Teimosia escrita por LizAAguiar


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olá o/

Apenas uma one despretensiosa exclusiva para pessoas que não tem diabetes u.u

Tenham uma boa leitura ^^



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Um espirro.

Piper jamais repreenderia alguém por um ato tão natural, espirros eram incontroláveis e perfeitamente cabíveis no inverno de Nova York, onde a neve congelava até os ossos, mesmo que no momento estivesse assistindo a última temporada de Game of Thrones e sua atenção tivesse sido desviada do diálogo por alguns segundos.

Como poderia culpar sua namorada por espirrar?

"Posso quando ela está assim a quase um mês e se recusa a ir ao médico."

— Ei. — Chamou, tentando ocultar o tom irritado que espantava o frio de seu corpo, Reyna jogou a manta para o lado, esticando-se até a ponta do sofá em busca de lenços de papel. — Você não quer que eu compre um xarope? — Ela assoou o nariz com força, quase como se estivesse lhe dizendo um não.

Piper tinha quase certeza que mais uma agressão daquelas seria suficiente para chamar uma ambulância.

— Eu só preciso beber bastante água. — A voz rouca e baixa denunciava o estado precário da garganta, ela jogou o lenço no lixo ao pé do sofá e enrolou-se novamente ao cobertor grosso ao seu lado, voltando a prestar atenção no episódio.

Era estranho que quisesse lhe dar um cascudo?

— Todo mundo tem que beber bastante água, isso é bem saudável. — Voltou-se para a TV de plasma também, sem entender o que diabos Cercei estava fazendo dessa vez. — Mas só isso não vai curar sua gripe. — Resmungou brincando com o balde de pipoca.

Era como convencer uma criança de que tomar vacina era bom.

— Não estou gripada. — Ela também resmungou contrariada, a voz de Reyna sempre era precisa e em um tom sólido como a de um xerife ou general, mas ficava difícil levar a afirmativa a sério com o timbre nasal.

— Está mal da garganta, com o nariz escorrendo e tosse: como não está gripada? — Indagou enquanto sentia sua proposta pacífica desmoronar, foram malditas três semanas em que tentava convencê-la a fazer o óbvio, era o cúmulo da teimosia.

— É só por causa do tempo. — Seus olhos seguiram o movimento da mão de sua namorada até a pipoca em seu colo, agora pouco se importando com a série.

"Que desculpa idiota!"

— Eu não estou desse jeito. — Tentou soar casual, imitando seus movimentos, o que provavelmente não daria certo.

"Se não está gripada por que está evitando me beijar?"

— Não temos organismos iguais. — Suspirou e rolou os olhos, a procura do resto de paciência que talvez tivesse. — Perdemos o final do episódio. — Disse com decepção estampada na voz, Piper checou rapidamente os créditos antes de fita-la novamente, sem vontade alguma de acabar com a discussão.

— Se o seu organismo é mais fraco então deveria se cuidar mais, não acha? — Reyna respirou fundo pela boca enquanto procurava pelo controle remoto, apenas após abaixar o volume ela voltou os olhos castanhos aos seus.

Na primeira vez que a viu, Piper achou que uma delegada tivesse se mudado para o apartamento ao lado do seu, — errara por pouco, já que sua nova vizinha era advogada, — o andar era preciso, como se apenas seu objetivo estivesse nos pensamentos, focada até quando levava seus galgos enormes para passear, era como ficar ao lado de um líder militar. Aos poucos a convivência lhe provara que as primeiras impressões poderiam estar erradas.

Exceto quando o assunto era saúde.

"Maldito sargentão."

— Eu me cuido muito bem, McLean. — Era uma sentença, ranzinza como uma diretora de sessenta anos.

— Não é o que parece, Arellano. — Deixou o popcorn na mesinha de centro para cruzar os braços, fitando-a como fazia ao entrar na diretoria de todas as escolas que frequentou na vida.

Reyna era uma mulher madura e decidida com a teimosia de uma criança orgulhosa.

"Onde é que eu fui me meter?"

— Piper. — Sua namorada lhe tirou dos devaneios com um chamado suave e estranhamente sem irritação. — Relaxe, ok? — Sorriu de maneira leve e amistosa, a voz macia estava um tanto rouca por causa da tosse, porém o indício de flerte era claro.

"Como é que é?"

— Você está se matando. — Se manifestou de forma pausada e com obviedade enquanto assistia sua movimentação, sentando-se de frente para si.

