Allons-y, Winchester! escrita por Hunter Pri Rosen


Capítulo 6
Perdas e danos


Notas iniciais do capítulo

Hello, Sweeties!

Mais um capítulo chegando por aqui, por ali e por acolá.

É um capítulo beeeeem importante e bombástico, então não pisquem!

Ah! Esse é narrado pelo Doctor mais amorzinho do universo ♥

Boa leitura!



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Sam e Dean Winchester. Gostei muito de conhecer esses dois. Eles têm uma séria inclinação a desconfiar de tudo e de todos, além de tendências violentas desnecessárias, mas acho que é isso que os torna tão fascinantes. 

São lobos solitários, sempre metidos em encrenca pelo o que entendi, mas sempre tentando ajudar as pessoas e tornar o mundo um lugar melhor e mais seguro para elas. Não sei por que, mas me identifico com a causa. Ou, como eles chamam, com o negócio da família.  

É realmente ótimo ter conhecido esses dois caçadores tão peculiares. É esplêndido ter companhia em minha TARDIS de novo. Ninguém é substituível, porém suas presenças aqui aplacam parte do vazio que sinto depois que Martha se foi e Rose — Ah, Rose Tyler... — se perdeu para sempre de mim.  

Procuro afastá-las do meu pensamento, pois sei que preciso me concentrar na aventura perigosa que estou prestes a viver ao lado dos irmãos Winchester. Temos que encontrar o Anjo Lamentador, antes que mais pessoas sejam enviadas a algum ponto do passado para que a criatura possa se alimentar da energia potencial delas. 

É sobre isso que estou conjecturando enquanto ajusto as últimas coordenadas pelo painel de navegação da TARDIS e observo, vez ou outra, Sam e Dean explorarem o interior da minha nave com olhares curiosos.  

É num desses momentos que o Winchester mais velho encontra algo muito simbólico para mim em um dos compartimentos. Algo que me remete automaticamente à lembrança da minha companion perdida num mundo paralelo. 

Não sei como o alcanço tão rápido. Quando dou por mim, já estou diante de Dean e arranquei de suas mãos, talvez de maneira muito brusca, a jaqueta roxa e inconfundível de Rose Tyler. Mais depressa ainda, oculto a peça em outro compartimento, longe do alcance dos caçadores. E como se nada tivesse acontecido, como se não houvesse nada de esquisito em meu comportamento, retorno ao painel de navegação sem olhar para os dois diretamente. 

Um longo e significativo silêncio se estende entre nós, sendo rompido apenas pelo trabalho contínuo e ruidoso das engrenagens da TARDIS. Algum tempo depois, a voz do Winchester mais velho se destaca e se sobrepõe ao som: 

— Você quer falar sobre isso, Doutor? 

Numa tentativa de me preservar, e ainda sem olhar para eles, faço-me de desentendido: 

— Sobre o quê? 

— Eu acho que você sabe muito bem. 

Apesar da resposta taxativa, e até atrevida, de Dean, continuo me esquivando como posso desse assunto que tanto me perturba: 

— Eu não tenho nada a dizer, a não ser que devemos nos concentrar no que vamos enfrentar logo mais. Que tal mantermos o foco apenas nisso? 

O novo e incômodo silêncio me obriga a sair da defensiva e erguer o olhar na direção dos irmãos Winchester. Sam, um pouco mais afastado, mantém um olhar curioso e solidário em mim. Dean, por sua vez, me encara de um jeito firme, também solidário, e é como se entendesse pelo que estou passando, como se soubesse como é se sentir vazio e meio perdido. 

Provando que meu palpite é quente, ele diz incluindo seu irmão no raciocínio: 

— Acredite, eu e o Sammy sabemos exatamente como é perder alguém. Nós somos formados nisso, cara. Mestres em muitas perdas e incontáveis danos pela estrada. Vasta experiência no assunto. — Dean faz uma pausa e prossegue: — Eu também sei que nessas horas, falar sobre o problema é um porre e dói feito o inferno. O trabalho ajuda um bocado a manter a cabeça no lugar, certo? Então, se você quer manter o foco aqui, por mim tudo bem. Mas se mudar de ideia, se quiser encher a cara depois disso e chorar as pitangas, eu estou aqui também. — Sem jeito, ele pragueja baixinho e ressalva: — Digo... Nós, eu e meu irmão, estamos aqui, podemos ouvir e quem sabe ajudar. É isso. 

