Histórias do cara do balcão. escrita por Mestre do Universo dos Vermes


Capítulo 10
Cola no RH e o sem calças.




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Hey! Você por aqui!

Depois do desastre da última conversa, eu não tinha certeza se você voltaria.

Para ser franco, eu não me lembro exatamente do que houve na nossa última conversa porque, bem, a sensação de elefantes dançando balé na sua cabeça realmente pode te distrair... Mas eu lembro que apelei para assuntos ridículos e terassá. Por experiência própria, eu sei que esse último afasta as pessoas.

Não que eu culpe as pessoas. Eu também manteria distância de um cara que não consegue pensar em nada melhor para falar que na língua quase impronunciável do povo que está em guerra com a humanidade como um todo.

Por outro lado, se você desconsiderar a guerra, a xenofobia, os possíveis acidentes envolvendo morder sua língua e deslocar sua mandíbula e o fato de praticamente nenhum ser humano o falar, terassá é um idioma muito interessante.

Por exemplo, sabia que em terassá existem três modos diferentes de dizer "lar"? Um deles é para lugares físicos, um é para seres vivos (eu ia dizer pessoas, mas não acho que seria preciso...) e um é para cheiros e sensações.

Não me pergunte o motivo. De novo: eu não faço ideia.

Eu não faço ideia de muita coisa.

Enfim, melhor eu parar de falar de terassá antes que você decida ter bom senso e sair daqui.

Sobre o que mais eu posso falar...?

Hm... Eu comentei a "batalha" brutal que teve entre humanos e monstros esses dias? Não que batalhas entre humanos e monstros sejam incomuns, afinal, estamos em guerra e tudo o mais. Essa só se destaca por ter sido bem brutal. Um montão de agentes de campo morreram, provavelmente um monte de monstros também... Em resumo, deve ter sido uma sanguinolência só.

Sanguinolência é uma palavra muito bonita, não? Devia ser mais usada... Ou não, afinal, o significado não é dos melhores.

Enfim, do que eu estava falando?

Ah sim, o massacre chamado carinhosamente de batalha.

Não foi grande coisa. Bem, quer dizer, as mortes e tudo o mais foram grande coisa, e a batalha deve ter sido também (mas eu não estava lá para saber, certo?), mas as consequência em geral não foram. Fizeram aquelas honras militares todas e enterraram, simples assim, nada além do usual.

Aliás, um monte de gente (agentes de campo) morreu, um monte de monstros morreram e, na prática, nada aconteceu. A guerra continua e mais batalhas estão por vir... Só eu acho isso meio esquisito? Sei lá, vai ver é porque eu nunca entendi direito as regras do War quando era menor (eu era péssimo nesse jogo), mas eu não entendo como funciona uma guerra. Você tem que matar todo mundo para vencer? Ou tem pessoas específicas?

Na minha opinião, deviam fazer um limite, algo do estilo "a partir de X inimigos mortos, você é automaticamente declarado vencedor e ganha uma cesta de frutas". Assim, pelo menos, as mortes não pareceriam completamente sem sentido! É batalha depois de batalha para quê? Para nada!

Enfim, acho que esse é o motivo de eu nunca ter trabalhado como estrategista. Isso e porque minha estratégia consistiria de esperar o dia dos namorados e entregar um buquê de flores gigante para os monstros e ver se dá certo.

Aliás, já falamos tanto de trabalhos, então por que não falar do povo que organiza o trabalho de todo mundo? Isso mesmo! O pessoal do RH!

Uau, eu devia ter pensado nisso antes. É um assunto muito melhor que, bem, qualquer outro que eu tentei improvisar antes.

Vamos lá:

"A primeira vez que eu tive contato com o povo do RH foi, obviamente, a primeira vez que eu tentei ter um emprego. Ia ser meu primeiro emprego e eu estava bem ansioso, mas não de um jeito bom, de um jeito nervoso e prestes a ter um ataque cardíaco seria o mais próximo da realidade.

