Histórias do cara do balcão. escrita por Mestre do Universo dos Vermes


Capítulo 8
Ironias do destino e a cor bege.




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Sabe uma coisa muito estranha? A cor bege.

Sério, até hoje eu não faço ideia se isso existe.

Vamos lá, sinceramente, me diga que cor é bege.

Já vi gente dizendo que bege é cinza claro, outro que é cor de pele (que, por sua vez, é um rosa claro meio pálido), outros que é um marrom parecido com areia... Fala sério, eu sinceramente duvido da existência do bege.

Mas, ei, eu também duvidava da existência dos monstros, então melhor não fazer apostas.

Por que eu estou falando de bege? Simples, estou entediado.

Enfim... Eu fiquei de te contar alguma coisa?

Vejamos... Tenho que terminar a historinha da minha breve vida de fazendeiro, certo? E teve aquele jantar com a Sênia/Saiko/Somalier que eu, pessoalmente, não achei muito interessante, mas algo me diz que você vai ficar morrendo de curiosidade se eu não contar.

Ou talvez não, vai saber? Eu posso ser muito presunçoso às vezes.

Minha vida não é tão interessante.

Enfim, por onde eu começo?

Vou te falar logo do jantar. Foi legal, comemos, falamos, comemos... Acredite se quiser, mas eu não tagarelei insuportavelmente! Afinal, não é sempre que eu ganho um convite para jantar e o mínimo que eu posso fazer é deixar a pessoa que pagou pela comida falar o que quiser e fingir que estou interessado na história. Além do mais, a comida era ótima!

Se bem que você não devia confiar muito nas minhas críticas culinárias. Qualquer coisa comestível, sem tomate e não completamente carbonizada é ótima para mim. Infelizmente, eu nunca alcanço esse último tópico por causa de acidentes com fogo na cozinha... Mas você já deve ter cansado de saber disso.

Enfim, a Sissie/Selethena/Saula falou um montão sobre um monte de coisas. Eu ouvi algumas, fingi que ouvi outras... Francamente, acho que nem ela ligava muito para o que estava falando, só queria evitar que a mesa caísse no silêncio.

Não sei como restaurantes "refinados" sobrevivem à guerra. Quem é o ser humano em perfeita sanidade que gasta dinheiro com luxo no meio de uma guerra? Tá que a comida era boa... Mas não é um lugar que eu iria se tivesse que pagar.

O ambiente era legalzinho também. Tinha até toalha de mesa bonitinha e música ao vivo, se bem que eu não sou o maior fã de violinos e esses instrumentos clássicos. Também tinha umas rosas vermelhas na mesa para enfeitar ou algo assim. Obviamente, não tinha muita gente (porque a maior parte da população deve ter bom senso e se contentar com a lanchonete ou os restaurantezinhos normais) então tivemos bastante privacidade também.

Aí, esse é um bom motivo para o restaurante chique se sustentar na guerra, propiciar um ambiente privado e seguro para reuniões e trocas de informação! Mas não leve isso muito a sério, é só uma ideia.

Ah, sim, eu tive que me enfiar num terno do Varsóvio/Veneso/Vilmar para ficar "apresentável" para o jantar. Sério, por que alguém usa um terno? Não vejo vantagens... É desconfortável, quente e ruim em geral! Não devíamos estar em guerra contra os monstros, devíamos estar em guerra contra as pessoas que instituíram ternos como roupas formais/sociais! Eu garanto que posso ser muito formal e social numa bermuda e com uma camiseta confortável, mas nããão....

E, antes que eu esqueça, se um amigo seu corre e se desdobra para te arrumar um terno com pouquíssima antecedência e sem muitas perguntas, ele é realmente muito seu amigo! Fico devendo uma para ele... Não que eu vá pagar um dia.

A Suleika/Sylna/Serena não tinha muitas fofocas interessantes... Aparentemente, a recepcionista foi mandada para a ala psiquiátrica porque estava abaixo do peso e vomitava tudo o que comia. A vaga abriu, mas o povo do RH já deve ter alguém em mente para preenchê-la. O "chefão", o cara que manda no prédio, fez uma reunião que parecia importante, mas duvido que fosse sobre isso, deve ser algo maior. Ah, e o bibliotecário ainda não gosta de mim (suspeito fortemente que ela só comentou isso porque estava sem assunto).

