WSU's: Zenith escrita por Lucas, WSU


Capítulo 7
Capítulo VII - Mise-en-scène


Notas iniciais do capítulo

''Três Anéis para os Reis-Elfos sob este céu;
Sete para os Senhores-Anões em seus rochosos corredores;
Nove para os Homens Mortais fadados a morrer;
Um para o Senhor do Escuro em seu Escuro Trono,
Na terra de Mordor, onde as Sombras se deitam.
Um Anel para a todos governar, Um Anel para encontrá-los,
Um Anel para a todos trazer e na Escuridão aprisioná-los,
Na terra de Mordor, onde as Sombras se deitam.''



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/741847/chapter/7

O caminho era curto. Nenhum dos dois queria o fim da viagem. Não precisavam ouvir discursos moralizadores, podiam ser quem eram, dois jovens que passam o dia falando asneiras, a evolução pessoal passa por esta fase. 

Mia já vivera um teatro antes, a experiência foi horrenda. Então, é certo que ela não quisesse mais passar por nenhuma outra epopeia. Contraditório, pois era justamente uma epopeia romântica aquilo que estava fazendo.  

Queria falar sobre música, cinema, queria poder xingar meio mundo sem se preocupar em ser repreendida. Ela fechou o cerco para si, envolveu-se com o que não deveria. Pobre garota, tinha o emaculado poder do submundo correndo por seu corpo, mas ao mesmo tempo tinha a cabeça confusa de uma adolescente.  

''O quê quero da vida?'' ''O quê fazer agora?''

Se Mia dissesse obter o controle sobre algo, estaria mentindo.  

— Mirra, yah!? É aqui, Székesfehérvár! — disse ele acordando-a.

A menina de olhos roxeados olhou pela janela e se deparou com a cidade. O contraste desnorteava. Céus eternamente cinzas, cidades magníficas de vivas, qualquer foto tirada ali proporciona um quadro modernista. 

— Esse país é lindo... — Mia sussurrou.

— Se juntassem todas as cidades húngaras, ainda não se comparariam à sua beleza. — Rotten Boy deu a cartada.

Mia virou o pescoço, puxou um sorriso, aproximou-se dele e retribui com um simples beijo no rosto seguido de um abraço.

— Se cuide, garoto podre. E pare de fumar, seu pulmão e o nariz das pessoas agradecem. —ela o soltou e saiu. 

— Yah, Mirra! — exclamou ele sob o bater da porta — Denken Sie daran: Tudo o que temos de decidir é o que fazer com o tempo que nos é dado.

E ele foi desaparecendo, encoberto por uma enorme névoa. Mia acompanhou seu amigo momentâneo partir-se. Ao virar-se para o lado, lá estava ele, sentado numa pequena mureta. 

— Pronto? — indagou Zagan para Mia — O quê fazemos agora? 

— É você que detém as forças que nos ajudarão, não eu... — esquivou-se.

— Nós fizemos uma promessa. 

— Fizemos...

— Mia — ele balançou a cabeça negativamente — O quê você quer da vida?

Ela se sentou ao lado de Zagan.

— Da vida quero apenas a morte. 

— A morte? As árvores aqui atrás podem ajudar. E se quiser podemos modelar uma corda agora mesmo... — provocou.

— Não, depois... Eu tenho tudo sob controle... Vamos explorar antes. — ela se levantou.

Zagan, agressivamente, agarrou o braço de.

— Explorar um lugar que nunca esteve? 'Risco'? 'Perigo'? Sabe o quê significam? — pela primeira vez, a voz de dele não manifestou-se inocente.

— Eu tenho o tempo que quiser! — mas ela confrontava. 

— Mais do que isso, sabe o que 'Responsabilidade' significa? Ou melhor, sabe o que 'Promessa' significa?

— O que quer que signifiquem, não te dá poder sobre mim!

— Não? — a voz voltou ao normal —Vem, sente-se aqui. — puxou-a suavemente.

Antes, ele analisou o redor. Viu que aquela região de Székesfehérvár estava vazia, e então decidiu que era hora de Mia ter o primeiro contato com seus dotes.

— Pegue a foto... — disse Zagan.

Ela começou a revirar os bolsos desesperadamente. Não achara. 

— Eu perdi, Zagan! Meu Deus, eu perdi a foto! — falou alarmantemente enquanto olhava o por dentro da blusa. Ao voltar as vistas para Zagan, lá estava ele com o papel estendido em direção à ela.

— De nada. — e provocou.

— E agora? — perguntou Mia introvertida.

— Coloque os dedos indicador e médio no rosto dele.

— Está bem... — ela fez.

— Feche os olhos.

— Certo... — ela os fechou. Para a estética era ruim que olhos tão belos não ficassem à mostra. 

