A Dádiva do Tempo escrita por Lua Chan


Capítulo 6
O Homem Impossível




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/740808/chapter/6

A cópia humana do Doutor sorriu maliciosamente, como se quisesse intimidá-lo daquela maneira, porém ele sequer se moveu. John Smith caminhava ao seu redor, como se fosse o lobo mau e o Doutor, sua presa. Eleven tentou o máximo para manter uma postura indiferente, mas aos poucos ele foi cedendo.

— O que foi, Doutor? - pergunta a cópia, como se tudo não passasse de uma piada - Está com medo de si mesmo?

— Como isso é possível? - o Doutor questiona, sem mesmo piscar.

O sorriso cínico de John Smith finalmente desaba, dando lugar a uma expressão sombria. Eleven não pode impedir de sentir um calafrio horrendo.

— Como o quê é possível? - questionou ele, quase que retoricamente - Que nós dois estejamos num mesmo lugar ao mesmo tempo? Hm... deixa eu pensar...

— Pare de brincar comigo, Cabeça de Coco. - murmurou Eleven, aderindo "Cabeça de Coco" como um apelido para John Smith, afinal, ele era muito cabeludo - Tem algo errado aqui e você explicará tudo!

— "Cabeça de Coco"? Que mal gosto. Mas nem posso julgá-lo, não é mesmo? Somos a mesma pessoa. Ou quase. Bom, não importa.

— Eu me importo! - Eleven retruca, impaciente. Ele nunca conseguia manter-se calmo - Eu sei com quem estou falando, John Smith, mas você, meu amigo cabeludo, é um evento impossível.

— Ooh! Eu gostei dessa palavra! - John Smith o provoca, como se fosse uma criança animada para assistir à uma queima de fogos - "O Homem Impossível". Até que soa bem. Enfim... não posso negar, Doutor, você está certo. Como sempre.

— Oh, é claro que estou.

— Mas tem algo que está faltando. Algo... uhm, como você diria? "Bem no canto do olho"? 

Eleven fica mais sério desta vez, a raiva e a dor voltaram a abrigar em seu peito. Aquela era a frase que falara à Amelia Pond há muito tempo, quando a versão mais adulta da garota de cabelos flamejantes acabara de conhecê-lo. O Doutor ainda se lembra da fantasia de policial que a menina usava (por breves momentos, ele ficara bem nervoso).

Seria fácil demais negar o que ele estava sentindo, mas era injusto. O Doutor sentia falta de sua Amy, de Rory. Seus Pond, suas esperanças. Não foram necessariamente os melhores companions que já teve - e ele teve tantos! -, mas com certeza eram uma das melhores companhias que um homem estranho, louco e maltrapilho como ele poderia pedir. Mas eles não estavam ali agora, essa era a mais angustiante realidade e ele detestava admitir isso.

— O que foi, Doutor? Eu abri a rachadura em seu peito? - o estranho homem à sua frente riu como se não houvesse amanhã - Desculpe, desculpe. Até eu tenho que admitir que os trocadilhos foram bem pesados.

— O que está faltando, seu completo imbecil? Do que você está falando?

— Olhe ao redor, Doutor. - John Smith abriu os braços, como se tentasse apontar para todos os locais possíveis, dentro da TARDIS - Você não já se perguntou como tudo o que estava acontecendo agora é possível? Como pode a tão bela e encantadora Rose estar na Terra, em Londres, quando na verdade deveria estar numa dimensão perdida através do Espaço-Tempo?

Como ele sabia disso tudo? Eles poderiam até vir de uma mesma pessoa, mas John Smith não passava de uma cópia, assim como River afirmara. Eles não podiam, necessariamente, compartilhar os mesmos pensamentos, as mesmas sensações. Eram corpos diferentes, mentes diferentes, até mesmo os códigos genéticos não eram iguais. O Doutor poderia até estar confuso neste instante, mas o fato de John Smith saber mais do que ele o deixava louco.

— Sei que você precisa completar sua missão, mas será que sabe mesmo qual é ela?

— Não seja ridículo. É claro que você é o meu alvo. - o Doutor retruca, gabando-se como normalmente fazia quando tinha certeza de algo - John Smith, a cópia meio-humana do Doutor, que deveria estar na Baía de Bad Wolf com Rose e sua família neste exato momento. Pouco estranho você estar na Terra, não é?