Enfim, esse foi meu "emocionante" jantar. Agora vamos à história!

"Onde eu parei mesmo?

Ah sim, galo travestido, fazendeiro bravo, fuga.

Sim, eu fugi de uma fazenda perfeitamente segura e ordinária por uma birra com o galo. Não, não foi dramático demais.

Eu ia cair fora e explorar o mundo sem rumo com nada além de uma mala improvisada. Por 'mala improvisada' entenda 'um cobertor amarrado como uma trouxa com umas roupas, comida e lápis de cor, tudo enrolado junto e preso num cabo de vassoura quebrado que eu peguei do depósito'. Eu poderia ter me virado para conseguir uma mala de verdade, mas, se era para fugir, eu faria direito! E a trouxinha de pano é clássica!

Clássica, mas não muito prática. Mochilas de rodinhas são muito mais fáceis de carregar! Ou mochilas normais... Mas tente carregar um amontoado de coisas presas num cabo de vassoura sobre seu ombro por tempo indeterminado. Uma dica: seu ombro vai começar a doer e você vai ficar trocando o peso de um para o outro, mas vai ser ruim mesmo assim.

E foi assim que eu desisti da ideia de 'fugir até o fim do mundo ou algo assim carregando minha trouxinha de coisas' por um motivo muito nobre: o fim do mundo era longe demais e minhas pernas e ombros estavam doendo! Sério, depois dessa, eu admiro as pessoas que tem disposição para fugir de casa, porque isso dá trabalho!

Eu andei até sentir que não conseguia mais dar um passo na frente do outro, não que minha condição física seja das melhores... E, quando isso aconteceu, fiz uma 'pausa para o piquenique' e fui repor as energias! Com muito cuidado para os agentes de campo não me verem, claro... Não acho que um cara que fugiu do trabalho por causa de um galo fosse uma história muito acreditável e, mesmo se acreditassem que eu era só um idiota e não representava perigo, eles só me mandariam de volta.

Eu me esquivei, achei um ponto deserto que parecia seguro, estendi meu cobertor no chão e fui comer! Aí vai um conselho de um péssimo fugitivo: se você tiver que optar entre perder um pouco mais de tempo para achar uma mala decente ou fazer uma trouxinha de pano clássica, escolha a mala. Lembra que eu joguei tudo dentro da trouxa? Pois é, depois tive que ficar separando roupa de comida de lápis de cor. Foi uma bagunça!

Por que eu levei lápis de cor? Ora, esteja sempre pronto para desenhar e colorir! Eu tinha direito a pelo menos um item divertido durante minha fuga!

Separar comida de pano foi uma droga, até porque eu levei um saquinho de grãos que abriu e ficou tudo espalhado. A pior parte foi que, depois de separar, descobri que tinha confundido os cereais com a ração de galinha de novo... Mas, bem, quem sou eu para reclamar a essa altura do campeonato? Só aceitei minha realidade e almocei ração de galinha.

Não é tão ruim quanto parece.

Ah, eu posso ou não ter esquecido de pôr água na minha trouxa improvisada... E com isso eu quero dizer que esqueci completamente.

Se bem que, considerando que o saco de ração abriu e se espalhou todo, talvez isso tenha sido uma coisa boa. Vai que eu molhava tudo também?

Decidi andar até um lugar que tivesse água, assim eu não morreria de sede. Parece uma boa escolha, certo? Isso é, se você desconsiderar meu péssimo senso de direção.

Em resumo: havia um rio bem a oeste da fazenda, eu andei praticamente para o lado oposto. E foi assim que eu esbarrei na fazenda do sudeste.

Isso aí, saí de uma fazenda para esbarrar em outra no caminho. Que demais! Há há há, ironia.

É nessas horas que eu penso se não devia ter me aventurado pelos bosques no território dos monstros. Tá que eu poderia acabar morto de várias formas, mas pelo menos não teria ironias cósmicas ou algo assim.

Enfim, eu estava cansado, com fome (ração de galinha não é exatamente satisfatória) e com sede. A fazenda estava ali... E eu nunca tive muitos princípios mesmo. Meu plano? Esperar a madrugada e 'pegar emprestado' uns suprimentos para seguir viagem.