Confesso que não entendo por que Dean apressou-se em explicar o ponto final. Olho para Sam e noto seu cenho franzido e um sorrisinho surpreso na direção do irmão.  

Nesse mesmo instante, a TARDIS oscila um pouco e, em seguida, estabelece-se no tempo e espaço determinados pelas coordenadas. Chegamos em Lawrence. E apesar de aliviado por ter sido salvo pelo gongo e pelo dever que me chama, vejo-me inclinado a agradecer pelo apoio e pela preocupação: 

— Obrigado, Deanno. — Volto-me para o mais novo e emendo: — Você também, Sammy. 

— É Sam — ele corrige, porém não me parece realmente bravo. 

Animado com o desafio que nos aguarda lá fora, enterro em minha mente — pelo menos por ora — o assunto Rose e lanço-me rumo à saída convocando os dois: 

— Allons-y, Winchester! 

Já do lado de fora, ouço Dean resmungando ainda na TARDIS: 

— Eu juro que da próxima vez que o Doutor disser isso, eu quebro os dentes dele. 

— Quebra mesmo? — Sam soa incrédulo e o provoca: — Porque, olhando daqui, me pareceu que vocês estão ficando amigos, Deanno. Bem rápido, aliás. 

— Cala a boca. 

Contrariando o protesto do irmão, ele solta uma risada e destaca algo que ouviu antes: 

— “Eu estou aqui”? Isso foi bem tocante. Especialmente vindo de você, o mestre em esconder sentimentos e fingir que está tudo bem. O Cass, com certeza, ficaria com ciúme, se tivesse te ouvido há pouco, cara. 

— Bitch — Dean xinga, a poucos passos de mim. 

— Jerk — Sam rebate, também deixando a TARDIS e fincando os pés no beco em que estacionamos. 

Tomado por certa curiosidade, ignorando a demonstração de “carinho” com os palavrões e sem me importar que eles saibam que eu ouvi a conversa paralela, volto-me na direção dos dois e indago: 

— Quem é Cass? 

Dean reage com certa perturbação à minha pergunta, deixando o caminho livre para Sam tomar a sua frente na resposta: 

— Certamente alguém com quem você não precisa se preocupar agora, Doutor. 

Meio zonzo, o Winchester mais velho pisca algumas vezes e fuzila o irmão com um olhar nada satisfeito. Logo depois, dirige-se a mim e esclarece com firmeza: 

— É um amigo nosso.  

Ao ouvir isso, Sam dá risada mais uma vez. Colocando as mãos nos bolsos da jaqueta surrada, provoca o irmão de novo: 

— Só isso? Um amigo nosso? Quanta frieza. — Olhando diretamente para mim, Sam corrige: — Cass é um anjo, nosso amigo sim, porém especialmente do Dean. Sério. Inclusive, muita gente acredita que eles são um casal. Eu mesmo me sinto deslocado e sobrando quando estou perto dos dois. 

Enquanto assimilo a explicação e tento captar qual é a piada nisso tudo, Dean dá uma cotovelada discreta nas costelas do caçula e ralha meio incomodado: 

— Qual o problema com você hoje, hein? Bateu a cabeça durante a viagem até aqui? Eu sou o irmão engraçado, você é péssimo nisso. Portanto, pare. 

Em resposta, Sam dá de ombros e o ignora: 

— Faltou dizer que o Cass, assim como você, Doutor, é um grande fã de sobretudos. Que coincidência, hum? Acho que o meu irmão tem certo fetiche por essa peça... 

Arregalo os olhos ao assimilar tal insinuação, enquanto Dean irrita-se de vez. Olhando tudo em volta e localizando a saída do beco, ele se põe em movimento ao mesmo tempo em que encerra a estranha conversa: 

— Ok, já chega. Vamos caçar aquela maldita estátua e ir embora daqui de uma vez. De preferência, antes que eu arranque os seus lindos e sedosos fios de cabelo, Sammy. 

Por fim dando-se por vencido, porém ainda divertindo-se com a piada, o mais novo dos Winchester segue na mesma direção.  

Apesar das provocações e piadas, a verdade é que me sinto lisonjeado por ter conquistado a confiança e empatia de Dean tão rápido. Com Sam, eu senti que poderia ser mais fácil, uma vez que ele mesmo demonstrou certa empatia por mim na masmorra e foi mais flexível desde o princípio. 

