Clichês escrita por Miss A


Capítulo 11
Como ter conversas bizarras, com Rose Weasley




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Queria saber para onde é que o discurso de James sobre não deixar a nossa amizade acabar por causa de sexo tinha ido parar. Será que ele tinha enfiado no rabo de alguém?

Afinal, qual era o problema dele?

Estava agindo daquele jeito ilógico por quê?

Normalmente quem fazia esse tipo de coisa estúpida era eu.

Meu celular emitiu um som de notificação. Era @vovôarthur. Sim, eu tinha favoritado o seu perfil.

Aposto que Winston Churchill já teria feito algo a respeito desse limite de 140 caracteres.

Sorri. O velho já chega citando Churchill.

Deixei o celular de lado e voltei-me ao meu livro.

O celular voltou a apitar.

E de novo.

E mais uma vez.

Peguei o celular. Eram todos tuítes do meu avô.

Eu deveria esperar que James viesse falar comigo, mas não consegui me conter. Chamei-o em um aplicativo de comunicação textual do celular.

Vovô Arthur no Twitter era motivo o suficiente para uma trégua. 

Ele não vai parar mais. Você criou um monstro.

James logo me respondeu.

Vovô Arthur?

Sim, respondi.

Eu não criei o monstro, só dei a chave para ele se libertar.

Que é quase a mesma coisa, eu disse.

É tudo questão de perspectiva.

“Digitando...” ficou piscando na tela por vários segundos.

Não está escrevendo uma dissertação filosófica, está?

Estava. Mas já que você não quer ouvir meus argumentos, não vou enviar.

Não, não quero saber da sua teoria.

Uma lástima, porque ela é incrível, ele escreveu. Sorri com a sua presunção.

Você não é nada justa, ele tornou a escrever, eu sempre escuto as suas teorias.

Nunca te obriguei a nada.

Isso é uma mentira deslavada.

Quando eu te obriguei a me ouvir?, perguntei.

Toda hora. Quando você começa a falar não há quem te faça parar. Portanto, sou obrigado a te ouvir.

E eu tenho culpa de ser aquariana?

Mas eu não te obrigo a ouvir. Você escuta por que quer. Sabe, é tudo questão de perspectiva, eu provoquei.

Quanta incoerência.

E não somos todos incoerentes?

Ele visualizou e não respondeu. Esperei por alguns minutos. Meu estômago estava fazendo uma performance de trapézio, o que era ridículo.

Ridículo comparar a sensação com uma performance de trapézio.

Ridículo ter essa emoção diante de alguém que você conheceu a vida toda.

Deixei o celular de lado e fiz a única coisa que eu poderia fazer para aplacar aquela sensação.

Dormir.

 

 

Tive um pesadelo onde eu estava grávida do Proust¹.

Despertei assustada e senti uma presença perto de mim, eu estava pronta para gritar quando James abriu a boca.

— Rose? Está acordada?

— Estou.

Senti e ouvi mais do que vi, já que o quarto estava um breu, James se deitando ao meu lado.

— Você vai continuar agindo como um idiota? – Sussurrei.

— Não. Desculpe – Ele suspirou - Eu só estava...

Esperei sua justificativa, mas ela não veio.

Ele se mexeu e senti sua mão me tateando. Seus dedos roçaram minha pele até o meu queixo. Ele segurou meu rosto e se aproximou para me beijar e eu deixei.

Não demonstrei nenhuma resistência enquanto ele me despia, me apalpava e beijava. Ao contrário, puxei-o para mais perto e deslizei minhas unhas pelo seu corpo. Desejava-o tanto que nem me preocupei se os meus pensamentos soariam clichês ou não.

— Detesto dizer isso, mas precisamos ser mais silenciosos - James falou no meu ouvido. Sorri.

— Fred vai achar que eu estou com o meu crush secreto.

— E eu sou?

— O que? O meu crush? Particularmente acho essa palavra ultrapassada.

Ele parou de se mover.