— O tempo me dá tosse alérgica. — Esclareceu em murmúrios, aproximando-se centímetros a mais. — Se for ao médico ele só vai me passar um antialérgico. — Ela levou uma das mãos até seus braços cruzados em um pedido mudo para que deixasse a postura séria, acariciando de leve o tecido da blusa, a outra se dispôs a colocar uma mecha de seu cabelo atrás da orelha. — Essas coisas me dão muito sono.

Mordeu o lábio inferior para desmanchar o sorriso antes que se formasse de vez, em uma forma de se convencer de que Reyna não estava tentando fazer o que parecia estar tentando fazer.

— Se é para me fazer melhorar dormindo qualquer outra coisa serve. — Ela lhe deu um sorriso curto de canto quando desfez a postura, escorrendo a mão sem pressa alguma até a sua.

Lhe devolveu o sorriso e entrelaçou seus dedos, Reyna não era nada inocente.

"Você é uma verdadeira víbora!"

Mas ela não estava lidando com uma adolescente pura ou casta.

— Pode tentar me seduzir o quanto quiser. — Percorreu grande parte do pequeno espaço que separava seus rostos, olhando profundamente nos olhos castanhos na penumbra, a voz tão macia quanto a de sua namorada. — Vou continuar a achar isso um absurdo, sua teimosa.

Reyna piscou em um indício de surpresa, uma garoa de satisfação caiu sobre seu ego, ela não era uma advogada de uma série de direito qualquer que conseguia tudo a base do charme, teria que ir ao médico e...

— McLean... — O tom saiu baixo na fala entrecortada por um riso suave, porém cheio de graça, que teve o poder de destruir sua linha de raciocínio, aquele sorriso convencido estava ali outra vez.

Semicerrou os olhos, irritada com o deboche feito as suas custas.

"Por que é que eu ainda tento?"

Reyna cortou o pouco espaço que as separavam sem pressa alguma, seus olhos denotavam divertimento e uma tranquilidade que lhe soou estranha, ela beijou sua bochecha ternamente, envolvendo-a em um abraço.

Cariño... — Sussurrou próxima ao seu ouvido. — Eu vou ficar bem. — Seu corpo relaxou quase de forma instantânea, com a mesma facilidade as mãos enlaçaram a cintura de sua namorada e o suspiro profundo tivera o único propósito de nivelar os batimentos de seu coração.

"Desgraçada."

— Ótimo. — Disse em um murmúrio, ainda contrariada, repousou o queixo no ombro de Reyna e fechou os olhos. — Se ouvir qualquer tosse vou chamar uma ambulância.

Quando voltara para casa naquela noite, — tendo apenas uma parede para definir tal coisa, — Piper se dirigiu a cama sem distrações a mais, jogou-se no colchão macio e rolou para o lado, seu dia fora cheio e cansativo.

Um de seus chapeiros estava doente e Leo, — seu querido sócio e amigo, — tivera que consertar as pressas o motor do Food Truck que ambos levaram tanto tempo para pagar. Abraçou um dos travesseiros na cama sorrindo em nostalgia, a ideia mais idiota de sua vida acabara por se tornar seu ganha pão.

"Ideia? Era só uma brincadeira."

Piper estava reclamando com Valdez em uma aula tediosa de matemática, sobre como conseguir comida vegetariana se tornara chato quando seu restaurante preferido fechou, foram risadas escolhendo do modelo ao nome, a princípio a única consequência fora uma detenção, agora se tudo desse certo teriam outro rodando por aí em breve.

O mundo definitivamente dava voltas.

Um miado baixo se fez presente no quarto, rolou novamente pelos lençóis a tempo de ver Luna subindo graciosamente na cama, a gata não teve cerimonias em virar uma bolinha de pelos pretos em seu colo, afagou o pelo macio ao mesmo tempo em que se punha a encarar o teto.

"Voltas? O mundo é pior que montanha russa."

O primeiro dialogo que tivera com sua atual namorada não era uma lembrança que Piper gostava de retomar. Era uma manhã de sábado qualquer e, em como todas elas sua rotina de levar o lixo para fora não era quebrada, — algo tão rápido e corriqueiro que muitas vezes nem ao menos se dava ao trabalho de fechar a porta de casa, — a grande diferença no evento matinal estava presente na mais nova moradora do 27, junto a dois cães enormes que mais tarde descobriria serem Aurum e Argentum, — mesmo depois de 8 meses diferencia-los ainda era difícil, — Reyna se prontificou a se apresentar e fazer toda a política de boa vizinhança.