Seja como for, estou realmente feliz e aliviado por termos superado a desconfiança inicial. Talvez seja cedo para dizer que nós três nos tornamos amigos, mas com certeza Sam e Dean Winchester têm potencial para se tornarem meus novos acompanhantes, se assim o quiserem. Foi mesmo muito bom ter encontrado os dois. Acho que esse pode ser o início de uma parceria promissora.  

Sorrio de forma discreta ao refletir sobre isso. Em seguida, retomando o foco e lembrando-me do Anjo Lamentador à solta, tranco a TARDIS e vou no encalço dos dois. Marcho apressado, quase correndo, com o meu estilo ansioso de ser. 

Algum tempo depois 

Como eu previa, o Anjo Lamentador que espreitou Sam e Dean no hotel, onde eles se hospedaram horas atrás, não está mais aqui. O quarto estava vazio quando chegamos, há poucos minutos. Aliás, não se vê viva alma ou estátua angelical alguma em qualquer parte do estabelecimento. A desculpa envolvendo um falso vazamento de gás, criada por Dean, foi mesmo certeira e afastou todas as pessoas daqui e das proximidades. 

Eu diria que foi melhor assim, entretanto, aparentemente isso também acendeu um alerta para o nosso inimigo, levando-o a escapar. Minha aposta é que o Anjo Lamentador em questão desapareceu da mesma forma que irrompeu no quarto: através da janela. O jeito que alguns cacos de vidro estão dispostos sobre o assoalho me dão a nítida imagem da criatura movendo-se na direção da abertura e alcançando o jardim lá fora.  

Uma vez no exterior do hotel, ele pode ter ido para qualquer lugar. E a essa altura, pode estar em qualquer lugar. Virou uma agulha no palheiro. 

— De volta à estaca zero, hum? — Dean resmunga dedutivo, expondo a minha conclusão também. 

Um segundo se passa e Sam contrapõe: 

— Talvez não. 

Assim que seu irmão e eu olhamos em sua direção, ele endireita a postura e expõe seu raciocínio: 

— Aonde um Anjo Lamentador iria para passar despercebido? Praças com estátuas de anjos, igrejas, museus, galerias de arte, fachadas de monumentos antigos, jardins, fontes... Nós só temos que procurar esses lugares na região e expandir o perímetro à medida que avançamos na busca. 

— Claro, bem lembrado. Então vamos começar agora mesmo. — Dean caminha rumo à porta, deixando o quarto logo depois. 

Enquanto sigo ao lado do seu irmão, emendo: 

— Brilhante, Sammy! Você pensou mais rápido do que eu. Geralmente, isso não acontece com frequência. 

Ele respira fundo e reforça: 

— É Sam. 

— A criatura não deve ter ido muito longe afinal. Espero. Talvez esteja tramando o próximo ataque, buscando sua próxima vítima em algum lugar mais ou menos perto daqui. Algo assim. 

— Animador — Sam balbucia com um sarcasmo tangível. 

— Oh, não se preocupe. — Lanço-lhe um sorriso torto, a fim de tranquilizá-lo. — Eu acho que tenho um plano. Nós só precisamos chegar a tempo. 

O caçador limita-se a soltar um riso baixo e reitera: 

— Como eu disse, animador. 

Dean, que nos aguardava do lado de fora, mostra que ouviu a parte final da conversa ao inquerir: 

— Você vai nos contar que diabo de plano é esse ou não? 

Faço uma careta enquanto penso um pouco e percebo que é melhor ser sincero com os dois: 

— Eu ainda estou definindo alguns detalhes. Todos, na verdade. Eu tenho um pré-plano, um objetivo, mas ainda estou formulando a execução, na verdade. Não se preocupem, vai dar certo, tenham um pouco de fé no improviso. 

O Winchester mais velho troca um olhar cúmplice com seu irmão e conclui contrariado: 

— Bem animador mesmo. 

*** 

Horas depois de perambular pela cidade com os Winchester, ido de um lado para o outro e de termos checado cada possível e mísero lugar onde o Anjo Lamentador poderia se alojar, voltamos para o beco inicial, para o princípio de tudo, de mãos abanando e sem qualquer progresso.  

Isso poderia me desanimar, porém apenas me intriga. Além disso, estaria sendo hipócrita se dissesse que não aprecio um bom desafio. E esse caso, em especial, parece estar num patamar diferente de mistério e dificuldade. O gosto pela aventura e o desejo por adrenalina apenas elevam seus níveis em meus dois corações. 