Que foi? Eu com certeza não queria outra estadia numa fazenda! A vida de andarilho doía menos!

Infelizmente, eles tinham um cachorro.

Era um bichinho adorável, sabe? Vira-lata de porte médio para grande e com uma bela arcada dentária. Posso garantir essa última parte porque fui eu que corri como nunca tinha corrido antes para evitar que os dentes dele se cravassem na minha pele!

Os latidos do cão acabaram acordando o fazendeiro e a filha dele. Ainda não sei se classifico isso como sorte ou azar... Por um lado, foi muito bom o cachorro parar de me perseguir, por outro, a visão de um fazendeiro irritado no meio da noite com uma arma na mão e uma cara de poucos amigos não foi uma melhora significativa.

Ele me perguntou 'quem diabos eu era e o que estava fazendo ali no meio da noite' ou algo assim. Eu fiz um resumo bem rápido porque, bem, quando uma arma está apontada para você, você não vai querer enrolar muito. Minha história soou tão ridícula quanto você imagina ('fugi da fazenda vizinha porque vesti um galo de galinha para ver se ele calava a boca') e eu ainda não sei como o fazendeiro não atirou em mim por achar que eu estava inventando.

Bem, eu ganhei comida e uma cama, viva! Tá que 'cama' significa 'um monte de palha no celeiro', mas estava bom. E a comida era de gente, o que foi uma mudança bem-vinda! A parte chata é que, assim que o sol nasceu, o fazendeiro me chamou para sentar com ele na mesa da cozinha e só me deixou sair depois de eu explicar tudo certinho e com todos os detalhes.

Por sorte, acho que caí nas graças da filha dele. Ela ficou espiando não muito discretamente e riu bastante durante minha história de como eu rivalizei com um galo, deixei animais escaparem e arruinei plantações. Aliás, senso de humor meio duvidoso para a filha de uma fazendeiro... Mas eu gostei de fazê-la rir, admito.

O fazendeiro me fez uma proposta irrecusável: eu passava um tempo trabalhando lá e, em troca, ele me alimentava e me deixava dormir no celeiro até decidir o que fazer comigo. Sair de uma fazenda para entrar em outra? Obviamente, eu não gostei muito da ideia, mas aí ele comentou não muito delicadamente que eu acabaria morrendo se saísse e que eu devia uma por acordá-lo no meio da noite e pela 'estadia'. Além disso, ele tinha uma espingarda nas mãos, o que foi provavelmente o argumento mais convincente que eu já vi...

Nunca contrarie um fazendeiro com uma espingarda!

Não faço ideia do motivo de ele querer minha 'mão de obra' depois de ouvir o desastre que eu fui na outra fazenda... Mas, ei, comida, cama de palha e não morrer nem ser acertado por uma espingarda parecia um ótimo negócio! Só fiz uma 'exigência' (morrendo de medo, porque pedir coisas para um fazendeiro armado é tenso) que eu realmente precisava: nada de galos no celeiro enquanto eu dormisse lá!

O fazendeiro riu e concordou com esse meu pedido. Já gostei mais dele que do Senhor EPC! O Senhor EPC nunca riu das minhas piadas...

Fiquei lá por quase uma semana, eu acho. Foi divertido. Tive alguns acidentes, claro. Irritei o fazendeiro, que, apesar de ter veia cômica, levava meus erros a sério! Mas, no geral, me saí bem melhor do que na outra vez. Provavelmente porque eles, já alertados do meu histórico, não me davam nenhuma tarefa 'perigosa'. Eu ajudei a filha dele a escovar os cavalos (sem acidentes porque, bem, era só crina e escova, nem eu sou tão desastrado assim!), a cozinhar (ela fez tudo que envolvia facas e fogo, eu só jogava os restos no lixo e amassava batatas/cenouras/alho se precisasse) e a estudar (isso aí, 'tutor-parte 2', ela recebia educação em casa mesmo e o pai não tinha tanto tempo por causa da plantação... Francamente, acho que não fiz muita diferença, ela estudava bem sozinha).

Enfim, não foi uma estadia tão ruim quanto eu imaginei. O cachorro deles não gostava muito de mim, mas eu podia viver com isso.