— Você sempre tenta se esquivar.

— Tento?

É claro que eu tentava. O que mais eu poderia fazer?

Beijei-o e o estimulei a continuar.

 

 

Ele não permaneceu a noite toda. No outro dia e nos dias que se seguiram não comentamos sobre a estranheza de James do fim de semana.

Mas uma sensação incomoda permaneceu comigo, como se eu soubesse que algo estivesse inacabado e aquilo voltaria à tona novamente.

Estávamos almoçando junto com Fred, quando aconteceu.

— Vi Scorpius ontem – Fred começou.  

Assenti com a cabeça e continuei comendo, não estava a fim de falar sobre Scorpius, especialmente perto de James.

— Ele perguntou de você.

Eu não disse nada.

— Ele comentou que você fugiu dele na boate.

Murmurei um “hum” e lhe lancei um olhar desinteressado.

— Acho que ele gostou de você.

Claramente ele não conseguia enxergar a minha falta de interesse no assunto.

— Achei que era ele com quem você estava saindo.

— Quem era no telefone hoje mais cedo? – Eu o cortei, bruscamente.

— Ah sim. Dominique te ligou, mas você estava no banho.

— O que ela queria?

— Não sei. Ela desligou na minha cara.

Eu ri.

— Como assim?

— Ela falou algumas palavras, eu falei outras, acho que ela se irritou e desligou.

— Quais palavras você disse?

Ele deu um sorriso malicioso.

— Palavras.

James levou o prato até o prato na pia.

— Pode deixar aí, eu cuido dos pratos – Já que James tinha cozinhado, outra pessoa deveria lavar a louça. Era a nossa regra.

Ele assentiu com a cabeça e saiu sem dizer nada. Parecia mal-humorado.

Fred ergueu uma sobrancelha para mim, intrigado com o comportamento calado de James. Balancei a cabeça em negativa, sem saber o que dizer.

Não é como se soubesse muito do que estava acontecendo.

 

 

Depois do almoço Fred voltou ao estúdio e eu fui me juntar a James na sala.

Abri o notebook e minutos depois eu estava rindo.

— O que foi?

— Átila, o Huno.

Ele me olhou sem entender.

— Sempre rio quando penso nesse nome – Expliquei. Ele franziu o cenho.

— O que você está vendo ai? – Ele se inclinou para a tela do notebook.

— Lendo sobre o Bob Dylan.

— E como disso você caiu em Átila, o Huno?

— Por causa de Hurricane, uma música dele.

— Sua mente é bizarra.

— Talvez.

Sorri.

— Sabia que Bob Dylan foi o primeiro músico a ganhar Nobel de literatura?

Ele não falou nada, mas achei o seu silêncio foi convidativo o suficiente.

— E acredita que ele não foi receber o prêmio na Suécia? Aposto que a Academia ficou furiosa.

— Esse é o risco de dar o prêmio para um esquerdista maconheiro.

Eu ri.

— E você? O que está fazendo? – Eu olhei para no notebook em seu colo.

— Escrevendo.

— Escrevendo o que?

— Uma coisa aí.

— Vai me mostrar?

— Você quer ver?

— Quero.

— Hum.

— E então?

— Não vou te mostrar.

— Por quê?

— Porque não.

— James!

— Eu te mostro quando terminar.

— Mas o que é?

— Quando eu terminar você verá.

Franzi o cenho.

— Não é uma carta de suicídio igual da Virginia Woolf², né?

— Não.

Voltei-me para o notebook. Bati os dedos no teclado. James me olhou.

— O que foi?

— Já ouviu falar do paradoxo do mentiroso?

Coloquei o notebook na mesa de centro e encolhi as pernas no sofá.

— Não.

— Se eu digo que sou mentirosa, eu estou mentindo porque sou uma mentirosa, então sou verdadeira, certo?

Ele continuou me encarando e eu continuei.