Não que pudesse culpa-la inteiramente pelo o que aconteceu, nem ela mesma havia visto Luna saindo pela porta e deveria ser muito difícil controlar dois galgos famintos por exercício.

"Quem tem cães de caça em um apartamento?!"

No final das contas sua gata saiu apenas traumatizada e as donas de ambos os animais sem fôlego algum.

Sua nova vizinha se desmanchara em desculpas e prometera ser mais cuidadosa depois do incidente, a única resposta que dera a princípio fora uma concordância, sem vontade alguma de ser simpática com a mulher que tinha cachorros selvagens, talvez houvesse sido pouco discreta em suas ideias, pois uma semana depois um buque de rosas brancas estava sendo entregue em sua casa.

O tempo fora passando e sem que se desse conta aquele relacionamento começou, sem pedidos de namoro ou gestos escandalosos, ocorrera da forma mais simples e natural possível, quando notara que o motivo de não gostar da secretaria atirada de Reyna ou das besteiras que Leo falava era um sentimento muito longe do fraterno: já era tarde demais.

E depois de seis meses sem se importar muito em explicar os próprios sentimentos a si mesma, as dúvidas de Piper teimavam em não desaparecer e ressurgiam em momentos como aquele.

"O que isso tudo significa?"

Piper não sabia dizer exatamente quando passara a se referir a Reyna como sua namorada, —talvez pouco mais de cinco meses — apresentaram uma a outra aos amigos, saiam juntas quando isso era possível, — ser dona de um restaurante sacrificava boa parte de seus fins de semana, — eram um casal e isso era algo obvio para quem as visse.

Mas o fato era que não sabia ao certo o que estavam fazendo, se por um lado tudo parecia caminhar bem, por outro alguns sinais a deixavam inquieta.

Reyna nunca falava sobre família, não entrava em detalhes sobre o trabalho ou outras intimidades do gênero, tão pouco Piper o havia feito, não lhe contara que seus pais eram famosos e que saira da Califórnia para fugir deles, sua namorada poderia ser filha de um casal de mafiosos ou donos de padaria, não saberia qual alternativa chutar.

Elas gostavam uma da outra, os momentos que passavam juntas eram sempre agradáveis, — mesmo com a teimosia gigantesca de sua vizinha, — se entendiam muito bem entre quatro paredes e tinham o mesmo gosto para séries, era perfeito!

Então por que estava incomodada?

"Porque ninguém está agindo como se quisesse que isso fosse para frente."

Ou será que estava em um daqueles relacionamentos transitórios de comédias românticas em que se esperava o amor da sua vida?

Suspirou longamente enquanto fechava os olhos, estava esquentando a cabeça com questões que poderiam ser esclarecidas com uma simples indagação, o que realmente impedia a situação de ser resolvida era sua falta de coragem em perguntar.

***

Quando Piper saiu do banheiro o vapor escaldante a seguiu pelo quarto parcialmente escuro de sua namorada.

Lançou-se sob as cobertas sem qualquer cerimônia, — o aquecedor fazia um bom trabalho, mas seus pés nunca gostaram do chão frio, — Reyna não pareceu se importar ou notar sua aproximação, concentrada em sua busca por qualquer coisa no celular.

Se ajeitou ao lado dela, sua curiosidade em descobrir o porquê de tamanha dedicação não foi suficiente para deixar de notar os ombros desnudos.

— O que é tão importante para você não ter nem se vestido? — Encostou o rosto em seu braço para espiar a tela do celular, um sorriso divertido tomou seus lábios: não precisava de uma resposta. — O médico disse que esse antialérgico era o que menos dava sono. — Murmurou, rezando para que a graça não estivesse tão exposta em sua voz. — Ou que deixaria você menos bêbada.

O suspiro profundo e cansado arrancou-lhe uma risada que tentava com ímpeto conter.

— Você está a uma semana rindo disso, quando é que vai perder a graça? — Reyna se esticou até o criado mudo para deixar o smartphone, desligando o abajur em seguida, o breu do local a obrigou a forçar a visão a procura da pouca luminosidade que vinha da janela.

— Provavelmente nunca. — Deitou-se na cama quando sua vizinha também o fez. — Falando nele, já tomou sua dose de hoje? — Com a pouca luz era difícil dizer se sua namorada estava mesmo com a cara fechada ou não.