Por isso eu fiquei bem chateado quando o fazendeiro disse que eu precisava voltar para a outra fazenda.

Eu até entendo o lado dele: eu não era exatamente 'útil' e era uma boca a mais para alimentar, além de ocupar espaço e tudo o mais... Além do mais, acho que ele poderia se encrencar bastante se alguém descobrisse que ele me 'acobertou' com minha fuga. Pois é, olha que surpresa: desertar seu posto durante uma guerra, seja ele qual for, não é muito bem visto por... Quase ninguém na verdade.

Ah, eu também posso ter incendiado uma partezinha do celeiro sem querer... História estranha que eu realmente não estou a fim de dividir. Pelo menos o fogo não se espalhou.

Enfim, tive que voltar e não tinha muita escolha no caso. É mais ou menos como quando você é uma criancinha tentando fugir de casa e alguém te pega na rua ainda na esquina. Não que eu já tenha feito isso... Mas imagino que a sensação é parecida.

O Senhor EPC não ficou nem um pouquinho contente por me ter de volta, o que me alegra é o fato de ele não possuir uma espingarda. Em resumo: eu causei danos demais, bem de menos e não tinha um pingo de fidelidade ou boa vontade para trabalhar no campo, então fui devolvido. Isso aí, como mercadoria defeituosa ou produto indesejado. Não sei o que o Senhor EPC disse, mas pode ter sido algo nas linhas de 'destruir plantações, perder animais, fugir...' porque eu voltei para o prédio bem rapidinho.

Fui meio que excluído da vida rural também, então espero não precisar trabalhar no campo de novo no futuro! O povo do RH deve ter feito até bonequinho voodoo de mim porque, admito, essa foi a melhor tentativa deles, mas eu arruinei mesmo assim.

Depois dessa, me colocaram para monitorar câmeras. Fui demitido rapidinho também... Ô empreguinho chato, aliás. Acho que foi aí que eu comecei a fazer inimizades na segurança também..."

Enfim, essa foi a história de quando eu fui despedido 'de vez' e como eu voltei para o prédio depois.

Não é emocionante, eu sei, mas você sabe que nunca é.

E, se você continua voltando, deve gostar de alguma coisa nessas histórias.

Ah, se lembra do Agente Chihuahua? Aquele que me obrigou a me exercitar sem nenhuma razão lógica e compreensível? Pois é, parece que ele e a Dra. Acre tiveram problemas no paraíso... Estão brigados.

Os dois continuam meio "obcecados" com os andares subterrâneos. Pessoalmente, não aconselho esse comportamento, mas não é como se eu tivesse moral para aconselhar alguém. E acho que eles só ignoraram qualquer indireta para "pergunte qualquer coisa menos isso" que os caras de colarinho branco devem ter dado.

Bem, deixa pra lá, só fofoca. Eu sou um fofoqueiro incorrigível, você sabe.

A Dra. Acre é esperta, sabe ficar quieta na dela quando as coisas ficam difíceis. Já o Agente Chihuahua, bem... Ele não tem a sutileza necessária.

Aliás, eu o acho meio interessante, você não? Quer dizer, como pessoa ele é bem simples: agente de campo que vigiava as fronteiras, mas nunca saiu para o "campo" de verdade, para a batalha. Bom condicionamento físico. Disciplina. Com certeza sabe cumprir ordens. O que me intriga é ele ter "desistido" das rondas e missões para virar instrutor no prédio. Sei lá, ele não me parece o tipo que ama ensinar ou algo assim, ele parece mais o tipo de cara que prefere a ação.

E ele decidiu abandonar o trabalho de campo mais ou menos na mesma época que o Capitão foi "morto por monstros" num lugar que não tinha monstros... Interessante, não? É quase como asilo político ou como aqueles criminosos de desenho que fogem e se escondem no México.

Enfim, esquece, só ideias soltas de um cara que não tem nada para fazer além de ficar atrás de um balcão fazendo nada e cuidando de um tamagotchi, nem deve fazer sentido.

Falando nisso, eu alimentei o Rinnie/Rocky/Rusty hoje? Xiii... Melhor checar isso logo.

Bem, te vejo por aí.

 


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