Zagan desapareceu e Mia ficou ali confabulando com os dedos sobrepostos à imagem.

Da boca dela começaram a pronunciar-se palavras não-comuns. A tal foto, então, começou a queimar onde Mia segurava. 

— Mortem. Zero. Homem. — começou a propagar mais intensamente — War. Mortem. Homem. Semita. Nayti. Homem...  

***

Mia foi para onde a luz não nascia e as cores não existiam. Quando abriu os olhos, deparou-se com a escuridão fleumática. Ela não se desespera. Caminha com cuidado, é claro, colocando as mãos à frente na intenção de sentir o que não era visto. 

— Granada! — grita o vulto que passa correndo ao fundo.

O eco persiste. Ela segue a sonoridade, que perde o austero conforme os segundos se passam. Ali não existe engenharia, pois não se constrói à partir de um desconstrução. 

Nem mesmo as trincheiras cobertas por corpos, sangue e estilhaços assustam Mia. Ela dá um passo à direita, observa a morte, sua face demonstra uma leve epifania diagramada de acordo as circunstâncias que imaginava terem colocado aqueles homens.    

''Quantos amores não acabaram?''  

''Quantos sonhos resumidos à estatísticas e dados históricos...''

Tudo partia do subconsciente. Quanto mais andava, mais descobria. Naquele lugar definitivamente não havia luz, não a que conhecemos. A luz era as pessoas. 

Mia ouviu gritos, não o seguiu pois era impossível, era infinito, eram gritos que pediam por uma ajuda que não viria. 

Raiva, ira, ódio, sinônimos encarnados pela criatura que se formava. Rasgava-se o uniforme e a pele, brotava o medo. 

— Meu Deus, por favor não! Não por favor! Tenha piedade de mim! — berra o homem enquanto seu humanismo e sanidade se esvaem.

Tarde demais. Dois metros e quarenta de pura dor se debatem como um peixe fora d'água. 

Ela não é amedrontável, não neste estado. Ficou observando indiferentemente a fera de autoflagelando. Deixou que os golpes fatais do tempo cansassem-no. 

Soca o chão e o peito. Esfacela as raízes humanas. Perun, o principal dos deuses eslavos, não transmitiria tanta violência e pânico.

Tudo caíra. E ele caiu, diante de Mia. De pouco a pouco perdera as características animalescas. Ela se abaixou diante do corpo, passou a mão por tudo que tinha direito.

Esfregou as palmas por trás do pescoço do soldado, e encontrou uma corrente de metal com os dizeres: V. Mereszész - Katona - 033

— Quem será você... — disse Mia.

***

Ela acordou ofegante, de uma vez. Deitada em uma velha cama num decadente quarto de hotel. Zagan estava ao seu lado, sentado em uma cadeira de madeira. Pasmem: Tal cadeira não fazia barulho algum. 

— Demorou sete horas, Mia. — ele informou.

— Como assim 'sete'?! — ela ofegou-se mais ainda surpreendida.

— Foi às onze, voltou às dezoito.

— Eu não fiquei dez minutos lá dentro, Zagan!

— Não mesmo, ficou quatrocentos e vinte.

— Mas por quê?! — questionou indignada

— Dimensões diferentes, proporções diferentes... O quê descobriu?

— Tinham uns homens em guerra, tudo era escuro... Havia um lobisomem, Zagan! — exclamou.

— Isso é útil...

— Sim, eu vi um lobisomem com meus próprios olhos... Ele gritava, combatia-se, não sei explicar! — disse trêmula — Ele caiu, ele caiu na minha frente! Eu vi um colar! Um colar de identificação que só dizia o segundo nome! 

— Isso é importante...

— Eu me lembro bem! Pode nos ajudar, podemos procurar por ele, devem existir registros aqui... Zagan, se aquele homem foi tudo o que vi, há uma história à ser descoberta! — interessou-se.

— Você está livre para tomar a decisão que quiser à partir de agora, Mia.

— Se tudo aquilo for verdade, deve ser conhecido nesse lugar, pode ser uma lenda urbana, mas alguém sabe alguma coisa.

— Você acha mesmo?— ele pouco se importava com a fascinação dela.

— Sim! Um centro de cultura ou uma biblioteca, ele era do exército, parece ter lutado na segunda guerra, museus possuem dados históricos sobre estes assuntos, podemos procurar! — Mia gesticulava energicamente com as mãos.

— O quê vai fazer?

— Vou procurá-lo! O quê mais poderia fazer?! 

— Eu não sei, você decide, lembra?

— amos fazer isso, eu tenho pelo que perguntar e vou ter sua ajuda, não é?

— É a terceira vez que falo: Tudo pertence à você. — disse sério.

— Até quando? — questionou.