Mal adentramos a TARDIS, e Dean reclama atrás de mim: 

— Eu não sei vocês, mas, para mim, isso está com cara de estaca zero. E temos um segundo problema: eu estou cheio de fome. 

Ao ouvir a última queixa, o Winchester mais novo se detém próximo da porta, relaxa os ombros e propõe: 

— Tudo bem, eu vou comprar alguma coisa. 

— Tem certeza que precisa ir tão longe? — interrompo-o, fazendo Sam deter o passo. — Nós temos a TARDIS, lembra? Eu posso levá-los aonde quiserem. Qualquer restaurante, lanchonete, food truck do mundo, da galáxia, do universo! Nós podemos fazer um verdadeiro tour gastronômico por aí! Em toda a parte! 

Paro de falar quando noto que ao contrário de Dean, visivelmente empolgado com a oferta, Sam parece pouco interessado. 

Mostrando que estou certo, ele ergue as mãos na altura do peito e argumenta: 

— Nós agradecemos, Doutor, mas não é necessário.  

— Como não? — Dean protesta como uma criança birrenta. Ou melhor, esfomeada. 

— Talvez quando resolvermos esse caso, tudo bem. Por enquanto, o melhor é manter o foco em Lawrence. Cabeça, pés e estômago bem aqui. 

Vou argumentar, esclarecendo ao caçula Winchester que podemos voltar exatamente para este ponto da história, mesmo depois de experimentarmos a gastronomia de incontáveis lugares, porém me detenho. Acho que ele está certo, o ideal é mantermos o foco mesmo. 

Parecendo também convencido disso, Dean expira com força e dá o seu aval: 

— Que seja. Mas se não quiser encrenca, não esquece a minha torta. 

Sam despede-se com um sorriso e uma promessa: 

— Pode deixar, eu vou trazer sua bendita torta, Dean. — Antes de cruzar a porta, ainda acrescenta: — Eu volto logo. 

Sabem, eu não prevejo o futuro. Sou apenas um viajante que, em boa parte das vezes, conta com uma tremenda sorte. Alguém que está no lugar certo e na hora certa quase sempre. 

Nesse momento, no entanto, a sorte parece ter soltado minha mão. Não sei por que sinto isso. Deve ser apenas um minuto de introspecção e esquisitice.  

Convencido disso, aceno um tchauzinho para Sam. E logo ele desaparece do meu alcance de visão, misturando-se à noite lá fora. 

*** 

Impaciente e consternado, Dean anda de um lado para o outro da TARDIS, com o celular grudado na orelha, ligando incessantemente para Sam e praguejando baixinho toda vez que a ligação cai na Caixa Postal, depois de muitos toques de chamada sem qualquer resposta. 

Eu quero dizer a Dean que sua preocupação é desnecessária, que Sam, com toda a certeza, está bem e já deve estar a caminho, porém a verdade é que também começo a estranhar sua demora.  

O mais novo dos Winchester saiu há cerca de duas horas, tempo mais que suficiente para comprar o que precisava e retornado. A não ser que algo tenha acontecido durante o percurso e o impedido de alguma forma. 

Afasto esse pensamento pessimista e volto a observar Dean. Ainda mais preocupado com a demora do caçula, ele vira-se na direção da saída e anuncia: 

— Já chega, eu vou atrás dele.  

Também intrigado e querendo ajudar, ponho-me em movimento também. 

— Eu vou com você! 

O caçador afasta o celular do rosto e dispensa: 

— Tudo bem, não precisa, eu mesmo cuido disso, Doutor. Com certeza, o Sammy deve ter se distraído com a sessão de xampus, só isso. Tão típico dele... 

Dean ri de um jeito ansioso da própria piada, e nesse momento percebo que é apenas uma maneira de esconder como realmente está se sentindo, mascarando a angústia com senso de humor.  

Ele se preocupa muito com o irmão mais novo, é óbvio para mim. E isso é totalmente compreensível, já que Sam é toda a família que lhe restou. Além disso, parece que Dean está convencido de que é seu dever cuidar de Sam, zelar por sua segurança sempre, mantê-lo são e salvo a qualquer preço. Com base no breve tempo que o conheço, vejo que ele leva muito a sério o papel de irmão mais velho, como se Sam fosse sua eterna responsabilidade. 