Por que eu estava nervoso? Não faço ideia. Acho que a primeira entrevista de emprego dispara um hormônio desconhecido no seu corpo ou algo assim que só funciona nessa vez específica, mas que faz todo o seu corpo sentir que está em perigo imediato no processo. Não, eu não era muito bom em biologia.

A entrevista em si não foi ruim. Claro que eu não tinha nenhuma experiência, mas eu ia ser estagiário, então não acho que isso pesou muito. Fizeram uma perguntas estranhas que, por razões desconhecidas, entrevistadores fazem, como 'que animal você seria?', 'como você se vê daqui a dez anos?', por que se interessou nessa vaga?', etc.

Acredite se quiser, eu não estraguei tudo! Talvez por causa desse hormônio desconhecido da primeira entrevista, mas eu estava tão 'travado' de medo e ansiedade que diz a única coisa lógica no momento: menti descaradamente.

Não tenho muita certeza do que eu disse, mas parece que eram as respostas certas, porque consegui a vaga de estagiescravo! Tá que, na época, eu chamava de estagiário, mas você entendeu...

Além do mais, acredite se quiser, mas eu colei no teste escrito. Isso aí, eu colei numa entrevista de emprego. Bem... Não na 'entrevista' propriamente dita, mas num questionário que vinha antes como 'pré-seleção'. O pior é que eram respostas pessoais.

Em minha defesa: eu colei as respostas pessoalmente! Deve valer alguma coisa!

Isso foi antes de a guerra começar. Depois do início da guerra todo mundo teve que refazer as entrevistas porque, bem, depois de a maior parte da população mundial ser exterminada, é sempre bom checar a estabilidade mental dos seus empregados.

Infelizmente, o "hormônio da primeira entrevista" só funciona uma vez, então, nessa aí, eu fui eu mesmo. Além do mais, não consegui colar de ninguém...

Não, eu não sei como consegui ainda ter um emprego. Eu fui muito 'eu mesmo' na segunda vez. Por exemplo, quando perguntaram 'qual animal você seria?', minha resposta foi 'um axolotl!'. Perguntaram o motivo e eu disse algo como 'eu seria fofinho, esquisito e com um nome muito estranho'. Também perguntaram como eu me via em dez anos e eu disse 'com sorte, empregado'. Para o motivo de eu querer o emprego foi mais ou menos 'olha, eu não quero exatamente o emprego, eu quero não morrer de fome ou de outros fatores, o emprego é consequência'.

Enfim, eu garanto que fui eu mesmo na entrevista! Nem colei!

Talvez a pior parte seja que eu, sem querer, derramei café na camisa do entrevistador... E depois posso ou não ter sem querer feito a cadeira dele atravessar a janela enquanto tentava apagar o tapete que pegou fogo sem querer num acidente envolvendo cigarros e algodão, que por sua vez aconteceu quando eu tentei ajudar ele a limpar a camisa.

Considerando que era só minha segunda entrevista de emprego, não acho que eu fui muito mal.

E eu consegui um emprego, certo? Então realmente não deve ter sido muito mal!

Aliás, se eu não me engano, foi nesse período que eu conheci o Sr. Fuinha com Prisão de Ventre. Ele era um 'chefe' meio enjoado e com certeza estava disposto a se aproveitar do meu crachá vermelho! Por isso eu digo e repito: crachá vermelho é a marca da besta nesse prédio!

Antes de eu aprender a lidar com ele, as coisas eram difíceis. Ele sempre achava algo para reclamar! E, quando eu digo 'sempre', é 'sempre' mesmo. Ele reclamava do café que eu pedia (mesmo sendo exatamente o que ele pediu), ele reclamava que eu demorava (mesmo se eu corresse mais rápido do que seria seguro numa escadaria) e, se ele não tivesse do que reclamar, reclamava da minha roupa/postura/atitude/falta de atitude.