— Não confia em mim?

— Confio... — respondeu Mia inspirando fundo — Mas poderei confiar em você até que ponto?

— Se a resposta é 'sim', tudo será seu, todo poder será seu, tudo à medida em que eu julgar necessário. — ele estralou os dedos — Há a possibilidade de que Zagan não deva confiar em Mia?

— Eu te ofereço algum mal? 

— Você pertence a uma raça que se auto-extermina. Se são capazes de matarem os próprios semelhantes, o quê não fariam à aqueles que não são iguais? 

— E você pensa que todos são desse jeito, é isso? — ela sentiu uma rápida e extrema preocupação. 

— Sempre que querem se eximir da culpa acabam usando a desculpa da generalização, esse é o maior argumento que os mortais tem?

— É certo igualar todo um conjunto de indivíduos às ações de alguns grupos ao longo da história? 

— "Alguns grupos"? "Alguns", Mia? Os nazistas, os fascistas, os proclamadores da inquisição, a Al-Qaeda, o ISIS... "Alguns"? Faz ideia de quantas vidas se foram por "alguns"? 

— Por que um demônio existente a mais de mil anos se importa com o que se faz ou se deixa de fazer na Terra? 

— Porque dependemos do que vocês fazem aqui... — Zagan surpreendeu Mia com a revelação —Por isso vigiamos os humanos todas noites, quando fecham os seus olhos lá estamos nós, na escuridão, onde o Messias nos deixou... Nós não temos nada, nossa única esperança são vocês, os pecadores. Pecado é nosso alimento, e quanto mais se manterem, por mais tempo existiremos.

— Entidades que vão além das compreensões humanas mas que são dependentes da razão humana... Hipócrita esse paradoxo, não acha?  

— Não há nenhuma dificuldade em nos compreender, Mia. Um aglomerado de espíritos servis... Sim, não vou mentir pra você, alguns de nós conseguem ser muito mais que isso. 

— Eu não tenho tempo e nem paciência pra saber o que vocês demônios são... Nós temos um ao outro e confiamos um no outro, então, se nosso vínculo for verdadeiro, — ela estendeu a mão fechada para Zagan — juntos podemos — forçou o punho e podia se ver suas veias saltando — ser maiores que tudo. — abriu-se e na palma de sua mão estava um crucifixo destruído.

***

Viktor havia saído, fora resolver os termos burocráticos antes de ir visitar Deszo. Nina não se desfez da rotina, escalou a mesma montanha com seu filho. Não era um lugar adepto de constantes visitas, era vazio de emoções falsas. Os galhos que sempre balançavam, o verde que cegava, a altura vertiginosa. São detalhes que irritariam o mais dos ignorantes. Acalmariam o mais dos ameaçadores. Ensinariam ao mais dos sábios.

— Seu pai sempre foi muito bem educado... — disse Nina para seu filho enquanto amamentava-o ao ar livre - Ele teve a sorte que muitos não podem ter, você também terá essa sorte... A diferença é que ele nunca quis ser mais que um ótimo marido e pai, mas você, meu filho... Será isso e mais um monte, te mandaremos para o Exército, vai aprender muito lá... Vai descobrir que o mundo funcionaria melhor se fosse governado pelas forças armadas. Seu pai sempre sempre valorizou a pátria, espero que ti herdes isso dele, Lýkos. Vai aprender a nunca chegar perto de uma francesa, não por causa do cheiro, mas porquê nenhuma francesa é fiel ao marido. Vai aprender muito, pois não quero que seja igual à mim e a ele, rico e desocupado? É desperdício, tem que aumentar o império cada vez mais, mesmo sendo uma fortuna de 35 bilhões de euros... Dinheiro cria o futuro, meu amor, dita o presente e destrói o futuro, cabe à você escolher. 

A única classe que entrega amor verdadeiro é a materna. Ninguém como ninguém é capaz de propagá-lo como uma mãe. O motivo não é muito claro, é fenômeno da natureza que se tornou definitivo. Um pai pode odiar o filho, o pai de Nina a odiava, a mãe não. É uma definição que incomoda, mas não são cem por cento dos pais que amam seus filhos. Quanto as mães sim, todas amam seus filhos. 

— Tem que ir além do impossível, meu filho — ensinou —, limites estão na sua mente. Limite é o que você dá a si mesmo. Viktor limitou-se ao marasmo... Não siga seu pai nesse quesito, é o que mais me dá vergonha nele, ser alguém que só faz peso na Terra. Não, a tarefa de cada um aqui, meu filho, é ser a diferença num emaranhado de semelhanças.

***

O fogo aos braços.

Outra com a mentira em mãos.

Ele sabe de tudo.

Ilusão da cabeça aos pés.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "WSU's: Zenith" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.