— Mas se eu sou verdadeira, eu estou mentindo quando eu digo que sou mentirosa, portanto eu sou uma mentirosa. Porém se a frase “eu sou uma mentirosa” é uma mentira, eu sou o que? Se não sou mentirosa e nem verdadeira, o que sou?

Ele franziu a testa.

— Você quer explodir minha mente?

— Essa é a intenção.

Ele balançou a cabeça e voltou-se para o notebook. Havia indícios de um sorriso em seu rosto.

— Pensei que questões filosóficas te excitassem.

Ele ergueu a sobrancelha.

— Então, esta é a sua verdadeira intenção.

— Fui muito óbvia? – Brinquei. Ele fechou o computador.

— Tão óbvia que só faltou você se atirar no meu colo.

— Eu posso fazer isso agora.

— Seria ótimo, mas eu preciso terminar isso – Ele apontou para o notebook— Aliás, eu vou escrever lá no quarto, assim você não me distrai.

— E eu me iludindo achando que eu era a sua musa.

— Claro que é - James beijou brevemente meus lábios e foi para o quarto.

Fiz uma careta.

Se James achava que podia me deixar no vácuo assim, ele estava enganado.

 

 

— Você está com dor de cabeça? – Debochei, abrindo a porta de seu quarto.

Ele estava tirando a camisa.

Obrigada por facilitar o meu trabalho, querido.

— Não.

— Você está com cólicas menstruais?

Ele ergueu a sobrancelha.

— Isso seria difícil já que eu não tenho um útero.

— Sorte sua – Sentei em sua cama.

— O que você quer?

Enrolei uma mecha de cabelo no dedo, tentando ser óbvia.

— Adivinhe.

Ele estreitou os olhos com a minha insinuação descarada. Deu uma olhada para o notebook, sussurrou um “dane-se” e veio para a cama.

 

 

— Talvez devêssemos fazer um acordo.

— Que tipo de acordo? – Já estava pensando em altas perversidades.

— Um acordo de exclusividade – Ele sugeriu isso como se estivesse falando sobre a estação do ano – Você não sai com ninguém, eu também não.

— Por quê?

— Você está querendo transar com alguém além de mim?

— Sempre é bom ter a opção.

— Bem, eu prefiro que você não tenha.

— É uma pena que não é você que decide esse tipo de coisa.

Ele ignorou a minha ironia.

— Só estou propondo um acordo que pode nos ser útil.

Meu lado apaixonado enxergava vantagens. Já o lado racional achava a ideia perigosa.

Analisei-o, enquanto algo me ocorria.

— Você está com ciúmes ou algo assim?

— Não viaja, Rose.

Ele não tinha me convencido.

Fazia algum sentido.

Eu só não esperava que o seu ciúme poderia ser tão intenso ao ponto de propor um acordo desses.

James, o cara que saía com uma garota diferente toda semana, oferecendo exclusividade.

— Toda vez que você diz isso é porque está escondendo algo.

— Talvez seja isso o que eu quero que você pense.

— Er, não. Você não é tão inteligente, assim.

— Talvez não, mas sabe o que eu sou? – Ele correu a mão pela minha perna desnuda.

— O que?

— Persuasivo.

Ele se aproximou, me abraçou e beijou o meu pescoço.

— Você é tão previsível.

Imaginar James com ciúmes me deixava bastante satisfeita.

— Pode até ser, mas ainda assim é uma arma eficaz.

Ele beijou-me com mais intensidade do que eu estava esperando.

— E então, amor?

Sempre tive dificuldade em dizer não ao James.

E este parecia ser um dos meus carmas.

— Tudo bem.

James sorriu antes de voltar a me beijar.

 

Depois disso perdi a razão sobre as coisas, se é que eu já não havia perdido.

 

 

Eu estava indo para a sala de aula quando meu celular tocou. Era Dominique.

— Alô.

— Por que não me ligou?

— Desculpa, eu estava ocupada.

— Certo. Você está ocupada agora?

— Estou na faculdade.

— Ótimo, então você não está ocupada.