— Eu vou com você, Deanno. Está decidido — insisto, colocando a mão em seu ombro a fim de tranquilizá-lo um pouco e demonstrar o meu apoio. 

Ele avalia a situação por alguns instantes e, por mais que, claramente, queira resolver tudo sozinho, noto certa gratidão em seu olhar, antes dele marchar até a saída e assentir de um jeito breve: 

— Que seja, vamos. 

Logo atrás dele, tento transmitir otimismo: 

— Eu tenho certeza que o pequeno Sammy está bem. Nós vamos encontrá-lo, não se preocupe. 

Dean não diz qualquer palavra, apenas volta a discar o número do irmão e mantém o celular colado ao rosto, enquanto segue com passos urgentes pelos quarteirões seguintes. 

Uma parte de mim realmente acredita que vamos rir disso tudo daqui a pouco. Porém, a ausência de resposta do Winchester mais novo também me deixa com a pulga atrás da orelha. Espero, realmente espero, que Sam Winchester esteja bem. 

Procuro manter essa esperança a todo vapor mesmo quando não o encontramos na loja de conveniência mais próxima ou em dois mercados mais afastados.  

Já sem conseguir conter certo desespero, Dean caminha de um lado para o outro da calçada, enquanto se pergunta de forma incessante: 

— Para onde você iria, Sammy? Para onde? Onde você está? 

Em dado momento, Dean finalmente para de se movimentar e fica calado. Estou convencido de que lembrou de algum detalhe importante ou sugestão. Ele respira aliviado, permite-se até sorrir um pouco e anuncia: 

— Já sei. Sentimentalista desgraçado, eu já sei onde você está! 

Sem fazer perguntas, apenas sigo Dean quando ele praticamente corre pela calçada, parecendo saber exatamente aonde ir e onde encontrará o irmão.  

Isso me deixa aliviado e reacende o otimismo dentro de mim. Ao que tudo indica, logo verei que me preocupei à toa e que Dean ficou de cabeça quente sem necessidade também.  

Sam está bem e logo vamos encontrá-lo, eu tenho certeza. 

*** 

Algum tempo depois, parece que por fim chegamos ao destino que Dean tinha em mente. Paramos em frente a uma antiga casa num setor mais afastado de Lawrence. A fachada está desgastada pelo tempo, a pintura, amarelada, e o jardim tomado por uma vegetação rasteira. O lugar deve estar abandonado há alguns anos, no mínimo. 

De súbito, a imagem diante dos meus olhos me transporta para a breve estadia na masmorra do bunker, quando, mesmo preso, consegui realizar uma rápida pesquisa sobre o caso que havia atraído a atenção dos irmãos Winchester. Esta casa me parece familiar porque já a vi antes, em uma imagem, ao ler uma notícia sobre um dos desaparecimentos. A residência estava ao fundo da matéria. 

— Ao que tudo indica, Rebecca Evans foi vista pela última vez nessa parte da cidade. Meu palpite é que ela encontrou o Anjo Lamentador perto daqui, talvez nessa casa — explano, pensativo. 

Para minha surpresa, no entanto, Dean contrapõe: 

— Não foi por isso que o Sammy veio pra cá.  

Intrigado, volto-me em sua direção e o observo sem entender o que isso quer dizer exatamente. Então, com um olhar meio perdido no imóvel abandonado logo adiante, Dean esclarece: 

— Essa era a nossa casa. Foi nossa primeira casa. Antes do demônio do olho amarelo, ou Azazel, aparecer e arruinar as nossas vidas para sempre.  

Ainda mais perdido e querendo entender a história, balbucio hesitante: 

— Como assim? 

Dean esboça um leve sorriso torto, me olha de esguelha e desconversa: 

— Assim como a sua Rose, essa é uma longa história, Doutor. Terá que ficar para outro dia, lamento. 

A menção à minha companion me convence a respeitar o argumento do caçador. Se é um assunto delicado e pessoal, que ele prefere não revelar agora, o melhor que faço é não insistir na questão. 

Enquanto tento aplacar minha curiosidade acerca da história da família Winchester, Dean torna a encarar a antiga casa e explica resumidamente: 

— Houve um incêndio aqui, há muito tempo. Por anos, a casa ficou fechada e abandonada, ninguém sequer passava perto da calçada. Até ela ser vendida e reformada muito tempo depois. Nós voltamos aqui em 2005, quando um maldito poltergeist enlouquecia a família que tinha acabado de se mudar. 