Acho que um dos melhores dias da minha vida foi quando eu descobri que os biscoitos de aveia da creche aliviavam o mau humor desse cara! Sério, se você tem algum problema envolvendo seu aparelho digestório, faça um favor para a humanidade e coma mais fibras em vez de descontar nos outros. Principalmente se 'os outros' são pobres estagiários recém contratados!

Também tinha um cara de colarinho branco nessa época que, eu juro, era doido para me demitir. Sério, ele procurava motivos para me mandar embora, me reportar para o chefe ou qualquer coisa assim! Vamos chamá-lo carinhosamente de Sr. Sans-culotte. Por quê? Fácil: se eu me lembro bem das aulas de história (o que é improvável, mas vamos ter fé) 'sans-culotte' significa, literalmente, 'sem calças'.

Isso aí, sem calças. Tinha algo a ver com a Revolução Francesa e o povo que era pobre demais para comprar 'culottes' (calças de gente rica com um nome enjoado). Não, o apelido não tem muito a ver com a Revolução Francesa, tem mais a ver com o 'sem calças' mesmo.

Se bem que, se quiser relacionar à Revolução Francesa, pode pensar que os sans-culottes lutaram pelos seus objetivos, mas foram reprimidos, assim como o Sr. Sans-culotte lutou para me demitir, mas fracassou.

Enfim, eu me recuso a acreditar que eu era o único incomodado com o fato de o Sr. Sans-culotte usar absolutamente todos os intervalos dele para se envolver em 'atividades recreativas' com a secretária (ou outras mulheres). Fala sério, era inconveniente! Quem consegue se concentrar no trabalho ouvindo o som de pessoas se divertindo de modos não muito pudicos na sala ao lado?

Aparentemente, todo mundo menos eu. Sim, o Sr. Sans-culotte se irritou com minhas reclamações, até porque eu não reclamei com ele, e sim com o chefe... Em resumo, ele precisou diminuir bastante as pausas recreativas dele.

Ora, não me olhe assim, você faria a mesma coisa no meu lugar!

Eu fiquei mais feliz sem ter que aturar aqueles sons inconvenientes, mas, por outro lado, não fiquei tão feliz por ter um novo inimigo 'de colarinho branco'.

Por sorte, eu deixei de ser estagiário logo. Nunca mais tive nem que olhar na cara dele! Acho que ele ainda tem algum tipo de ressentimento contra mim..."

É, eu sei que não é a mais emocionantes das histórias, mas é o que eu tenho.

Espero que seja o bastante pra você, eu gosto das suas visitas.

Enfim...

Já teve a sensação de estar esquecendo alguma coisa? Eu tenho com muita frequência, mas acho que dessa vez é algo importante...

Bem, se for realmente importante, eu vou acabar descobrindo mais cedo ou mais tarde.

Enquanto isso, podemos ficar aqui falando sobre nada.

Só espero não apelar para falar do clima! Isso é falta de assunto demais até pra mim!

Mesmo assim, o que eu posso estar esquecendo?

Não pode ser de alimentar o Rufus/Românico/Renê porque hoje ele está com o Vesúvio/Vinnie/Valter. E, provavelmente, está sendo mais bem cuidado do que seria se estivesse comigo.

Não pode ser um almoço/lanche/jantar por conta da Sissineide/Sulmira/Sicília porque, por mais que eu gostasse de comer à custa dela, ela não trabalha mais nesse prédio desde ontem.

Não pode ser algo relacionado ao trabalho porque, bem, meu trabalho consiste em não fazer nada, e é impossível esquecer disso.

Hm... Ah sim! Era isso! A Dra. Acre disse que queria me ver hoje!

Aliás, que horas são? Xiii... Melhor eu me apressar. Algo me diz que deixar aquela mulher esperando é uma péssima ideia. Diferente da Sélia/Sam/Sônia, ela não me desculparia de jeito nenhum!

Bem, melhor eu ir, mas foi ótimo falar com você.

Nos vemos por aí.

 


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