Revirei os olhos.

— O que você quer?

— Sair com você. Vamos tomar um café?

— Sorte sua que minhas aulas hoje são chatas.

— Você viria me encontrar mesmo que suas aulas fossem espetaculares.

— Bem, sim. Mas se alguém perguntar, eu vou negar.

Ela riu.

— Te mando o endereço por torpedo.

— Ok.

— Não demore.

 

 

Quando cheguei à cafeteria, Dominique já estava lá. Fizemos nossos pedidos e quando o garçom se afastou eu tive liberdade para colocá-la contra a parede.

— Você me chamou por algum motivo específico?

— Não. Sim. Talvez.

— Poderia tentar ser mais evasiva?

— Tem algo, mas eu não quero pensar nisso.

— Algo ou alguém?

Ela apertou os lábios.

— Se eu responder estarei pensando sobre, o que vai contra o meu objetivo.

— Ok, podemos falar sobre outra coisa. Algo que você goste. Celebridades, fashion week ou algo mais importante, como o biquíni da moda.

— Eu acho que quem gosta de falar dessas coisas é você.

— Dificilmente. Mas variar um pouco é bom. Fred e James nunca sabem das fofocas da corte.

— Eles não devem saber nem quem governa o país.

— Os gatos, obviamente.

O garçom trouxe nossos pedidos e Dominique sorriu para ele.

— Pare de flertar com o garçom – Brinquei quando ele se afastou.

— Não estou flertando com ele.

— E eu sou unicórnio.

— Conte-me uma novidade.

— Meu wallpaper do celular é o Albert Einstein.

— O meu é Jack Frost.

— Garota, você precisa superá-lo.

— Eu tentei, mas não consigo. Ele é lindo demais.

— Ele é um desenho animado.

— Pelo menos ele não está morto.

— Einstein pelo menos ajudou a humanidade.

— Jack Frost também.

— Como exatamente?

— Ele nos dá a neve.

— Nossa, realmente, como eu não enxerguei isso? Alguém, por favor, dê um Nobel para o desenho animado.

Ela tentou ficar irritada, mas não conseguiu e acabou sorrindo.

 

 

— Vamos para Paris no inverno?

— Por que não? Meus planos para o inverno se resumem a ver os garotos da Eton³ em seus fraques e eu posso fazer isso nas outras estações.

— Você já não está velha demais para os garotos de Eton?

— Atração não tem idade quando se fala de garotos em fraques.

Ela ergueu a sobrancelha.

— Que fique claro que estou falando dos garotos do último ano.

— Podemos focar na viagem?

— Pensei que você tinha dito que não iria para a França este ano.

Dominique era descendente de franceses, portanto, era recorrente suas viagens ao país para visitar familiares.

— Mudei de ideia.

— Tem certeza que você não quer contar o que está escondendo?

— Eu não sei... É que sei lá.

— Sua concisão e clareza hoje estão ótimas – Ironizei.

— Acho que não tem problema se você souber.

— Se você não quiser me contar está tudo bem.

— Não, eu conto.

Eu esperei.

— É que eu estou saindo com Fred.

 

 

...

 

 


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Notas finais do capítulo

1. Proust: escritor de “o tempo perdido”, além de canceriano.
2. Virginia Woolf deixou uma carta bem comovente ao marido antes de entrar num rio com pedras nos bolsos e se suicidar.
3. Eton: Escola para meninos. Muitos ministros, escritores e garotos da corte inglesa já passaram por lá. Seus alunos são obrigados a usarem fraques durante as aulas.

Eu sei que vocês já sabiam sobre a Dominique, então, sem surpresas UAHSAUSH
Sobre o paradoxo do mentiroso... EU AMO explodir a mente das pessoas com ele.
James e acordo de exclusividade juntos... Seria meu sonho de princesa?

Comentários são bem vindos, não se acanhem. Leitores novos, sejam bem vindos ♥
Vejo vocês no próximo domingo o/



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