— Doutor... sabemos que eu não sou o único evento estranho. - John comenta, deixando o homem sem palavras - Jackie Tyler também está aqui, assim como sua preciosa filha. Ainda acha que eu sou o único esquisito? Para falar a verdade, eu sei qual é sua missão, Doutor.

— Ah, é? - disse Eleven, meio cético. Suas palavras pareciam ser cheias de veneno, mas algo, no fundo, fazia sentido.

— Sim, sim, sim. E se você quiser, eu posso dizer tudo!

A proposta soou incrivelmente tentadora. O Doutor estava perdido naquele mundo, cheio de dúvidas e inseguranças e Rose Tyler era a maior delas. Se aquele sujeito realmente pudesse contar tudo, ele poderia cumprir sua tarefa com mais rapidez, quem sabe até com mais eficiência. Sim, John Smith, agora, era a chave de tudo.

— Então vamos lá, Cabeça de Coco! Conte-me tudo o que sabe.

John Smith riu pela terceira ou quarta vez, aquilo já havia virado um hábito. A confusão bateu a porta da sua consciência novamente.

 - Não é tão simples assim, Doutor. - diz ele, sem abandonar o sorriso malicioso dos lábios - Para tudo existe um preço.

— E o que você quer? 

— A pequena e doce Emma. - os corações do Doutor aceleraram à menção do nome da filha de Rose. Ele não podia fazer aquilo, era baixo demais - Quero que  a traga para mim.

Dessa vez, era o Doutor que estava sorrindo com o mesmo tom de malícia que sua cópia meio-humana. Ele diminuiu a distância entre os dois e suspirou pesadamente.

— Escute bem, Cabeça de Coco, eu posso ser um homem determinado, mas não sou um traidor. É meu dever salvar as pessoas e não é você quem irá mudar o rumo da minha vida.

— Você corre perigo, Doutor. Se se apegar muito às pessoas da Terra, você estará perdido. 

John alerta, prestes a ir embora da TARDIS. Sua mão repousava na porta azul da nave e o Doutor sequer se importou de se despedir dele. Já estava pronto para sentar-se no pequeno sofá que acomodava na máquina, quando John Smith volta a falar.

— Você fala de salvar vidas, Doutor, mas por que não é capaz de salvar a sua?

Por fim, o homem o deixou. O Doutor ficou pensativo, tentando gravar todas as palavras importantes que sua cópia dissera, mas era muito para absorver. Eleven também pensou em Emma, já que John fez questão de colocá-la em jogo, mas esta era uma preocupação para o outro dia. Agora ele merecia descançar por algumas horas.

[. . .]

O sol finalmente chegou, e os barulhos da TARDIS serviram como um perfeito despertador. O Doutor emitiu um leve bocejo, ele não dormira há muitas semanas, já que não via tanta necessidade. Mas mesmo descançando, ele não sentiu-se bem. Ele havia sonhado com Rose e com o dia em que ele a havia deixado na Baía de Bad Wolf com John Smith. Ele não gostava de despedidas e lembrar daquela era, no mínimo, doloroso.

— Bom dia, srta. Sexy. - ele murmura para a nave, que emite um ruído como resposta. O Doutor sorri para ela, enquanto acaricia a madeira de sua Velha Garota - Não fique com ciúmes de Rose. Ela é uma ótima companheira. Só preciso me encontrar com ela, agora. Você vai ficar bem, sem mim?

A TARDIS emite o ruído novamente e o Doutor se sente feliz. Ele precisou esconder a TARDIS num lugar mais discreto, já que os Tyler não deveriam vê-la. Após checar o painel da nave, Eleven vai embora.

Após alguns minutos caminhando pelas ruas londrinas, o Doutor chega na casa dos Tyler. Ele sentiu uma felicidade brotar em seu peito só de lembrar do sorriso de sua Rose. Saber que poderia vê-la novamente era o melhor presente que poderia receber. Tudo estava ocorrendo perfeitamente até ele ouvir murmúrios de dentro da casa.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Dádiva do Tempo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.