenhuma parte de seu corpo respondia a seus comandos mais. Tudo o que a mantinha acordada ainda eram pessoas gritando seu nome, agora do outro lado do muro. Sara tentou abrir a boca, tentou gritar, mas tudo o que sentiu foi mais sangue saindo por sua boca, quase a impedindo completamente de respirar.

A mulher tossiu de novo e percebeu que já não tinha forças mais. Sabia que havia chegado o seu fim.

“Sinto muito, não consigo ajudar vocês”, Sara pensou consigo mesma, incapaz de pronunciar palavra alguma em voz alta.

Então, ela fechou os olhos, entregando-se à escuridão.


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Notas finais do capítulo

Fim da Parte 1