— Acabei de tomar. — O tom suave e baixo lhe pareceu um claro indicio de censura. — A última. — Disse em um suspiro aliviado, pondo-se a brincar com uma mecha de seu cabelo.

— Não é tão ruim assim. — Uma incontestável verdade dita pela semana toda que Reyna se negava em escutar. — Pelo menos agora dá para respirar direito. — Havia até parado de tossir. — Só porque você fica falando coisas esquisitas e contando micos sobre si mesma não quer dizer que...

— Boa noite. — Disse seca enquanto lhe dava as costas, gesto que a surpreendeu a princípio, entretanto o riso que preencheu o ambiente demostrou que nada que sua namorada fizesse para se desviar do assusto daria certo.

— Vamos, Reyna. Não seja ranzinza. — Sussurrou com um sorriso na voz ao mesmo tempo em que abraçava sua cintura sob as cobertas. — Só estou brincando com você. — Beijou seu pescoço, sentindo a pele arrepiar de leve.

— Claro que está. — Piper tinha certeza que o tom de banalidade em sua voz era mais uma tentativa de fuga, ela deslizou os dedos por entre os seus puxando-a para frente, encaixando seus corpos de maneira tão perfeita que a fez fechar os olhos. — Apenas lembre-se que a vingança é um prato que se come frio. — Conteve o sorriso mordendo o lábio inferior, tendo uma pequena ideia de qual seria essa vingança.

Provavelmente iria gostar.

— Como foi a reunião com o gerente do banco? — A mudança súbita de assunto a pegou de surpresa.

— Satisfatória. — Definitivamente a melhor palavra para descreve-la. — O Leo vai começar a procurar por modelos novos amanhã. — Sua namorada soltou um riso baixo e suave, porém cheio de pretensão.

— Eu disse que daria certo. — Outro sorriso se formou em seu rosto, mas dessa vez não teve a intensão de contê-lo.

Reyna sempre estava disposta a dar conselhos, desejar boa sorte ou simplesmente procurar o lado bom de qualquer coisa que dera errado, mesmo que mal conversassem sobre negócios.

Sempre lhe apoiava.

Talvez fosse estupidez sua estar retesando quando deveria apenas deixar que tudo continuasse a acontecer naturalmente.

"E não dormir no ponto como você está fazendo."

— Eu já comentei que a minha mãe é atriz? — Rezou para que seu tom estivesse banal como imaginava em sua cabeça.

— Não. — Dessa vez o murmúrio saiu com pitadas de sono, talvez fosse o remédio, o ambiente, ou os dois. — Por que?

— É que ela vai vir apresentar um espetáculo. — Poderia dizer depois que seria na Broadway. — E me deu um ingresso a mais. — Na realidade eram cinco, que estava pensando em sortear entre seus clientes. — Você quer ir comigo?

Piper não se lembrava da última vez em que ficara nervosa ao convidar alguém para sair.

"Com 15 anos? Acho que com 16, mas não foi quando..."

— Claro. — Suspirou a palavra enquanto apoiava melhor a cabeça no travesseiro, em um claro indício de que detalhes só seriam computados amanhã, conteve o suspiro de alívio. — Lembra daquele restaurante no centro? Na primeira vez que saímos? — Indagou, brincando com seus dedos e deixando-a confusa.

— Sim. — Não sabia o que ela queria como resposta.

— Acha que sua mãe vai gostar dele? — Abriu os olhos com o susto, não vendo mais que a escuridão.

"Você é uma imbecil, McLean."

— Acho. — Sussurrou, tentando não parecer nem tão surpresa nem tão feliz. — Ela gosta de qualquer coisa que lembre Paris.

Sua namorada riu baixo e murmurou um que bom, dando o assunto por encerrado, mas o dorso de sua mão continuava a ser afagado.

— Boa noite. — Beijou sua nuca em um contato casto e suave.

— Boa noite. — Ela apertou sua mão por uma última vez, antes de realmente se entregar aos delírios do antialérgico.

Por uma última vez naquela noite Piper sorriu, tentando se lembrar qual dos galgos era Aurum e qual era Argentum.

Devia mais aqueles cães, — e não poderia se esquecer de Luna, — do que um dia poderia imaginar.


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Notas finais do capítulo

Sabe, uma parte dessa one-shot é meio que verdade U.U

Minha mãe sempre pega no meu pé quando estou quase doente e fico me recusando a tomar essas drogas e.e

Caso tenham algo a dizer, — críticas ou sugestões, — não deixem de se expressar XD

Xaaaaau o/



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