Dean faz uma pausa e engole em seco, como se houvesse lembrado de algum detalhe importante no meio do relato, mas que talvez prefira não compartilhar no momento. Logo depois, ele conclui de um jeito reservado: 

— Pelo visto, ela foi abandonada de novo. Talvez tenha permanecido assim até essa garota passar por aqui, ter resolvido entrar, quem sabe, e... 

Dean para de falar no mesmo instante em que arregalo os olhos. Uma possibilidade perigosa e uma coincidência fatal surgem em minha mente. E pelo olhar preocupado que o caçador não consegue disfarçar agora, temo que tenha chegado a mesma conclusão que eu. 

Quais são as chances, afinal? Quais são as chances de Sam Winchester ter vindo aqui e entrado na casa? Quais são as chances do Anjo Lamentador que cruzou o caminho de Rebecca ser aquele mesmo do hotel que Sam e Dean viram? Quais são as chances desse mesmo Anjo ter voltado para cá?  

Pessimismo. Novamente me assombra e mistura-se com um mau pressentimento que passo a sentir e me domina pouco a pouco. 

Tento ignorar essa sensação desconfortável, mas não sei bem se sou capaz disso. Seria uma terrível coincidência, mas é possível. 

Ainda tomado por esse sentimento, sigo Dean às pressas quando ele irrompe pelo jardim decrépito e logo empurra a porta de entrada da casa. 

— Sammy! 

O local está escuro e o odor de mofo paira por toda a parte, deixando o ar pesado. O assoalho range à medida que exploramos o primeiro andar feito loucos, correndo e abrindo portas incessantemente, adentrando recintos empoeirados e escuros em busca de Sam. Dean usa uma lanterna para iluminar nosso caminho. 

Algumas portas estão emperradas. Dean abre algumas na base dos empurrões e chutes, até que tomo sua frente e aciono minha chave de fenda sônica na direção da próxima fechadura. Mas nada encontramos na antiga despensa. 

Estou quase acreditando que tudo isso não passou de um palpite de Dean e que nosso desaparecido não está aqui na verdade, quando ele retoma o ritual de ligações e, desta vez, uma resposta acontece. Ou quase isso. 

Sobre nossas cabeças, em algum cômodo bem acima de nós, o toque de um celular se faz audível e crescente. Não preciso fazer a pergunta óbvia, tenho certeza que se trata de um toque específico e bem conhecido para Dean.  

Sam está aqui. 

Depois que corremos para o andar de cima e entramos em um dos quartos, em péssimo estado de conservação assim como o restante da propriedade, encontramos o celular em questão largado no meio do chão.  

Correção: Sam esteve aqui. 

Dean encerra a ligação e dá alguns passos rumo ao interior do recinto. Abaixa-se e pega o celular. 

O silêncio impera. O pessimismo volta a martelar em minha mente quando sinto uma vibração no ar ao nosso redor. Algo se movimentou perto de nós. 

No mesmo instante, e acredito que por perceber o mesmo que eu, Dean se põe de pé e lança a luz da lanterna na direção de um canto do recinto. A luminosidade revela não só uma, mas sim duas estátuas angelicais a poucos metros de nós. As mãos sólidas e cinzas ainda ocultando os olhos frios.  

Sou tomado por uma surpresa estarrecedora. Eu devia ter imaginado que o Anjo Lamentador do hotel não estava sozinho. Geralmente, essas criaturas andam em grupo ou, pelo menos, em dupla. Revezam as vítimas ou as disputam, não sei muito bem. 

Nesse exato segundo, meu pessimismo transforma-se em uma certeza cruel: Sam Winchester não está mais aqui. Não está mais nesse ponto do tempo e espaço. Definitivamente. Ele se foi. 

— Não... — o caçador mata a charada também, soando relutante e inconformado. — Não. De jeito nenhum, não! Eu quero o meu irmão de volta, e esses miseráveis vão devolvê-lo para mim agora mesmo! 

— Não pisque — é tudo o que consigo dizer para Dean nesse momento, com um sussurro. 

De repente, a luz da sua lanterna oscila. O ar a nossa volta vibra mais uma vez. Estamos em apuros.


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Notas finais do capítulo

#EstamosEmApuros #NãoPisque #Salve-seQuemPuder #CorramParaAsColinas #SammyIsGone #Oi?

Well, depois desse capítulo, eu vou ali e já volto.